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18.7.19

LONGA TRAVESSIA - PARTE I

reedição


O homem abriu a porta, e fechou-a atrás de si com um toque de calcanhar. Carregou no interruptor e o espaço encheu-se de luz. Estava numa pequena sala de entrada, com um único móvel de madeira escura, com tampo de mármore encimado por um quadro a óleo.
Junto à porta um bengaleiro.
 Despiu o casaco e pendurou-o. Depois em passos largos encaminhou-se para a divisão seguinte.
Acendeu a luz, e sem se deter caminhou até um pequeno bar e segurando um copo serviu-se de uma dose de Uísque. De um pequeno frigorífico incrustado e dissimulado no bar, retirou e colocou no copo, duas pedras de gelo.  Com o copo na mão sentou-se num dos brancos sofás que compunham a sala. 
O homem que devia andar perto dos quarenta anos, era alto, e bem constituído. Tinha uns olhos escuros e cabelos pretos, mas nas suas têmporas, apareciam já alguns fios brancos. O rosto, moreno, dir-se-ia ter sido esculpido por um talentoso escultor dada a sua perfeição.
Vestia roupas de corte elegante de bom tecido. Decididamente era um homem rico, e bonito, capaz de ter tudo o que desejava, mas naquele momento, recostado no sofá, de olhos semicerrados e aspeto cansado, não aparentava ser um homem feliz. Pelo contrário, se por ali houvesse um pintor, em busca do tema ideal para retratar a solidão, decerto acharia que tinha encontrado o modelo perfeito.
Apesar do seu porte atlético, parecia demasiado pequeno na grande sala com os dois enormes sofás brancos, a parede atrás de si completamente coberta de livros, o bar do seu lado esquerdo, e o reposteiro que cobria toda a parede da frente possivelmente envidraçada.
Ouviu-se o som de um telemóvel. O homem abriu os olhos e procurou o aparelho. Lembrou que o tinha poisado, no móvel da sala de entrada.
Sem vontade, levantou-se e foi até lá. Atendeu. Era Diogo, o advogado.
-Que se passa? – Perguntou com brusquidão.
- Queria lembrar a hora da reunião amanhã com os donos da “Tudilar”
- Que é às dezassete, já me tinhas dito.- Replicou aborrecido. Espero que tenhas tudo pronto, Quero efetuar a compra amanhã. Estou a pensar viajar de novo em breve.
- Está tudo em ordem. Creio que não vai haver problema. Eles estão com a corda na garganta. É a venda ou a falência.
-.Está bem. Espero-te no meu escritório às quinze para revermos isso.
- Lá estarei, Mário.







