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3.4.20

DIVIDA DE JOGO - PARTE XXIII

Epílogo

Giovanna, acabara de prender o véu nos cabelos de Eva, quando Isabella entrou para dizer que a limusina já tinha chegado. Eva  ainda não sabia onde ia ser o casamento. André fizera questão de manter o segredo para surpreendê-la, e ninguém na família quisera quebrar a ordem.
Nunca, nem nos seus sonhos mais românticos, ela sonhara viver, como vivera aqueles dez dias. Dois dias antes, chegara o resto da família, que viera de Itália, bem como toda a família portuguesa, que vivia em Braga. E todos sem exceção a acolheram com todo o carinho. Na última noite, André fora dormir no hotel, donde seguiria para a igreja, com a família. Com ela ficaram a futura cunhada Giovana e Isabela, a sobrinha mais velha, filha de Pietro, para a ajudarem a preparar-se para a cerimonia. Agora, seguiam a caminho do local onde o casamento se  realizaria.
Quando a limusina parou junto do portão do orfanato, e viu os portões abertos, guardados por dois seguranças, e o grupo de meninos, rigorosamente vestidos, segurando folhas de palmeira formando um arco para ela passar, a emoção foi tão grande que quase não conseguia andar.
O sogro aproximou-se e deu-lhe o braço para a conduzir à capela, em cujo altar André aguardava ansioso.
Para Eva tudo era um sonho. As meninas todas vestidas a rigor, (saberia mais tarde que tinha sido o noivo e os seus pais, que tinham oferecido as roupas às crianças do orfanato) aguardavam-na perto da capela, muito compenetradas do seu papel de damas de honor, a Irmã Maria interpretando Avé – Maria, de Schubert. André, no altar, de olhos brilhantes e sorriso rasgado, ladeado pelo irmão e cunhada, que iam ser os seus padrinhos, a capela engalanada, a Irmã Madalena no altar, acompanhada de um tio de André, que se seriam os  padrinhos dela. 
A cerimonia decorreu de forma muito emotiva. Quando o padre, os declarou marido e mulher e disse ao noivo que podia beijar a noiva, o beijo foi tão intenso, que todos os presentes aplaudiram. O copo-de-água, no refeitório do orfanato, totalmente engalanado, a alegria das crianças, tudo contribuiu para um dia excecional que ela não esqueceria nem que vivesse várias vidas. Por fim, a emocionada despedida da Irmã Madalena, que só voltaria a ver quando viessem de férias a Portugal e da sua nova família, que iria reencontrar na Toscana, quando voltassem da lua-de-mel, cujo destino ela ainda desconhecia, mas a julgar pelo que vivera até ao momento, seria a continuação de um belo sonho, disso não tinha dúvidas.



 Fim 

Elvira Carvalho

                                      INFORMANDO

Para quem me lê há pouco tempo, devo dizer que as minhas histórias quase todas partem de um assunto que não me agrada, e para o qual quero chamar a atenção, nesta por exemplo, o tema era os malefícios do jogo (lembro-me da minha avó contar uma história de um homem que perdeu a casa e a mulher numa mesa de jogo, nos anos trinta do século passado) e do branqueamento do dinheiro, de atividades ilícitas, através do jogo. À volta desses dois temas criei esta história. Noutras o tema foram a fome, a guerra e os mutilados por bombas em África, a guerra no Afeganistão, a traição entre casais, a inseminação através de esperma de um dador anónimo, a violência doméstica, e as suas consequências na vida adulta das crianças que a sofreram, os acidentes por alcoolismo, etc. 
 As exceções são a "Rosa", retrato de uma época entre 1945 e 1975, que tentei retratar o mais fiel possível, (assisti a muitas das situações lá descritas), bem como em "As Cores do Amor," uma história romanceada entre 1973/1975 onde se descreve o antes e depois do 25 de Abril e o despoletar da guerra em Luanda, que vivi nesse tempo. O "Casamento por Procuração", retrato de uma época entre 1960/1974  cheia destes casamentos, e onde se lembram as fugas de salto para França e as condições quase sub-humanas em que viviam os emigrantes portugueses nos Bidonville, e "Renascer," 1971/1974 todas elas parte da nossa história no século passado. 
Posto isto, resta-me acrescentar que desta vez exagerei no romantismo. Na verdade agi como a fada madrinha para Eva.
Afinal, dizem que quando a idade pesa mais do que nós, ( e eu já estou nessa fase) voltamos a ser crianças. E elas acreditam em fadas.
Agradeço a vossa compreensão.


