Seguidores

30.9.17

A RODA DO DESTINO - PARTE VIII






Anete voltou-se, e encarou Salvador com um ar trocista.
- É uma nova tática de engate? – Perguntou mirando o homem que tinha na sua frente. Era alto, moreno de cabelos castanhos e olhos cor de âmbar, elegantemente vestido. Reparou que a sua tez morena empalidecia, enquanto o seu olhar frio, ganhava um brilho perigoso. Ela não se assustou. Não fora à toa, que passara a vida lutando para se impor aos dois irmãos.
-Não brinques, Ana Clara. Sei bem de onde vens. Vem comigo, precisamos ter uma conversa séria, não vamos tê-la aqui no meio da rua.
É claro que Anete não estava disposta a ir a lado nenhum por muito interessante que aquele desconhecido lhe parecesse.
- Caro senhor, não sei quem você é, nem quem é essa Ana Clara, se é que existe alguém com esse nome. Agora por favor deixe-me em paz.
 Voltou-se e desceu o primeiro degrau da escada que a conduziria ao metro. Mas logo a mão do homem se fechou sobre o seu braço, com tal força, que receou lhe esmagasse o osso.
Voltou a encarar o homem, e verificou que estava furioso. Havia um brilho de loucura nos seus olhos que a atemorizou. Seria um psicopata? Olhou à volta procurando um polícia, ou alguém que a pudesse ajudar, mas as pessoas passavam apressadas e nem davam por eles.
- Por favor, creio que o senhor me deve estar a confundir com alguém. Meu nome é Anete Sampaio, cheguei à cidade há menos de um mês e tenho a certeza que não o conheço. 
Salvador franziu o sobrolho. Que raio de conversa era aquela? Será que a sua cunhada sofria de dupla personalidade? Ela parecia não reconhecê-lo. E por muito desconfiado que a sua profissão o tivesse tornado, custava-lhe a crer, que Ana Clara conseguisse fingir com tanto realismo. Logo porém afastou aqueles pensamentos.
-Não me enganas, Ana Clara. Conheço-te demasiado bem para cair nesse teu jogo. Juro-te que se não me escutas, telefono ao meu irmão, para vir ter connosco,agora. E mostro-lhe o prédio onde a sua encantadora mulher se encontra com o seu amante. Tenho a certeza de que te tira os teus filhos e nunca mais os vês, - ameaçou.
Agora, Anete ficou muito preocupada. Será que havia na cidade uma mulher tão parecida com ela, capaz de confundir alguém que a devia conhecer muito bem? E se realmente havia, será que não ia destruir a sua vida, se não acabasse com aquela confusão? Decidida a acabar com aquela cena, disse:
- Vamos acabar de vez com esta confusão, senhor. Vamos até aquela pastelaria, e vou-lhe provar de uma vez por todas que não sou essa tal Ana Clara. 


ESTAVAM À ESPERA DISTO? AFINAL PARECE QUE  NÃO SÃO DUAS HISTÓRIAS.

29.9.17

A RODA DO DESTINO - PARTE VII



Tinham-se passado duas semanas, desde que Salvador presenciara aquela cena que o trazia atormentado. O julgamento fora difícil, Salvador nunca tinha tido tanto trabalho com uma defesa, e apesar disso sentiu-se completamente frustrado, quando o seu cliente foi inocentado, não porque a sua inocência tinha sido inequivocamente demonstrada, mas porque o Santiago não conseguiu demonstrar de forma inequívoca, os factos de que o acusava. A sentença de inocência por falta de provas, tinha sido uma derrota para qualquer dos dois advogados, apesar de na prática, o seu cliente ter sido inocentado.
Depois do julgamento, Salvador tivera que se ausentar, durante uma semana para dar assistência jurídica a uma firma que fazia parte dos seus clientes,e quando chegara, a pedido de Santiago Castro, Raquel tinha-lhe agendado um encontro com ele. 
Santiago tinha uma proposta para lhe fazer. Ele pretendia formar uma sociedade de advogados. Escolhera meia dúzia de bons nomes que se tinham tornado mais notados em determinados campos, e estava a sondá-los para ver a viabilidade do projeto. Ele, Salvador, por exemplo, como tinha várias empresas a que dava assessoria jurídica podia ficar com essa área. Salvador, sempre trabalhara isolado, mas a proposta era muito interessante, os nomes escolhidos eram de excelentes profissionais, e ele pedira um tempo para a estudar com calma. Santiago dera-lhe um prazo até ao fim do mês. Logo que tivesse todas as respostas, marcaria uma reunião para tratar de todas as coisas inerentes à formação da Sociedade, como os estatutos da mesma, a localização dos escritórios, e tudo o mais necessário, a fim de iniciarem o novo ano, já estabelecidos. 
    Por tudo isto, só agora, duas semanas depois, daquela malfadada tarde, e porque não tinha nenhum julgamento agendado para os dias mais próximos, podia dispor de algum tempo para resolver o caso pessoal que envolvia a sua família. Tinha decidido ter uma conversa séria com a cunhada, e se ela se mostrasse arrependida e disposta a deixar o amante, não contaria nada ao irmão. Dizia a si mesmo que essa era a melhor solução por causa dos sobrinhos. Mas não queria falar com a cunhada em casa, onde podiam ser ouvidos pela empregada, ou pelas crianças. Também era impensável procurá-la na escola no seu horário laboral.
Depois de dar voltas e mais voltas à cabeça, decidiu-se. Conhecia o ninho de amor dos dois pombinhos, e embora não soubesse o andar exato onde o homem vivia, podia montar guarda ao número setenta e sete, na certeza que mais tarde ou mais cedo, iria apanhar a cunhada.
Tomada a decisão, avisou Raquel de que se ia ausentar e que não lhe agendasse nada até nova ordem.
No dia seguinte, pelas dez da manhã, estacionou o carro junto ao passeio, entrou na pastelaria do prédio ao lado e sentou-se numa mesa junto à montra, de onde via perfeitamente a porta do setenta e sete, disposto a passar ali o dia se tal fosse preciso. Se não fosse nesse dia, viria no dia seguinte, e no outro. Um dia ela voltaria.
Pediu um café e um pastel de nata, abriu o jornal que comprara à saída de casa, e dispôs-se a esperar.  
Mais de uma hora depois, viu a porta do prédio abrir-se e soltou uma imprecação ao ver que a cunhada saía do prédio sozinha e começava a andar rua abaixo. Tinha estado tão concentrado em vê-la chegar, e afinal ela estivera lá dentro aquele tempo todo. Rápido, largou o dinheiro da conta, em cima da mesa e saiu quase correndo, alcançando-a já mesmo à entrada do metro.
A sua mão caiu como garra no ombro dela.
-Não deste aulas hoje, Ana Clara?


