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8.12.23

8 DE DEZEMBRO - DIA DA Nª SENHORA DA CONCEIÇÃO - RAINHA DE PORTUGAL

                               


                                       A Imaculada Conceição e a história de Portugal

As Nações sobrevivem à erosão do tempo e permanecem vivas na história dos povos se prosseguirem na fecundidade que lhes vem da sua espiritualidade e da sua cultura. A diluição espiritual e cultural de um povo significará inevitavelmente a perca da sua identidade e a sua fusão num hoje sem futuro.

A História de Portugal regista dois momentos altos na recuperação da sua independência: a Revolução 1383-1385 e a Restauração de 1640.

Na Revolução de 1383-1385 salienta-se o cerco de Lisboa, que durou cerca de cinco meses e terminou em princípios de setembro de 1384, acentuando-se durante o assédio, o significado da vitória alcançada por D. Nuno Alvares Pereira em Atoleiros a 6 de abril de 1384 e a eleição do Mestre de Aviz para Rei de Portugal, curiosamente a 6 de abril de 1385. Em 15 de agosto travou-se a Batalha de Aljubarrota, sob a chefia de D. Nuno Alvares Pereira, símbolo da vitória e da consolidação do processo revolucionário de 1383-1385.

No movimento da restauração destaca-se a coroação de D. João IV como Rei de Portugal, a 15 de dezembro de 1640, no Terreiro do Paço em Lisboa.

A Solenidade da Imaculada Conceição liga estes dois acontecimentos decisivos na História da independência de Portugal e no contexto das Nações Europeias. Segundo secular tradição foi o condestável D. Nuno Alvares Pereira quem fundou a Igreja de Nossa Senhora do Castelo em Vila Viçosa e quem ofereceu a imagem da Virgem Padroeira, adquirida na Inglaterra. Este gesto do Contestável reconhece que a mística que levou Portugal à vitória veio da devoção de um povo a Nossa Senhora da Conceição.

Aliás, já desde o berço, já aquando da conquista de Lisboa por D. Afonso Henriques, havia sido celebrado um pontifical de ação de graças, em Lisboa, em honra da Imaculada Conceição.

A espiritualidade que brotava da devoção a Nossa Senhora da Conceição foi novamente sublinhada no gesto que D. João IV assumiu ao coroar a Imagem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa como Rainha de Portugal nas cortes de 1646.

Esta espiritualidade imaculista foi igualmente assumida por todos os intelectuais, que na prestigiada Universidade de Coimbra defenderam o dogma da Imaculada Conceição sob a forma de um juramento solene.

De tal modo a Imaculada Conceição caracteriza a espiritualidade dos portugueses, que durante séculos o dia 8 de dezembro foi celebrado como "Dia da Mãe" e João Paulo II incluiu no seu inesquecível roteiro da Visita Pastoral de 1982 dois Santuários que unem o Norte e o Sul de Portugal: Vila Viçosa no Alentejo e o Sameiro no Minho.

O dia 8 de dezembro transcende o "Dia Santo" dos Católicos e engloba indubitavelmente a comemoração da Independência de Portugal, que o dia 1 de dezembro retoma. O feriado do dia 8 de dezembro é religioso, mas é também celebrativo da cultura, da tradição e da espiritualidade da alma e da identidade do povo português.

Não menos importante, e em âmbito religioso e litúrgico, o tema da Imaculada Conceição da Virgem Maria é já abundantemente abordado pelos Padres da Igreja. Será o Oriente cristão o primeiro a celebrá-la. Festividade que chega à Europa Ocidental e ao continente europeu pelas mãos das cruzadas Inglesas nos séc. XI e XII. Vivamente celebrada pelos franciscanos a partir de 1263, será o também franciscano Sixto IV, Papa, que a inscreverá no calendário litúrgico romano em 1477.

De facto, o debate e a celebração desta festividade em toda a Europa é acompanhada pela história do próprio Portugal. Coimbra, como já vimos, tem um importante papel em todo este processo.

Em 8 de dezembro de 1854, viverá a Igreja o auge de toda esta riqueza teológica e celebrativa. Através da bula "Ineffabilis Deus", Pio IX, após consultar os bispos do mundo, definirá solenemente o dogma da Imaculada Conceição da Virgem Maria.