A nova história tem apenas um capítulo pronto e eu não gosto de fazer publicações antes de entrar na reta final. Por isso e como alguns me pediram "À Média Luz", escrita na mesma época de Dívida de Jogo" será essa que entra para a semana.


18.9.19

VIDAS CRUZADAS - PARTE IX




Quando voltou, duas horas mais tarde, a tia Rosa já tinha chegado, com o seu inseparável Tomé, um gato que quase não se conseguia mexer, de tão gordo que estava. A mãe, já estava com o almoço pronto para pôr na mesa. Depois de beijar a tia, comentou:
- Gordinho o bichano, tia.
- Que queres, ficou assim depois de castrado. Já me tinham dito, mas o malandro não parava em casa antes da operação.
- Coitado...
 – Vamos almoçar que se faz tarde – interrompeu a mãe com a terrina da sopa na mão.
O almoço foi servido com as duas mulheres sempre tagarelando. Absorto nos seus pensamentos, Pedro isolou-se da conversa e foi com sobressalto que sentiu a mão da tia no seu braço, seguida da pergunta:
- Não me estás a ouvir, rapaz?
 – Desculpe tia, estava a pensar nas férias...
 – Então vê se me arranjas por lá namorada, que eu bem sei o desgosto que a minha irmã sente de nunca mais te resolveres a criar o teu ninho. Sabes que és um caso raro na nossa família? Nunca ninguém esteve solteiro até à tua idade.
- Ora tia, quando chegar a hora, eu penso nisso...
 – Quando chegar a hora? Mas rapaz estás quase com trinta anos.
 

Incomodado com o rumo da conversa, Pedro levantou-se dando o almoço por terminado.
- Vês o que fizeste, mulher? - A voz da mãe fez-se ouvir em tom de reprovação. - Por tua causa não comeu o suficiente.
- Ora essa! Mas eu não disse nada demais. Não me digas que o teu filho fez votos de castidade. Ora se ele não é padre...
 – Nada disso, minha mãe- apressou-se a dizer o jovem, para evitar a preocupação da mãe. - Não quis comer mais para não me dar o sono a conduzir. Pelo caminho paro em qualquer lado e como mais alguma coisa. Vou pôr as malas no carro. A distância é grande, e a mãe sabe que não gosto de velocidades.
E dizendo isto voltou costas às duas mulheres, que continuaram a conversar. Tratou de meter a bagagem no carro e voltou para se despedir. Abraçou primeiro a tia, fazendo-lhe recomendações em relação à mãe, e por fim abraçou esta, apertando-a com força junto ao peito.
- Que se passa, filho? Sinto-te estranho desde ontem. Parece que me escondes alguma coisa.
- Nada mãe, é que é a primeira vez que vou de férias sem a sua companhia – enquanto tentava tranquilizar a mãe, não pôde deixar de pensar que coração de mãe sempre adivinha o que lhe querem esconder.
Arrancou e sem olhar para trás ergueu a mão num adeus. Sabia que as duas mulheres iriam estar ali acenando até o carro desaparecer na curva da estrada.

