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31.7.18

FOLHA EM BRANCO - PARTE II





Tudo arrumado, Miguel acendeu um cigarro. A jovem estava a levar mais tempo a acordar do que aquilo que ele previra. Quem seria? À primeira vista, não tinha documentos, pois não trazia nenhuma bolsa, nem se lhe notava na roupa qualquer carteira.
A jovem soltou um gemido e pouco depois abriu os olhos. E que olhos! Grandes, de um quente e aveludado castanho dourado. Na mente de Miguel ficou impressa a imagem que mais tarde iria transpor para a tela. Ele não era um pintor famoso, daqueles cujas obras vão para os museus, mas modéstia à parte considerava-se um bom pintor. Tinha palmilhado meio mundo, e em todos os lugares onde expôs, os seus quadros sempre se venderam bem, e sempre foi disso que ele viveu. Nunca se tinha dedicado a pintar o ser humano. Era um apaixonado da natureza, e  sempre optara por perpetuar as suas maravilhas, mas aquela imagem da jovem, deitada na vegetação o corpo soerguido sobre o cotovelo esquerdo, olhando-o de forma inquiridora, era por demais sugestiva.
Aproximou-se dela.
-Como se sente? - Perguntou.
- Confusa, -respondeu a jovem numa voz melodiosa. – O que faço aqui? Que lugar é este? E quem é o senhor?
Miguel engoliu em seco.“Querem ver que é doida?” – Pensou.
Estendeu-lhe a mão para a ajudar a levantar-se.
- Vamos por partes, - disse calmo. Chamo-me Miguel. E a menina?
- Não sei, - respondeu desconcertada.
Passou a mão, de dedos longos e finos pela testa, como se quisesse lembrar de alguma coisa e por fim murmurou.
- A verdade é que não me lembro. Não me lembro de nada. A minha cabeça está vazia.
Fez-se silêncio. A cabeça da jovem podia estar vazia, mas a de Miguel estava a mil. Quem seria ela? Teria sido a comoção do momento que lhe fizera perder a memória? Ou já tinha acontecido antes, e fora o desespero de não saber quem era, que a levara a tentar o suicídio? De súbito a jovem quebrou o silêncio, como quem acaba de ter uma ideia.
- Mas você sabe quem eu sou, verdade? Não teria vindo para aqui se não fossemos conhecidos. Vejo que é pintor. Sou sua modelo? 
-Não, - retorquiu Miguel. A menina não veio comigo.
-Como assim?- Interrogou a jovem. Pois se estava aqui dormindo, enquanto pintava.
Apertou a cabeça entre as mãos e desatou a chorar.
-Que se passa comigo? Porque não me lembro de nada? Porquê?- Gritou em desespero.




30.7.18

FOLHA EM BRANCO - PARTE I

Re-edição

FOTO MINHA



 O homem que se encontrava por trás de uma tela, perto da falésia, era sem dúvida, além de pintor, um amante da natureza, já que a paisagem ao redor era de cortar a respiração. Era alto e magro, de cabelos compridos, e desalinhados, Vestia umas calças de ganga, que já tinham conhecido melhores dias, e uma camisa de xadrez. A julgar pelas pequenas rugas à volta dos olhos, e pelos fios de prata que iam salpicando o seu cabelo, andaria algures entre os quarenta e os quarenta e cinco anos.
Com vigorosos traços de espátula e cor, ia fazendo surgir na tela, a falésia altiva, com o mar a espraiar-se de mansinho a seus pés, numa suave carícia.
De repente ao levantar os olhos da tela a paisagem tinha-se alterado. Ali perto uma jovem contemplava o mar absorta.
Miguel, assim se chamava o pintor franziu o sobrolho. Tinha escolhido aquele ponto, mais distante da falésia, por ser aquele onde habitualmente os turistas não iam, nas suas incursões, naqueles belos dias de Outono, quando o sol aquece a terra de forma suave, e sem os calores ardentes do Estio.
Sentiu um arrepio. Largou a espátula e foi-se aproximando da jovem, que continuava sem dar pela sua presença. Mais perto percebeu pelo tremor do seu corpo que chorava, e frenético quase correu para ela, agarrando-a precisamente no momento em que decidida, ela se encaminhava para a beira da falésia, numa clara intenção de suicídio.
Contra a resistência da jovem, Miguel aprisionou-a nos seus braços fortes, retirando-a daquele local perigoso.
De repente, a jovem parou de resistir, e o homem sentiu que o corpo dela lhe deslizava entre os braços.
Percebeu que tinha desmaiado. Ergueu-a e ao colo levou-a até junto de onde se encontrava o seu material de pintura. Aí chegado estendeu-a suavemente no solo, e só então viu bem a mulher. Era muito jovem. Quase uma criança. Franziu o sobrolho numa expressão que lhe era característica, sempre que alguma coisa o incomodava. Começou a arrumar o material, enquanto pensava que raio poderia levar uma mulher tão jovem e tão bonita a querer acabar com a vida.  Sim porque a jovem era muito bonita. Um corpo esbelto, assentava numas pernas longas que a julgar pelas calças justas, eram bem torneadas. Um rosto oval, testa alta, nariz pequeno e bem feito, boca pequena de lábios bem delineados, e uma farta cabeleira de cabelos castanhos, levemente ondulados. Os olhos, bom, os olhos, teria que esperar que acordasse para ver a sua cor.







29.7.18

PORQUE HOJE É DOMINGO

Re-edição

PENSO EM TI


Penso em ti
Na solidão
angustiada
dos dias
que dançam
em ondas de agonia
no oceano
do meu corpo
esquecido.

Penso em ti
Nos labirintos
do sonho
perdida.
Como barco
sem rumo
nem norte
em mar de
tempestade.

Penso em ti
Na escuridão
silenciosa
da minha noite
que cavalga
o tempo sem fim
do meu corpo
ondulante
de desejo.

Penso em ti
Principio e fim
da razão
do meu ser.

Elvira Carvalho


Logo mais quero ver se ainda tenho tempo para mais uma visita. Depois os posts estão programados e eu visitá-los ei quando puder, já vos disse que só levo o Smartphone, e nem sempre é fácil comentar através dele.

