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19.2.18

ENTRE DUAS DATAS - PARTE II



- Mana, mana, já viste, esta senhora tem tantas saias! -disse de repente a pequenita.

Ela olhou, a bonita nazarena, que estava junto à irmã. Sorriu, e a mulher devolveu-lhe um sorriso rápido, que tinha muito de nervoso. Logo os seus olhos voltaram-se de novo para o barco que estava já bem perto do sítio onde iria fundear. O Gazela, era um belo veleiro de três mastros, Talvez o mais belo barco da Faina Maior,(1) que arrogante e belo passeava majestosamente pelo rio Coina, com as suas velas brancas tremelicando ao vento, como se foram lenços gigantes acenando. Era o navio mais antigo da frota, mas era também o mais belo. Nele, ela via, toda a primitiva beleza das naus, com que os portugueses saíram em busca de novos horizontes.

 Nesse ano estivera prestes a afundar-se durante um temporal, e, talvez por isso houvesse ainda em cada olhar, um misto de receio a toldar a alegria da chegada.
 A ela, apaixonava-a, ver como aqueles homens de aspeto duro e rude, que lá longe travavam uma luta diária, contra o mar, que tem tanto de belo, como de traiçoeiro, quando pisam terra se transformam nos mais delicados, para abraçar quase sem jeito, as suas mulheres, os seus filhos, e as suas famílias.
 O barco estava agora fundeado. Os pescadores saltam rapidamente para as lanchas, que os irão levar até à pequena ponte de madeira, onde a família os espera com ansiedade.
 - Anda cá querida, não te debruces que podes cair à água - chamou ela a irmã que se afastara um pouco.
 Nesse preciso momento chegaram à pequena ponte as primeiras lanchas, cheias de pescadores.
- Manel, meu rico Manel - gritou uma velhota mesmo ao pé dela.

-Paizinho, paizinho, - chamou um garoto mais distante.

E há abraços e beijos, risos e lágrimas, naqueles rostos queimados pela vida rude do mar. E chega outra lancha, e outra, e mais outra ainda. E há enlevo e amor nos olhos de toda a gente. Naquele momento, tudo foi esquecido, apenas se vive o momento presente. Lá no rio, as velas do barco, ondulando ao vento parecem acenar gritando:

- Adeus até para o ano!

                                                              Foto AQUI



1) Faina Maior, era a designação dada à Pesca do Bacalhau, que não se fazia com rede como hoje. Era um trabalho muito duro e solitário. Cada navio, levava tantos dóris como homens para a pesca. O dóri era esse barquito da imagem. Quando chegavam ao seu destino, o barco fundeava, e os dóris eram lançados ao mar. Cada um levava apenas um homem, e algumas provisões, e a pesca era feita à linha, com uma longa linha de vários anzóis. Só voltavam ao barco, quando o dori estava cheio ou as provisões de comida e água se esgotavam, ou se houvesse ameaça de tempestade. Não havia naquela altura coletes salva-vidas, mas ainda que os houvesse não teriam servido de muito, já que as águas geladas da Groenlândia, levavam apenas três minutos a matar um homem pelo frio. 
Muitos ao longo dos anos ficaram por lá vitimas de uma tempestade que parecia surgir do nada. E se mais não ficaram, era porque o pescador ao abrir o bacalhau e encontrar no bucho pedras, sabia que uma tempestade se ia formar e remava para o navio para se proteger. Na verdade o bacalhau, sempre que pressentia a tempestade, engolia pedras para se manter no fundo do mar, imune à mesma.

24 comentários:

chica disse...

Momento lindo do próximo reencontro aqui tão bem delineado! beijos,chica

noname disse...

E hoje o dia já valeu, se mais nada houver, pelos ensinamentos que aqui deixou.

Beijinho Elvira

Cidália Ferreira disse...

Boa tarde!
Mais uma maravilhosa leitura! Amei ler

Beijos e uma excelente semana.

Anete disse...


Um novo conto cheio de bonitos horizontes...
Penso que seja um enredo esperançoso e com fortes emoções!
Boa semana, Elvira, e tomara a internet não a atrapalhe nesses dias...
Bjs

_ Gil António _ disse...