E AGORA VOLTAMOS AO SALVADOR? SERÁ QUE ISTO É COMO NO SUPER? VÃO LER DUAS HISTÓRIAS EM VEZ DE UMA?


                                                

28.9.17

A RODA DO DESTINO - PARTE VI


Quando regressaram da lua-de-mel, ambos estavam cientes de que tinham cometido o maior erro das suas vidas, e que o melhor que podiam fazer, seria divorciarem-se. Sentaram-se e discutiram a decisão, sem ódio nem rancores. Sabiam que a única solução para eles era o divórcio. Porém também sabiam que não podiam tomar uma decisão dessas, à chegada da lua-de-mel. Ia ser um choque enorme para as duas famílias. Iam virar, a anedota da terra, e já que a asneira tinha sido deles, decidiram de comum acordo, esperar uns seis meses. Entretanto eles continuariam a ser o que sempre foram. Amigos, quase irmãos. Porém quando passados os seis meses iam contar às respetivas  famílias e avançar com o divórcio, o seu sogro fora diagnosticado com um cancro no cérebro, e de comum acordo, decidiram que o divórcio teria que ser adiado. A situação emocional dos sogros, não aguentaria semelhante dor. Além disso o marido precisava do seu apoio. Os três meses que mediaram entre o diagnóstico e a morte do sogro, pareceram anos, tão grande foi o desgaste físico e emocional, das idas diárias ao hospital, do observar o sofrimento do sogro, sem poder fazer nada para o aliviar, de ver o sofrimento da esposa, sua companheira de vida durante trinta e cinco anos. Sem falar em Afonso, para quem o pai sempre foi o herói em quem ele próprio, gostaria de se transformar um dia. Depois da morte do sogro, a instabilidade emocional, e o desgosto da sogra, deixaram-na depressiva, e mais uma vez, os dois adiaram o divórcio. 
Foram precisos mais de dois anos, após a morte do sogro, para que Anete e o marido, tivessem decidido, que era hora de tratar do divórcio. Ambos estavam a deixar passar a juventude vivendo uma mentira, e quem sabe, entretanto deixavam passar a oportunidade de conhecerem o amor das suas vidas.  
Mas ainda foi preciso convencerem as famílias, de que a decisão era irrevogável e não havia tentativa milagrosa que pudesse evitar um divórcio (que ninguém entendia), para evitar as tentativas frustradas de fazê-los mudar de ideia. O casamento fora um erro, do qual os dois eram culpados e estavam igualmente decididos a dissolvê-lo.
Depois do divórcio, como Afonso tinha a sua empresa na cidade, e precisava ficar perto da mãe, ela decidiu ir viver para a capital. Alguma coisa lhe dizia que lá estava o verdadeiro rumo da sua vida.
Conseguira, alugar um pequeno apartamento num ponto periférico da cidade, mas muito bem situado em relação aos transportes, pois tinha uma paragem de autocarros a cinquenta metros, e o metro a menos de cem. O que era o ideal, uma vez que o seu carro, ficara na garagem dos pais. Mais tarde iria buscá-lo, quando perdesse o medo à cidade grande.
Sorriu ao lembrar da cara do seu irmão Luís, quando dois dias atrás a visitara, e ela se atrevera enfim a contar-lhe a razão por que se divorciara. Contudo o seu assombro seria bem maior, se soubesse que em mais de três anos de casamento, ele nunca fora consumado.

ESTA DEVE SER A ALTURA EM QUE VOCÊS ESTÃO A PENSAR, QUE NÃO DIZ A BOTA COM A PERDIGOTA.  SERÁ QUE ME PERDI?

