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31.3.21

CASAMENTO POR PROCURAÇÃO - PARTE XVII

 




Um mês mais tarde, o “casal” tinha adquirido rotinas e viviam aparentemente felizes. Sofia estava empregada numa loja de moda, ia para o emprego e regressava de metro, jantava no restaurante e aguardava pelo marido para regressarem a casa. Passavam os sábados juntos, já que o restaurante encerrava nesse dia, e ela só trabalhava até à uma. Depois do almoço, davam uma volta pela cidade, e às vezes pelos arredores. 

Quim era um homem culto e um excelente guia e ela gostava de o ouvir. Jantavam em casa. E depois do jantar, iam ao cinema, ao teatro, ou simplesmente ficavam em casa, vendo televisão e conversando.
Ao domingo o restaurante estava aberto, ele ia trabalhar. Ela levantava-se cedo, tratava das tarefas da casa, ia à missa, almoçava no restaurante e passava parte da tarde com a tia Délia.

A tia era simpática e  boa conversadora e Sofia tinha-se afeiçoado a ela.
Pena que cada vez se encontrasse mais debilitada.
Jantava com os tios e só descia à hora que o marido costumava sair. E seguiam juntos para casa.

Decorrido esse mês, Sofia estava completamente apaixonada pelo marido. Cada dia o admirava mais, gostava da paciência com que lhe explicava coisas, que ela nunca entendera, como a politica por exemplo. Tinha aprendido mais com ele naquele mês, do que na sua vida inteira. Sentia-se fascinada pela mentalidade do marido, tão diferente da dos homens da sua aldeia. E cada dia era maior o seu desejo de que ele reparasse nela como mulher.

Por essa altura, conheceu a mulher por quem ele se apaixonara. Encontraram-se num sábado, quando passeavam pelas margens do Sena. Ela estava sentada num café quando os vira. Levantou-se e dirigiu-se a eles. Era uma bela mulher, pequena, de aspeto delicado, tez branca e cabelos loiros. A sensação que Sofia teve foi de que se tratava de uma boneca de porcelana, tal a imagem de delicadeza e fragilidade da outra. 

 Sofia soube imediatamente quem ela era, não porque o marido lhe dissesse. A mão de Quim apertou de forma inconsciente, durante uma fração de segundo, o ombro de Sofia, quando a  viu, e isso foi tudo.
-Olá Quim. Não há quem te veja. Disseram-me que te casaste. É claro que não acreditei, - disse ela pestanejando exageradamente. 
- É bom que acredites Joana. Porque é verdade, - respondera-lhe ele aparentemente calmo.

A “boneca” fez um trejeito com os lábios, como se fizesse beicinho e dignou-se olhar para Sofia. Pendurou-se no braço de Quim e perguntou:
-Apresentas-me?
-Não. E se me dás licença, estamos com pressa.
Sem qualquer espécie de decoro, ela esticou-se, deu-lhe um beijo na face, e afastou-se dizendo:
- Telefona-me.





Esta história voltará depois da Páscoa.  Para todos desejo um resto de boa semana e uma Santa Páscoa, tão feliz quanto possível.

30.3.21

POESIA ÀS TERÇAS - A CANÇÃO DO RIO




A CANÇÃO DO RIO


Escuta
A canção do rio
Correndo
 De pedra em pedra.
 Não te parece
 Alguém
 Chorando?


Talvez seja
 O choro dorido
 das pobres mães
 A quem
Sobra a fome
Para por na mesa
Aos filhos

Ou quem sabe o lamento
 Do pobre velho
 Abandonado
 Num corredor de hospital
 O corpo doente
 A alma sem forças
 Para lutar.

Ou ainda
O desespero dos jovens,
 Que dia após dia,
 Rompem solas
 E energias
 Na busca de emprego
 Engolindo a raiva
 Contra aqueles
 Que lhes roubam
 O direito ao futuro.


Escuta
 A canção do rio
Correndo
 De pedra em pedra.
 Não te parece
 Alguém
 Chorando?