Não estamos diante de uma simples festa cristã ou de capricho religioso. O dogma resulta de tudo quanto a Igreja viveu até aqui e vive hoje em toda a sua plenitude. Faz parte da identidade da Igreja. Isso mesmo o prova o texto proclamado por Pio IX que apoia a sua argumentação nos Padres e Doutores da Igreja e na sua forma de interpretar a Sagrada Escritura. Ele, de facto, reconhece que este dogma faz parte, depois de muitos séculos, do ensinamento ordinário da Igreja.

Portugal, segundo Nuno Alvares Pereira, ou melhor, São Nuno de Santa Maria, e D. João IV isso mesmo o demonstram, não só como resultado da sua própria fé, mas como expressão de um povo deveras agradecido pela sua Independência e Liberdade.



A Conceição Imaculada da Virgem é um dogma de fé segundo o qual Maria é considerada a primeira redimida pela Páscoa de Cristo.

 

P. Francisco Couto
Reitor do Santuário de Vila Viçosa, professor do Instituto Superior de Teologia de Évora

 


7.12.23

A AVÓ E O S. NICOLAU - TILDE MICHELS

 

Vou contar uma história que se passou quando eu era criança. A história do S. Nicolau e da avó.
A minha avó era pequena e franzina e a mim parecia-me muito velhinha. Não por ter rugas ou cabelo branco, mas pela roupa que usava, sempre escura e de um corte antiquado. Também andava sempre com um avental preto, até mesmo ao Domingo. O avental dos domingos era de seda e fazia barulho ao andar.
Todos os anos, no princípio de Dezembro, a avó vinha para nossa casa. Passava o Inverno connosco na cidade. Assim que a avó chegava, começava para mim a época de Natal. Ao crepúsculo das tardes de Inverno, sentávamo-nos as duas diante do fogão de cerâmica. Era um fogão grande e verde e irradiava um calor muito confortável. Nos outros quartos, os fogões eram de ferro e raramente se acendiam.
O fogão tinha uma portinhola por detrás da qual havia uma placa de ferro onde se podia assar maçãs. Ao assar, o cheirinho espalhava-se pela sala, e a avó ia-me lendo histórias em voz alta. Também fazíamos prendas de Natal.
Mas a nossa melhor brincadeira era “Vamos a Belém”, que todos os anos repetíamos. Durava vários dias, talvez semanas até, e deixava a casa em pantanas.
Nada estava a salvo quando andávamos à procura do equipamento para a nossa viagem. Precisávamos de lençóis para a nossa tenda – em que outro sítio se poderia dormir durante a longa viagem para a Terra Santa? Precisávamos de caixas e caixotes para fazermos um barco – de que outra forma poderíamos nós atravessar o Mediterrâneo? Precisávamos de cadeiras e de cobertores para fazermos animais de carga que nos transportassem a nós e à nossa bagagem.
Nessa altura, o meu pai acabava sempre por sentir que lhe faltava qualquer coisa: o martelo, o alicate, os pregos ou o rolo da corda. Uma vez até disse que lhe tinha desaparecido a câmara-de-ar da bicicleta. E tinha razão. Tínhamos precisado dela à última hora para as nossas provisões de água. O caminho passava pelo deserto e já se sabe que os viajantes passam sede por lá, se não levarem água suficiente.
Era sempre uma longa viagem cheia de peripécias. Em terra, tínhamos de vencer lutas com bandidos e animais ferozes. No mar, passávamos por tempestades que quase afundavam o nosso barco. Uma vez, salvei a avó pela saia, mesmo no momento em que ia ser cuspida borda fora
Mas acabávamos sempre por chegar sãs e salvas a Belém. E, como por magia, sempre no dia 24 de Dezembro!