21.8.18

FOLHA EM BRANCO - PARTE XXIV





O homem, preocupado, sem saber que fazer, e quase sem tempo para adiar uma resolução, pois a data agendada para a próxima exposição aproximava-se. A jovem, assustada, perdida, sabe-se lá em que infernos interiores, quase não jantaram nessa noite, apesar de toda a simpatia do empregado do restaurante e do belo aspecto do peixe assado pedido para o jantar. Depois em casa, rapidamente a jovem recolheu ao quarto. Mas estranhamente, ou não, a porta do quarto ficou aberta, e a luz acesa, acabando por adormecer assim.
Na sala Miguel continuava perdido nos seus pensamentos, buscando uma solução para o problema em que se tinha metido.
O melhor, cogitou, será levá-la para Lisboa. Lá existem bons psiquiatras, poderá ser tratada lá. Depois se verá. Mas levá-la daqui, que pode ser a sua terra, não será demasiado arriscado? – Interrogava-se.
Por fim tomou uma decisão. No dia seguinte teria uma conversa franca com o médico, e faria o que ele achasse melhor para a jovem, ainda que isso o contrariasse. Mais calmo, preparou-se para dormir. Como a porta do quarto estava aberta e a luz acesa, chamou pela jovem julgando-a acordada. Ela não respondeu. Hesitou, um pouco e depois dirigiu-se ao quarto. Ela dormia, meia destapada, a farta cabeleira espalhada na almofada. Por alguns instantes ficou contemplando-a. A imagem era demasiado bela para o  olhar de qualquer homem, mas Miguel atribuiu a sua admiração ao facto  de ser pintor. Os seus olhos estavam treinados para tudo o que era belo. E o abandono da jovem que dormia confiante, era de grande beleza. Depois suavemente puxou-lhe a roupa para cima, apagou a luz, e saiu do quarto murmurando:
-Tão jovem e tão sofrida!
Acordou perto das onze. Sentou-se no sofá, e enquanto calçava os chinelos, olhou para o quarto. A porta continuava aberta, mas a cama estava feita, pelo que deduziu que a jovem se teria levantado à muito.
Encontrou-a sentada à mesa da cozinha fazendo rabiscos no caderno de desenho. Vestia, umas calças de ganga, e um camiseiro turquesa. O cabelo apanhado numa só trança, caía-lhe sobre o ombro direito.
“Caramba, parece uma miúda”, pensou enquanto saudava:
-Bom dia Mariana. Dormiu bem?
- Bom dia Miguel. Dormi sim. E parece que o Miguel também. Pelo menos quando me levantei, dormia.
- Adormeci tarde, - desculpou-se sorrindo. Bom, vou tomar o meu duche. Temos que almoçar mais cedo, por causa da consulta. Está preparada?
Ela assentiu com a cabeça.
-Ainda bem.
E saiu dirigindo-se à arrecadação junto à casa de banho. 
Dias depois da chegada da jovem, ele  tinha comprado um armário, que mandou colocar na arrecadação, para onde mudou todas as suas roupas. Não tinha lógica, e nem lhe parecia  correto,  ir para o quarto da jovem, sempre que precisava mudar de roupa. 
Mariana fechou o caderno e dirigiu-se à sala. Apanhou a roupa espalhada no chão, sacudiu-a,  dobrou-a cuidadosamente, guardando-a no gavetão do sofá. Depois fechou-o e colocou-lhe por cima a manta alentejana, e as almofadas de croché.   



  




5.8.18

FOLHA EM BRANCO - PARTE VII



                                       


Quando a jovem entrou na cozinha a comida já estava na mesa, e Miguel esperava por ela, para iniciar a refeição.
- Sente-se. Vamos comer. Confesso que estou cheio de fome.  
Estendeu-lhe um prato com uma coxa de frango assado e batatas fritas. - Se gosta de salada, sirva-se, disse apontando para a travessa de tomate, salpicada de orégãos.
A refeição foi penosa para os dois. O homem porque tentava sem conseguir, introduzir uma conversa, que pudesse levar a jovem a vislumbrar uma nesga que fosse, sobre a sua identidade. A jovem porque estava demasiado preocupada, para ter fome. Não sabia quem era, nem como tinha chegado até ali. Não sabia quem era aquele homem, nem porque estava com ele. Até aquele momento, parecia ser confiável. Tinha agido consigo como um cavalheiro. Mas seria sempre assim? E ainda que fosse, quanto tempo demoraria a fartar-se dela e a mandá-la embora? Já não era muito jovem, via-se que estava habituado a viver sozinho. Quanto tempo aguentaria uma intrusa no seu espaço? E ela? Quem era ela? Seria solteira? Casada? Porque não se lembrava de nada?  Porque não tinha documentos? Uma mulher não sai de casa, sem mala, sem documentos. Então porque ela não tinha nada? Teria sido assaltada? Isso explicaria o facto de estar sem mala. Mas, porque raio, não se lembrava de nada? Por mais que se esforçasse, só se lembrava de ter acordado na relva, junto do pintor. Era como se tivesse nascido no momento em que abriu os olhos. Teria levado alguma pancada na cabeça? Mas não.Tinha acabado de lavar a cabeça e não encontrara nenhum hematoma.
 Sentia-se desesperada. Queria que o pintor lhe dissesse alguma coisa, que lhe desse uma pista.
Mas ele dissera que ela não estava com ele, não era seu modelo, e nunca a tinha visto antes.Então, o que poderia ele dizer-lhe para a ajudar?
Terminaram a refeição e Miguel começou a retirar a loiça da mesa em silêncio.
- Deixe eu arrumo a cozinha – ofereceu-se ela.
- Estou habituado a fazê-lo, - respondeu ele, não sem uma ponta de dureza na voz, magoado com o silêncio da jovem.
Talvez ela tivesse percebido, porque disse.
- Desculpe-me. Nem sei como lhe agradecer o que está a fazer por mim. Mas acredite que me é muito dolorosa esta situação. Nem sequer sei como me chamo. Estou desesperada.
O homem caminhou até ela, acariciou-lhe os cabelos como se ela fora uma criança e disse;
- Não se preocupe. Quando menos esperar vai lembrar-se. E se isso a faz feliz, pode lavar a loiça,- acrescentou sorrindo.