A RODA DO DESTINO - PARTE V


- Não te preocupes, mãe, eu estou bem. O Luís, não te disse? Ele esteve aqui há dois dias. Vinha muito preocupado, mas verificou que não há razão para isso. O meu casamento já tinha terminado há muito. O que aconteceu agora foi apenas a oficialização do divórcio.
- Não acredito que estejas tão bem como queres que eu acredite. Um divórcio machuca sempre, minha filha.
- Não o meu, mãe. O meu casamento foi um erro. Sabes que eu e o Afonso fomos amigos desde criança. Grandes e bons amigos. O problema foi que ao entrar na idade adulta confundimos sentimentos. Julgámos que o amor que nos unia, era o que devia existir entre um casal. E não era. Na nossa união não havia paixão nem desejo. E quando tentámos forçar as coisas, ficou horrível. Era quase como se quiséssemos ter uma relação incestuosa. Nunca poderíamos ser amantes, porque o amor que nos unia, era igual ao que me une aos meus irmãos.
- Custa-me a crer, como não deram por isso antes do casamento.                    
 -Teríamos dado, se tivéssemos tentado ir para a cama antes do casamento. Mas não aconteceu, precisamente porque não havia entre nós desejo de que isso acontecesse. Não te preocupes. Já arranjei casa, estou à procura de emprego, e tenho a certeza de que em algum recanto desta cidade, existirá um homem que me fará feliz. E acredito que acontecerá o mesmo com o Afonso. É um excelente homem, merece ser feliz. O Luís não te disse que tinha estado comigo?
- Não. O teu irmão não me disse nada. Não sei se disse ao Ricardo, a Teresa disse-me ontem, que o marido tinha estado ao telefone com o irmão, mas não me disse mais nada. Os meninos estão sempre a perguntar por ti.
- Eu também tenho muitas saudades de todos. Do meu irmão, da minha cunhada, dos meus sobrinhos, de ti e do pai. Mas deves compreender que quero dar uma volta à minha vida. Ainda estou à espera que me venham entregar o resto da mobília. E preciso dedicar-me à procura de emprego. Quando tudo estiver organizado, vou passar aí passar um fim-de-semana convosco. Agora desculpa, mas vou fazer o meu jantar. Adeus mãe, dá um abraço ao pai.
- Tem cuidado contigo filha. Amamos-te muito.
-Também vos amo, mãe. Beijo grande.
A jovem desligou o telefone e dirigiu-se à cozinha. Mexeu dois ovos com fiambre, fez uma salada, juntou-lhe um pouco de queijo fresco. Sentou-se à mesa, e partilhou a refeição com as lembranças que a acompanhavam.
Anete era a mais nova dos três irmãos, e a única menina da família Sampaio. Daí que desde sempre foi tratada como uma pequena princesa.
Ricardo e Luís, os irmãos, e Afonso o vizinho, revezavam-se entre si para a acompanharem e a protegerem. Na rua, na escola, e mais tarde já adultos, nas saídas. Não conviveu com outros rapazes, e quando a sua mãe, e a vizinha começaram a falar em casamento, juntando-a com Afonso, a ela pareceu-lhe natural. Conversou com o jovem, e ele também achou natural. E assim quase sem se aperceberem estavam noivos, e dois anos volvidos, casaram com a bênção do padre e das duas famílias. O pior aconteceu, quando tiveram o seu momento de intimidade na lua-de-mel. Em vez de uma noite de amor, própria de recém-casados, o que aconteceu foi uma situação confrangedora, que fez com que o resto da viagem fosse um pesadelo.


QUE RAIO DE CAPÍTULO É ESTE? QUEREM VER QUE A AUTORA SE ENGANOU NA HISTÓRIA? 


27.9.17

A RODA DO DESTINO - PARTE IV




Ele podia e tinha perdoado a traição de Ana Clara, quando o “trocou” pelo irmão. Afinal ninguém escolhe por quem se apaixona, e não havia qualquer compromisso entre eles, que não fosse apenas atribuído a uma saudável amizade. Queria até acreditar que ela nem sequer se tivesse apercebido dos seus sentimentos. Mas a recém-descoberta traição dela, matara tudo de bom que havia no seu coração. Ela não traíra apenas o marido. Traíra-o também a ele, às suas emoções, os seus sonhos, à sua fé nas mulheres. O seu coração estava cheio de raiva, e o seu maior desejo era ir a casa do irmão e contar-lhe tudo. Impediam-no a lembrança dos sobrinhos, duas inocentes crianças, que não tinham culpa dos erros da mãe, mas que ele sabia seriam os primeiros a sofrer as consequências. O irmão, iria sofrer sem dúvida, mas era jovem, bonito, e dono de uma inegável simpatia. Logo encontraria alguém disposto a fazê-lo esquecer a má experiência. O mesmo não aconteceria com os miúdos.
Tinha que se concentrar neles. Arranjar uma solução que lhes evitasse todo e qualquer sofrimento.                   
Indeciso, sem saber muito bem, o que fazer com a “bomba” que tinha nas mãos, desejando e receando ser ele a detoná-la, com um importante julgamento agendado para aqueles dias, Salvador não conseguia concentrar-se no processo.
Continuava de pé, junto da janela, olhando sem ver a rua, onde aquela hora o movimento tinha decrescido bastante.
Olhou para o bonito e caro relógio de pulso. Eram vinte e trinta. Franziu o sobrolho. Como é que o tempo passara tão depressa? Afinal, ficara até mais tarde para quê? Não fizera nada depois que o horário de expediente acabara. E duvidava que conseguisse fazer.                                           
Era imperioso que tomasse uma decisão. Não podia continuar a atormentar-se daquela maneira. Era sua obrigação contar ao irmão o que se passava. Mas pensando melhor, e especialmente por causa dos sobrinhos, decidiu não o fazer. Pelo menos por agora. Depois do julgamento, procuraria Ana Clara, e teria uma conversa séria com ela. Faria com que jurasse nunca mais ver aquele sujeito. E talvez assim, conseguisse não só salvar o casamento do irmão, como impedir que as crianças viessem a ter uma infância triste, sem a companhia e o apoio dos pais.  Porque ele conhecia bem o irmão. Tinha a certeza de que ele partiria para um divórcio litigioso e tentaria evitar todo o contacto dos filhos com a mãe. E ele sabia melhor que ninguém como certos casais se serviam dos filhos, como armas de arremesso para se ferirem um ao  outro, sem pensarem no mal que estavam fazendo às crianças. Na sua profissão já se deparara com vários casos. Tomada que foi a decisão, o seu corpo relaxou. Endireitou os ombros, suavizaram-se-lhe os músculos faciais, a concentração voltou. Porém eram quase nove horas da noite, o seu estômago revoltava-se, irritado com a falta do almoço, e os inúmeros cafés.
Decidido guardou o processo, apagou a luz e saiu do escritório apagando a luz.   