27.7.18

CONVERSANDO COM O LEITOR

Bom dia. Chegou ao fim mais uma das minhas histórias. Esta como a que se segue um pouco mais longa. 51 capítulos.  Certo podia ter acabado no 42 e deixado o resto à vossa imaginação, Mas estamos no verão, o calor cansa e não quis sobrecarregar-vos. Rsrsrs.
Falando sério, havia ainda umas pontas soltas, na história. Gostaram? Sabem que quando acabo uma história fico sempre à espera de saber o que mais vos agradou nela, e o que acharam que devia ter melhorado?
Uma das coisas que parece ter-vos surpreendido, é o facto da protagonista chegar virgem ao casamento. Não é muito normal nos dias de hoje, mas pensem comigo. O Cláudio amava e admirava Jorge como se fosse seu filho. A Lena era filha do Jorge, e os dois viviam na mesma casa que ele. O respeito pelo pai, terá contido os desejos de Cláudio que depois de ter magoado Jorge com as suas desconfianças, não quereria fazê-lo de novo.
Nesta historieta, eu quis passar duas coisas em que acredito, A primeira, é que até o facto mais doloroso que nos aconteça, pode sempre levar-nos a uma situação feliz. E aqui está. A morte de Natália, parecia ser uma dor inultrapassável para a filha, e no entanto foi o ponto de partida para a sua felicidade futura. A segunda, é que não adianta fugir, aquilo que temos de viver, assim como o que nos preocupa, viaja connosco para onde nós formos. A Helena fugiu, e não resultou.
A próxima, como vos disse, vai ser uma reposição. Andei a ver pelos comentários e muitos dos que o leram já trocaram este espaço pelo FB. Os mais antigos,vão lembrar-se da história, se ela tiver despertado interesse suficiente para que a vossa memória a tenha registado. Mas muitos de vós não a conhecem, e os/as meus/minhas colegas e amigos/as da UTIB, também não. Só tiveram conhecimento do Sexta o ano passado. Vai ficar programada, para sair todos os dias de manhã.
Sempre que puder visitar-vos-ei. Lá não tenho computador  e às vezes não é fácil seguir-vos pelo Smartphone.
Obrigado pela vossa paciência e carinho. Sejam felizes.




Deixo-vos com um pequeno poema que a minha professora Leonor Alvito, me dedicou na festa de encerramento.

Tendo pela prosa paixão
Passa horas a escrever
Quase a titulo de exceção
E com muita emoção
A aluna Elvira Carvalho
O seu poema ao Amor
Para todos nós quis ler.








26.7.18

O DIREITO À VERDADE - FIM




Mais tarde, ela descansava a cabeça no peito forte do marido, enquanto ele, lhe contornava o rosto numa terna carícia. Ela suspirou. Preocupado ele perguntou:
-Estás bem? 
-Sim, - murmurou
-Foi incrível! Nunca experimentei nada assim, senão em sonhos.
Ela levantou a cabeça e olhou-o.
-Sonhavas que eu estava contigo, neste quarto e fazíamos amor.- Não era uma pergunta, era mais uma afirmação, como se ela soubesse
- Muitas vezes, Mas... como sabes? Não me digas que também sonhavas o mesmo, - disse rindo
- Quem julgas, que me ensinou a ser assim tão desinibida? Acreditas que a primeira vez que tive esse sonho, ainda nem sabia quem eras, e vi nele, este quarto tal qual é, sem nunca ter estado na quinta?
- Mais uma razão para nunca duvidares do amor que nos une. Somos almas gémeas, minha querida. Percebi-o desde o primeiro momento que nos vimos. Mas agora é tempo de nos levantar e vestir, já anoiteceu.
-Meu Deus! - Exclamou ela saltando da cama. Daqui a pouco chegam os nossos pais. Que vergonha.
Ele seguiu-a para a casa de banho rindo.
-Querida; estamos casados, lembras-te? E os nossos pais sabem o que é ser recém-casado.
Meia hora mais tarde entravam no carro e dirigiam-se para Coimbra.


Epílogo

Vinte e três de Abril do ano dois mil e dezoito. Cláudio e Helena, estão casados, há quase trinta meses. Durante aquele tempo muitas coisas tinham acontecido nas suas vidas. A casa deles ficara pronta, Cláudio conseguira enfim aquele tal vinho especial que tentava criar há anos, e que acabara de lançar no mercado com o nome de Quinta dos Milagres. Carmo recuperara a saúde e o seu vigor, e até o tio Alberto, estava de novo apaixonado, depois de doze anos de viuvez.
Helena terminara o Curso de História Contemporânea, e já estava a lecionar no Colégio da Imaculada Conceição em Viseu. A sua vida era agora muito diferente daquela que tinha tido em Lisboa. E a maior diferença operara-se nela. A Helena de hoje, era uma mulher feliz e segura de si, do seu amor e das suas capacidades como mulher. Daquela mulher, triste, insegura, que fugia de qualquer relacionamento. por não acreditar ser merecedora, de viver um grande amor, não ficara nem resquício.
Hoje o casal está em Lisboa. Para apadrinharem o casamento de Paula, a amiga de Helena, que foi sua madrinha de casamento, e Sandro o jovem  namorado de há mais de quatro anos.
Tal como a amiga fizera com ela, Helena ajudou Paula a aprontar-se para a cerimónia. E acabava de lhe prender nos cabelos a tiara com o véu, quando a mãe da amiga, entrou no quarto.
- Filha o carro para te levar, acaba de chegar. A noiva deve chegar um pouco atrasada, mas não tanto que desespere o noivo. Lena é melhor vocês irem andando. Os padrinhos já devem estar no altar quando a noiva entrar na igreja.
Helena deu um beijo na amiga, e saiu do quarto. Encontrou o marido na sala com o dono da casa, que parecia mais nervoso do que a filha.
-Vamos, amor? Temos que chegar à igreja antes da noiva.
Cláudio despediu-se do anfitrião, e saíram em direção ao carro. O trajeto até à Igreja de S. Paulo onde se ia realizar a cerimónia era curto.
Quando chegaram ao altar, a igreja já se encontrava cheia. Cumprimentaram o noivo, que se mostrava bastante nervoso, e os padrinhos dele e ocuparam o seu lugar no lado esquerdo do altar. Ouviu-se a marcha nupcial e a noiva entrou no templo, sendo conduzida ao altar pelo braço do pai.
Na hora em que os noivos fizeram os seus votos de amor e fidelidade, Cláudio apertou a mão da esposa entre as suas e olhando-a nos olhos, repetiu num murmúrio, os votos que fizera quando casara, deixando-a emocionada.
E enquanto o padre declarava os nubentes, marido e mulher, e eles se beijavam, Helena inclinou-se e murmurou:
- Eu e o nosso filho, amamos-te hoje e vamos amar-te para toda a vida.
Surpreso, ele olhou-a interrogativo. Ela limitou-se a acenar com a cabeça afirmativamente, enquanto o sacerdote derramava sobre os nubentes, a bênção final.
Cláudio estava por demais emocionado. Apenas teve tempo para lhe segredar, enquanto os noivos se beijavam de novo, antes de serem submersos, por familiares e amigos, num mar de abraços e felicitações.
-Mulher, tu sabes quando dar uma notícia! Prepara-te, a minha vingança vai ser terrível.
Ela riu com malícia, e apressou-se a ir abraçar a amiga.