Quando a avó estava em nossa casa, também se passavam coisas misteriosas. Uma vez, ao meter-me na cama, encontrei um grão de ouro na minha almofada. Grãos de ouro! De onde é que vêm os grãos de ouro? Só podem vir das asas dos anjos! Algum anjo devia ter passado a voar sobre a minha cama!
Quando perguntei à avó, ela sorriu, mas não respondeu.
Certa manhã, apareceu uma estrela pendurada no tecto por um fio transparente. Ninguém sabia quem a tinha lá posto. Também ninguém soube explicar como é que o minúsculo presépio feito numa casca de noz fora parar no meio dos meus lápis de cor.
O facto mais maravilhoso era a minha avó conhecer o S. Nicolau. Ela conhecia-o mesmo! Eu sei! Eu estava lá quando ele falou com ela, lá no parque.
Já disse que a avó era antiquada. Mas não era só antiquada na roupa. No resto também. Falava muitas vezes do tempo em que tudo escasseava e ela achava que as pessoas deviam ser mais poupadas no dinheiro e nas coisas.
A avó era-o. Por isso queria trazer o ramo seco que estava caído no caminho.
– Ainda serve para o fogão – disse ela. – Apanha-o, por favor.
Mas eu não queria.
– Não! – disse eu. E, quando ela tentou apanhá-lo, eu afastei-o.
– Nós não apanhamos lenha. Vão levá-la a casa.
Na altura, não sabia porque tinha sido tão impertinente com a avó, mas agora penso que foi por causa das pessoas que passavam. Não queria que pensassem que precisávamos de andar a apanhar a lenha da rua.
A avó hesitou. Reparei que não sabia o que fazer.
De repente, à nossa frente, apareceu um homem idoso. Estava ali como por magia. Alto e respeitável, com uma barba branca e olhos a brilhar.
– Faça favor, minha cara e honrada senhora – disse ele com uma leve vénia. A voz era grave e sonora.
Estremeci como se tivesse sido atingida por um raio. Aquela voz! Aqueles olhos! Aquela barba branca comprida! Só podia… era, de certeza… Nem me atrevia a continuar a pensar. “Minha cara e honrada senhora”, tinha ele dito à avó. Tinha-lhe feito uma vénia e a avó sorrira e agradecera-lhe.
Depois desapareceu. Tão repentinamente como aparecera.
No caminho para casa, não abri a boca. Tropeçava nas pedras do passeio e nas tampas do saneamento, e dentro de mim ia uma grande confusão.
Agora ele viu – pensava eu. – Agora ele já sabe como é que eu às vezes me porto.
A avó caminhava ao meu lado, em silêncio. O ramo meio seco ia a arrastar pelo chão. À porta de casa, não aguentei mais. Enterrei a cara nas pregas da gabardina da avó e desatei num pranto.
A avó deixou-me chorar. Não fez nada para me consolar, e eu pensava: “Agora vai ficar zangada comigo para sempre e aquele… aquele desconhecido do parque, também.”
Mas então reparei que ela se tinha debruçado sobre mim. Sentia a sua respiração quente nos meus cabelos e ouvia-a falar-me muito baixinho. O que dizia, não percebi, porque ainda soluçava com muita força. Não conseguia parar.
A avó então afastou-me um pouco dela e perguntou:
– Queres levá-lo para cima? Já é um pouco pesado para mim.
Claro que percebi imediatamente que se referia ao ramo e por um momento, sustive a respiração. Depois remexi no bolso, tirei um lenço e assoei as lágrimas que tinha no nariz.
– Dá cá! – disse. Peguei no ramo seco e subi ruidosamente as escadas.
Metemo-lo logo no fogão de cerâmica e ouvia-o a crepitar e a estalar.
“Será que ele sabe que fui eu que o carreguei para cima?”, pensava eu. A avó acenou-me com a cabeça e riu-se. Vi então que estava tudo bem outra vez e fiquei muito feliz com isso.
Tilde Michels 
Anne Braun (org.)
 Weihnachtsgeschichten
 Würzburg, Arena Verlag, 1991
 Tradução e adaptação