16.4.19

UM HOMEM DIVIDIDO - PARTE XXVI




Ficámos muito ricos, voltamos a Portugal, criamos vários negócios e aumentámos em muito a nossa fortuna. Mas eu continuava com a obsessão de me vingar daquele homem, e não descansei enquanto não o arruinei. Pareço-lhe um monstro?- Perguntou fixando os seus olhos negros no rosto afável do Padre.
- Apenas humano. Mas acredito que não encontrou na vingança, a satisfação com que sonhou durante todos esses anos.
- Acabei por não a levar até ao fim, embora ele pense que sim. O homem em questão é o pai da jovem que acabou de sair. Não tem sido nada fácil para mim, Padre. Tenho vivido os últimos cinco anos dividido entre o amor que sinto por ela e o ódio pelo pai. Agora estou decidido. Vou devolver-lhe tudo no final do mês, embora ele ainda não saiba. 
- Porque lhe perdoou, ou por causa da jovem?
- A verdade é que não sei. Durante anos, odiei-o e só sonhava com o dia em que me pudesse vingar dele. Acreditava que o meu pai morrera, por sua causa, apesar de saber que a saúde dele já estava muito periclitante quando tudo aconteceu. Minha mãe sempre me disse que o médico já a tinha alertado para a possibilidade de uma recidiva fatal, logo após ele ter tido o Acidente Vascular Cerebral. Ela sempre acreditou que a sua morte nada teve a ver com o facto de eu ter sido despedido por suspeita de roubo. Hoje interrogo-me se ela não estaria certa. 
Por outro lado, não fora a atitude cruel daquele homem, eu nunca teria emigrado, não teria conhecido o Júlio, não teríamos feito aquele boletim,e provavelmente hoje teria uma vida medíocre, e sem interesse.
- Já é bom que tenha conseguido compreender isso. Mas existe alguma coisa que ainda não está muito clara no seu espírito, não é verdade?
- Trata-se da jovem que esteve aqui há pouco, e que é filha desse homem.  Estou profundamente apaixonado por ela,talvez até tenha estado a vida inteira, pois nunca me interessei verdadeiramente por outra mulher. E parte da raiva que sentia por esse homem, era também por ela, e pelo desinteresse com que ele a tratava. Todavia penso que posso ter destruído as hipóteses de a conquistar, por causa da minha sede de vingança contra o seu pai. Que me aconselha, Padre?
- Esqueça o passado e foque-se apenas no presente. Por muito que faça, nunca conseguirá mudá-lo. E corre o risco de estragar o presente e o futuro. Seja sincero consigo mesmo e com ela. E se os seus sentimentos são tão fortes como parecem, pode ser que ela venha a corresponder. Mas se assim não for, esqueça e procure ser feliz com outra pessoa. O amor conquista-se, não se compra, por muito dinheiro que o amigo tenha. Já viveu grande parte da vida, preso a más recordações e a sentimentos de vingança. Liberte o coração de rancores e permita-se ser feliz.
-Obrigado, muito obrigado por me ter escutado, Padre. Acredite que me sinto bem melhor agora do que quando aqui entrei.
-Volte quando quiser. Estou sempre por aqui e estarei pronto a escutá-lo quando sentir necessidade de falar com alguém.
Estendeu-lhe a mão, que António apertou calorosamente, sentindo que mais do que um padre, tinha encontrado um amigo.
Saiu da Igreja e dirigiu-se ao carro, pensando que o sacerdote tinha razão. Aquela vingança não tinha sentido.
Pôs o carro em movimento, mas em vez de se dirigir à empresa, foi direto para casa. Precisava meditar sobre o que acontecera naquele dia e por as ideias em ordem.