FIM




O DIREITO À VERDADE - L




A meio da tarde, os noivos partiram o bolo e pouco depois na pista de dança, Cláudio segredou à sua mulher:
- Quando a música acabar, vamos sair. Estou ansioso por estar a sós contigo.
-E os convidados, não ficarão zangados?
- Os convidados querem é divertir-se. Na verdade ninguém espera que os noivos fiquem até ao fim da festa. Eles também sabem o que é estar apaixonados. E demais os dias são pequenos, daqui a pouco é noite e ainda vamos para Coimbra.  O pai se encarregará de nos desculpar e a festa continuará sem problemas.
Quando os jovens planearam o casamento, impôs-se a escolha do local para a lua-de-mel. Helena disse que gostaria de ir uns dias para Coimbra, não só porque sempre desejou conhecer a cidade, como porque fora lá que se conheceram e se apaixonaram. O pai não achou bem. Afinal Coimbra ficava a dois passos, em qualquer altura podiam lá ir passar um dia, ou até um fim-de-semana. Mas Cláudio apoiou a noiva e assim decidiram que passariam três dias em Coimbra, e os restantes sete no Algarve, afinal estava-se no final de Novembro, com o Inverno à porta, e no sul, a temperatura sempre era mais agradável. Era a vontade da noiva que rejeitou a viagem a Paris, que o tio lhe queria oferecer, dizendo que não se justificava ir para o estrangeiro, quando não se conhecia nada do seu próprio país.
Durante o resto da música, os noivos foram-se encaminhando, subtilmente, em direção da porta e mal a melodia terminou, esgueiraram-se de mãos dadas para o átrio, onde o empregado do hotel, que já tinha sido avisado, lhes entregou as chaves do carro, que já  estava estacionado junto à porta.
Poucos minutos decorridos, o carro entrava na quinta e estacionava frente ao alpendre. Saíram do carro e assim que abriu a porta de casa, Cláudio voltou-se e pegou na noiva ao colo.
- Que fazes?- Perguntou enlaçando-lhe o pescoço.
- É a primeira vez que entras nesta casa como minha esposa. Manda a tradição que o faças nos meus braços e confesso-te que nunca uma tradição foi cumprida com maior prazer, - disse ele encaminhando-se diretamente para o seu quarto, com a  noiva ao colo.
- Mas a minha mala está no meu quarto.
- O teu quarto, agora é o meu, senhora minha,- disse ele pousando-a no chão,
sem deixar de a manter presa nos braços. Procurou a sua boca e beijou-a apaixonadamente, enquanto as mãos ágeis  nas suas costas, procuravam o fecho  do vestido, e começavam a corrê-lo. Continuando a beijá-la começou a despi-la. Notou que a jovem tremia, e lembrando que a mulher que tinha nos braços era virgem, prometeu a si mesmo, controlar a sua paixão, e ser paciente. Teria uma vida pela frente, para dar livre curso ao desejo que o invadia. Aquela era a primeira vez dela, e queria que a recordasse toda a vida como uma coisa muito bonita e prazerosa. Quando o vestido caiu no chão, puxou o édredon para trás, sentou-a na cama e ajoelhando na sua frente, despiu-lhe os colãs, mas conteve o desejo de a ver nua, e não lhe tirou a minúscula cuequinha nem o lindo sutiã de renda branco.  De seguida estendeu-a  sobre a cama, cobrindo-a de seguida. A casa estava fria, a lareira não fora acesa naquele dia, e a mulher doente na lua-de-mel, era tudo o que ele não desejava.
 Sentou-se na cama, descalçou os sapatos e tirou as meias. Desapertou o cinto e tirou as calças e camisa. Levantando o édredon estendeu-se a seu lado Abraçou-a e sussurrou ao seu ouvido.
- Não tenhas medo. Vou fazer com que isto seja especial.
Ela não duvidava de que assim seria. Recordar-se-ia daquele dia, por toda a vida, mesmo quando o seu rosto se enchesse de rugas, e os netos brincassem à sua volta.


E pronto, amanhã chega ao fim esta história.  Entretanto informo que graças aos tratamentos de fisioterapia, tenho menos dores. A cirurgia ao olho será em Novembro, e a consulta de neurologia só consegui para Setembro. 