6.12.23

O NATAL DAQUELE ANO

 



O Francisco frequentava o terceiro ano de escolaridade

 com muito bom aproveitamento. Era um miúdo admirável!

Já vivera razoavelmente mas, atualmente, sofria as 

consequências da quase indigência do pai por, no início 

daquele ano, ter perdido o emprego. Era um bom  

trabalhador, mas a oficina fechara.

Andava o miudinho muito triste e amargurado porque a 

fome, o frio e a tristeza eram o pão-nosso de cada dia 

naquela casa.Como habitualmente, ao aproximarem-se as

férias do Natal, a professora mandou que os alunos fizessem

uma redação sobre essa quadra festiva.

O Francisco debruça-se sobre o papel e, numa letra mais 

adulta que infantil, intitula a sua composição de APELO e 

escreve:

«Menino Jesus: não acredito no que tenho ouvido dizer a 

teu respeito, ou seja, que só dás a quem já tem, e nada dás

 a quem nada tem! Explico-te porquê: eu sei que são os pais

 a darem essas prendas e não tu, que tens mais que 

fazer; se fosses tu, de certeza que davas a todos e, se 

calhar, em primeiro lugar aos mais pobres.

Sim, eu tenho certeza que davas a todos e, se calhar, em 

primeiro lugar aos mais pobres. Sim, eu tenho a certeza que

 seria assim, pois nunca te esqueces que também nasceste 

pobre e pobre morreste.

Não venho pedir nada para mim. Quero lembrar-me que 

o meu pai está há um ano sem trabalho e precisa de 

ganhar dinheiro para nos sustentar. Por isso, não te 

esqueças de lhe arranjar um emprego. 

Eu sei que Natal quer dizer nascimento e, olha, nós também 

nascemos e, com certeza, não foi para que morrêssemos já, 

sem dar testemunho sobre a terra. Se assim fosse, como é 

que poderíamos dar os parabéns pelo teu aniversário?! Já 

agora podes ficar a saber que eu nasci no mesmo dia: nasci 

no Natal»

Pouco antes de as férias começarem, a professora chamou 

o Francisco e disse-lhe que tinha arranjado trabalho para o 

seu pai e, que já poderia começar a trabalhar no princípio 

de Janeiro do próximo ano. Foi tal a alegria dele que 

chorou copiosamente e, então, passou a andar tão 

contente, que os pais não sabiam que dizer. No entanto ele 

não disse porque é que andava assim.

Na véspera de Natal todos se deitaram cedo, pois a 

consoada consistiria em sopa e pão, por o dono da 

mercearia, atendendo ao dia que era, ter condescendido 

em acrescentar ao rol do livro da dívidas.

O Francisco não adormeceu logo. Depois de ter verificado 

que toda a gente estava a dormir, foi colocar o seu 

sapatinho à porta do quarto dos pais, com um bilhete dentro.

No dia de Natal, a mãe, que era sempre a primeira a 

levantar-se, ao sair do quarto tropeçou no sapato do filho. 

Baixou-se, pegou nele, e leu o bilhete: "Pai, a partir de 

Janeiro vai ter trabalho. Foi a minha professora que lho 

arranjou, por causa da minha redação ao Menino Jesus. É 

a nossa prenda de Natal".

Com as lágrimas nos olhos, de contentamento já se vê, 

aquele casal entrou, pé ante pé, no quarto do filho. Ao vê-

lo profundamente adormecido e a sorrir, ambos disseram: 

eis aqui o nosso Menino Jesus!



Fonte AQUI

5.12.23

UMA ESTRELA COM LUZ DE POESIA

 


