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17.2.23

CICATRIZES DA ALMA - PARTE XX

 



-Boa noite, Diogo - saudou. A Paula avisou que eu vinha?

-Boa noite. Entra, o jantar está quase pronto, a Paula está a pôr a mesa.

A criança esticava os braços, chamando a “madinha”, mas Diogo disse:

- Primeiro temos de ir lavar estas mãozinhas e a cara. - E voltando-se para a jovem, acrescentou: Esta Princesa, continua a comer mais com as mãos do que com o talher. Fica à vontade, conheces bem a casa.

Anabela pendurou a mala no cabide junto à porta, despiu o casado e deu-lhe o mesmo destino, seguindo depois para a cozinha, onde Paula acabava de retirar do forno um tabuleiro que cheirava deliciosamente.

-Boa noite, - saudou. Que cheiro maravilhoso.

-Boa noite, Anabela. O jantar está pronto. Não pus a mesa na sala, porque sempre clamas que preferes comer aqui. Estou “em pulgas” para saber o que o doutor Azevedo queria contigo.

A afilhada agarrando-se às suas pernas e exigindo a atenção da “madinha” impediu a jovem de responder. Baixou-se e pegou na menina ao colo, mas logo a mãe disse:

- Dá-ma. Está na hora, dela dormir. Vamos ver se corre bem, ou se a excitação de te ver, não a deixa adormecer.

-Vou, contigo. Quantas histórias temos de ler para ela dormir?

-"Históias não, madinha. À, à, à," - interrompeu a menina.

- O que é isso?

- Agora quer que lhe cantemos todas as noites essa canção. Talvez seja o que cantam na creche.

- Muito bem, Princesa. Vamos ver se a madrinha, ainda se lembra da machadinha – disse Anabela enquanto Paula punha uma fralda na menina e lhe vestia o pijama.

Já deitada, as duas entoaram em coro a canção, enquanto a criança murmurava a silaba final de cada verso como se estivesse acompanhando-as.

Adormeceu a meio da terceira vez que as duas entoavam a canção. Paula aconchegou-lhe a roupa, apagou a luz e as duas saíram do quarto, fechando a porta em silêncio.

-Vá lá, pensei que levasse mais tempo para adormecer, - disse Paula enquanto se dirigiam à cozinha. Às vezes tenho de lhe cantar tanta vez, que quase adormeço primeiro que ela.

 

 

11.10.21

SINFONIA DA MEMÓRIA - PARTE XXX

 

Aquele domingo de Abril, amanheceu radioso. Helena, o filho e os pais, tinham chegado dois dias antes ao Porto, e hospedaram-se no hotel, onde se realizaria a festa de casamento para os mais de duzentos convidados, que chegaram na véspera.

Helena jamais tinha sonhado com uma festa assim, mas Fernando não esquecia que lhe devia a vida, e quis que ela tivesse um casamento de princesa.
 
Graças à armadilha montada pelo inspetor Morais, e sua equipa, conseguiram irritar Joaquim Salgueiro, que fez exatamente aquilo que eles esperavam. Tentou matar Fernando, o que não conseguiu, graças à pronta intervenção da agente que o acompanhava. Perseguido na fuga, e vendo-se encurralado, acabou disparando contra si próprio, a arma com que tentara alvejar o pianista. Com este desfecho, a polícia convocou a imprensa e contou toda a história.

 Os restantes membros da Orquestra, seus colegas, que se preparavam para regressar a Portugal, terminada que fora a sua digressão, foram então informados pela polícia americana do que se passara. 

Enquanto isso, ele regressara a Lisboa, para a sua doutora. Recuperara os seus documentos, apreendidos numa busca a casa do malogrado facínora, mas não a memória. Isso aconteceria, quinze dias mais tarde, quando numa academia de música, a que Helena o levou, por sugestão do psiquiatra, se sentou ao piano e deu livre curso à sua paixão.

 A Sinfonia nº 40 em sol menor de Mozart, com que devia estrear-se como solista nos Estados Unidos, penetrou nas profundezas da sua mente, e trouxe todo o passado para a atualidade. A magia da sua interpretação, fez com que as pessoas que se encontravam na academia, se fossem dirigindo para a sala, e aplaudissem entusiasmadas no final.