Elvira Carvalho

29.3.21

CASAMENTO POR PROCURAÇÃO - PARTE XVI

 




- Nada. Ainda não me conheces, mas garanto-te que sou um homem de princípios. Apesar de tudo o que te disse, não me casaria, se soubesse que não tinha forças, para acabar com uma relação, e fechar a porta ao passado.
 Quis que o soubesses, para que me entendesses, e não te sentisses rejeitada. Porque não me vou deitar na tua cama, a pensar noutra mulher, nem te vou pedir que me ajudes a esquecê-la. É tarefa minha. Peço-te paciência, enquanto me livro dos meus fantasmas.

Finalmente voltou-se. Olhou-a fixamente, tentando adivinhar o que lhe ia na alma. Virando-lhe as costas, Sofia voltou para o sofá.
-Agradeço a tua sinceridade. Lembro-te que estamos casados pelo registo e pelo que sei, aqui existe o divórcio.
- Não me entendeste, Sofia. Nunca pediria o divórcio, do mesmo modo que nunca te vou atraiçoar, porque ainda que aqui dentro, sejamos apenas bons amigos, fora deste apartamento, és a minha mulher e como tal, sempre te respeitarei.  Sou  homem que honra os seus compromissos.

- Bom. Depois do que acabaste de me contar, pensei que tinhas pedido o casamento pelo registo, a pensar num possível divórcio.
-Não. Talvez esteja errado, mas penso que um juramento perante Deus, não se deve fazer de ânimo leve. Penso que só dois seres que se conhecem bem e se amam de corpo e alma, devem casar pela igreja. E não é o nosso caso.

- Então, agora que esclarecemos a situação, o que vamos fazer? - perguntou a jovem, sem bem saber o que pensar.
- Não sei. Não disseste que o amor vem com a convivência? Podemos ser amigos, partilhamos a casa, conhecemo-nos. Depois se verá o que o futuro nos reserva.  Parece-te bem?
- Sim.

O silêncio caiu sobre eles. Intenso. Ela não sabia se estava feliz, se desiludida. O que sabia, é que o seu desejo de sair da aldeia, a tinha metido numa "camisa de onze varas" como costumava dizer o pai. Resolveu mudar de assunto.
-É preciso alguma coisa especial, para procurar trabalho aqui? Inscrever-me em algum lado?

-Não. Na Segunda-feira, temos que ir tratar da tua legalização no país. Nada que acarrete problemas, afinal somos casados, e ainda que o não fossemos, a França permite a legalidade sem grandes problemas. E em que gostarias de trabalhar? Disseste que tens o Curso Comercial. Se falar com o tio, talvez pudesses ajudá-lo com a contabilidade do restaurante.

-Não. Não quero trabalhar contigo ou com o teu tio. Pelo menos por agora. Tenta compreender. Quero qualquer coisa, onde me sinta uma empregada como outra qualquer, não a sobrinha do dono. Entendes?
- Sim. E tens alguma ideia do que gostarias de fazer?
- Neste momento, e dado a diferença de moda entre o que vi aqui e o que se usa  na nossa terra, o que gostava mesmo, era de uma loja de roupas.
- Podemos ver os anúncios no jornal. Mas não precisas ter pressa. Tenho  algumas economias. E um bom salário.

28.3.21

DOMINGO COM HUMOR


Uma senhora, aparentemente de meia-idade, vítima de atropelamento, chega ao hospital em péssimo estado. O médico examina-a enquanto a enfermeira vai anotando numa ficha:
- Escoriações na cabeça, fratura no braço direito, luxação na clavícula, desarticulação do tornozelo esquerdo…
Virando-se para a paciente, o médico pergunta:
- Qual a sua idade minha senhora?
- Trinta e cinco anos. – Responde a paciente.

Continua o medico:
- Anote também: perda de memória…


                                                      *****************


A maquina de lavar roupa de minha esposa queimou e ela me pediu para comprar outra, para por ela em seu lugar lhe respondi :


"No tempo das cavernas, antes de existirem maquinas de lavar as mulheres lavavam as roupas no riacho"

Ela ficou quieta, fui trabalhar e ao abrir minha marmita tinha arroz, feijão e dois ovos crus. Acompanhava um bilhete que dizia.
"Os homens das cavernas comiam comida crua antes da descoberta do fogo " AGORA TE VIRA MANÉ.


                                                      ************



 O médico, que havia tratado a Dona Berta em quase toda a sua vida, aposentou-se e foi substituído por outro colega.