Uma Estrela com Luz de Poesia
De repente, passou uma pequena nuvem de tristeza sobre os olhos de Francisca. A avó Josefa partira há dois anos para um sítio de onde ninguém costuma mandar notícias. Antes da partida ainda sofreu muito, e tão depressa a queria junto de si, para sentir o calor do seu carinho, como a queria longe, para não se aperceber dos rostos que o sofrimento pode ter.
Francisca ainda era pequena mas nunca mais esqueceu a dor daquela perda. Foi como se o mundo, naquele dia, tivesse decidido mostrar-lhe o seu lado negro e atemorizador, como se o sol se tivesse zangado com a claridade dos dias e como se até as lágrimas se recusassem a sair para não verem como dói ser infeliz.
Era Dezembro e, lá em casa, nesse ano, ninguém quis festejar o Natal, porque não havia vontade de dar nem de receber presentes e porque todas as conversas se encaminhavam no mesmo sentido, que era o da tristeza e do desconsolo.
Antes de partir, a avó Josefa dissera a Francisca:
— Uma noite, quando já estiver habituada à minha nova morada, hei-de dar-te sinal para que saibas que estou bem e que penso em ti.
Francisca lembrou-se sempre dessas palavras e encontrou, nos poemas que lia nos livros da escola palavras mágicas e belas que eram iguais às que a avó Josefa usava quando queria mostrar-lhe que, por vezes, a beleza de uma coisa pode estar na forma que usamos para a nomear.
— Pode dizer-se de uma coisa — explicava a avó Josefa — somente aquilo que os olhos vêem. Mas também se pode acrescentar qualquer coisa que a torne mais bonita e mais agradável de ver. Isso, minha filha, chama-se Poesia.
Quando Francisca lhe pediu para explicar melhor o que queria dizer, ela deu-lhe alguns exemplos:
— Podemos dizer: “isto é uma árvore”, mas também podemos dizer: “esta árvore está triste porque tem sede” ou “esta árvore é alta e elegante como uma girafa num dia de Primavera”.
Francisca percebeu sem esforço as palavras da avó Josefa e, a partir desse dia e desses exemplos, compreendeu que a Poesia havia de ajudá-la a estar sempre perto da avó, estivesse ela onde estivesse, por maior que fosse a distância que as separava.
Tinha passado um ano e a família preparava-se para festejar mais um Natal. Tinham-se distribuído tarefas e cada um dava o melhor que podia e sabia para realizar bem a que lhe coubera. Uns ajudavam a mãe a pôr a mesa, outros verificavam se os ornamentos da árvore de Natal estavam todos no lugar certo, outros ainda colocavam os presentes nos lugares certos para poderem ser localizados na hora de serem distribuídos, quando fosse meia-noite.
Francisca também cumpriu as suas tarefas, que não eram nem mais fáceis nem mais difíceis que as dos outros, mas nem mesmo estando ocupada conseguia disfarçar a tristeza que as saudades da avó Josefa lhe punham nos gestos e nos olhos.
Todos sabiam qual era a razão dessa tristeza, mas estava assente que, naquela noite, ninguém falaria no assunto. A avó Josefa, que não tinha rival na forma de organizar a festa de Natal, seria lembrada por todos em silêncio, pois as palavras mais belas tinham viajado com ela para muito longe.
Quando se ouviram, na torre da igreja, as doze badaladas da meia-noite, Francisca sentiu que uma lágrima lhe escorria pela face como se fosse uma pérola de um tesouro antigo e secreto.
Foi então que um dos irmãos, o Afonso, lhe disse, tentando animá-la e distraí-la:
— Francisca, há uma estrelinha no céu, lá muito alto, que parece estar a chamar por ti.
Francisca correu para a janela, limpou a lágrima, olhou para a estrela e conseguiu ver no seu brilho intenso o rosto da avó Josefa sorrindo para ela como nos tempos em que lhe contava histórias estranhas e belas para a convencer a comer a sopa.
Quando chegou o momento de se distribuírem os presentes, coube a Francisca, para além de muitas coisas que lhe deram grande satisfação, um belo livro de poemas sobre árvores, rios e animais, ilustrado com muita imaginação e cores muito vivas.
— Quem foi que me deu este livro? — quis saber Francisca. Mas ninguém lhe respondeu.
— Vá, digam lá, quem foi que me deu este livro tão bonito? — insistiu ela, mas continuou a não obter resposta.
Então Francisca pegou no livro, foi para junto da janela e recitou baixinho o mais belo poema que encontrou, como se estivesse a conversar com a avó. Ninguém comentou o seu gesto ou o achou estranho. Lá fora, a pequena estrela brilhava ainda com maior intensidade, como se quisesse encher de luz, de uma luz cintilante e rara, aquela festa de Natal.
E quando Pedro, o irmão mais novo de Francisca, na manhã seguinte lhe perguntou do que mais tinha gostado na festa de Natal, ela respondeu de uma forma breve e simples:
— Do que eu mais gostei foi da Poesia.
— E o que é a Poesia? — perguntou Pedro.
— É uma estrelinha perdida na noite a querer dizer-nos que está sempre alguém connosco quando nos sentimos tristes e temos saudades de quem já partiu.
Também Pedro nunca mais se esqueceu de como pode ser bela a palavra Poesia.


4.12.23

VOLTEI, VOLTEI; VOLTEI DE LÁ...


 

Boa noite amigos.

Estou de volta. Amanhã iniciarei as visitas aos vossos blogues. Como é hábito deste blogue, durante o mês de Dezembro, não haverá as rubricas habituais, mas serão postados contos de Natal, tradicionais de Portugal ou de outros países. Em Janeiro, após os Reis, voltaremos aos temas normais. Para todos um bom mês de Dezembro.

23.11.23

PEQUENA PAUSA


Amigos, como sabem, o pé do meu marido que tinha sofrido no dia 27 de junho, a amputação de um dedo necrosado por entupimento arterial, que o obrigaria a uma cirurgia para um  bypass da cintura ao gémeo no dia 3 de Julho. Bom finalmente a ferida fechou, a enfermeira deu-lhe alta ontem pelo que estamos de partida para o Algarve, e lá não tenho internet. Vamos matar saudades da família e descansar uns dias já que em dezembro eu tenho vários exames e consultas. Então até à volta...