 Recuperada a memória, Fernando só tinha um desejo. Casar e regressar à sua casa na Póvoa, e à orquestra no Porto. Mas Helena, tinha que se despedir da clínica, e tentar a transferência do Hospital de Santa Maria para um hospital no Porto.

 E agora, tudo resolvido, envergando um belíssimo vestido branco, devidamente penteada e maquilhada pelos profissionais do hotel, preparava-se para sair em direção à limusina que a levaria à Igreja da Lapa, onde o noivo a esperava cheio de ansiedade.
Mais tarde, pelo braço do pai avançou pela nave da igreja, confiante e feliz, sem desfitar o noivo, lendo nos seus olhos, as mais belas promessas de amor.

Quando a emocionante cerimónia chegou ao fim, e o padre lhe disse que podia beijar a noiva, Fernando beijou-a com paixão murmurando-lhe depois ao ouvido:
-Amo-te, doutora. Como nunca amei nada, nem ninguém.
Ela respondeu no mesmo tom.
- Amo-te tanto, que nem sei como consigo respirar.

Seguiram-se as felicitações. Primeiro, o próprio sacerdote, depois, o Inspetor Morais e a agente que durante uns dias fora “noiva” de Fernando, e que o noivo fizera questão de ter por padrinhos, Marta e o marido que foram padrinhos de Helena, os pais da noiva, e depois os restantes  familiares e amigos. Por fim os noivos encaminharam-se para a saída, da Igreja,  com Fernando carregando ao colo o pequeno Diogo, radiante por já ter um pai, como os outros meninos.


Fim

15.8.18

FOLHA EM BRANCO - PARTE XVII




Já escurecera quando saíram do consultório. Passaram pela farmácia, e depois tomaram o caminho de casa.
- Uma moeda pelos seus pensamentos, - disse Miguel dirigindo-se à
jovem, que o seguia, muda como uma sombra.
- Está farto de gastar dinheiro comigo. As roupas, o médico, e esses exames…
-Ora, ora, o dinheiro fez-se para se gastar. E como eu sou mais de ganhar do que de gastar…
-Nunca lhe poderei pagar.
-Talvez sim, talvez não. Quem sabe, não é uma rica herdeira, ou uma princesa dum reino petrolífero, - riu Miguel tentando tirar a jovem daquela preocupação. Passaram pelo restaurante para jantarem, mas a jovem tinha perdido a fome e comeu apenas uma sopa.
Já em casa, Miguel esperou que a jovem guardasse as compras e depois pediu-lhe:
-Venha cá. Sente-se aqui, - disse apontando um lugar no sofá, junto de si. Vamos conversar. Creio que já lhe dei provas suficientes de que quero ajudá-
la, e que pode confiar em mim.  Também já lhe disse,que não  precisa  agradecer. O que quero, é que colabore, a fim de conseguirmos chegar a algum lado. Eu sei que ficou desiludida. De resto eu também fiquei um pouco, não pensei que podia ser tão complicado. Mas não vamos desistir. Amanhã será outro dia. Vai fazer o exame sim, tão depressa quanto possível, às vezes estes exames são difíceis de marcar. Amanhã comprarei o caderno de desenho para que faça o que o médico recomendou. E vamos combinar uma coisa. A partir de agora, sempre que fale consigo, vou chamá-la por um nome diferente. Quem sabe se algum deles lhe diz alguma coisa?
 Pôs-lhe a mão sobre o ombro e puxou-a para si. Um gesto suave, sem desejo, nem maldade, como se faz com uma criança. De súbito a jovem rompeu num choro convulsivo.
- Mau, assim eu zango-me. – Ralhou Miguel. 
-É que é muito doloroso para mim,- disse ela levantando para ele o rosto molhado. Por mais que me esforce, não me ocorre nada de nada. E se ficar sempre assim?
- Já falámos disso esta manhã. Não me vou repetir. Sei que está cansada. Seja uma menina bonita, tome o medicamento e vá dormir. Vai ver que amanhã acorda melhor.
Levantou-se, foi à cozinha, e regressou com um copo de água, e as duas metades do comprimido.
Obediente, ela tomou a metade que ele lhe estendia, e depois dirigiu-se à casa de banho.
Miguel aproveitou para ir ao quarto buscar as suas roupas, para não ter que dormir vestido de novo.
Pouco depois a jovem voltou. Dirigiu-se ao quarto dizendo:
-Boa noite Miguel.
Boa noite Luísa.
Em silêncio a jovem fechou a porta.





