Enquanto esperava por ela depois de ter pago as suas compras, Nuno observava, o rosto delicado, os cabelos soltos, a figura esbelta. Não tinha dúvidas de que era uma mulher muito bonita. A jovem que ele amara, dera lugar a uma mulher em toda a sua plenitude. Era estranho que estivesse sozinha. Segundo o seu pai lhe dissera, ela estivera casada pouco mais de um ano. Seria que tinha amado tanto o marido, que não queria atraiçoar a sua memória? De qualquer modo isso não lhe interessava. Ele não a deixaria entrar na sua vida, não a deixaria saber do seu acidente, nem a deixaria saber que ele já não era um homem por inteiro.
Não, ele só queria vingar-se de toda a amargura que ela destilara na sua alma. Hoje era só o que lhe restava. Saborear a vingança.
Luísa acabou de meter as compras nos sacos, pagou e saiu.
- Não devias ter esperado. Estás a atrasar-te.
- Não tenho pressa. É sábado. Não tenho urgências este fim-de-semana. E não respondeste ao meu convite. Almoçamos juntos?
- Não posso mesmo.
- E jantar? Não me vais dizer que também não podes. Não estou a pedir nada de especial. Apenas um jantar de amigos.
-Está bem, - concedeu sem se atrever a olhá-lo.
- Há algum sítio da tua preferência?
- Não. Escolhe tu.
Tinham chegado junto do carro dela. Abriu o porta bagagens, e começou a arrumar os sacos de compras.
- Às oito vou buscar-te. Mas tens que me dizer onde moras.
- Na mesma casa que vivia naquela época. A casa de meus pais.
- Está bem. Lá estarei às oito. Até logo.
Fez-lhe uma leve carícia no rosto, e afastou-se em direção do seu carro.
Luísa, ficou uns segundos a vê-lo afastar-se, depois entrou no carro e manobrou para sair do estacionamento e seguir para casa. Estava perturbada com o encontro. Nuno fora o único homem que amara, e era também o único, desde a morte do marido, cuja aproximação não lhe provocava pavor.
Mesmo tendo passado catorze anos, e muitas horas de tratamento psicoterapêutico, ela ainda não se sentia muito confortável na presença do sexo oposto. Com Nuno as emoções que ela sentia, não tinham nada a ver com medo.
Continuava a ser um homem bonito e com uma presença marcante.
Estranho, era não ter casado, pois adorava crianças, e ela lembrava bem dos projetos que partilharam no passado. Uma casa com jardim, e espaço suficiente para criar três filhos.