22.11.23

CICATRIZES DA ALMA - PARTE LVIII

 


E chegou o dia 31 de Dezembro, e aproximava-se a noite de fim de ano. Os dois dias anteriores, tinham passado a correr, entre os exercícios, cada dia mais fáceis de Tiago e alegres refeições em que a simpatia e cordialidade de Peter era notória. E a alegria de Tiago com a presença do amigo, não lhe ficava atrás, de tal modo que por vezes Anabela se sentia a mais e então se afastava. Mas logo, Tiago ou Peter lhe pegavam no braço e a traziam de novo ao convívio.

O ambiente era tal, que pela primeira vez na vida, Anabela esqueceu Óscar e conviveu como qualquer outra jovem da sua idade em harmonia, com os dois homens, abertamente. Aquela, seria a última noite que Peter estaria com eles, no dia seguinte partiria, e Anabela não tardaria a fazer o mesmo, pois embora Tiago quisesse prolongar a sua estadia, por mais um mês, a verdade é que ele já não precisava dela. O que faltava na sua recuperação podia fazer em qualquer clínica.

Enquanto ajudava Isilda na cozinha, com as iguarias que os deliciariam na ceia daquela noite, Anabela pensava em como a vida era estranha. Três meses antes chegara àquela casa, com a alma ferida, cujo único consolo era o carinho dos seus compadres e da pequena Patrícia. A luta que teve de enfrentar para tirar o doente do marasmo não foi fácil, mas teve o valor de não lhe dar tempo a remoer a sua dor. E a paz e o carinho que encontrou naquela casa, foram o melhor dos lenitivos. Apenas a animosidade do doente lhe amargava os dias.

Depois quase sem se dar conta, o mau humor foi desaparecendo, e o irascível doutor, foi ficando cada dia mais cordial. Isso tornou os dias da sua estadia mais prazerosos. Era como se a paz que disfrutava na quinta se tornasse ainda mais pacífica e luminosa.

Agora, que chegava a hora da partida, sentia um aperto no peito, uma grande tristeza no coração. Tinha-se afeiçoado ao caseiro, sentia Isilda como uma verdadeira amiga, e Tiago…

Que sentimentos tão contraditórios sentiu naqueles três meses. Primeiro admirou o homem, pelos seus ideais, pela sua luta por um mundo mais igualitário. Encheu-se de compaixão, quando o viu no primeiro dia, naquele quarto escuro, a barba crescida, o rosto macilento, os olhos sem brilho.

Mais tarde a raiva substituiu a compaixão ao perceber que o doente tinha escolhido o caminho para a morte, em vez de lutar pela sua recuperação.

Manteve durante os primeiros tempos uma luta constante para trazê-lo de volta e embora por vezes se sentisse desanimada, nunca desistiu. Orgulhou-se mais dele que de si mesma, quando percebeu que ele tinha voltado a querer viver, a querer voltar a ser a mesma pessoa de antigamente. E nos últimos tempos, depois que a atitude de Tiago, mudara por completo, Anabela sentiu um orgulho imenso pelo seu trabalho, mas também uma grande amizade pelo doente.

Sim, ela estava convencida que era uma simples e bela amizade. De modo nenhum queria pensar que podia ser algo mais…

 

 

 

21.11.23

POESIA ÀS TERÇAS - ADRIANO ALCÂNTARA - A UTOPIA DOS OLHOS ESCANCARADOS

                                                     Obra do pintor Roberto Chichorro





A Utopia dos Olhos Escancarados


 Se num momento de loucura

acaso arriscares acima do tédio
e afoito sozinho dobrares
a agreste solidão da esquina dos dias,
poderás então entrever
por entre as brumas do tempo
a imensa multidão e o verde prazer
das tuas mais urgentes utopias.

Se depois com ardor escreveres
- ridícula como o poeta a dizia -
uma simples carta de amor
cuja verdade ofereça fogosa o seu pudor
sinceros significados tão prementes
que a ouro fiquem bordados
no seio nu das palavras inexistentes,
imune farás tombar do muro os pecados
com que este presente impune
procura sarcástico esconder-nos o futuro.