15.4.19

UM HOMEM DIVIDIDO - PARTE XXV



Meia hora mais tarde os dois despediam-se de Alice a governanta, depois de António ter dado o código de acesso à jovem e ter dado ordens à governanta para acatar os pedidos dela como se fossem ordens suas, seguindo para a igreja cada um no seu carro.
Paula não conseguiu demover António de ir à igreja e ele não a conseguiu convencer a deixar ali o automóvel e ir com ele no seu veículo.
Na Igreja, procuraram pelo pároco, e uma velhota disse-lhes que o Padre  estava na sacristia, pelo que se dirigiram para lá. O Padre Celso  era um homem jovem que os acolheu com cordialidade, e posto ao corrente do que pretendiam aceitou imediatamente dizendo que numa época, em que os jovens, cada vez mais fugiam do sacramento do matrimónio, e na maior parte dos casos aqueles que a ele recorriam, não o conseguiam manter por muito tempo, era sempre com enorme alegria que ele fazia a confirmação de votos vários anos depois. Tudo tratado, com dia e hora marcados e depois de ter recebido uma boa contribuição para as obras paroquianas, os dois despediram-se do pároco, e saíram despedindo-se à porta da igreja.
-A que horas, queres que eu esteja no teu escritório amanhã?
- Se puder ser por volta das duas, ótimo. Como te disse depois de amanhã, vamos a Faro tratar de uns negócios e seria bom que falasses com o meu cunhado antes.
-Vou tentar ter tudo pronto esta mesma noite. Até amanhã, - disse estendendo-lhe a mão, no tradicional gesto de despedida.
António, segurou-lhe os dedos e depositou-lhe um cálido beijo na palma da mão que a estremeceu da cabeça aos pés. Depois sem uma palavra abriu-lhe a porta do carro, esperou que entrasse e colocasse o cinto, e só depois a fechou. Afastou-se um pouco, quando a jovem arrancou, esperou que o carro desaparecesse na curva e voltou a entrar na igreja. Sentou-se num banco quase junto à porta, e inclinando-se para a frente apoiou os cotovelos no joelhos e meteu a cabeça entre as duas mãos abertas. Fechou os olhos e fez uma retrospetiva da sua vida. Lembrou da doença do pai, da acusação de Jorge Maldonado, do seu despedimento, da ida para França, dos sacrifícios do desejo de vingança, de tudo o que tinha passado até aí. De súbito sentiu uma mão que lhe pousava suavemente no ombro. Abriu os olhos, e viu o rosto jovial do Padre Celso que o olhava com bondade.
- Precisa de ajuda, meu amigo? Quer conversar?
- Como assim, padre? Uma confissão?
- Não tem que ser necessariamente uma confissão, pode ser só uma conversa, se achar que lhe faz bem desabafar.
- Padre eu tive uma educação religiosa, mas desde que deixei os escuteiros aos dezoito anos, não voltei a entrar numa igreja até hoje. Meu pai adoeceu quando me preparava para entrar na Universidade, tive que abandonar todos os meus sonhos e procurar emprego para ajudar em casa, já que a minha irmã era pequena e minha mãe deixou de trabalhar, para cuidar do meu pai. Mais tarde fui acusado de roubo, despedido, e não conseguindo arranjar outro trabalho, vi-me obrigado a emigrar, depois de ter visto meu pai morrer sem lhe poder provar que não era um ladrão. Revoltado, pensei que Deus era injusto, que me tinha abandonado e afastei-me da igreja e d' Ele. Durante anos, trabalhei como um condenado, para conseguir uma vida melhor.
Doze anos depois, um colega de trabalho com quem partilhava a casa convidou-me a fazer o Euromilhões, numa dessas semanas de muito dinheiro. Nunca tinha jogado, e não acreditava que nos saísse alguma coisa de jeito, mas o Júlio convenceu-me e fizemos uma única aposta. Estavam em jogo cento e oitenta milhões, e houve apenas duas apostas certas. Uma delas era a nossa.


Aviso, dada a solenidade que se aproxima esta semana só serão publicados três capítulos desta história.