Na consulta seguinte, o novo médico pediu à Dona Berta a lista dos medicamentos que lhe haviam sido receitados.
Quando o jovem médico viu a lista, ficou atónito!!!
- 'D. Berta, sabe que estas pílulas são.... são... ANTICONCEPCIONAIS???'
- 'Sim, doutor, elas ajudam-me a dormir.'
- 'D. Berta, eu afirmo perentoriamente que não há ABSOLUTAMENTE NADA nestas pílulas que faça uma pessoa dormir!'
A velhinha deu um sorriso, e disse:
- 'Sim, eu sei.. mas para mim, FAZ ! Todas as manhãs dissolvo uma pílula no sumo de laranja da minha neta, que tem 16 anos e, assim,
durmo em paz... ...TODAS AS NOITES...'


****************


Um dia o Xico 😎 cansado da vida de casado disse que ia comprar cigarros e desapareceu.
Não é força de expressão ou sentido figurado, ele disse exatamente isto:
- Vou ali à esquina comprar cigarros e já volto....
Ficou dez anos desaparecido.
Há algum tempo, reapareceu. Bateu à porta de mansinho, a mulher 👩‍🦰foi abrir e, lá estava ele: dez anos mais velho, magro, cabisbaixo, quieto, sem dizer uma palavra...
A mulher👩‍🦰quando o viu, despejou toda a revolta para cima dele:
- Seu isto! Seu aquilo! Então dizes que vais à esquina comprar cigarros e desapareces? Abandonas-me, abandonas as crianças, ficas dez anos sem dar notícias, fazes-me criar os putos sozinha e ainda tens o desplante, a pouca vergonha, a coragem de reaparecer deste jeito?
Pois vais pagar-me. Fica sabendo que vais ouvir poucas e boas. Eu nunca te vou perdoar. Estás a ouvir? Nunca! Entra, mas prepara-te para.........
Nisto, o homem dá uma palmada na testa e diz:
- Eh, pá! Esqueci-me dos fósforos... volto já!


*****************

Um advogado para um novo cliente:
- De acordo com a sua vontade, o senhor quer divorciar-se da sua mulher porque ela o enganou. É isso?
Responde o cliente:
- É sim, senhor doutor. Ela até me confessou que amava outro…
O advogado:
- Mas, então, se ela confessou, disse-lhe a verdade, portanto não o enganou…

26.3.21

CASAMENTO POR PROCURAÇÃO - PARTE XV



- Não eras totalmente um desconhecido. Conheço toda a tua família e lembrava-me de ti, embora estejas muito diferente daquela época, como é evidente. Mas tens razão, sim. Na verdade o meu maior sonho, era sair da aldeia. Queria conhecer outras pessoas, outros terras. O facto de ser filha única não me fez mais feliz do que as demais, antes pelo contrário, quase me tornou uma prisioneira, na minha própria casa. Desde que acabei os estudos, nunca mais saí da aldeia. Nunca tive um namorado, nem sequer um amigo. Meus pais não me deixavam ir trabalhar e eu sentia-me sufocar entre quatro paredes. 
Aceitar a tua proposta, foi o abrir da gaiola, e o meu voo para a liberdade.

- Um casamento nunca é um voo para a liberdade, Sofia! 


- Mas era a minha hipótese de ter outra vida, conhecer novos horizontes. Hás de convir, que não tem nada a ver esta casa, e esta cidade, com a nossa aldeia.
Até mesmo a tua mentalidade. Os homens da nossa aldeia, não falam com as mulheres ou com as filhas abertamente, nem lhes dão opção de escolha, como tu o fazes. Eles é que sabem tudo da vida e do mundo, as mulheres servem para lhes dar filhos e para cuidar da casa e da família. Pode ser que eu seja um pouco maluca, mas penso que o horizonte das mulheres na aldeia e talvez no país, não sei, é demasiado negro. Sonhava com uma vida diferente.

- E o amor, Sofia? Onde fica o amor?
- Minha mãe, sempre me disse que o amor vem com a convivência. Que só no dia a dia, enfrentando juntos, alegrias e tristezas, se pode chegar ao amor. 
-E tu, acreditas nisso?

-Não sei. Como te disse, nunca tive um namorado, só convivi com rapazes da minha idade, enquanto estudava, era uma miúda e nunca me senti atraída por nenhum deles. Ainda não tinha feito dezasseis anos, quando terminei o curso, e desde aí praticamente não saía de casa, a não ser para a igreja, e sempre com a minha mãe. Não tenho razões que me permitam acreditar ou não.

