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2.7.24

SAUDADES - ELVIRA CARVALHO




 SAUDADES


Tenho saudade

Do tempo em que a minha casa

era um palácio.

Tinha por rei o Amor

e  por rainha a Felicidade.

Tenho saudade, 

do tempo que passava

Sentada no chão

Com a cabeça nos teus joelhos,

sentindo a doce carícia

dos teus dedos no meu cabelo,

tão suaves como brisa de verão.

E em silêncio vivíamos

o amor que nos unia.

Tenho saudades, amor

dos passeios de mão dada

dos sorrisos cúmplices

em palavras trocadas.

Agora a nossa casa

já não é um palácio.

Os reis partiram contigo

as paredes perderam o calor

e um silêncio de chumbo

espalhou-se pela casa,

trazendo consigo a dor

 e a saudade. 

Elvira Carvalho

9.5.19

UM HOMEM DIVIDIDO - PARTE XLV


Horas mais tarde, tendo posto uma máquina de roupa a lavar, e arrumado as compras, Paula confecionou uma salada de presunto e queijo parmesão para o jantar e enquanto comia recordou a conversa com Cidália. Preocupava-a a situação da firma do pai. Apesar de nunca ter havido uma grande ligação afetiva entre eles, depois que Cidália lhe falou do grande amor que ele tinha tido pela esposa e do desespero em que a sua morte o mergulhara, começou a olhar o seu progenitor de outra maneira. Mas havia outra coisa que a atormentava. A saudade que sentia de António, o desejo quase doentio de ouvir a sua voz, de sentir o calor da sua mão, de ver o brilho dos seus olhos. Embora o negasse a todos os outros, não podia negar a si própria que se apaixonara pelo empresário. Recordou os dias em que ele esteve no Algarve e lhe telefonava todas as noites, sem ter nada de especial para dizer. E ela esperava a chamada com ansiedade. Se ao menos pudesse acreditar que realmente ele gostava dela, e que todo aquele encantamento não era apenas mais uma maneira de se vingar do pai dela.
Acabava de jantar, quando o telemóvel tocou. Admirou-se com a chamada do pai. Não se lembrava de ele lhe ter telefonado alguma vez desde que há sete anos saíra da casa paterna para morar sozinha.
-Estou…
-Boa noite Paula! A Cidália disse-me que tinhas interrompido as férias. Está tudo bem contigo, filha?
Sentiu um nó na garganta. Desde que se lembrava de ser gente não tinha memória de ter ouvido o pai chamar-lhe filha. Sempre a tratava apenas pelo nome.
- Está, não te preocupes. Estou demasiado habituada à vida agitada da cidade, a paz alentejana cansou-me.  
- Bom, fico contente que seja esse o motivo. Vou passar o telefone ao teu irmão que está ansioso por te contar as peripécias da pescaria de hoje.
-Mana, sabes que apanhei dois peixes? – perguntou o menino  eufórico.
-Ah! Sim? E eram grandes?
-Não muito. E sabes de uma coisa? Fiquei com tanta pena deles que pedi ao pai para os devolver ao mar.
- E ele devolveu?
-Pois foi. Mas parece que agora não vamos mais à pesca. É que os outros meninos também pediram aos pais para devolverem os seus peixes e alguns até choraram. Então ninguém trouxe peixes e disseram que para a próxima ficávamos em casa.
-Ó que pena!
-Pois é. Porque nós gostámos de andar no barco e até de pescar. Só que os peixinhos coitados estavam tão aflitos. Devias ver como se torciam todos, para se libertarem.
- Deixa lá, a próxima vez que o pai for pescar, telefonas-me e levo-te ao cinema.
-Que bom! És a melhor mana do mundo. E eu gosto muito de ti.
-Eu também. Mas agora são horas de ires para a cama. Dorme bem. Beijinho.
Desligou enternecida. Adorava o irmão, que pela diferença de idades podia ser seu filho. Sentiu um nó na garganta, e uma imensa vontade de chorar, ao pensar que nunca iria ser mãe. Dentro de uma semana faria trinta anos. Passara quatro anos da sua vida fazendo projetos para uma vida que a traição de Adolfo fizera ruir. Mal se recuperara desse desaire, apaixonara-se por um homem em quem não se atrevia a confiar. Decididamente não tinha sorte com a vida amorosa.