E se fosse convosco, que decisão tomariam? Fariam de conta que não tinham visto nada? Contariam ao marido a traição? Ou fariam como Salvador?


E A LISTA DE NOMES SUGERIDOS AUMENTOU

O filho Pródigo
A lei e a vida
O tribuno
A força da Lei
Disputa de irmãos
Amor e direito
Duelo entre amigos
Duelo das feras
A balança da lei
Defesa transcendente
Prova  da inocência
A verdade vencerá
Sucesso, meu irmão
Aliança
Tenacidade e coragem
Audácia
Deus escreve direito por linhas tortas
Julgamento decisivo
A carreira não é tudo.
A sentença
Nos caminhos da lei
Encruzilhada
Entre o amor e o rigor
O processo.
Culpado ou inocente
A justiça dos homens, 
Fez-se justiça, 
Amor no tribunal
Para lá do que os olhos vêem 
Destino Traçado.
A escolha
Traição




                                                

A RODA DO DESTINO - PARTE III





Pousou a chávena no momento em que sentiu a porta exterior da receção ser fechada por Raquel.
Voltou a olhar pela janela. Lá fora, a azáfama era grande. A fila de pessoas na paragem em frente, era enorme, pese os autocarros que iam chegando e partindo. Depois de um dia de trabalho, toda a gente se apressava para regressar a casa. Ficou pensando, se aquelas pessoas que na fila em frente,  se atropelavam para ganhar um lugar no autocarro, teriam tanta pressa de regressarem, se em casa não houvesse ninguém à sua espera.
Ele, nunca tinha pressa de regressar ao seu apartamento, que cada dia lhe parecia mais frio e solitário. Aquela hora, decerto que o irmão já estaria em casa, junto de Ana Clara e dos seus dois filhos.
Durante os cinco anos que se passaram desde que o irmão se casara, Salvador tentara manter-se o mais à margem possível da casa do irmão. Visitara o casal quando do nascimento dos sobrinhos, e pelas festas em que não se pôde escusar, como no aniversário das crianças ou no Natal. Apesar de tudo, adorava os sobrinhos e desejava a felicidade do casal.  Claro que de vez em quando visitava o irmão. Ou era visitado por ele. Nos seus respetivos escritórios.
Talvez, porque no seu coração tivesse apagado qualquer ressentimento contra o irmão, e o seu desejo de os ver felizes fosse sincero, ele se encontrava naquele dilema, que o desesperava.
O que o preocupava daquela maneira, acontecera quando na véspera se dirigia do tribunal para o seu escritório. O trânsito era intenso e o carro rodava lentamente, e não raras vezes parava, quando a sua atenção se  fixou num casal que seguia pelo passeio, junto à estrada. Mesmo de costas, aquela figura, era inconfundível para o homem que a trouxera no coração, durante tanto tempo. Tratava-se da sua cunhada Ana Clara, mas o homem que lhe enlaçava os ombros, não era o seu irmão.
O carro rodou mais um pouco e parou no sinal vermelho. Salvador apertou o volante com tanta força que os nós dos dedos, ficaram brancos, quando o casal se dirigiu ao número setenta e sete. Ele encostou a mão à porta, e ela abriu-se, provando que estava só encostada. 
Afastando-se para que ela entrasse primeiro, o homem disse qualquer coisa.  Ana Clara riu-se e voltou-se para a estrada, como se estivesse observando o que ele lhe dissera, e depois entrou seguida do homem. Salvador ficou ali parado, o rosto pálido, as mãos a tremer, sem reparar que o sinal abrira e que os condutores atrás de si buzinavam desesperados.
Só “acordou” quando o condutor atrás de si saiu do carro e lhe bateu no vidro. Arrancou no momento exato em que o sinal voltou a ficar vermelho.
Nem soube como chegou ao escritório, sem sofrer nenhum acidente. Fechou-se no seu gabinete e ligou à cunhada. Atendeu ao quinto toque. Com a mesma simpatia de sempre, desculpou-se. A empregada fora fazer umas compras e ela estava a dar o lanche aos filhos. Ele inventou uma desculpa e desligou. Afundou-se no cadeirão e escondeu o rosto entre as mãos.
Sentia-se  esmagado, como se um trator lhe tivesse passado por cima. Como era possível tanta hipocrisia?


BOLAS! PARECE QUE O SALVADOR TEM RAZÃO PARA ESTAR DESCONCENTRADO. 

E A LISTA DE NOMES SUGERIDOS AUMENTOU

O filho Pródigo
A lei e a vida
O tribuno
A força da Lei
Disputa de irmãos
Amor e direito
Duelo entre amigos
A balança da lei
Defesa transcendente
Prova  da inocência
A verdade vencerá
Sucesso, meu irmão
Aliança
Tenacidade e coragem
Audácia
Deus escreve direito por linhas tortas
Julgamento decisivo
A carreira não é tudo.
A sentença
Nos caminhos da lei
Encruzilhada
Entre o amor e o rigor
O processo.