Quim levantou-se e aproximou-se da janela. Ficou olhando na escuridão durante alguns segundos.

- E se te disser que não pensava em me casar? E se te disser que os meus tios me pressionaram até ao limite, para que o fizesse?
A sua voz soou rouca, ao fazer a confissão.
- Não entendo. Estás a dizer que te obrigaram? Porque iriam fazê-lo? E porque o aceitaste? És um homem adulto.

- Desculpa, se de algum modo te vou magoar, mas não ficarei de bem com a minha consciência, se não for sincero contigo. Apaixonei-me por uma mulher que eles não consideram digna. No fundo, eu sei que estão certos, mas é como dizem, no coração não se manda. Daí que eles acharam que a maneira de me “meterem juízo na cabeça” seria casarem-me.

Porque é que lhe doeu aquela confissão? Não tinha razão para isso. Não estava apaixonada pelo marido.

- Continuo sem perceber, porque obedeceste. És maior de idade, e por muito que gostes deles, não têm o direito de mandar na tua vida. Nem sequer são teus pais.
- Não entendes. Seria mais fácil se fossem meus pais. Como viste estão velhos, e depositaram em mim todas as esperanças e o amor que teriam dado a um filho. Estou-lhes muito grato e devo-lhes respeito. 
 Se recusasse teria que deixá-los, procurar outra casa, outro emprego. O trabalho não me mete medo, sinto-me capacitado para trabalhar em qualquer lugar, mas  sei que ao fazê-lo,  os mataria de desgosto.
Sofia, levantou-se e caminhou até ele. Pôs-lhe a mão no ombro, e perguntou suavemente:
- E agora? Que pensas fazer?




24.3.21

CASAMENTO POR PROCURAÇÃO - PARTE XIV

 





 Sentia-se nervosa.
Quim ainda foi à cozinha, mas o tio já se tinha retirado, e estavam apenas os dois jovens ajudantes, a fazer a limpeza e  preparando as coisas para o dia seguinte.

E finalmente regressaram a casa.
Como se previamente tivessem chegado a acordo, ambos se dirigiram à sala. Quim deixou-se cair no cadeirão, ela sentou-se no sofá. Após uns minutos de silêncio, ele pediu.
- Fala-me de ti.
- De mim? – admirou-se. Será que o pai dele, não lhe tinha falado dela? - O que queres saber?- interrogou por sua vez.

- Tudo. Por exemplo, porque aceitaste este casamento absurdo?
Ficou espantada. Absurdo? Se era assim que pensava porque tinha escrito ao pai e lhe pedira para o organizar?
- Se pensas que é absurdo, porque o propuseste?

- Não é essa a questão, Sofia. Pelas razões de que já falámos, sabes que eu não podia ir a Portugal. Mas tu és mulher. Uma mulher muito bonita por sinal. Os teus pais podem ser considerados abastados, num país com o nível do nosso, especialmente nas aldeias. E és filha única o que faz de ti um excelente partido a quem não faltariam pretendentes. Julgo saber, o que os pais nas nossas aldeias, são capazes de fazer com a vida dos filhos, especialmente quando são mulheres. Também sei que os nossos pais são amigos. O que quero saber, é se tu aceitaste este casamento, de livre vontade, ou se o teu pai to impôs.

Sofia, pensou que a alusão dele à sua beleza, era um sinal de que tinha reparado nela. Respondeu sem saber onde ele queria chegar com semelhante interrogatório.
- O meu pai nunca me impôs que casasse contigo. Ele falou-me do teu desejo, de casares com uma moça da terra, e de que o teu pai gostava de mim para sua nora.  E eu aceitei. Só isso.

- Porquê? Para esqueceres alguém?
- Não há ninguém para esquecer, - respondeu irritada. Estava cada vez mais  nervosa. Porquê aquele interrogatório? Nem parecia o homem agradável que se mostrara até há poucos minutos.
- Desculpa. Não queria irritar-te. Apenas entender as tuas razões para te casares assim com um desconhecido. Eu sei que os casamentos por procuração são correntes no nosso país, mas geralmente são casais que já se conheciam, ou que foram namorados e por razões várias tiveram que se separar. Os casamentos entre desconhecidos, penso que serão bem mais raros.