25.7.18

O DIREITO À VERDADE - XLIX



Legalizado o reconhecimento de paternidade da jovem por parte do pai, e averbado ao seu nome o apelido Noronha, e já com a construção da nova casa iniciada, Cláudio e Helena casaram na Igreja Matriz de Nelas no dia vinte e oito de Novembro do ano dois mil e quinze.
A seu lado, como padrinhos, a jovem tinha o tio Alberto, e a sua grande amiga Paula Correia. Os padrinhos de Cláudio, eram o seu amigo Doutor Ricardo Souto e a esposa Clara.
A pedido de Helena, a amiga viera logo no início da semana, e ficara hospedada lá em casa. Para tratar de todos os pormenores antes do casamento, a jovem sentia-se mais à-vontade, com Paula que era quase da sua idade, do que com Carmo, que além de ser mais velha, era mãe do noivo.
A alegria e simpatia natural de jovem encantaram Cláudio e os pais. Por seu lado Paula também estava encantada com a quinta e a nova família da amiga.
Sandro chegara apenas na véspera com os pais de Paula, e tinham ficado hospedados no Áqua Parque de Nelas, hotel onde se realizaria a festa, vulgarmente conhecida por copo-de-água.
A cerimónia foi muito bonita, apesar do nervosismo da noiva e da emoção do noivo, e dos pais. Nada que não seja vulgar em qualquer casamento.
Depois da cerimónia os noivos viram-se submergidos num mar de abraços e felicitações de familiares e demais convidados.
- Eu não te disse, que tivesses cuidado, não podias andar por aí a atropelar pessoas, que um dia te metias em sarilhos, - disse o padrinho rindo, enquanto abraçava o noivo.
- É um sarilho lindo, de que não quero livrar-me nunca, -respondeu ele emocionado.
Depois de mais uma série de fotografias à saída da igreja, os noivos e convidados lá entraram nos seus automóveis rumo ao hotel, para a festa.
Atento, Jorge estava preocupado com a filha e a determinada altura não se conteve.
-Que se passa querida? Vejo uma sombra de tristeza nos teus olhos. Não me parece que estejas feliz como é natural numa noiva, - disse inclinando-se e falando-lhe ao ouvido.
- Sinto falta da mãe. Gostava tanto que ela estivesse comigo, neste dia.
- Dizem que Deus escreve direito por linhas tortas, e neste caso penso que assim foi. Se a tua mãe fosse vida, continuarias a ignorar a minha existência,  e este momento nunca teria acontecido. Pensa nisso, querida.
- Penso nisso o tempo todo, mas não consigo evitar a saudade, nem deixar de me sentir triste.
-É natural filha, mas tenta esquecer pelo menos hoje. É o teu dia, aquele que se recorda toda a vida. Quer-se feliz. Repara no ar preocupado do teu marido. Já deve estar a pensar que te arrependeste.
A jovem olhou para Cláudio e o seu rosto abriu-se num sorriso radioso, que sossegou o coração do homem.

O DIREITO À VERDADE - XLVIII




- Queres saber se já fizemos amor?- Perguntou inclinando-se para a frente e olhando a amiga nos olhos.
Helena assentiu com um movimento de cabeça, e depois murmurou:
-Desculpa. Não devia ter perguntado.
- Não precisas ficar assim. Não tem nenhum mal. Não disseste há pouco que eu era a irmã, que a vida não te deu? Lena, eu e o Sandro, namoramos há quase ano e meio, amamos-nos e estamos a pensar casar. E quando assim é, é lógico e natural que façamos amor. Não estamos no século passado, onde o sexo era encarado apenas como meio de procriação da espécie. Hoje a sexualidade é uma parte muito importante do relacionamento entre um homem e uma mulher. É parte integrante do amor. Tu não pensas assim?
- Sim, claro – apressou-se a dizer.
- Não me parece tão claro assim, Lena. Parece-me que tu e o Cláudio não viveram ainda esse momento, e tu estás confusa e amedrontada. Acertei?
- De certo modo, sim. Nós nunca… bom, primeiro conhecemos-nos, convivemos apenas dois dias, e eu não acreditava  que a atração que sentíamos, passasse disso mesmo. Uma atração. Agora estivemos a  viver debaixo do mesmo teto que os nossos pais. Trocamos beijos, e uma ou outra carícia mais ousada, nada mais.
- Porque será que eu tenho a sensação de que não me estás a contar tudo? Desembucha, mulher.
- É que sucede uma coisa muito estranha. Já por várias vezes sonhei que entro no quarto dele, me deito na sua cama e os dois fazemos amor de uma forma incrível. De tal forma que quando acordo, fico sempre baralhada, porque tudo me parece tão real, que tenho dificuldade em aceitar, que foi apenas um sonho.
- Olha lá, tu não és sonâmbula, pois não?
- Claro que não. O mais curioso, é que a primeira vez que isto me aconteceu nem sabia ainda quem ele era, nem onde vivia. Estava no hotel em Viseu, foi na véspera de ir fazer o teste com o meu pai. Agora imagina o susto que tive quando mais tarde cheguei à quinta, conheci a casa e vi o quarto dele. Eu nunca tinha estado na quinta, não tinha como conhecer o quarto, mas ele era exatamente igual ao que me aparecia no sonho. O aposento, os móveis, a janela, o cortinado. Tudo. Achas isto normal?
- Bom, normal não será, mas quem sabe tens algum sentido, extrassensorial? Ou então estás tão apaixonada, que enquanto dormes a tua alma vai ter com ele.
- Acreditas nisso?
-Bom para te ser sincera não. Mas estás feliz, não estás?
-Como nunca estive.
- Isso é que importa. Esquece o resto, e vive essa felicidade em pleno.