31.5.18

CASAMENTO DE CONVENIÊNCIA - PARTE XII


A jovem, que a sua secretária acabava de introduzir no seu gabinete, em nada se assemelhava aquela que ali estivera procurando o pai do sobrinho, três semanas atrás. As calças de ganga foram substituídas por um gracioso conjunto de saia e top em seda verde e os ténis deram lugar a sapatos de salto agulha, que a faziam parecer mais alta.
- Boa tarde, -saudou. Confesso que estou intrigada com a carta que recebi a convocar-me para esta entrevista.
- Senta-te, - disse indicando-lhe a cadeira. Devo dizer-te que receei que não aparecesses, depois da maneira com que me descartaste naquele dia. Por favor não insultes a minha inteligência com uma desculpa, - acrescentou ao ver que se preparava para falar.
- Deves entender que nunca te tinha visto antes, e que a minha vida nada tem a ver com a do rico empresário que és.
- Talvez te enganes. Tenho uma proposta para te fazer, mas antes de continuar, quero dizer-te que sou um homem sério, incapaz de brincadeiras estúpidas, e portanto o que te vou propor é a sério, por muito absurdo que te pareça. Tenho trinta e oito anos, e sou solteiro. Tenho vários negócios e mais dinheiro do que posso gastar o resto da vida. Por outro lado, tu tens a teu cargo o teu sobrinho, e a tua mãe, que segundo sei esteve muito doente, e talvez ainda esteja.
- Andaste a investigar-me?- Perguntou tirando os óculos num gesto que ele já tinha visto e que provavelmente repetia quando se irritava.
- Por favor acalma-te e ouve-me até ao fim. O que te proponho não é uma aventura, a troco de dinheiro. Proponho-te um casamento, com o qual a tua mãe terá direito aos melhores tratamentos, e mais, proponho-te a adoção legal do teu sobrinho e a melhor educação para ele, como convém ao meu futuro herdeiro. Além de te proporcionar uma vida de princesa.
- A que propósito? És gay? Ou impotente?
-Nem uma coisa nem outra. Juro-te.
-Então, não entendo. O que pode levar um homem rico, e bonito, a propor casamento a uma mulher que mal conhece, como se lhe estivesse a propor um negócio?
- De certo modo é um negócio. Eu sinto falta de uma família, e posso dar-lhe tudo o que ela precise. Tu tens uma família e terás que levar uma vida de sacrifício para suprimires as suas necessidades mais básicas. Um casamento seria uma boa solução para os dois.
- Um casamento de conveniência. Isso não daria certo. E o amor?
- Salvo raras exceções, o amor não passa de uma invenção dos romancistas. Ao longo da vida, quantos casais conheceste que se casaram apaixonados, e se divorciaram em menos de dois anos?
- E se eu te disser que estou apaixonada?
-Estás?
- Não. Mas isso nem interessa. O que me importa é tentar entender. Porquê eu? Com tanta mulher bonita, na sociedade em que te moves?
- Já pensaste que de certa maneira me sinto responsável pelo mal que um meu empregado causou à tua irmã? E que pelo facto de ele ter usado o meu nome, me sinta com vontade de tornar essa criança meu filho de facto?