23.3.21

POESIA ÀS TERÇAS - O Enforcado



                                     A foto, é reprodução de um quadro de Pisanello.




O ENFORCADO


Olha, ali!...
aquele corpo caído
dependurado
naquela arvore nua...

Parece que nos faz uma careta!

Deita-nos a língua de fora
como quando
jogávamos em criança.

Jogo
interessante
difícil
fazer rir!

Matou-se!

PALERMA!

Como se na morte
encontrasse
os ideais forjados.

Elvira Carvalho


 
Poema escrito nos anos 60, foi lido no rádio Nampula. Encontrei-o há tempos, quando ia destruir papéis velhos.

22.3.21

CASAMENTO POR PROCURAÇÃO - PARTE XIII





O empregado voltou com a lista das sobremesas.
-Aconselho-te o pudim de pão. É muito bom.
Fizeram o pedido.
- Não tens saudades dos teus pais e irmãos? – perguntou curiosa.
- Claro que sim, - respondeu com tristeza. Tenho cunhados e sobrinhos que nem conheço. Mas não posso voltar. 

-- Não enquanto Portugal mantiver uma guerra colonial, com a qual não concordo e que considero injusta. Quando vim, sabia que me estava a despedir deles para sempre. A menos que um dia haja uma reviravolta política, que acabe com a guerra e a colonização.

- E acreditas que isso vai acontecer algum dia?
- Acredito que sim. Mais dia, menos dia, a juventude vai acordar e dizer basta. 
Terão que ser os jovens, já que os outros, ou estão demasiado comprometidos com o regime, ou estão paralisados pelo medo, ou sem forças para lutar. Tinha grandes esperanças no General Humberto Delgado. Penso que se ele tivesse chegado ao poder, poderia ter mudado o curso da história. Mas os esbirros do regime, não deixaram.

- Voltarias para Portugal, se o regime mudasse? 
-Para ficar? Não! Pelo menos enquanto os tios forem vivos. Talvez tu não entendas o que sinto por eles. É amor, respeito e gratidão. Estão velhos. Sei que precisam de mim. Mas decerto que iria a Portugal sim. Para abraçar os meus pais e irmãos. Para conhecer os cunhados e sobrinhos; família que ainda não conheço. Para rever a nossa terra, os lugares onde passei a minha meninice, os amigos de infância, se é que por lá está algum.
E não é engraçado, que me lembre dos teus pais e não me recorde de ti?

-Não admira. Era uma criança, de nove anos, quando partiste. Eu sim, lembro-me de ti. Eras um magricela alto, só tinhas pernas.
Riram os dois.
Aos poucos o restaurante fora-se esvaziando. Eles também tinham terminado, e Sofia sentiu pena de que assim fosse. A noite tinha sido maravilhosa, a refeição deliciosa, e tinha adorado as explicações do marido. Mas as horas corriam e o momento de maiores intimidades aproximava-se. E sentia um aperto no peito.



21.3.21

21 DE MARÇO - DIA DE ...

 Não sei se o dia HOJE, tem horas suficientes para o que nele se comemora. Então vejamos:

Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial
Quando será que a humanidade entende e aceita, que não existem raças,
 mas todos fazemos parte de uma única espécie.  A HUMANA



Dia Mundial da Poesia

Tempo sem Tempo

Para ti, minha irmã

Meu irmão
escrevo
este pobre poema.

Para te falar da angústia
e do medo
que enche
os bancos vazios de gente
nos jardins
e parques do meu país.

Para te falar
deste tempo sem tempo
de horas intermináveis
de solidão e saudade.
E das vacinas que não chegam
perdidas
nos escuros labirintos de interesses
das indústrias farmacêuticas.

Para te falar, também
que por trás de cada máscara
de cada abraço que não se deu
de cada sonho que não se cumpriu.
A esperança é um pequeno barco
que navega
neste imenso mar
adormecido
que é a nossa vida,
em tempo de pandemia.

(poema meu) 



Dia Internacional de Nowruz

O Festival de Nowruz, que celebra o Ano Novo do calendário persa, uma festa tradicional que se festeja por quase toda a Asia Central, há pelo menos 3.000 anos, este ano cancelado devido à pandemia.



Dia Internacional do Síndrome de Down





Por último mas não menos importante  já que as florestas são os pulmões do planeta.