24.7.18

O DIREITO À VERDADE - XLVII




As duas amigas encontravam-se num recanto de uma pastelaria, na Avenida Almirante Reis, onde se tinham encontrado para lanchar e para porem em dia a conversa, sobre os últimos acontecimentos
-E é tudo Paula.
-Meu Deus, Lena! E eu preocupada contigo, sem saber o que te teria acontecido. Até fui duas vezes tocar a campainha da tua casa. Eras tão ligada à tua mãe, que temia tivesses feito uma asneira com o desgosto, e afinal… quer dizer que conheceste o Cláudio em Coimbra, se apaixonaram, foste em busca do teu pai, e o Cláudio é enteado dele? E agora estás noiva? É inacreditável. Parece um daqueles romances cor-de-rosa, com que alguns escritores que não conhecem a realidade da vida se entretêm.
- Nestes últimos tempos, cheguei à conclusão que a vida é o maior dos autores, Paula. Ela pode ser mãe, ou madrasta, mas é sempre intensa em tudo o que nos dá, seja amor ou ódio, paz, ou guerra, calma ou tempestade. Não adianta lutar contra moinhos de vento. Já sofri muito, chorei noites a fio, mas hoje estou feliz com  o que ela me dá.
-E sendo assim vais viver com o teu pai? E o curso? Não vais acabar?
-Claro que sim. Vou pedir a transferência para Viseu.
- Vou ter muitas saudades tuas, amiga.
-Eu também. Mas agora é lá que está a minha vida. Vou casar em breve, logo que os documentos estejam prontos. Queria que tu fosses a minha madrinha. Sempre foste a minha melhor amiga, a irmã que a vida não me deu. E nada me faria mais feliz do que ter-te a meu lado nesse dia. Aceitas?
- Gostava muito, Lena. De verdade. Mas não sei se será possível. Sabes, o meu pai foi reformado devido a problemas de saúde. Com a reforma, baixou substancialmente a receita que entrava todos os meses em casa. Sabes como são as reformas neste país. Já é um sufoco continuar com os meus estudos, mas apesar de eu estar disposta a abandonar a faculdade eles fazem questão de que termine o curso. Ser madrinha de um casamento implica muita despesa.
- Não tens que fazer despesa nenhuma. O tio Alberto vai ser o meu padrinho e vai pagar o que eu precisar. Isto se o pai deixar, já que discutiam há dias, cada um querendo e dizendo que lhe pertencia a ele pagar a despesa. Só quero mesmo, é que estejas a meu lado nesse dia. E o Sandro? O vosso namoro, como vai?
- Cada dia estamos mais apaixonados. Como sabes, ele acabou o curso o ano passado, e já está a trabalhar . Pensamos casar quando eu terminar o curso, e me empregar.  Vamos ficar a viver com os meus pais. É bom para eles e para nós, pois partilhamos despesas e não temos que alugar casa. Menina, tu não fazes ideia do preço das rendas atualmente.
- E os teus pais estão de acordo?
-Claro. Eles gostam do Sandro, quase tanto, quanto eu.
- Não é preciso dizer-te que o convite é também para ele. E então? Posso contar contigo?
- Já te disse que gostava, mas deixa-me falar com o Sandro e os meus pais. Depois dou-te a resposta.  
- De acordo. Posso fazer-te uma pergunta um tanto íntima?
- Nunca tivemos segredos, Lena.
- Tu e o Sandro… já dormiram juntos? – Perguntou baixando a voz



Ora bem, parece que bem posso pôr os capítulos restantes todos de uma vez. Desde que o Cláudio se explicou, a novela perdeu interesse para vós, não foi? Bom então amanhã, preparem o modelito para a cerimónia. Estão todos convidados para o casamento.

O DIREITO À VERDADE - XLVI


Porém antes de regressar a Lisboa, Jorge e os dois jovens, foram a Viseu. Jorge foi consultar um advogado, saber o que necessitava fazer, para legalizar a sua posição de pai, e dar a Helena o seu nome.  E depois foram ao registo para iniciar o processo de casamento. Por fim, entraram numa ourivesaria, onde Cláudio comprou o anel de noivado.
 A jovem queria usar o que fora da mãe, mas nem o noivo nem os pais acharam bem. Afinal não fora um anel que trouxesse felicidade. No teu lugar, - disse-lhe o pai - vendia essas jóias de má memória. 
Regressou a Lisboa com o tio, e com a promessa de que tão depressa tratasse do que a levava a regressar, Cláudio iria buscá-la.
Em casa esperavam-na várias mensagens de Paula Correia, a sua melhor amiga. A única aliás a quem podia chamar de amiga. Desde criança, Helena sempre fora uma criança tímida e um tanto introvertida. Talvez por isso era pouco procurada pelas outras crianças para participar nas brincadeiras. No terceiro ano, a sua turma recebeu uma nova menina, que vinha transferida de outra escola. Paula Correia acabara de ser adotada por uma família daquela freguesia. A menina um pouco mais velha do que o resto da classe, nunca tinha conhecido os pais biológicos. Vivera sempre numa instituição, e aos dez  anos já não alimentava esperanças de que alguma família a quisesse, quando o casal que viria a adotá-la a conheceu, e embora inicialmente tivessem pensado adotar uma criança bem mais pequena, deixaram-se encantar com o seu ar doce e triste.
 As duas crianças, sentiram-se imediatamente atraídas, e em breve eram inseparáveis.  Paula estava atrasada em relação ao resto de classe e teria perdido o ano, se Helena, não se tivesse proposto ensiná-la. As duas passaram a estudar juntas. Helena era a melhor aluna da turma, Paula tinha uma capacidade de aprendizagem incrível e assim em pouco tempo tinha recuperado o atraso.  Desde então sempre tinham sido companheiras e amigas. No secundário e depois na faculdade. Na verdade Helena só se afastara no último ano por duas razões. Primeiro porque a doença da mãe, requeria que ela estivesse o máximo de tempo com a progenitora, pelo que mal saía das aulas ia imediatamente para casa. Segundo, a amiga arranjara namorado, e mesmo que a mãe não estivesse doente, ela ter-se-ia afastado na mesma, pois entendia, que quando duas pessoas se amam, bastam-se um ao outro, e qualquer intrusão não é aconselhável.
Porém quando a sua mãe piorara, Paula, foi um grande apoio. Ela passou muitas horas lá em casa, ajudando-a não só na tarefa de cuidar da mãe, como apoiando-a moralmente. Depois quando a mãe foi internada e até à sua partida, era raro o dia que não ia com ela ao hospital. Helena nunca iria esquecer tudo isso, muito embora a descoberta da sua origem e a consequente partida em busca da sua história, lhe tivessem feito esquecer-se da amiga.
E Paula estava preocupada e assustada com o seu desaparecimento, dizia numa das mensagens que lhe deixara. Também dizia que o seu telemóvel avariara, e ficara sem os seus contatos, por isso é que não lhe ligara para o telemóvel.
Helena ligou e combinou um encontro nessa mesma tarde, numa pastelaria da zona para lancharem e contarem uma à outra as novidades. E Lena tinha tanta coisa para contar à amiga.