Se porém impossível te for
a sangria das palavras a sério
e ao cansaço sem outra saída
com fúria não conseguires opor
a beleza dum punho bem apertado,
arrepia caminho e não ouses.
Nunca ouses monstro malfadado
dobrar a esquina deste tempo
de cobardias prenhe e silêncios cheio.

Porque só o amor mata a hipocrisia
e reconhece os homens iguais
porque para além deste dia
só de olhos escancarados se sonha a utopia.


Adriano Alcântara - Moçambique

20.11.23

CICATRIZES DA ALMA - PARTE LVII

 




- E então meu tio enviou a Anabela. Ela não se assustou com os meus gritos e contra a minha vontade, obrigou-me a estar com as cortinas abertas e a fazer fisioterapia. Ela fechou a porta da morte e obrigou-me a voltar para o corredor da vida.

- E hoje pareces estar a dois passos de uma recuperação total. Pelo que contas, salvou-te a vida. Não admira que estejas tão apaixonado. Já lhe confessaste os teus sentimentos?

-Até há poucos dias, eu continuava sem saber se ainda poderia ter alguma coisa a oferecer a uma esposa. Na verdade só ao acordar na manhã de Natal, soube que as coisas tinham voltado ao normal.

-Milagre de Natal?

-Mais de um sonho erótico.

-Com a enfermeira, suponho. Então já nada te impede de lhe dizeres o que sentes.

- Continua a ser impossível. Anabela é acima de tudo uma excelente profissional e ainda que sentisse alguma espécie de sentimento por mim, ia negá-lo em virtude de eu ser seu paciente. Depois ainda não sei com o que posso contar a nível de reprodução. Tenciono submeter-me a uma série de exames no início do ano, pois nada me garante que não esteja estéril. E tu sabes que a maioria das mulheres tem o sonho de ser mãe. Especialmente se já sentiu as alegrias de uma gravidez, e nunca pode sentir a alegria de ter um filho nos braços. 

Queres dizer que sofreu um aborto?

Pelo que sei, Anabela é uma mulher que sofreu muito com o seu casamento. Não sei se sabes, que ela é viúva, o marido morreu há três meses assassinado, mas havia meses que viviam separados. Segundo o meu tio, era um traste que a maltratava. Ele contou-me ainda que Anabela perdeu um bebé não há muitos meses e que estava a pensar abandonar o país, porque os sogros a culpavam da morte do filho e lhe faziam a vida negra. Por tudo isto, não estará pronta a abrir-se para uma nova relação.

-Compreendo. Vais ter de ganhar a sua confiança antes do mais.

É isso. Mas falemos de ti. Que novidades me contas? E os teus pais?

-Os meus pais estão bem, levam a vida a dizer que está na hora de me deixar de missões e casar. Que a principal missão de um homem é ser pai e não querem morrer sem ter a alegria de abraçar um neto.

- Os pais são assim. Antes de ficar noivo, os meus atormentavam-me com a mesma conversa. Mas compreende-se, por vontade própria ou não, só nos têm a nós. Se tivessem tido mais filhos a esta hora já estavam encantados com os netos e não nos incomodavam.

-Menino Tiago, interrompeu Isilda entrando na salinha. - O jantar está na mesa.

 

19.11.23

DOMINGO COM HUMOR...OU NÃO.


 A cor do horto gráfico...

 Última atualização do dicionário de língua portuguesa - novas

    entradas:

 Testículo: Texto pequeno

    Abismado: Sujeito que caiu de um abismo

    Pressupor: Colocar preço em alguma coisa

    Biscoito: Fazer sexo duas vezes

    Coitado: Pessoa vítima de coito

    Padrão: Padre muito alto

    Estouro: Boi que sofreu operação de mudança de sexo

    Democracia: Sistema de governo do inferno

    Barracão: Proíbe a entrada de caninos

    Homossexual: Sabão em pó para lavar as partes íntimas

    Ministério: Aparelho de som de dimensões muito reduzidas

    Detergente: Acto de prender seres humanos

    Eficiência: Estudo das propriedades da letra F

    Conversão: Conversa prolongada

    Halogéneo: Forma de cumprimentar pessoas muito inteligentes

    Expedidor: Mendigo que mudou de classe social

    Luz solar: Sapato que emite luz por baixo

    Cleptomaníaco: Mania por Eric Clapton

    Tripulante: Especialista em salto triplo

    Contribuir: Ir para algum lugar com vários índios

    Aspirado: Carta de baralho completamente maluca

    Assaltante: Um 'A' que salta

    Determine: Prender a namorada do Mickey Mouse

    Vidente: Aquilo que o dentista diz ao paciente

    Barbicha: Bar frequentado por gays

    Ortográfico: Horta feita com letras

    Destilado: do lado contrário a esse

    Pornográfico: O mesmo que colocar no desenho

    Coordenada: Que não tem cor

    Presidiário: Aquele que é preso diariamente

    Ratificar: Tornar-se um rato

    Violentamente: Viu com lentidão

   E…  Língua "perteguesa"... PORQUE O SABER NÃO OCUPA LUGAR!

