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13.11.15

SEXTA-FEIRA 13

Ora bem, cá estamos outra vez numa Sexta - Feira 13. E a propósito deste dia se contam lendas e superstições como todos sabem. A história que vou contar, sempre me foi contada pela família, como sendo real. Já a contei aqui, porém parece-me que não resta nenhum leitor dessa data.



Então é assim. Nos anos trinta do século passado, numa aldeia do norte, vivia a minha avó e os seus nove filhos. Inicialmente eram onze, mas dois não resistiram à vida dura duma casa sem qualquer conforto onde faltava tudo até o pão na maioria dos dias.  Meu avô vivia da venda de algum ferro velho que recolhia entre os moradores das aldeias vizinhas. Minha avó cuidava dos filhos e vendia peixe de porta em porta, quando o meu avô conseguia dinheiro para comprar algum. À medida que os filhos cresciam iam trabalhar para os senhores da terra, aqueles que possuíam quintas e casas. Não iam à escola, pois a escola não lhes enchia a barriga e a trabalhar ainda que não ganhassem grande coisa não passavam fome e às vezes até traziam para casa  um pedaço de pão, ou um resto de comida que algum patrão mais caridoso mandava. Os miúdos iam para o monte cuidar do gado, ou faziam alguns trabalhos mais leves, pois dizia-se que "trabalho de menino é pouco mas quem o desperdiça é louco" Como a aldeia era muito pequena e os trabalhos não abundavam, os mais velhos iam afastando-se para outras aldeias vizinhas à medida que cresciam.
Ora bem naquele tempo em que não havia televisão nem sequer a luz eléctrica chegava à aldeia, os serões passavam-se à roda da lareira e as histórias de bruxas e lobisomens, damas de pé-de-cabra e afins, eram o pão nosso de cada dia. As crianças cresciam a ouvir essas histórias, e a imaginação infantil dava-lhe contornos inimagináveis. 
O meu tio José, o mais velho dos irmãos foi trabalhar para uma dessas aldeias doa arredores.  Naquele tempo as estradas eram em terra batida, entre extensos pinhais, caminhos feitos pelas carroças e carros de bois.  A meio caminho entre as duas aldeias havia um encruzilhada onde se dizia que todas as Sextas-Feiras as bruxas se reuniam para dançar e cantar enquanto esperavam a meia noite para hora a que o "mafarrico" que surgia na forma de um bode. 
Depois de um mês de trabalho numa Sexta à noite, depois do trabalho, o patrão, pagou-lhe e deu-lhe o fim de semana para ir a casa ver os pais e os irmãos. Como conhecia a família e sabia das dificuldades deles, deu-lhe um saco de serapilheira com um alqueire de feijão para ele levar para casa. 
O bom do rapaz agarrou no saco e colocando-o às costas pôs-se a caminho.  A meio do caminho começou a lembrar-se das histórias ouvidas e o medo começou a apossar-se dele. Lembrou-se que era Sexta-Feira e que tinha de passar pela tal encruzilhada. Cheio de medo, apurou os sentidos e de repente ouviu um som. Tic.... Parou e pôs-se à escuta. Silêncio absoluto. Recomeçou a andar e o som voltou. Tic...tic... pareciam passinhos muito leves atrás de si. A tremer apressou o passo e o som ficou também mais rápido. Estava já muito perto da encruzilhada, as pernas tremiam, o suor escorria. Desatou a correr e o som corria atrás dele. Tic...tic...tic...tic... 
Lívido e quase sem conseguir falar sufocado de tanto correr chegou a casa, e foi rodeado pelos pais e pelos irmãos mais novos. Quando por fim se acalmou contou o que lhe tinha acontecido e como tinha sido perseguido por alguma coisa , talvez alguma bruxa ou quem sabe até pior. 
Naquele momento lembrou-se do saco que tinha às costas e estendeu-o à mãe. Tic... ouviu-se o barulho de um feijão caindo no chão. A mãe virou o saco e viu o buraco ao mesmo tempo que outro feijão caía no chão.  Estalou gargalhada geral enquanto o José baixava a cabeça envergonhado.



E o Sexta de regressa amanhã com mais um pouco da saga do pintor e da menina desmemoriada.

23 comentários:

Unknown disse...

Muito boa história.

Bell disse...

Outro dia ouvi que os gatos pretos estavam sendo abandonados pois estava havendo discriminação devido as superstições e cor.
Que triste né?

bjokas =)

Anete disse...

Uma história cheia de detalhes, muito boa pra se imaginar...
O Gato Preto com as suas famas e emoções...

Bom fim de semana... Muita paz!

Edum@nes disse...