31.7.18

FOLHA EM BRANCO - PARTE II





Tudo arrumado, Miguel acendeu um cigarro. A jovem estava a levar mais tempo a acordar do que aquilo que ele previra. Quem seria? À primeira vista, não tinha documentos, pois não trazia nenhuma bolsa, nem se lhe notava na roupa qualquer carteira.
A jovem soltou um gemido e pouco depois abriu os olhos. E que olhos! Grandes, de um quente e aveludado castanho dourado. Na mente de Miguel ficou impressa a imagem que mais tarde iria transpor para a tela. Ele não era um pintor famoso, daqueles cujas obras vão para os museus, mas modéstia à parte considerava-se um bom pintor. Tinha palmilhado meio mundo, e em todos os lugares onde expôs, os seus quadros sempre se venderam bem, e sempre foi disso que ele viveu. Nunca se tinha dedicado a pintar o ser humano. Era um apaixonado da natureza, e  sempre optara por perpetuar as suas maravilhas, mas aquela imagem da jovem, deitada na vegetação o corpo soerguido sobre o cotovelo esquerdo, olhando-o de forma inquiridora, era por demais sugestiva.
Aproximou-se dela.
-Como se sente? - Perguntou.
- Confusa, -respondeu a jovem numa voz melodiosa. – O que faço aqui? Que lugar é este? E quem é o senhor?
Miguel engoliu em seco.“Querem ver que é doida?” – Pensou.
Estendeu-lhe a mão para a ajudar a levantar-se.
- Vamos por partes, - disse calmo. Chamo-me Miguel. E a menina?
- Não sei, - respondeu desconcertada.
Passou a mão, de dedos longos e finos pela testa, como se quisesse lembrar de alguma coisa e por fim murmurou.
- A verdade é que não me lembro. Não me lembro de nada. A minha cabeça está vazia.
Fez-se silêncio. A cabeça da jovem podia estar vazia, mas a de Miguel estava a mil. Quem seria ela? Teria sido a comoção do momento que lhe fizera perder a memória? Ou já tinha acontecido antes, e fora o desespero de não saber quem era, que a levara a tentar o suicídio? De súbito a jovem quebrou o silêncio, como quem acaba de ter uma ideia.
- Mas você sabe quem eu sou, verdade? Não teria vindo para aqui se não fossemos conhecidos. Vejo que é pintor. Sou sua modelo? 
-Não, - retorquiu Miguel. A menina não veio comigo.
-Como assim?- Interrogou a jovem. Pois se estava aqui dormindo, enquanto pintava.
Apertou a cabeça entre as mãos e desatou a chorar.
-Que se passa comigo? Porque não me lembro de nada? Porquê?- Gritou em desespero.