26.9.17

A RODA DO DESTINO - PARTE II







Salvador Rodrigues era um homem alto, de porte atlético. Cabelos castanhos e olhos castanho âmbar,  de expressão séria e profunda. Testa alta, nariz retilíneo, queixo firme e boca bem desenhada. Era sem dúvida um belo exemplar masculino. Porém ele parecia não dar-se conta dos suspiros femininos, nem dos olhares lânguidos com que as mulheres o brindavam, onde quer que ele fosse.
Dir-se-ia que vivia apenas para a sua carreira, e que era imune às setas do Cupido. Porém nem sempre foi assim.
Cinco anos atrás, tinha conhecido uma jovem extraordinária, por quem se apaixonara. Durante três meses, saíram praticamente todos os dias, passearam pela cidade, foram jantar juntos, dançar.
Chegou até a levá-la a sua casa, para lhe apresentar o pai e o irmão.
Com ela, o sempre sisudo Salvador, aprendera a rir, e os seus olhos que no tribunal, quando enfrentavam os seus opositores, pareciam os de um tigre, prestes a atacar, ganharam uma expressão de ternura que só ela conhecia.
Salvador estava cada dia mais encantado e supôs que a jovem partilhava o mesmo sentimento, mas para ela, ele não passava de um amigo, um quase irmão, por quem sentia um verdadeiro carinho, que nada tinha de amor, nem de desejo de partilhar outra coisa que não fosse uma sã amizade.
Salvador não se deu conta disso. Precisamente quando se convenceu que Ana Clara era a mulher da sua vida, dirigiu-se a sua casa para lhe confessar os seus sentimentos. Ficou lívido quando o seu irmão lhe abriu a porta em tronco nu. Disfarçou o melhor que pôde e soube, fazê-lo com tal perfeição que acabou no altar como padrinho do homem que lhe roubou a mulher amada. Desde então nenhuma outra mulher, trouxe alegria ao seu olhar. Não que levasse vida de santo. Saía com mulheres, é verdade, aproveitava o que elas estavam dispostas a dar-lhe, mas jamais encontrou alguma com quem lhe apetecesse sair uma segunda vez, muito menos que o levasse a desejar  mudar o seu estado civil.
A sua carreira como advogado, acumulava sucessos, amealhara um bom pecúlio, e não fora um certo cansaço que por vezes o acometia, dir-se-ia que na sua solidão, Salvador era um homem feliz.
Acabou de comer e premiu o botão da campainha que o ligava à secretária.
-Raquel, trazes-me agora um café por favor?
-Levo já, chefe.
Voltou a aproximar-se da janela. Lá fora anoitecia. O trânsito era intenso, as luzes começavam a aparecer. Na rua, nas janelas. Uma gaivota passou grasnando, num voo rápido junto à janela. O dia chegava ao fim.
Raquel entrou com o café.
-Aqui tens. Vais ficar a fazer serão, com esse processo?
-Vou. Antes de sair telefona ao Ferrer. Diz-lhe para estar aqui amanhã às onze horas. Temos que preparar o julgamento. Santiago é um osso duro de roer, não quero que nada dê errado, neste julgamento.
-Fica descansado. Vou fazê-lo antes de sair. E se não precisas mais nada, até amanhã.
-Até amanhã Raquel.




CONTINUO A AGUARDAR AS VOSSAS SUGESTÕES PARA O TITULO. COMPREENDO QUE COM TÃO POUCO DA HISTÓRIA SEJA DIFÍCIL.. SE EU QUE A ESCREVI ESTOU A VER NAVIOS.


TÍTULOS SUGERIDOS ATÉ AGORA.

O filho Pródigo
A lei e a vida
O tribuno
A força da Lei
Disputa de irmãos
Amor e direito
Duelo entre amigos
A balança da lei
Defesa transcendente
Prova  da inocência
A verdade vencerá
Sucesso, meu irmão
Aliança