 Prontus

    Usar o mais possível. É só dar vontade e podemos sempre soltar um

    'prontus'! Fica sempre bem.

  Númaro

    Também com a vertente 'númbaro'. Já está na Assembleia da República uma

    proposta de lei para se deixar de utilizar a palavra NÚMERO, a qual

    está em

    claro desuso. Por mim, acho um bom númaro!

 Pitaxio

    Aperitivo da classe do 'mindoím'.

Aspergic

    Medicamento português que mistura Aspegic com Aspirina

Alevantar

    O acto de levantar com convicção, com o ar de 'a mim ninguém me come por

    parvo!... alevantei-me e fui-me embora!'.

 Amandar

    O acto de atirar com força: 'O guarda-redes amandou a bola para bem

    longe'

Assentar

    O acto de sentar, só que com muita força, como fosse um tijolo a cair no

    cimento.

Capom

    Tampa de motor de carros que quando se fecha faz POM!

 Destrocar

    Trocar várias vezes a mesma nota até ficarmos com a mesma.

 Disvorciada

    Mulher que diz por aí que se vai divorciar.

 É assim...

    Talvez a maior evolução da língua portuguesa. Termo que não quer

    dizer nada

    e não serve para nada. Deve ser colocado no início de qualquer frase.

 Entropeçar

    Tropeçar duas vezes seguidas.

 Êros

    Moeda alternativa ao Euro, adotada por alguns portugueses.

    Também conhecida por “aéreos”

Falastes, dissestes...

    Articulação na 4ª pessoa do singular. Ex.: eu falei, tu falaste, ele

    falou,

  TU FALASTES...

Fracturação

    O resultado da soma do consumo de clientes em qualquer casa

    comercial. Casa

    que não fratura... não predura.

Há-des

    Verbo 'haver' na 2ª pessoa do singular: 'Eu hei-de cá vir um dia; tu

    há-des

    cá vir um dia...'

 Inclusiver

    Forma de expressar que percebemos de um assunto. E digo mais: eu

    inclusiver

    acho esta palavra muita gira. Também existe a variante 'Inclusivel'.

    A forma mais prática de articular a palavra MEU e dar um ar afro à

    língua

    portuguesa, como 'bué' ou 'maning'. Ex.: Atão mô, tudo bem?

Nha

    Assim como Mô, é a forma mais prática de articular a palavra MINHA. Para

    quê perder tempo, não é? Fica sempre bem dizer 'Nha Mãe' e é uma

    poupança

    extraordinária.

 Parteleira

    Local ideal para guardar os livros de Protuguês do tempo da escola.

Perssunal

    O contrário de amador. Muito utilizado por jogadores de futebol.

    Ex.: 'Sou

    perssunal de futebol'. Dica: deve ser articulada de forma rápida.

Prutugal

    País ao lado da Espanha. Não é a Francia.

Quaise

    Também é uma palavra muito apreciada pelos nossos pseudo-intelectuais...

    Ainda não percebi muito bem o quer dizer, mas o problema deve ser meu.

Stander

    Local de venda. A forma mais famosa é, sem dúvida, o 'stander' de

    automóveis. O 'stander' é um dos grandes clássicos do 'português da

    cromagem'...

 Tipo

    Juntamente com o 'É assim', faz parte das grandes evoluções da língua

    portuguesa. Também sem querer dizer nada, e não servindo para nada, pode

    ser usado quando se quiser, porque nunca está errado, nem certo. É

    assim...

    tipo, tás a ver?

Treuze

    Palavras para quê? Todos nós conhecemos o númaro treuze.



Não sei bem se isto é para rir, ou chorar, mas hoje é o que há.



    E feliz dia para todos os cavalheiros que me visitarem. Hoje é 19 de Novembro dia Internacional dos Homem