23.7.18

O DIREITO À VERDADE - XLV



Os quinze dias que Helena passou na quinta foram maravilhosos. Ela diria sem medo de mentir que tinham sido os mais felizes de toda a sua vida.
A mãe de Cláudio tinha sido uma surpresa. Dado o quase metro e noventa do filho, Helena tinha imaginado uma mulher alta e forte, e Carmo era exatamente o oposto. Não ultrapassaria o metro e meio, e o seu aspeto era frágil e delicado, embora tanto o marido como o filho lhe dissessem que o seu aspeto era enganador e que ela era uma força da natureza. Desde o primeiro momento, a jovem sentiu que Carmo a recebeu com muito carinho, sem reservas, como se ela pertencesse à família desde sempre. Depois porque o tio aceitara ir passar uma semana lá, e ela verificou que havia realmente uma saudável amizade entre o pai e o tio, e teve a certeza de que se os dois homens não tinham privado durante todos aqueles anos, foi porque o tio se sentia culpado de não contar ao amigo que ele tinha uma filha. E não podia fazê-lo, por via da promessa que fizera à cunhada. O tio estava mais sereno e até já falava em vender a casa em Lisboa e se tornar sócio do amigo.
O seu romance com Cláudio não podia ir melhor, ele levara-a a percorrer a quinta, falara-lhe do seu trabalho, dos seus sonhos, e dissera-lhe que gostaria de casar o mais depressa possível.  Como quem casa quer casa,  se ela estivesse de acordo, ele gostaria de viver na quinta e podiam construir aí a sua casa. As crianças teriam mais espaço para brincar e sempre  podiam contar com a ajuda dos avós. Entretanto até que a casa ficasse pronta, alugariam uma casa em Viseu, ou Nelas, ou, caso ela não se importasse, poderiam continuar a viver com os pais, durante o tempo que levassem a construir a casa deles.  O que interessava é que casassem rápido, ele não aguentava mais. Os abraços e beijos, não lhe matavam a fome, que tinha dela.
Helena gostou que ele contasse com os seus desejos, em relação à maneira como e onde iam viver, e disse que não se importava de ficar a viver com os pais durante o tempo necessário à construção, mas queria ter a certeza, de que iria acabar o seu curso e ter a sua profissão, fora de casa, não se via o dia inteiro na quinta apenas dedicada ao lar. Ele respondeu-lhe que os dois teriam liberdade para viverem os seus sonhos, o verdadeiro amor, liberta não subjuga.
- E que faço com a casa em Lisboa?- Perguntou.
-Nada. Não precisamos desse dinheiro, a casa está numa excelente zona, será muito agradável poder contar com ela quando quisermos dar uma escapadinha à capital. Servirá também para os pais, ou para o tio Alberto, passarem alguns dias quando lhes apetecer. Isto claro se o teu tio, levar adiante a ideia de vender a casa dele e se tornar nosso sócio.
Definidos que foram todos os pormenores, Helena ia voltar a Lisboa. Ia buscar o seu enxoval, tratar da sua transferência para a Universidade de Viseu, e depois voltaria.

O DIREITO À VERDADE - XLIV



Chegaram à quinta, quando o sol, acabava de desaparecer no horizonte mas a noite ainda não se fazia presente. Eram dezanove horas do dia quatro de Outubro do ano da Graça de dois mil e quinze. Durante a viagem, Helena falou de si, da faculdade que se vira obrigada a abandonar com a doença e morte da sua progenitora, Falou da sua infância, de como lhe custou o facto de não ter o pai a seu lado quando era menina, da surpresa que foi achar aqueles documentos no armário da mãe. E do seu amor por ela, por todos os sacrifícios que fizera para a criar e educar. Apesar da desilusão que teve ao  descobrir o que a mãe fizera, nada apagava os anos de amor incondicional que a mãe lhe devotara. Abriu o coração para ele, como ele fizera com ela quando chegou.
Com a aproximação da quinta, fora ficando cada vez mais nervosa. Apesar de Cláudio lhe garantir que a mãe, era uma excelente pessoa, e que mesmo sem a conhecer já gostava dela, por saber que era a mulher que ele escolhera, ela estava receosa. Sempre ouvira dizer que sogras e noras não se amam, porque ambas competem pelo amor do mesmo homem, A mãe sempre teme que a nora afaste o filho dela, e a nora receia que o marido faça comparações, entre as duas, com desprimor para ela. Acresce que no caso, ela era também filha do marido da futura sogra. E para uma mulher que não pôde dar ao homem que amava, um filho, de repente, ele aparecer com uma filha, de outra mulher, devia ser doloroso. Helena vinha pensando nisso, e cada vez estava mais nervosa.
Cláudio estacionou o carro em frente da casa. Saiu do veículo ao mesmo tempo que a jovem. Jorge e a esposa, que estavam sentados no alpendre, levantaram-se para os receber.
Cláudio pegou na mão da jovem e apertou-a carinhosamente, enquanto dizia baixinho.
-Tem calma. Vai correr tudo  bem.
-Boa noite, -disse saudando os pais. Depois falando apenas para a mãe acrescentou:
-Mãe aqui tens Helena, a mulher que eu amo.
As duas, cumprimentaram-se beijando-se, enquanto Jorge perguntava ao filho:
- Foi difícil de convencer?
Ele respondeu sorrindo.
- Achas? Com todo o meu charme?
Todos riram e aquela pequena brincadeira contribuiu para quebrar a tensão de um primeiro encontro. Depois, Jorge beijou a filha e disse:
- Vocês devem estar cansados e talvez queiram tomar banho antes do jantar. Os dias continuam muito quentes. Cláudio, mostra a casa à Lena e diz-lhe onde é o seu quarto. Esperamos que estejam prontos para começarmos a jantar.
O jovem assim fez. Começou pela cozinha, a sala, os dois quartos de hóspedes, o quarto dos pais e por fim o seu.
Helena, não conseguiu reprimir a surpresa, ao ver o quarto de Cláudio, a grande cama de ferro pintada de preto, o armário, a posição da janela, tudo. Como era possível, que sem nunca ali ter entrado, se visse naquele quarto nos seus loucos sonhos?



Gente, agora até acabar vão ter dois episódios por dia.  Para acabar Sexta-feira. Pode ser?