E depois de tudo isto, os meus votos não serão apenas de um dia feliz, mas de um mundo melhor.

 


20.3.21

PORQUE HOJE É SÁBADO... E COMEÇA A PRIMAVERA




Primavera - Vivaldi  ( As quatro estações )

Para todos os que me visitam desejo que vivam uma Primavera alegre e com saúde.


Informando:
Como creio que todos sabem, depois de quatro cirurgias, em 2019, aos olhos fiz em Fevereiro de 2020 um transplante de córnea.  e um colagem de retina.  Tinham-me marcado para 17 do mês passado, a consulta para tirar os pontos do transplante que o médico me disse seriam tirados após um ano. Estou com um astigmatismo muito grande que me disseram, são consequência dos pontos, e portanto óculos e correção só depois dos testes feitos após a extração dos pontos.
Acontece que a consulta foi cancelada por email que informava que aguardasse uma carta com nova data. Cada dia tenho mais dificuldade em ler, escrever, cozer ou qualquer outra coisa em que tenha de fixar os olhos durante um certo tempo. 
Daí as reposições de contos já publicados e os vídeos.  E daí também a dificuldade em ler e comentar todos os blogues que sempre li e comentei.  E por isso peço desculpa.

19.3.21

19 DE MARÇO - DIA DE S. JOSÉ - DIA DO PAI

                                                              Foto do meu pai 


 PAI


Para ti,
que foste a semente da vida
Em mim.
Que me acolheste com Amor 
Em teus braços
Tantas vezes cansados
Mas sempre presentes
E me acompanhaste
Mais de metade da minha vida.
Que me ensinaste
 A caminhar
A ler
A escrever
Que me mostraste
Com teu exemplo
Como ser uma pessoa de bem.
Para ti
Meu pai, meu amigo,
Meu mentor.
Um enorme obrigado.
E se lá na dimensão
Onde te encontras
Te é dado ver o nosso plano
Aceita pai a minha gratidão
O meu amor, a minha saudade.



Peço desculpa pelas ausências. Tenho estado pior dos olhos.

18.3.21

CASAMENTO POR PROCURAÇÃO - PARTE XII

 




O empregado trouxe os pratos e Quim esperou que se afastasse para continuar.
- Portugueses bem-sucedidos como o meu tio, contam-se pelos dedos das mãos. E vieram para cá nos primeiros anos após o fim da guerra. A mão-de-obra para a reconstrução era escassa e pagava-se muito bem. Esses às vezes vêm matar saudades dos nossos pratos. Ainda assim muito raramente. 
Em contrapartida os franceses apreciam muito a nossa gastronomia. E graças a isso, o restaurante está sempre cheio.

- Nem sequer imaginava o que me contas. Apenas estranhei só ouvir falar em francês, quando pensava que seria um restaurante para os emigrantes portugueses. E nunca pedem comida francesa?

- Não. Restaurantes de comida francesa existem muitos  e bons. De comida tipicamente portuguesa em Paris, só este. Quem aqui vem, quer  experimentar uma comida diferente, degustar os nossos pratos, os nossos vinhos. Do mesmo modo que se vais a uma pizaria, vais para apreciar uma boa piza, não para pedires um cozido à portuguesa.

- O bacalhau estava delicioso,- disse Sofia poisando o talher. - Pensava que os franceses, não fossem grandes apreciadores de bacalhau.
- São-no, enquanto cozinhado por nós. Não é algo que eles utilizem na sua gastronomia. É claro que os franceses também pescam e comem bacalhau. Têm arrastões modernos que são fábricas-congeladores. Debaixo do convés, de cada barco, há uma fábrica de processamento, com máquinas automáticas de filetes, refeições de peixe, e um enorme conjunto de congeladores, onde se congela o bacalhau, cortado em postas e já embalado. Por isso o usam em pratos como outro qualquer peixe, fresco ou congelado.
  O bacalhau assim curado, seco e salgado, como o fazem os portugueses, que ainda pescam à linha, não. Por isso muitas vezes não o encontramos no mercado e temos que o importar diretamente de Portugal.