15.3.18

A TRAIÇÃO - PARTE XXI




Amanhecera há bastante tempo quando ela acordou. Ainda sonolenta olhou à sua volta com estranheza, e logo se lembrou de onde estava. Sentou-se na cama e olhou o lugar onde João dormira. A almofada ainda conservava a forma da sua cabeça. Estendeu a mão e tocou-lhe. Estava fria, o que queria dizer que já devia ter acordado há bastante tempo. Foi até ao armário e retirou a roupa para vestir. Com ela na mão foi para a casa de banho. Tomou um duche rápido, enrolou-se na toalha e secou o cabelo.
Depois vestiu-se e voltou ao quarto. Puxou os lençóis para arejar a cama e saiu do quarto. Na cozinha encontrou João, mas nem sinal das duas idosas.
-Bom dia, - saudou.
- Bom dia. Dormiste bem?
-Que nem uma pedra. Onde estão tua mãe e a tia Margarida?
- Foram à missa das oito. Senta-te. Deves ter fome. Queres torradas?
-Sim.
-Com manteiga ou doce? – Perguntou enquanto metia duas fatias de pão na torradeira.
- Manteiga. A que horas vamos regressar? – Perguntou despejando num copo o sumo de laranja.
-Ainda não pensei nisso. Tens pressa?
- Gostava de ir ver a minha mãe, coisa que não poderei fazer, se chegarmos muito tarde.
-A tua mãe passou bem a noite e está bem. E o teu pai chega esta noite.
-Como sabes?
Está no contrato com a empresa de enfermagem. A enfermeira deve ligar-me de manhã e à noite, para me fazer o relatório do estado da doente, - disse pondo na sua frente as torradas e o recipiente com a manteiga, acrescentando em seguida. Se quiseres, podemos ir à praia da Costa Nova. É uma zona muito bonita, com as suas casas de riscas que lembram estranhos e gigantescos pijamas. Trouxeste fato de banho?
- Não.
- Podemos passar pelo fórum e comprar, se quiseres ir claro.
- Preferia ficar aqui pela cidade. Não me apetece a praia.
- Então não vamos.
- Porquê, João?
- Porquê… o quê, - perguntou arqueando o sobrolho.
- Porque viemos, porque tens estado a tratar-me como se eu fosse uma princesa?
Um sorriso rasgado espelhou-se-lhe no rosto.
-Ah, isso? Se calhar é porque penso que és mesmo uma princesa.
- Deixa-te de tolices. Estou a falar a sério
- Eu também Alteza, eu também, - retorquiu sorrindo


26.10.17

A RODA DO DESTINO - PARTE XLI


Sentado à mesa na cozinha, Salvador observava a graciosidade e desenvoltura com que Anete se movimentava na preparação do jantar.
- Tens a certeza de que eu não posso ajudar-te? – Perguntou
- Sabes cozinhar?
- Pouca coisa. Mas posso por a mesa.
-Isso é uma boa ideia. Naquela gaveta, tens os talheres, e na outra ao lado, há toalhas e individuais. Escolhe o que mais te agradar. E na dispensa, deve haver uma garrafa de vinho. Podes abri-la.  
Ele levantou-se e começou a por a mesa.
-Tens falado com os teus pais?
- Quase todos os dias.
- Tens uma família muito bonita. São todos muito simpáticos.
- Espera até os meus irmãos saberem que vens cá a casa jantar, e vais ver como se acaba logo a simpatia, - disse rindo.
-Sei. Foram sempre assim tão protetores?
- Sempre, -disse colocando na mesa a travessa dos bifes, com o arroz branco.
Sentou-se e iniciaram a refeição. Só depois continuou
– Desde que fui para o infantário. Os três não me largavam.
- Os três?
- Os dois e Afonso, o meu ex-marido!
“ Quer dizer que o teu ex-marido, é um amiguinho de infância. Vamos ver se contas mais alguma coisa”
- Já estou a ver três rapazes a assaltarem o castelo para brincar com a princesa, e as suas bonecas, - disse rindo.
- Era mais assim. Três rapazes a arrastarem a princesa para ir jogar à bola, subir às árvores, ou pescar.  Fui crescendo sempre com três sombras. No recreio da escola, nas festas, nas saídas. Era tão frustrante que às vezes chegava a odiá-los. Os dois só me deixaram em paz quando fiquei noiva do Afonso.
- Um noivado com ódio ao noivo? – Perguntou franzindo as sobrancelhas.
- Ó não. Aquele ódio era só raiva de momento, por exemplo quando queria ir à discoteca com as minhas amigas, e só podia ir com os três guarda-costas.
- Então amáva-lo…
-Não. Os pais do Afonso viviam, e a mãe ainda vive, na vivenda ao lado da nossa. Os nossos pais eram amigos, e como andávamos sempre juntos eles começaram a falar em casamento, e nós deixá-mo-nos embalar pela ideia. Quando acordámos estávamos casados.
 Tinham acabado a refeição. Anete levantou-se
- Queres café? Como sabes, é do instantâneo.
- Sim. – Levantou-se para retirar a loiça da mesa, enquanto ela punha a chaleira ao lume e retirava do armário as chávenas e o frasco do café. E voltou à conversa:
- Divorciaram-se em seguida. De comum acordo?
- Não e sim. Não nos divorciámos em seguida, Porque o pai do Afonso ficou doente, e depois da sua morte, a mãe dele teve uma depressão, precisava de todo o nosso apoio e carinho, não era hora de pensar em nós. Mas sim foi de comum acordo e continuamos amigos.
Pôs a água fervente na mesa, e continuou enquanto preparava os cafés.
- Tão amigos, que me veio visitar anteontem, para me contar que está apaixonado, que pensa casar e queria que fosse a primeira a saber disso.
Escureceram os olhos masculinos.
- Tens a certeza, que foi por amizade? Não teria sido mais por retaliação, pelo divórcio?
-Não conheces, o Afonso. Se o conhecesses nem te passava pela cabeça semelhante coisa, - disse colocando a loiça na máquina.
"Que defesa tão acalorada," - surpreendeu-se. "Será que ainda gosta dele"?
Foram para a sala. A chuva continuava a cair fustigando os vidros da janela. A jovem foi até ela e desceu a persiana.
-Agora é a tua vez, - disse ao voltar-se. Nunca te casaste?
- Não.
- Mas decerto já te apaixonaste.
 -Não sei se o teu conceito de apaixonar-se é o mesmo que o meu. Se te referes ao amor, pois sim. Há uns anos, conheci uma mulher que julgava, única, especial. Amei-a tanto que estava a pensar pedi-la em casamento.