9.4.19

UM HOMEM DIVIDIDO - PARTE XX



-Sim…
- Tenho a dona Paula Maldonado ao telefone. Pode atender?
-Sim, claro. Passe-me a chamada por favor.
- Estou: Bom dia Paula. Porque não ligaste para o meu telemóvel?
- Não é uma chamada pessoal. Prefiro tratar os negócios pelo telefone. Preciso conhecer o local da festa, com urgência. O espaço temporal é demasiado curto e ainda não me disseste onde se vai realizar a festa.
- Falaste numa festa ao ar livre e eu gostei da ideia. Tenho uma casa em Sintra, numa pequena quinta. Só lá vou aos fins-de-semana, mas tem um bonito jardim, com um pequeno lago, penso que seria o ideal.
-Preciso vê-lo. Saber onde fica a igreja mais próxima, ir falar com o padre, uma infinidade de coisas.
-Eu mesmo gostaria de te levar lá, mas vou ter uma reunião dentro de meia hora com o meu sócio. Não podes deixar a visita para mais tarde?
- Prefiro ir já.
-Muito bem. Vou enviar-te a morada. E telefonar à governanta para que te mostre o jardim. Entretanto logo que termine a reunião vou lá ter. Almoçamos e depois podemos ir juntos falar com o padre. Além disso,- apressou-se a dizer, antes que ela recusasse. – Gostava de te mostrar a casa, e de ter uma ideia do que pensas fazer.
- Bom, manda então a morada. E vou falar com o padre, sozinha. Não quero correr o risco de encontrar alguém conhecido, e alimentar boatos em revistas cor-de-rosa. Vou desligar. Até logo!
António desligou a chamada, enviou a mensagem com a morada e ficou pensativo. A ele também não lhe agradavam os boatos, mas não desdenharia nada de sair nas revistas como noivo dela, se isso fosse verdade. Pelo contrário ia sentir-se muito feliz. Cada dia que passava, mais pensava nela. E não tinha nada a ver com a vingança que durante tantos anos alimentou contra o pai dela.
Na verdade sempre que pensava na jovem, conseguia imaginar muita coisa, mas nada que a ligasse ao pai e ao seu desejo de se vingar.  Desejo que aliás pôs de parte, por ela. Nunca em toda a sua vida sentiu algo parecido por outra mulher. Estaria apaixonado?
Foi interrompido nos seus pensamentos, por uma batida na porta, e logo Susana, a sua secretária entrou dizendo:
- Chegou o senhor Júlio Correia, e doutor Eduardo Soares.
- Faça-os entrar. E pode retirar-se. Se precisar de si, chamo.
Os dois homens entraram no escritório, e a secretária retirou-se fechando a porta atrás de si.
António levantou-se e os três homens, cumprimentaram-se de forma amistosa.
- Sentem-se. Querem tomar alguma coisa?- Perguntou António.
- Não, - disse o seu sócio. – Deves lembrar-te que nunca bebo de manhã.
-Eu também não, acabei de beber um café, -disse Eduardo, antecipando-se à pergunta do cunhado.
- Então vamos lá trabalhar. Já marcaram a escritura em Faro?
- Está agendada para depois de amanhã às quinze. Vais connosco não é verdade?- Perguntou Júlio.
- Bom, não era necessário, mas o Eduardo diz que fazes questão na minha presença.
- Sinto-me mais confiante assim. Somos amigos, mas também somos sócios, e lembras-te de quando tinhas o boletim premiado? No mesmo dia quiseste que fossemos a um advogado para firmar uma sociedade. Quando te disse  que não era necessário, porque confiava em ti, disseste. “Amigos, amigos, negócios à parte.” Hoje digo-te o mesmo.
-Não é a mesma coisa, além de que o Eduardo estará lá com o doutor Alcides, teu advogado, e podes ter a certeza que eles terão muita atenção a todos os pormenores da compra. Irei convosco se fazes questão, mas esse negócio tal como os outros relacionados com os automóveis, terá que ser dirigido por ti, eu já tenho imenso trabalho com os restaurantes e a Imobiliária.
-Então está combinado. Vamos depois de amanhã às nove horas.Outra coisa. Sabes que vou casar no final do próximo mês? - Perguntou Júlio.
- Penso que já tinha ouvido alguma coisa sobre o assunto. Os meus parabéns.
- Obrigado. Eu ficaria muito feliz se aceitasses ser o meu padrinho.
Aceitas?
- E eu sinto-me honrado com o convite. Claro que aceito, - disse levantando-se e abraçando o amigo. – Depois conversamos sobre isso. Agora tenho que sair, tenho um compromisso em Sintra.


15.5.18

RENASCER - XXXVIII







Vejo que estão todos a achar lenta esta história. Lembrem-se que estamos em 1969. Nesse tempo as únicas coisas rápidas que existiam eram os ritmos musicais.  Posso garantir-vos uma coisa. Já leram muito mais do que aquilo que falta. 