17.11.15

FOLHA EM BRANCO - PARTE XXXII


Foto do google


O tempo não pára, os dias de inverno, são curtos e passam rapidamente. 
É extraordinária a facilidade com que os jovens estabelecem relações de amizade. Parecia que as duas jovens, se conheciam de toda a vida. Apesar de ter ficado sem pai há pouco tempo, Maria era uma jovem alegre e extrovertida. Namorava um colega, que a julgar pelo seu entusiasmo era a oitava maravilha do mundo, e, tirando a escassez monetária, era uma jovem feliz e sem problemas. Mariana era a antítese. Mas como diz a sabedoria popular, os pólos atraem-se.
 A exposição de Miguel fora um êxito, as obras foram todas vendidas, algumas para o estrangeiro.
As duas jovens, foram juntas ver a exposição, no dia seguinte ao da inauguração. Embora tivessem reacções diferentes, Maria parecia não estar habituada àquele ambiente, enquanto Mariana estava à vontade, mas ambas “viajaram” para locais lindíssimos através dos quadros expostos. O pintor, encontrava-se rodeado de várias pessoas, a maioria das quais, mulheres muito bonitas. Irritada, Mariana quase se arrependeu de ter ido.
Preparavam-se para sair, mas antes aproximaram-se de Miguel.
Maria cumprimentou efusivamente o pintor.
-Parabéns. Os quadros são lindos. O senhor é um génio.
-Quem dera, quem dera, - disse sorrindo divertido.
Logo se voltou para Mariana:
-E tu? Gostaste?
- Como não? São muito bons. Mas  não vi o quadro daquele lugar…
- Não faz parte da exposição.
-Porquê? Não o acabaste?
Não teve tempo de responder, pois um casal, chamava a sua atenção, e teve de se afastar.
Mariana continuava as suas sessões semanais de psicoterapia, mas exceptuando o facto do médico, ter mandado parar com a medicação, tudo estava quase  na mesma. Quase, porque eram cada vez mais frequentes , os lampejos  de rostos, e ruas , que apareciam e desapareciam sem que ela soubesse quem eram ou de onde eram.
O Natal aproximava-se a passos largos, montras e ruas cobriam-se de luz e cor.
Miguel passava longas horas no atelier. À noite quase sempre saía.
A jovem sentia-se “abandonada”. Não lhe apetecia ver TV. Os livros, começavam a aborrecê-la. Quase todos falavam de amor, de gente apaixonada e feliz. Coisa que ela começava a duvidar de vir a ser algum dia.
Porém naquela manhã, antes de subir para a mansarda, Miguel disse.
-Logo depois de almoço, vamos sair. O Natal é já para a semana, precisamos prepará-lo. Vamos às compras.
Sorriu, o coração batendo acelerado.

28.10.15

FOLHA EM BRANCO PARTE VII



                                           foto da net


Quando a jovem entrou na cozinha a comida já estava na mesa, e Miguel esperava por ela, para iniciar a refeição.
- Sente-se. Vamos comer. Confesso que estou cheio de fome.  
Estendeu-lhe um prato com uma coxa de frango assado e batatas fritas. - Se gosta de salada, sirva-se, disse apontando para a travessa de tomate, salpicada de orégãos.
A refeição foi penosa para os dois. O homem porque tentava sem conseguir, introduzir uma conversa, que pudesse levar a jovem a vislumbrar uma nesga que fosse, sobre a sua identidade. A jovem porque estava demasiado preocupada, para ter fome. Não sabia quem era, nem como tinha chegado ali. Não sabia quem era aquele homem, nem porque estava com ele. Até ali, parecia ser confiável. Tinha agido consigo como um cavalheiro. Mas seria sempre assim? E ainda que fosse, quanto tempo demoraria a fartar-se dela e a pô-la na rua? Já não era muito jovem, via-se que estava habituado a viver sozinho. Quanto tempo aguentaria uma intrusa no seu espaço? E ela? Quem era ela? Seria solteira? Casada? Porque não se lembrava de nada?  Porque não tinha documentos? Uma mulher não sai de casa, sem mala, sem documentos. Então porque ela não tinha nada? Teria sido assaltada? Isso explicaria o facto de estar sem mala. Mas, porque raio, não se lembrava de nada? Por mais que se esforçasse, só se lembrava de ter acordado na relva, junto do pintor. Era como se tivesse nascido no momento em que abriu os olhos. Teria levado alguma pancada na cabeça? Mas não.
Tinha acabado de lavar a cabeça e não encontrara nenhum hematoma.
 Sentia-se desesperada. Queria que o pintor lhe dissesse alguma coisa, que lhe desse uma pista.
Mas ele dissera que ela não estava com ele, não era seu modelo, e nunca a tinha visto antes.Então, o que poderia ele dizer-lhe para a ajudar?
Terminaram a refeição e Miguel começou a retirar a loiça da mesa em silêncio.
- Deixe eu arrumo a cozinha – ofereceu-se ela.
- Estou habituado a fazê-lo, - respondeu ele, não sem uma ponta de dureza na voz, magoado com o silêncio da jovem.
Talvez ela tenha percebido, porque disse.
- Desculpe-me. Nem sei como lhe agradecer o que está a fazer por mim. Mas acredite que me é muito dolorosa esta situação. Nem sequer sei como me chamo. Estou desesperada.
O homem caminhou até ela, acariciou-lhe os cabelos como se ela fora uma criança e disse;
- Não se preocupe. Quando menos esperar vai lembrar-se. E se isso a faz feliz, pode lavar a loiça,- acrescentou sorrindo.