Esperou que o empregado retirasse os pratos e perguntou:
- Falas francês?
- Alguma coisa. Como sou filha única, meus pais mandaram-me estudar para Viseu. Fiz o quinto ano do Curso Comercial. E tu? Estudaste?
- Fiz um curso de hotelaria e restauração, enquanto aprendia na prática, aqui mesmo, na cozinha com o meu tio.


Este seria o post de amanhã, mas amanhã é dia 19 de Março. dia do Pai pelo que troquei os posts.


17.3.21

CASAMENTO POR PROCURAÇÃO - PARTE XI

 



O empregado aproximou-se com a lista. Sem a abrir, Quim fez o pedido e ela ia pedir o mesmo, quando ele disse:
- Dá uma olhada na lista e escolhe o que mais gostas. Não tens que comer o mesmo que eu, a menos que seja realmente aquilo que preferes.
-Mas pediste “Bacalhau à Brás”,  e eu gosto imenso desse prato - respondeu
- Então está bem. Só quero que saibas, que tens liberdade de escolha.  Divides comigo uma garrafa de vinho?
- Não estou habituada a beber.
- Curioso ! Se bem me lembro, quando vivia na aldeia, toda a gente bebia, incluindo as crianças, rapazes ou raparigas.
-Ainda hoje é assim. Mas nunca me habituei às bebidas alcoólicas e  os meus pais nunca me obrigaram a fazê-lo.

Feito o pedido, ele respondeu por fim à pergunta sobre seus tios.
- Voltando aos meus tios. Não, eles não têm filhos. Casaram-se já tarde, e a saúde da tia nunca foi muito boa. Sinceramente não sei, se os não tiveram por opção ou porque não os pudessem ter. O tio Joaquim é o irmão mais velho do meu pai, e é também o meu padrinho. Ele é o responsável por todos me chamarem Quim. 

-Quando vim para cá, cada vez que ouvia chamar por ele, eu acorria julgando que era comigo. Então para evitar confusões, começaram a chamar-me Quim. Cheguei aqui com quinze anos e eles cuidaram de mim como se fosse filho deles. Deram-me casa, uma profissão e o mais importante de tudo, amor. Tudo o que sou, devo-o a eles.

Enquanto ele falava, Sofia apercebeu-se que nas mesas em redor só se falava francês.  
- Pensava que o restaurante era frequentado por portugueses, mas parece que me enganei.
Quim sorriu.
- Se o restaurante fosse para portugueses, estaria como se diz em Portugal, "às moscas", embora estejamos perto de Champigny-sur-Marne,  o "bidonville" onde existe a maior concentração de portugueses. "Bidonville", é aquilo que no nosso país, chamam “bairro de lata”. Eles não têm água, nem luz, nem habitações decentes. Eles não têm nada, a não ser o sonho de uma vida melhor no futuro. Vieram para a França, para fugirem da guerra, do desemprego, do regime político, da miséria. Muitos deles são clandestinos, fizeram a pé mais de dois mil quilómetros, quase sempre de noite para fugirem às forças policiais.

- Talvez se observares as condições em que vivem, te perguntes. Mas haverá maior miséria do que esta? Eles sabem que sim. Há a miséria que não permite sonhos. Que não permite sequer a liberdade de expressar uma ideia.
Aqui têm trabalho. As crianças vão à escola e apesar de esta não ser mais do que uma barraca, eles aprendem.  E contam com o senhor  Louis Talamoni, (1)  Maire de Champigny-sur-Marne, que está a fazer tudo para lhes dar melhores condições de vida, que já mandou instalar alguns pontos de água, luz e esgotos. Que manda distribuir agasalhos no inverno. E que luta por eles, ouve-os e procura ajudá-los. 

-E eles sabem que podem falar livremente das suas vidas e das dificuldades que enfrentam, sem correrem o risco de ir presos. E que os seus filhos não vão acabar mortos numa guerra estúpida. O trabalho diário, o saber que vão ter todos os dias o pão na mesa, e o sonho de uma vida melhor, tornam a miséria atual, mais suportável. 
Acredito piamente que muitos dos que hoje vivem no "bidonville", serão gente de sucesso dentro de vinte, trinta anos. 



1) Quase cinquenta anos depois, emigrantes portugueses e luso descendentes unir-se-iam para mandar  erigir no local deste "bidonville" um monumento ao antigo  Maire Louis Talamoni, que tanto lutou para melhorar as suas condições de vida, naquele local




                                         Monumento a Louis Talamoni