25.9.17

A RODA DO DESTINO - PARTE I




Afastou a cadeira e levantou-se. Estava cansado. Há horas que lia e relia aquele processo e não conseguia concentrar-se. Foi até à janela. Pensativo passou a mão pela testa. Tinha que se concentrar. O julgamento era dentro de três dias e o seu opositor era um advogado de renome. Santiago Castro, um dos nomes mais fortes da história atual, na advocacia, um homem frio que nunca perdia um caso.
Salvador Rodrigues, estava no mesmo barco. Também nunca tinha perdido um caso, mas os dois nunca se tinham enfrentado, até aquela data. Ia ser o julgamento do ano, já que um deles seria derrotado pela primeira vez, e os dois temiam-se por igual.
Salvador no entanto sabia que não era o julgamento que o deixara naquele estado. O problema era pessoal, e isso é que o estava a impedir de se concentrar na defesa do seu cliente, em cuja inocência ele acreditava piamente.
Não se perdoaria se por erro seu, o cliente, fosse condenado. Ouviram-se umas pancadas na porta e de seguida uma mulher entrou na sala.
- Vou ao café. Queres que te traga algo para comeres? Há horas que estás aqui fechado, nem sequer foste almoçar.
Raquel a sua secretária, era uma mulher de baixa estatura, corpo roliço e rosto simpático. Rondava os cinquenta anos, e conhecia Salvador desde menino. Estava no escritório, há quase trinta anos. Fora secretária do seu pai, e continuara no escritório, quando ele se reformara e passara para o filho mais novo o escritório e a sua carteira de clientes. Raúl o mais velho dos dois irmãos não quis saber da advocacia. Aliás ele não quis saber da Universidade. Largou os estudos mal terminou o Secundário. Sempre se interessou pelo desporto e se bem que nunca pensou ser profissional, nem competiu em nenhuma modalidade, na hora em que recebeu a parte da herança da mãe, abriu um estabelecimento de artigos desportivos, em Cascais e as coisas estavam a correr tão bem que em breve pensava abrir uma filial, numa cidade no Algarve, estando ainda a pesquisar o melhor local para ela.
-Obrigada, Raquel. Não me apetece comer. Se puderes trazer-me um café, antes de ires…
-Não. Só se comeres alguma coisa antes. Já te trouxe seis cafés, desde que chegaste. Queres sofrer uma “overdose” de cafeína? Não acredito que esteja assim tão difícil essa defesa.
- Não. Eu é que estou com os níveis de concentração muito em baixo. Vai lá então e traz-me uma sandes de presunto e uma água mineral.
 - Ok. Não me demoro. Vou passar a ligação telefónica para o teu gabinete enquanto me ausento.
Saiu deixando-o só. Cinco minutos depois, estava de volta. O que não admirava já que o café se situava no piso inferior do mesmo edifício do escritório.


NOTA. ACABOU-SE A INSPIRAÇÃO PARA O TITULO DESTE CONTO. ASSIM IRÁ SER PUBLICADO COM SEM TITULO. PEÇO A VOSSA COLABORAÇÃO. QUEM ME VAI AJUDAR A ENCONTRAR-LHE UM TITULO?
AGUARDO AS VOSSAS SUGESTÕES

24.9.17

PORQUE HOJE É DOMINGO




O meu olhar é… mágico


O meu olhar é mágico. 
Ele é o portal de entrada na vida que me rodeia.
É a borboleta que dança inebriada
Sobre um canteiro florido.
Ele é a alegria esfuziante da criança,
Que brinca
Sob o atento olhar da mãe, que sonha
Para ela um futuro radioso.
Ele é o Amor latente nos jovens
Que trocam beijos num banco de jardim.
O meu olhar é mágico
Ele é a lágrima escondida na solidão dos idosos
A quem o desemprego levou
Os filhos na mala da emigração.
É a dor sem tamanho daquela mãe
A quem um acidente brutal roubou
A luz dos seus olhos.
Ele é o mar que no horizonte
Se funde no espaço celeste.
Ele é a nuvem que passa
O vento que verga as árvores
E o sol que a todos afaga.
O meu olhar é mágico
Porque ele é o portal das emoções
Que compõem a Sinfonia da Vida.

Maria Elvira Carvalho.


in  Antologia de Poesia Contemporânea, Entre o sono e o sonho vol V tomo II Pag. 253
Chiado Editora






23.9.17

A LENDA DE SANTO ANTÓNIO DA CHARNECA

Tal como informei no post anterior, dou seguimento ao desafio
foto da Igreja de Santo António da Chaneca


jardim com a imagem do Santo como terá sido visto pelo escravo


Lenda do Santo António da Charneca 
Havia no Alentejo um rico proprietário que tinha feito a sua fortuna nas Índias, de onde trouxe uma filha e um escravo. D. Aires de Saldanha tinha um feitio difícil e ideias fixas: obrigava o seu escravo Macumba a ir todos os dias recolher lenha por serras distantes e guardava bem fechada no seu solar a sua bela filha Ana. A partir de um certo momento, o escravo Macumba passou a cruzar-se com um frade franciscano que provocava uma estranha perturbação nos bois que puxavam o carro de lenha: os bois tremiam e curvavam-se diante do frade em obediência ritual. A princípio o escravo irritou-se mas quando descobriu que se tratava de Santo António tremeu de emoção e julgou-se indigno da sua presença. Macumba deveria transmitir ao patrão o desejo de Santo António de ver construída uma capelinha e de dizer à jovem Ana que esta sofria porque não tinha fé suficiente. Quando Macumba contou a Ana o sucedido esta não acreditou nele e impediu-o de falar com o seu pai. Então, Santo António falou com Ana e transmitiu-lhe o seu desejo e também que ela realizaria em breve o seu sonho de se casar. No dia seguinte, e segundo as instruções de Santo António, os bois foram largados e no lugar onde pararam e começaram a escavar a terra surgiram cal e areia. A população construiu nesse mesmo lugar a capelinha mais bonita de toda a região. Ana casou-se com um mensageiro que na semana seguinte chegou ao solar e Macumba, agora homem livre, dedicou-se para sempre ao culto do seu santo protector.