10.2.18

A VIDA É... UM COMBOIO - PARTE XXXV




Paulo chegou pontualmente às onze horas. Beijou a idosa e ajudou-a a entrar no carro, depois acariciou a cabeça de Martim e só então se virou para Amélia, e lhe roçou os lábios com uma caricia tão suave que mais parecia um beijo de brisa. Arqueou uma sobrancelha, num gesto que ela já reparara, ele repetia quando algo o preocupava, e perguntou quase num sussurro.
- Que se passa? Estás bem?
Ela acenou afirmativamente com a cabeça e apressou-se a entrar no carro. Ele sentou-se ao volante e arrancou. Durante o trajeto Martim não se calou. Estava muito feliz por ir passar o dia com os seus novos amiguinhos.
Na quinta, todos estavam entusiasmados com a perspetiva da próxima boda e as mulheres trocavam ideias para a decoração da casa e a ementa. Paulo queria contratar uma empresa de “catering” mas elas queriam fazer a festa, já que a cerimónia seria íntima, e apenas os colegas de Amélia estariam presentes, além da família. Ao fim de algum tempo, ele acabou convencendo-as. Afinal ele queria que todos estivessem felizes com aquela boda, não queria ver ninguém atarefado e nervoso com medo de que alguma coisa corresse mal.  Resolvida esta questão, passaram às seguintes. Matilde iria levar as alianças, os meninos seriam os pajens, Alfredo e a esposa os padrinhos de Paulo. Amélia, ainda não falara com o irmão, de férias em Cabo Verde, e teria que lhe ligar, para saber se ele aceitaria ser o seu padrinho, ou se convidava Carlos e a esposa. O tempo era muito curto para preparar tudo mas Paulo não queria de modo algum prolongar o prazo. De resto o facto do irmão de Amélia estar em Cabo Verde não seria impedimento para ela falar com ele, que teria decerto o seu telemóvel à mão. As roupas e calçado, compravam-se num dia. Ele sabia que talvez Alfredo, não tivesse disponibilidade financeira para tanta despesa, mas mais tarde quando estivessem sozinhos resolveria esse problema.
Depois do almoço, os dois foram a Alvaiázera, a vila mais próxima, para falar com o padre. Alfredo informou-os que a igreja estava aberta todo o dia, e que quando o padre não estava por lá, estava em casa, mesmo ao lado da sacristia.
O sacerdote era um homem de idade avançada e rosto afável que os recebeu com cordialidade, e se mostrou contente por eles procurarem a bênção divina para o casamento, numa época em que as pessoas cada vez se casavam menos.
Depois de ouvirem atentamente as recomendações do sacerdote, despediram-se ficando a cerimónia marcada para quinze dias depois,  às onze horas.