Gostei amiga Elvira, do tic,tic, pois, como eu não tive o direito de poder frequentar a escola diurna, se quis aprender a ler e a escrever tive de frequentar a escola nocturna, porque de dia tinha que vergar a mola. Cuja escola distava de onde vivia cerca de 5 quilómetros. Nas noites de inverno, fortes ventanias, relâmpagos, trovões, tudo isso me assustava, mas não tinha outra opção. Também, quando em noites de luar, com a minha própria sombra me assustava. Quando o vento fazia mexer os arbustos, ou se ouvia algum ruído. Ó pernas para que te quero. Quanto mais fugia mais medo tinha.
Não é mentira nenhuma, só deixei de ser medroso, quando fui para a tropa.
Hoje, do que eu tenho mais medo é quando o meu braço direito me dói! Quanto ao meu braço esquerdo do que está, não podia estar melhor!

Tenha amiga Elvira, um bom dia de sexta-feira, 13 de Novembro, um abraço.
Eduardo.

Francisco Manuel Carrajola Oliveira disse...

Uma bela história de tempos em que não havia televisão e as pessoas tinham uma imaginação muito fértil.
Um abraço e bom fim de semana.

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

não conhecia esta história, mas também eu sorri.
gostei muito de ler.
bom fim de semana.
obrigada pelas suas visitas e seus comentários sempre gentis.
beijinhos
:)

Zé Povinho disse...

Não sei se andava por cá da 1ª vez, não me recordo, mas deu para sorrir com o som dos feijões...
Abraço do Zé

AC disse...

:))
Boa história, Elvira. Daquelas para passar de geração em geração, como legado familiar.

Um bom final de semana :)

lis disse...

Uma boa pausa no conto com outro tão interessante quanto Elvira
Há quem tenha medo do 13 e das sextas´feiras,
Pura invencionice que persiste dias afora.
abraços Elvira

Odete Ferreira disse...

Na verdade, nesse tempo, penso que todas as crianças ficavam influenciadas pelas histórias que ouvíamos aos mais velhos. Também "sofri" alguma influência mas consegui racionalizar...
Bjo, amiga

Mariangela l. Vieira - "Vida", o meu maior presente. disse...

Gostei da história Elvira. Desde criança ouvi muitos causos... Para nós era divertimento ficar escutando!
Abraços

Vera Lúcia disse...


Olá Elvira,

O caso caracteriza bem os medos decorrentes das lendas que circundam a sexta-feira 13. Também cresci ouvindo histórias de assombração. Era muito comum ficarmos reunidos, ouvindo meu pai contá-los. E haja medo!!!-rsrs.

Beijo.

Beatriz Pin disse...

Querida Elvira, obrigada por asomarte, de novo, ao meu blog. Gosto de ler esta historia que tan familiar me resulta por ter vivido eses tempos da miña infancia e xuventude a carón de contos de medo que logo tiñan a súa explicación lóxica e real e non máxica como se agardaría. Pero o medo prendía no meu maxín e acompañóume ben tempo. Recrear aquela época é saudabel. Parabéms! Unha aperta

Janita disse...

Gostei muito que nos tivesse contado esta história verídica, Elvira.

Felizmente, o mistério do tic-tic que tanto amedrontou o seu tio foi desvendado. Imagine quantas lendas de bruxedos e bruxarias, ficaram por esclarecer adensando a crença do povo?

Um beijo e obrigada pela partilha.
Janita

( Vou colocar em dia os episódios da outra história )

paideleo disse...

Pois eu son un dos leitores que quedan que o leu da outra vez e que nunca esquecerei polo que me gustou.
Pola Galiza está mui extendida a estoria do home que pasou toda a nai agarrado por unha ánima que á luz do día resultou ser unha silveira.

Ana disse...

ahahah o medo é capaz de coisas terríveis!

Laura Santos disse...

Uma história sobre os medos, muito adequada para uma sexta-feira 13! :-)
xx

Duarte disse...

Aqui são as terças, los martes.
Hoje em dias os medos são outros.
Um grande abraço

Portuguesinha disse...

Superstições são mesmo assim.
Escuta-se uma coisa com uma explicação lógica, mas teme-se o folclore :D
O pior é quando se vê algo sem explicação, procuram-se todas as possíveis, e continua sem aparecer uma. Já me aconteceu. Mas ainda assim, acho que talvez exista uma - mais lógica que fantástica -

Li a história do pintor e da menina desmemoriada e fiquei sedenta por mais. Mentalmente pensei: «E então? E então??» - tens esse dom.

Zilani Célia disse...

OI ELVIRA!
MUITO BOM A GENTE LEMBRAR DE HISTÓRIAS ANTIGAS PRINCIPALMENTE DE FAMÍLIA.
ABRÇS

http://zilanicelia.blogspot.com.br/

Rosemildo Sales Furtado disse...

Eu, particularmente, me auto-puniria, retornando e apanhando todos os grãos, causadores do tic...tic...Rsrs.

Abraços,

Furtado.

maria disse...

Gostei muito, beijinho amiga e um Fim de Semana muito feliz!

chica disse...

Gostei de ler e valeu...Ainda não tinha lido.Havia perdido esse! Boa 6ª feira, 13! bjs, chica