Fonte

 Fonte: http://lendasdeportugal.no.sapo.pt/distritos/setubal.htm 


E uma vez que Lagos  é a cidade do mais-que-tudo e também minha por adoção, aqui vai uma lenda da zona






A Fonte Coberta
Em um sítio chamado a Fonte Coberta, nas proximidades de Lagos, existe encantado um mouro ou uma moura. Em certa ocasião foi uma pobre mulher buscar água à fonte, e ao afastar-se viu duas esteiras com belos figos secos a enxugar ao sol.
No Algarve há por assim dizer duas diversas exposições de figos:
uma por ocasião de seca geral, e é quando o figo, apanhado já muito maduro, pincre, lhe chamam os algarvios, é conservado ao sol até secar de todo, e capaz de entrar nas tulhas de cana ou gamão, onde é acalcado e conservado; a outra, para consumo da família, sendo previamente lavado e posto ao sol a enxugar.
Não pôde a pobre mulher resistir ao desejo de lançar mão a alguns figos e apanhou cinco. A certa distância reparou que era seguida de uma criancinha a chorar, chamando pela mãe.
Perguntou a mulher à criança por que razão chorava, a criança porém em vez de dar qualquer resposta chorava cada vez mais.
Comoveu-se ela, e na suposição de que a criança tinha fome, meteu a mão nos bolsos e tirou dois figos para lhe dar. Qual não foi o seu espanto quando em lugar do figos se encontrou com cinco peças de ouro!… Nesse mesmo momento a criança desapareceu, aparecendo em seu lugar um homem trigueiro, vestido ao modo dos maltezes, de barrete vermelho e com um varapau na mão.
Atemorizou-se a mulher do súbito aparecimento do homem; este, porém, respondeu-lhe:
— Bruta, que não soubeste aproveitar-te dos figos, podendo apanhar os que quisesses!
E ao mesmo tempo que disse estas palavras também desapareceu.
Em outra ocasião passou junto da mesma fonte uma tendeira, chamada Mariana, e viu próximo uma criancinha de barrete encarnado. A tendeira ficou naturalmente surpreendida e atemorizada, porque já a esse tempo ouvira dizer que ali apareciam mouros encantados.
A criancinha, porém, sem fazer reparo na surpresa da tendeira, aproximou-se-lhe e disse:
— Dou-te uma boa porção de feijões, se me prometeres não os distribuires por outras pessoas.
E ao mesmo tempo mostrou-lhe uma boa porção de feijão branco.
A mulher prometeu à criança cumprir a condição e encheu uma alcofa do referido legume.
Mais adiante encontrou ela um homem e pediu-lhe com muitas instâncias que lhe desse os feijões, que levava consigo. Respondeu-lhe a mulher que lhos não podia dar, pois os recebera com a condição de os não distribuir por ninguém. Impôs-se-lhe o homem dizendo que a criança era seu filho, e que este lhe oferecera os feijões sem a sua autorização. A mulher abriu a alcofa e ficou admirada de encontrar os feijões substituídos por belos pintos antigos de prata.
O homem disse-lhe:
— Não te aconselharam a que não desses a ninguém os feijões?…
Quando a mulher ia a dar a resposta, já não viu o homem: tinha desaparecido como o fumo.
Estes dois casos e muitos outros andam na memória de toda a gente que reside próximo da fonte. Os velhos contam-nos por os ter ouvido contar aos seus avós, e estes aos seus avoengos. Como em muitas outras lendas de mouras encantadas, desconhece-se a razão por que ali se encontram encantados os tristes mouros.
Estes contos são sempre ouvidos com o profundo respeito de quem assiste à narração de um milagre autêntico.
OLIVEIRA, Francisco Xavier d’Ataíde As Mouras Encantadas e os Encantamentos do Algarve Loulé, Notícias de Loulé, 1996 [1898] , p.245-246

Nota: Se algum dos que me acompanham, conhecerem alguma lenda e a quiserem contar nos seus espaços por favor digam nos comentários neste link, para que todos possamos acompanhar

22.9.17

AVISO À NAVEGAÇÃO



Terminada que foi mais uma história, (a última das três escrita antes das férias) e resolvido o problema do pc avariado, publicarei a partir de segunda  dia 25 uma nova história. Ando às voltas com o titulo, se até lá não me ocorrer nada, publico-a assim mesmo e peço a vossa ajuda para o titulo. Até lá, informo que amanhã, sábado, publicarei uma lenda, dando continuidade a um desafio que corre na net, iniciado pela CATARINA e pela PAPOILA, e que já conta com a participação de vários blogues. No "LEGENDEIRO DA AFRODITE" poderão ver quem já participou e se estiverem interessados em participar, deixem a indicação nos comentários para que possamos todos acompanhar.
Uma vez mais agradeço o carinho e paciência com que acompanham as minhas histórias. 
Um bem haja para todos vós.

21.9.17

À MÉDIA LUZ - PARTE XX




- Mas isso é uma ótima noticia. – Soltou-a. - Vem, vamos para a sala, quero que me contes tudo. Senta-te aqui ao meu lado,- disse afundando-se no sofá.
- O café!
- Quem quer saber de café agora? – Estendeu-lhe a mão num convite mudo.
Ela sentou-se a seu lado e ele passou-lhe o braço pelos ombros puxando-a para si.
- Conta-me tudo. Não, deixa-me adivinhar, o Pedro descobriu que foi mesmo o Fernando?
Ela relatou-lhe a conversa tida com o inspetor nessa tarde.
- Tenho pena do António. Não merecia este desgosto. Aquele sobrinho é a única família que lhe resta. Amanhã mesmo vou pedir ao nosso advogado que tome conta do caso, e tenho a certeza de que não demorará muito, terás o teu pai em casa. E mais tarde, quando se recuperar, faço questão de o readmitir.
Levantou-lhe o queixo, procurando o seu olhar.
- E então não haverá nada mais que impeça a nossa união. Quero que saibas, que até que te conheci, nunca acreditei no amor tal como o descrevem os apaixonados. O amor para mim era uma utopia, uma miragem, o que me interessava mesmo era o sexo. Todos os meus amigos, sabiam que eu era assim, e nenhum deles acreditaria ainda que lhes jurasse, que há meses venho a tua casa apenas para estar contigo, sem nunca ir contigo para a cama. E no entanto aconteceu, não porque não te deseje, e Santo Deus, como te desejo, mas porque és diferente de todas as outras. E és diferente, porque te amo, porque desejo fazer parte da tua vida, até ao meu último suspiro. Entendes?
- Como não ia entender, se comungo do mesmo sonho?
Segurou o rosto dele entre as suas mãos, e pediu quase sem voz:
-Por favor Gabriel. Vai-te agora! Não consigo ser tua enquanto não vir meu pai reabilitado. Mesmo amando-te com todo o meu ser.