15.3.18

A TRAIÇÃO - PARTE XX




Ainda que vivesse uma eternidade, Odete não esqueceria aquele dia em Aveiro, pensava à noite, enquanto se olhava no espelho, já depois de ter escovado os dentes e de se ter preparado para dormir. Tinha sido uma tarde e uma noite fantástica, com João sempre pendente dela, sempre disposto a vê-la feliz. A julgar por aquele dia, qualquer pessoa diria que ele estava apaixonado por ela. Mas ela sabia que isso não era verdade. Quem ama não trai. Devia tratar-se de um jogo qualquer. E o pior é que ela continuava a amá-lo com a mesma paixão de outrora. A distância e a saudade, longe de lhe fazerem esquecer, pareciam ter avivado o seu amor por ele. E agora ali estava ela, preparada para dormir, mas com as pernas a tremer e sem coragem de se dirigir à cama que teria que partilhar com o homem, que ainda era seu marido.
Finalmente saiu da casa de banho e respirou fundo ao ver que estava sozinha no quarto. Apressada enfiou-se na cama, puxou o lençol até ao pescoço adotando a posição fetal, e fingiu dormir. Poucos minutos volvidos, João entrou no quarto, foi direto à cama, e puxando o lençol, deitou-se e apagou a luz.
No seu lado da cama, Odete relia mentalmente a carta de Inês, tantas vezes lida que a sabia de cor, tentando assim afastar o desejo que o partilhar da cama com o marido, despertara no seu corpo.
No outro lado da cama, de costas para ela, João apertava os punhos, amordaçando a vontade de se voltar e abraçar a mulher.  Tinha quase a certeza de que se o fizesse, ela não ia resistir. Mas não ia fazê-lo. Um dia, ela tinha-o amado. E sempre ouvira dizer que onda há cinzas há fogo. Tinha que conseguir avivar esse fogo. Conquistá-la de novo. Só assim podia ter a certeza de que não voltaria a abandoná-lo, logo que a mãe ficasse curada.
 Recordar o que sofrera, naquela altura, dava-lhe força para resistir. Não saber onde e com quem estivera naqueles quase quatro anos, era um espinho cravado na alma, que doía sem parar. Se ele soubesse, talvez amenizasse a sua dor, mas era demasiado orgulhoso para lho perguntar. Teria que ser ela a contar-lhe, quando viesse para ele de livre vontade. Se assim não fosse, seria melhor pedir o divorcio e por de vez um ponto final nos seus sonhos, por muito que lhe doesse.
Cansado acabou por adormecer.
Odete continuava acordada. Fingindo dormir mas atenta a todos os movimentos do marido, soube que ele tinha adormecido quando percebeu a alteração da sua respiração. Relaxou, esticou um pouco as pernas doloridas, e murmurou uma pequena prece ao Anjo da Guarda, hábito antigo, aprendido em criança com a sua avó paterna
Anjo da Guarda / minha companhia
Guardai a minha alma/ de noite e de dia.

3.3.18

A TRAIÇÃO - PARTE II





Estendeu as compridas pernas, em cima da mesa, recostou o corpo no sofá e fechou os olhos. Sentia-se tão só. Por onde andaria Odete? E como é que ela estaria? Será que era feliz? Ou, como ele, vivia atormentada com a saudade e a solidão? Durante aqueles anos, tinha recordado, vezes sem conta a sua vida, na tentativa de achar uma resposta, para o facto da sua esposa o ter abandonado.
João nascera numa família de origem modesta. Seu pai fora um militar da Guarda Nacional Republicana. Não uma alta patente, mas um humilde soldado, de posto provincial. A mãe lavava e passava roupa para fora, a fim de ajudar a equilibrar o orçamento que era tanto mais curto, quanto mais caros iam sendo os estudos do filho. Certo que ele ganhou sempre bolsas de estudo, mas ainda assim foi grande o sacrifício dos pais, até se formar em Medicina. E não foram muito melhores, os anos de internato hospitalar, enquanto se especializava em cardiologia.  Foram muitos anos de privações da sua parte, para que conseguisse sempre as melhores notas. Pena que todos os seus estudos, de nada tivessem valido ao seu pai que sofreu um ataque cardíaco fulminante, e, apesar da sua mãe ter chamado de imediato o INEM, chegou ao hospital já cadáver. João ficou então como único apoio da mãe. Completou trinta anos, sem quase ter vivido, pois a ânsia de saber mais, de ser o melhor, não lhe dava tempo para nada mais do que a profissão e o estudo.
Foi nessa altura, numa das raras festas a que foi, por ocasião do aniversário do seu amigo e colega Manuel que conheceu a mulher que, julgava ele, seria a mulher da sua vida. Inês era uma mulher muito bela. Tinha vinte e oito anos, era alta e esguia de cabelo loiro, e olhos azuis.
Apesar de achar que aquela mulher era uma verdadeira beleza, João não se mostrou muito entusiasmado, nem se juntou ao grupo de admiradores que a rodeavam, como se ela fosse uma rainha. Talvez fosse a sua indiferença, que instigou a vaidade feminina e levou a jovem a ir convidá-lo para dançar e a namoriscar com ele. Inês era filha única, de uma família rica, habituada a que todos lhe prestassem vassalagem, e se curvassem ante ela em adoração