22.7.18

O DIREITO À VERDADE - XLIII








Quando a soltou, perguntou:
-De que tens medo, querida?
- De que te canses da minha inexperiência, de não estar à altura das tuas expetativas.  Foste o primeiro homem com quem saí, o primeiro que me beijou.
-Vou sentir-me muito feliz e muito honrado por te iniciar na arte de amar. E desde este momento, prometo amar-te até ao último dia da minha vida. Agora querida vai arrumar as tuas coisas, e vamos embora. Almoçamos pelo caminho. Os nossos pais estão ansiosos e os dias já são bem mais pequenos.
-Mas não posso ir contigo. Não hoje. Estava a meio da limpeza da casa, tenho a máquina da roupa a acabar o programa, preciso ir estendê-la.
- Olho à minha volta e não vejo que a casa esteja a necessitar de qualquer limpeza urgente. Vê se a máquina já acabou de lavar. Estendes a roupa, e vamos almoçar. Quando voltarmos fazes a mala, enquanto eu apanho a roupa e se ainda não estiver seca, estendemo-la nas cadeiras para acabar de secar.
-És sempre assim decidido?
-Contigo sim.
-Não tenho alternativa?
- Não. A menos que me convides a passar a noite contigo, disse exibindo um sorriso brincalhão
Sentindo que corava da cabeça aos pés escapou-se para a cozinha. Abriu a máquina e retirou a roupa para um alguidar. Depois levou-o para a varanda e iniciou a tarefa de estendê-la.
Pouco depois saíam para almoçar num café restaurante ali mesmo na rua.
- Não me posso ir embora sem falar com o tio Alberto. Vou telefonar-lhe enquanto esperamos o almoço.
-Diz-lhe, que o pai o convida, a ir passar uns dias lá na quinta. E que ficamos à sua espera.
Enquanto a jovem comunicava com o tio, Cláudio ligou para o pai, e deu-lhe conta de que já se tinha entendido com a jovem e partiriam a meio da tarde, pelo que iriam chegar mais tarde do que inicialmente tinha previsto.
Almoçaram Bacalhau à Brás, acompanhado por um tinto, Casa de Santar, Reserva 2012.
- Casa de Santar? Não são vossos vizinhos? -Perguntou a jovem.
- Sim, mas eles são os maiores produtores da zona. A quinta é enorme e muito antiga. Tens que ir vê-la. Tem um solar antigo e uns jardins fantásticos. Junto deles somos uns grãos de areia. Mas desde que o pai comprou a quinta evoluímos muito. E já compramos mais alguns terrenos onde pretendo produzir a Trincadeira, uma terceira casta de uvas. Até agora apenas temos duas. Alfrocheiro e Touriga Nacional. Um dia, a Quinta dos Milagres ainda vai ser tão grande como a Casa de Santar.
- Acredito, vê-se pelo teu entusiasmo que amas o teu trabalho.
- É verdade. Durante anos foi o meu único amor, a minha razão de viver. Agora, embora continue a gostar do que faço, já não é a coisa mais importante da minha vida, porque nela já há um amor maior, -disse estendendo a sua mão e acariciando a dela que repousava sobre a mesa.
Emocionada Helena não soube que responder.


O DIREITO À VERDADE - XLII


Helena, ouvia as explicações masculinas, com o coração batendo apressado, e o cérebro repetindo. “É amor. Ele ama-te”. Vendo que ele se calara e a olhava, como se esperasse uma resposta, ela murmurou:
- Continua.
-Segui-vos no carro, e ainda fiquei uns minutos do outro lado da rua, mas depois arranquei e fui-me embora. Ia cego de raiva, o coração ferido, a cabeça cheia de maus pensamentos. Desde esse dia, evitava encontrar-me com o pai. Quando o via, ao telefone contigo, afastava-me, pois a minha vontade era partir para a violência. Foram dias tenebrosos, de muito sofrimento. Lembrava-me das horas que passámos juntos e interrogava-me. Como era possível que me tivesse enganado tanto a teu respeito? Claro que o pai notou logo a diferença, mas nunca lhe passou pela cabeça, a razão  da mudança do meu comportamento. Uma noite questionou-me, e eu perdi a cabeça e disse-lhe tudo o que pensava da sua atitude ignominiosa.
- E ele?- Perguntou a jovem tentando adivinhar a reação paterna.
-Ele, com toda a calma, levantou-se e ordenou. “Vem comigo ao escritório. Agora!” Tu ainda não tiveste tempo para o conhecer, mas eu vivo com ele há mais de vinte anos. Quando ele dá uma ordem daquele jeito, sem mover um músculo do rosto e sem levantar a voz, quer dizer que está muito zangado e magoado, com algo que tu fizeste ou disseste. Não me atrevi a desobedecer. No escritório, ele pôs-me na mão aquelas certidões; e perante o meu espanto contou-me tudo. Se a terra se abrisse sob os meus pés, o meu espanto, não seria tão grande. Eu nem sequer sabia, que ele já tinha sido casado, antes de casar com a mãe. Dividia-me entre a vergonha de vos ter julgado mal, e a alegria de saber que através dele te ia encontrar. Então foi a minha vez de o surpreender contando-lhe que eras tu a mulher que tinha conhecido em Coimbra e por quem me tinha apaixonado.
Consegui convencê-lo a não te dizer nada, até que eu pudesse vir buscar-te, já que naquela altura, com o vinho a fermentar no lagar, não podia abandonar a quinta. Por outro lado, ele e a mãe tinham de conversar antes de eu vir. Agora a mãe já sabe tudo. Que és filha dele, mas que és também a mulher que eu amo e pretendo convencer a partilhar comigo o resto da vida. E está ansiosa por te conhecer.
Cláudio estendeu-lhe a mão, fazendo com que a jovem se levantasse. Com as duas mãos sobre os ombros femininos, disse sem deixar de a fitar.
- Penso em ti assim que acordo, sonho contigo, mal adormeço. O meu maior anseio é partilhar a minha vida contigo. Não me digas que isto não é amor.
Séria, suportando o fogo do olhar masculino, a jovem retorquiu:
-Eu, também te amo, Cláudio. E quero muito, ser feliz a teu lado, e fazer-te feliz. Espero que me ajudes a vencer os meus medos, não quero ser uma segunda edição de Natália Trindade.
Feliz, ele abraçou-a e beijou-a apaixonado.