6.11.15

FOLHA EM BRANCO PARTE XVII




Já escurecera quando saíram do consultório. Passaram pela farmácia, e depois tomaram o caminho de casa.
- Uma moeda pelos seus pensamentos, - disse Miguel dirigindo-se à
jovem, que o seguia, muda como uma sombra.
- Está farto de gastar dinheiro comigo. As roupas, o médico, e esses exames…
-Ora, ora, o dinheiro fez-se para se gastar. E como eu sou mais de ganhar do que de gastar…
-Nunca lhe poderei pagar.
-Talvez sim, talvez não. Quem sabe, não é uma rica herdeira, ou uma princesa dum reino petrolífero, - riu Miguel tentando tirar a jovem daquela preocupação. Passaram pelo restaurante para jantarem, mas a jovem tinha perdido a fome e comeu apenas uma sopa.
Já em casa, Miguel esperou que a jovem guardasse as compras e depois pediu-lhe:
-Venha cá. Sente-se aqui, - disse apontando um lugar no sofá, junto de si. Vamos conversar. Creio que já lhe dei provas suficientes de que quero ajudá-la, e que pode confiar em mim.  Também já lhe disse,que não  precisa  agradecer. O que quero, é que colabore, a fim de conseguirmos chegar a algum lado. Eu sei que ficou desiludida. De resto eu também fiquei um pouco, não pensei que podia ser tão complicado. Mas não vamos desistir. Amanhã será outro dia. Vai fazer o exame sim, tão depressa quanto possível, às vezes estes exames são difíceis de marcar. Amanhã comprarei o caderno de desenho para que faça o que o médico recomendou. E vamos combinar uma coisa. A partir de agora, sempre que fale consigo, vou chamá-la por um nome diferente. Quem sabe se algum deles lhe diz alguma coisa?
 Pôs-lhe a mão sobre o ombro e puxou-a para si. Um gesto suave, sem desejo, nem maldade, como se faz com uma criança. De súbito a jovem rompeu num choro convulsivo.
- Mau, assim eu zango-me. – Ralhou Miguel. 
-É que é muito doloroso para mim,- disse ela levantando para ele o rosto molhado. Por mais que me esforce, não me ocorre nada de nada. E se ficar sempre assim?
- Já falámos disso esta manhã. Não me vou repetir. Sei que está cansada. Seja uma menina bonita, tome o medicamento e vá dormir. Vai ver que amanhã acorda melhor.
Levantou-se, foi à cozinha, e regressou com um copo de água, e as duas metades do comprimido.
Obediente, ela tomou a metade que ele lhe estendia, e depois dirigiu-se à casa de banho.
Miguel aproveitou para ir ao quarto buscar as suas roupas, para não ter que dormir vestido de novo.
Pouco depois a jovem voltou. Dirigiu-se ao quarto dizendo:
-Boa noite Miguel.
Boa noite Luísa.
Em silêncio a jovem fechou a porta.