PORTUGAL ACABA DE SE SAGRAR CAMPEÃO EUROPEU DE FUTEBOL.
PARABÉNS PORTUGAL



E como hoje é sábado de Carnaval, eis-me pronta para a farra.  Rsrsrs



10.7.17

ROSA - PARTE XIII




                                          Foto DAQUI


Quando Rosa saiu do hospital, o padre que a tinha casado, arranjou-lhes um dos oito fogos, que ele próprio mandara construir para alguns dos seus paroquianos, que viviam em condições miseráveis. A casa ficava na vila, longe portanto da Seca, mas Rosa achou que lhes tinha saído a sorte grande. A casa, composta por uma boa cozinha, casa de banho e  três quartos, com água, luz e chão de tacos, pareceu-lhe um palácio. A vida do casal começava a melhorar. A filha mais velha foi servir para Cascais e só vinha a casa uma vez por mês. A segunda também foi servir para casa dum Sr. Doutor, lá mesmo no Barreiro. Dos três mais velhos, ficava em casa o rapaz que era muito frágil e que tinha sempre “uma ninhada de gatos no peito”. Ali na vila, Rosa arranjou algumas senhoras que lhe davam umas horas de trabalho para limpezas, ou passar a ferro e a vida parecia começar a equilibrar-se. Mas… foi nessa altura que João mudou. Andava macambúzio, perdera parte da sua alegria, olhava à volta com desconfiança e, de vez em quando, saía à noite. Às vezes, vinha cedo mas outras, só voltava de madrugada. Rosa começou a pensar que ele tinha arranjado uma amante.
Sentia que o chão lhe fugia debaixo dos pés e um dia fez-lhe a pergunta direta.
João irritou-se. Que ela estava doida, onde teria ido buscar essa ideia. Mas Rosa não ficou convencida. E numa noite, em que o marido voltou a sair, ela foi atrás dele. E viu quando ele se encontrou com mais dois e como andavam 
em silêncio, acautelando-se nas sombras. E viu quando um quarto homem chegou com uma pasta, da qual tirou uns papéis que distribuiu em silêncio. Escondida, viu como os homens espalhavam alguns papéis, protegendo-se sempre no escuro e sem trocarem uma palavra. Assustada, voltou para casa e meteu-se na cama. A tremer, esperou a chegada do marido. Ela já tinha visto alguns papéis daqueles no chão. Tentara até apanhar um, mas a vizinha impediu-a. Disse-lhe que eram papéis contra o governo, que os comunistas espalharam, e que se ela fosse apanhada com algum, seria considerada comunista e seria presa. O João podia ser preso? A frase martelava-lhe a cabeça e dava-lhe suores frios.
Quando João chegou a casa, achou a mulher estranha.
- O que tens, mulher? Aconteceu alguma coisa?
Ela respondeu com outra pergunta:
- Tu és comunista, João?
- Cala-te, - disse perdendo a cor. Nem em pensamento, ouviste, nem em pensamento, repitas isso.
- Então é verdade, - disse ela com a voz embargada pelas lágrimas. Mas porquê? Já passamos tanta fome, tanta miséria e agora que a nossa vida está bem melhor, é que queres desgraçar-nos.
-Tu não compreendes mulher. É nosso dever tentar que os nossos filhos não passem o que nós passamos.
- Mas… e se eles te prendem João?
 - Não te preocupes, nós temos cuidado. É verdade que há muitos “bufos”, mas também há muita gente do nosso lado.
Mas, desde aquela noite, e durante vários anos, Rosa nunca mais teve um minuto de sossego.


Continua


19.4.16

MANEL DA LENHA - PARTE LVI


As duas fotos que a filha do Manuel lhe enviou de Moçambique, para provar o casamento religioso realizado em Nampula. Na segunda foto é notória a diferença do vestido da noiva em relação ao casamento realizado no Barreiro


Em Janeiro de 71, chega uma carta da filha a viver em Nampula. Diz que esteve muito mal, por causa de uns camarões que comeu e os médicos dizem que é alérgica e não mais pode comer. Está bem, acabou de falar com o padre da Catedral de Nampula para casarem pela igreja, e que era necessário que eles agilizassem os documentos no registo do Barreiro a fim de que o casamento pudesse ser realizado em Abril nos anos do marido. O que ela não contou, foi que estando em coma no hospital, antes mesmo de recuperar a consciência, ouvia alguém ao lado que repetia insistente. "Chamem um padre que eu vou morrer" Aquilo foi-se-lhe entranhando na cabeça, e ao voltar a ficar consciente, a primeira coisa em que pensou, foi que não poderia levar a extrema-unção porque não era casada pela igreja. A educação ultra religiosa da família materna, fazia-se impor. Enquanto Manuel, tratava dos documentos que a filha lhe pedia, o filho que entretanto tinha ido às sortes e ficara apurado, ingressava na Marinha de Guerra Portuguesa. E os documentos ficaram prontos, mesmo a tempo para que o casamento se realizasse no dia 5 de Abril desse ano de 1971.
Enquanto isso, Marcelo Caetano continuava com as suas televisivas conversas em família, e anunciava reformas administrativas, constitucionais e de ensino.
Poucos dias depois do aniversário do Manuel, chegou carta da filha. Conta como foi a cerimónia do seu casamento, manda fotografias e dá notícias do tio que a visitara recentemente.  Nesse mesmo dia será descoberto o desaparecido navio "Angoche". É encontrado deserto, com sinais evidentes de ter sofrido uma explosão, e vazio da sua preciosa carga, armas para os militares portugueses e combustível para a Força Aérea.
 A Frelimo, logo apontada como responsável, fará o desmentido público.
Mas poucos dias depois, no Casino Estoril, Riquita,  a Miss Angola, é eleita Miss Portugal. O facto serviu para abafar  de certa forma o mistério do "Angoche".