Eu tinha dito que hoje só sairia um capítulo.  Mas ainda faltam dez capítulos e eu vou dia 30

21.7.18

O DIREITO À VERDADE - XLI


- E tens a certeza de que não existe? Porque da minha parte, eu tenho a certeza do contrário. Para amar não são precisos anos. Por vezes basta um olhar, um sorriso, uma frase para nos cativar o coração. E entre nós, assim foi, não há como negá-lo. Se os dois aceitamos esse amor, e fazemos por mantê-lo vivo, ou se o negamos e o deixamos morrer já é outra história. Em Coimbra fui sincero contigo. Na altura ainda não sabia se te amava mas sabia que algo muito forte já nos ligava. Queria conhecer-te melhor, sabia que alguma coisa muita bonita estava a nascer entre nós. Em compensação tu não usaste de igual sinceridade e fugiste. O pai falou-me da tua mãe, da sua insegurança e de como isso destruiu a relação dos dois. Quero acreditar que não tenhas herdado dela essa insegurança. Quando me deixaste, fiquei desesperado, e revoltado, contra ti e contra o próprio destino, que me tinha permitido conhecer-te para logo te afastar. Sentia-me como uma criança a quem dão um doce e quando ela se prepara para o saborear, lho arrancam das mãos. Para tentar esquecer-te, entreguei-me de corpo e alma ao trabalho que nesta época do ano é sempre muito intenso. Como sabes o pai é produtor de vinhos e eu sou o enólogo responsável por toda a produção até ao momento de engarrafamento, muito embora uma boa parte da nossa uva seja entregue à vinícola de que somos sócios, e seja comercializada através dela. Mas por mais cansado que estivesse, não conseguia esquecer a jovem sensível que se emocionou na fonte das lágrimas, nem a menina radiante que percorreu como uma criança o Portugal dos Pequenitos. Muito menos a mulher que tremeu nos meus braços quando nos beijamos na despedida. Incendiaste-me o sangue e a alma. Desesperava, por não saber como te encontrar. 
Por essa altura, o pai começou a ter um comportamento estranho. Ele não conduz desde que teve um acidente e quando se desloca, sempre sou eu que o levo. Então ele começou a ir a Viseu de camioneta. E a falar ao telefone, desligando quando eu me aproximava. Comecei a pensar que ele teria alguma aventura na cidade. Afinal ainda é um homem jovem e a mãe levou o último ano até ser operada, muito doente. Só para teres uma ideia, ela não conseguia caminhar dez metros, sem ter que parar, sem forças.
Questionei-o e ele jurou que amava a minha mãe e que nunca seria capaz de a trair. Acreditei, mas passados uns dias, ele voltou a Viseu. Por uma dessas coincidências com que o destino nos brinda, nesse dia telefonaram-me da empresa onde tinha encomendado uma nova bomba de trasfega, dizendo que já tinha chegado, podia ir buscá-la. Acabava de acondicioná-la no porta-bagagem, quando vos vi sair de um prédio no outro lado da rua. O pai enlaçava-te os ombros e os dois seguiram pelo passeio até ao hotel.  Não será difícil imaginares o que eu pensei. Um homem não vai para um hotel com uma mulher que não é de sua família, se não for para irem para a cama, não é verdade?


Atenção amigos. Acabei ontem de escrever esta história. Não tenho mais nenhuma escrita e com os tratamentos que ando a fazer e o tempo de espera que levo na clínica não tenho tempo para elaborar outra, e nas férias só tenho 
Internet no telemóvel. Não sei se fecho o "estaminé" se deixo agendada uma das minhas primeiras histórias, Sei que alguns já a leram, mas muitos dos meus leitores atuais chegaram em 2016/2017. Posso re-editar uma história mais antiga. Que pensam vocês? Por favor deixem alguma resposta nos comentários. Obrigada 

O DIREITO À VERDADE - XL





Envergonhada, sentindo-se imunda e feia, tentou fechar a porta, mas Cláudio foi rápido a introduzir um pé na ombreira, não deixando que o fizesse.
- Não querida, não vou deixar que me expulses da tua casa e me fujas como fizeste em Coimbra.
Sentindo que as lágrimas ameaçavam correr pelo rosto, ela largou a porta e virou-lhe as costas.
- Andava em limpezas. Não estou minimamente apresentável, para receber visitas.
- Estás linda como sempre. Mas se ficas mais confortável tomando banho e mudando de roupa, eu espero o tempo necessário na tua sala. Porém não me vou embora sem termos uma conversa séria.
- Nesse caso, a sala é aqui, -disse abrindo uma porta. Vou pôr-me apresentável. Mas antes quero saber como me descobriste, quem te deu a minha morada.
- Dir-te-ei quando voltares, - disse sentando-se no sofá.
Helena não insistiu. Foi ao quarto, tirou um conjunto de roupa íntima da cómoda, pegou numas calças de seda pretas e numa blusa azul e dirigiu-se à casa de banho.
Nunca na sua vida, a jovem tomou um duche tão rápido. Pensar que Cláudio estava na sala e que no tempo de espera, podia entreter-se a imaginá-la nua, punha-a nervosa.
Com o corpo enrolado na toalha secou o cabelo, vestindo-se de seguida. Escovou o cabelo à pressa, ansiosa por saber como ele a tinha encontrado.
- Bom, aqui estou. Podes começar.
Cláudio estava feliz. Voltar a encontrá-la, saber que tinha sobre ela o poder de a deixar assim, ruborizada e nervosa, era algo que o encantava. Apeteceu-lhe brincar.
-Isso são modos de cumprimentar o teu futuro marido? Nem sequer um inocente beijinho? Desiludes-me.
- Deixa-te de brincadeiras estúpidas, -disse, lançando-lhe um olhar furioso. Como chegaste até minha casa? Quem te deu a morada?
- Jorge Noronha, o nosso pai.
- O nosso… pai…-  soletrou ela deixando-se cair numa cadeira. Imagens rápidas dos sonhos eróticos, que preenchiam algumas das suas noites,  perpassaram na sua memória. Mas então… nós somos irmãos?
- Não, claro que não, - disse pondo-se em pé. O pai nunca te falou de mim? Sou filho de Carmo, a mulher com quem se casou, anos depois do divórcio com a tua mãe. Minha mãe era viúva e eu já tinha nove anos quando eles se conheceram. No entanto, habituei-me a chamar-lhe pai por duas razões. A primeira, porque ele me criou com tanto amor, como se eu fosse de verdade, seu filho. A segunda, porque sabia do muito que ele queria um filho e a mãe, não podia dar-lho. Quando eu nasci, alguma coisa correu mal no parto e a mãe ficou impossibilitada de ter mais filhos. O que importa, é que não somos irmãos e por isso podemos amar-nos, sem qualquer prurido de consciência.
- Falas de amor como se ele existisse entre nós. Conhecemo-nos há dias.


Bom fim-de-semana