Gente, por aqui chove intensamente. E pelos vossos sítios?

20.11.14

ROSA PARTE XV




Naquela manhã do dia 25 de Abril de 74, Rosa olhava-se no espelho e não se reconhecia. Apesar de não ter ainda 50 anos, Rosa estava cada dia mais velha, a face enrugada, os cabelos embranquecidos, o corpo magro e alquebrado, resultado de ser toda a vida, saco de pancada da própria vida. Pensava que já não tinha forças para se aguentar muito mais tempo. A sua família tinha-se desagregado.
Do marido, não sabia há muito, talvez estivesse preso, ou, quem sabe, tivesse morrido em qualquer prisão. As filhas casaram e embora não vivessem longe, estavam cada dia mais desligadas da casa materna, divididas entre o trabalho, o cuidarem da casa e dos filhos.
Dos dois rapazes mais novos, um conseguiu realizar o sonho de ser fuzileiro e encontrava-se num destacamento no Lungué-Bungo, no leste de Angola, enchendo de saudade e preocupação o seu coração de mãe. O outro, que era contra a guerra, fugira de salto para a França. Restava-lhe em casa um filho, cada dia mais doente, e uma filha adolescente.
Sacudiu a cabeça, como se quisesse abandonar todos os seus pesares, e dirigiu-se a casa do Sr. Doutor, onde ultimamente trabalhava a dias, sem sequer sonhar que no seu País estalara uma revolução que ia mudar toda a sua vida. Ela não sabia, mas a sua família não era muito diferente da maioria das famílias portuguesas pois, nessa altura, o País via-se sangrado da sua juventude. Uns partiam para a guerra do Ultramar, sem  nunca saber se voltavam, ou ficavam por lá, vítimas de uma mina ou de alguma bala emboscada. Outros fugiam para não serem obrigados a partir para uma guerra que não queriam nem entendiam.
Foi com surpresa e medo que Rosa ouviu da boca da patroa, a notícia da Revolução. Medo porque a "doutora"- era assim que ela gostava de ser tratada, embora o médico fosse o marido - lhe deu a entender que a revolução era muito má para o País e para eles, patrões, que talvez não pudessem continuar a dar-lhe trabalho. Rosa ficou muito preocupada. Se ficasse sem trabalho, como ia pôr comida na mesa? Mas quando chegou a casa, o filho explicou-lhe o que significava a revolução de uma maneira diferente. Falou-lhe do fim da guerra colonial, da abertura das prisões, do fim da P.I.D.E. e do sonho dum País mais igualitário. E o seu coração sofrido encheu-se de esperança.
Dois dias mais tarde, quando Rosa chegou a casa, no fim de mais um dia de trabalho, teve uma grande surpresa ao encontrar o seu João. Muito magro, o cabelo todo branco e o ar macilento, em nada se parecia com o homem com quem casara. Apenas o brilho nos olhos encovados, lhe lembrava o João de antigamente. Apesar da alegria do reencontro, Rosa estava preocupada com a saúde do marido. E tinha razão, porque se ele recuperava aos poucos as mazelas físicas,  as psicológicas continuariam a persegui-lo durante muitos anos.
Dias depois, Rosa e João comemoravam pela primeira vez na sua vida o 1º de Maio em liberdade. E dois meses depois, podiam abraçar o filho António, que regressara da França, ao saber que o novo governo estava a negociar a independência das colonias e que, por isso, não teria que ir para a guerra.


Continua




Para os amigos que já leram o conto, inicialmente ele terminava aqui. Como porém o final não me agradava muito, pois aparecia demasiado repentino, agora ele tem mais um capitulo. O próximo será o final

20.4.09

EM DIA ESPECIAL...




Para uma amiga especial, e para todos os outros que por aqui passam. Espero que gostem. Para ver o filme, por favor desliguem a musica na lateral. Boa Semana