EPILOGO





Um mês depois, o juiz assinava a revogação da pena e ordenava a libertação de Joaquim Machado, bem como a prisão preventiva de Fernando Lourenço.
As marcas do tempo e da vergonha eram bem visíveis no rosto e no corpo do pai da jovem, que parecia ter envelhecido mais de dez anos naqueles quatro anos de cativeiro.
À sua espera tinha a filha, que lhe explicou como tinha chegado ao verdadeiro culpado, bem como o papel importante de Gabriel e do seu amigo inspetor em todo o processo.
Não foi difícil para o homem que ouvia, reparar no brilho dos olhos da filha cada vez que falava do seu chefe. Temeu por ela. Afinal eles eram pobres, viviam do seu salário, o empresário era um homem muito rico e com fama de mulherengo.  Mas o temor só durou até à noite quando Gabriel se apresentou em sua casa, para pedir a mão de Sandra com anel de noivado, e a informação de que queria casar o mais rápido possível.
Quando os jornais sensacionalistas, tiveram conhecimento do noivado, muita coisa se escreveu, chegando a dizerem que Gabriel se casava com a filha do homem que estivera injustamente preso, para evitar um processo de indemnização.
Eles não se importaram. Sabiam dos sentimentos que os uniam, e do longo percurso percorrido até aquele momento.
A noiva fez questão de uma cerimonia simples e intima, apenas para os familiares e padrinhos.
Ela não queria continuar a ver-se nas páginas dos jornais, nem a ler as mentiras com que a imprensa os brindava
Com a bênção paterna, casaram duas semanas depois.
Dias mais tarde, em plena lua-de-mel, na pista de dança do hotel, ele confessava-lhe que se apaixonara por ela, ao vê-la dançar o tango, e que desde aí, sonhava com o momento em que os dois o dançassem juntos.
E então como se os músicos tivessem ouvido as suas palavras, ouviram-se os primeiros acordes da música “À média luz”



Fim

Elvira Carvalho


19.9.17

À MÉDIA LUZ - PARTE XIX


Chegou nessa noite, e foi direto para casa dela. Estava morto de saudades. Fizera todos os possíveis para se esquecer dela, durante aqueles dias, procurara divertir-se com outras mulheres, mas nenhuma conseguiu romper a armadura com que aquele novo sentimento o vestira. Estava irremediavelmente apaixonado, por aquela mulher maravilhosa de corpo e alma. Uma mulher que por lealdade ao amor filial era capaz de tudo, até de se arriscar a ser presa. E ele queria essa capacidade de amar e de se dar para ele. Mais do que querer. Necessitava-o com toda a sua alma. Resistira. Claro que resistira, nunca pensara em casamento, nunca sentira aquela necessidade de ter, e de se dar a uma determinada pessoa. Nos seus relacionamentos anteriores, nunca esteve nada em jogo, que não fosse o sexo, quanto mais prazeroso melhor. Com ela foi diferente desde o primeiro momento, e não porque não lhe despertasse a libido. Santo Deus, nunca tinha tomado tantos duches gelados. Mas sempre soube, que no dia em que se deitasse com ela, não se contentaria com menos do que o resto da sua vida. E era disso que ele tinha medo. Disso que fugia. Aqueles dias de ausência, acabaram com toda a sua resistência. Estava ansioso por chegar, por apertá-las nos braços e beijá-la até se cansar. Até se cansar? Tinha a certeza de que nunca se cansaria. Apanhou um táxi no aeroporto, e deu a morada dela. Ansioso por a ver, tocou a campainha, uma, duas, três vezes.
Franqueou-lhe a passagem, surpresa com a mala que carregava. Ele entrou, largou a mala, e pegando-lhe num braço puxou-a para si e sem deixar de a fitar, beijou-a. Um leve toque na boca, como que um roçar de ave, que a fez suspirar e entreabrir os lábios, e logo ele a invadiu num beijo urgente e desesperado, que os deixou sem fôlego. Ela apertou o seu corpo contra o dele, numa entrega que o enlouqueceu. Finalmente afastou-a um pouco, sem deixar de a fitar, nem de a abraçar.
- Amo-te. Sabes isso não sabes? – Perguntou a voz enrouquecida pela paixão.
Confirmou com um gesto mudo, uma lágrima rolando pela face.
-Também me amas, mas…? – Perguntou preocupado com a sombra de tristeza, nos olhos dela.
-Não pode haver futuro para nós, enquanto o nome de meu pai, não for reabilitado. Não quero que os meus filhos saibam que o avô esteve preso, acusado de ter roubado a empresa do pai.
- Sandra, eu acredito na inocência dele. Mas não sei se conseguiremos prová-lo ao fim destes anos todos. Por favor, não condenes tu também o nosso amor.
- Talvez não seja tão difícil assim. O inspetor procurou-me hoje. Acredita que descobriu quem fez o desfalque, e pediu para arranjar um advogado e pô-lo em contacto com ele.