20.10.15

FOLHA EM BRANCO PARTE II






Tudo arrumado, Miguel acendeu um cigarro. A jovem estava a levar mais tempo a acordar do que aquilo que ele previra. Quem seria? À primeira vista, não tinha documentos, pois não trazia nenhuma bolsa, nem se lhe notava na roupa qualquer carteira.
A jovem soltou um gemido e pouco depois abriu os olhos. E que olhos! Grandes, de um quente e aveludado castanho dourado. Na mente de Miguel ficou impressa a imagem que mais tarde iria transpor para a tela. Ele não era um pintor famoso, daqueles cujas obras vão para os museus, mas modéstia à parte considerava-se um bom pintor. Tinha palmilhado meio mundo, e em todos os lugares onde expôs, os seus quadros sempre se venderam bem, e sempre foi disso que ele viveu. Nunca se tinha dedicado a pintar o ser humano. Era um apaixonado da natureza, e  sempre optara por perpetuar as suas maravilhas, mas aquela imagem da jovem, deitada na vegetação o corpo soerguido sobre o cotovelo esquerdo, olhando-o de forma inquiridora, era por demais sugestiva.
Aproximou-se da jovem
-Como se sente?
- Confusa, -respondeu a jovem numa voz melodiosa. – O que faço aqui? Que lugar é este? E quem é o senhor?
Miguel engoliu em seco.“Querem ver que é doida?” – Pensou.
Estendeu-lhe a mão para a ajudar a levantar-se.
- Vamos por partes, - disse calmo. Chamo-me Miguel. E a menina?
- Não sei, - respondeu desconcertada.
Passou a mão, de dedos longos e finos pela testa, como se quisesse lembrar de alguma coisa e por fim murmurou.
- A verdade é que não me lembro. Não me lembro de nada. A minha cabeça está vazia.
Fez-se silêncio. A cabeça da jovem podia estar vazia, mas a de Miguel estava a mil. Quem seria a jovem? Teria sido a comoção do momento que lhe fizera perder a memória? Ou já tinha acontecido antes, e fora o desespero de não saber quem era que a levara a tentar o suicídio? De súbito a jovem quebrou o silêncio, como quem acaba de ter uma ideia.
- Mas você sabe quem eu sou, verdade? Não teria vindo para aqui se não fossemos conhecidos. Vejo que é pintor. Sou sua modelo? 
-Não, - retorquiu Miguel. A menina não veio comigo.
-Como assim?- Interrogou a jovem. Pois se estava aqui dormindo, enquanto pintava.
Apertou a cabeça entre as mãos e desatou a chorar.
-Que se passa comigo? Porque não me lembro de nada? Porquê?- Gritou em desespero.