Ansioso por continuar a leitura.
.
* Aroma da papoila ... E a outra face do sentimento *
.
Uma semana feliz.

Edum@nes disse...

O trabalho agora é diferente,
mais leve do que era outrora
quem o desconhece há muita gente
que sem saber como era fala agora!

Tenha uma boa tarde amiga Elvira.
Um abraço.

Bell disse...

Que lindo!!!

Deu vontade de degustar frutos do mar.

bjokas =)

Pedro Luso de Carvalho disse...

Olá, Elvira!
Essa sua história, "Entre duas datas", é uma narrativa muito boa. Aguardemos os próximos capítulos.
Parabéns, minha amiga.
Uma ótima semana.
Um abraço.
Pedro

Meu Velho Baú disse...

Venho retribuir a simpática visita que fez ao meu blogue.
Fiquei maravilhada pela sua capacidade narrativa maravilhoso mesmo.
Uma Boa Semana

Joaquim Rosario disse...

boas
já quase não há adjetivos para descrever este começo de historia que vai com certeza ter o mar como fundo .
JAFR

Janita disse...

Cá estou a acompanhar mais uma história, desta feita ligada à pesca do bacalhau e do sacrifício que tal trabalho exigia aos pescadores e às suas famílias, pela longa ausência de meses passados no mar.
Curiosa essa informação que nos dá, acerca da 'esperteza' do peixe engolir pedras para permanecer no fundo e escapar às redes.
Vivendo e aprendendo, com tudo e com todos. É essa a riqueza da blogosfera.
Um abraço, boa semana

A Nossa Travessa disse...

Minha querida Elvirinhamiga

A pesca do bacalhau era uma epopeia carregada de heroicidade. Ainda vi os doris e ouvi o senhor tenente Santana imediato do navio de três mastros do Santa Isabel, (que era meu vizinho no segundo andar direito da Rua Filipe da Mata, 122) contar-me a história da pesca do bacalhau., como tu a retratas.

Para quê fazer mais comentários, se isto diz tudo. Apenas agradecer-te

Muitos queijinhos do teu amigo e admirador

Henrique, o Leãozão

Os olhares da Gracinha! disse...

É maravilhoso ler a descrição que faz nos seus contos! bj

Emília Pinto disse...

Começo por te agradecer as flores que deixaste para os amigos e a minha já está numa jarrinha com água na sala, Cá estou para acompanhar mais um dos teus contos este muito relacionado com a vida dura dos teus pais na seca do bacalhau. Li desde o começo e, como sempre, acompanharei até ao último capítulo. Um beijinho e tudo de bom, querida amiga.
Emilia

Diana Fonseca disse...

Deve ser um alívio quando eles voltam.

Manu disse...

Uma história primorosamente contada em que os detalhes fazem com que visualizemos toda a difícil realidade da pesca.
Fico à espera de novos desenvolvimentos.

Abraço

Isa Sá disse...

A passar por cá para acompanhar mais uma história.


Isabel Sá
Brilhos da Moda

Francisco Manuel Carrajola Oliveira disse...

Uma bela história que vou acompanhar. As fotografias são fantásticas.
Um abraço e boa semana.

Andarilhar
Dedais de Francisco e Idalisa
O prazer dos livros

Lúcia Silva Poetisa do Sertão disse...

Reencontro é sempre lindo, emocionante e recheado de felicidades partilhadas.
Beijos carinhosos!

Ailime disse...

Boa noite Elvira,
Como era difícil a vida dos pescadores do bacalhau!
Sempre ouvi falar nisso.
Gostei imenso de ler a nota com explicações que eu desconhecia.
Obrigada!
Um bom momento de leitura da sua maravilhosa escrita.
Beijinhos,
Ailime

Andre Mansim disse...

O legal dos seus escritos são as várias informações que eles carregam.
Falam de coisas que a gente não conhece, mas é tão claro que parece que vimos e vivemos tudo isso.

lis disse...

Imagino a alegria de pais filhos e amigos nessa volta a casa, principalmente, dada as dificuldades do trabalho.
Seguindo o conto vamos acompanhando e gostando
beijo

Gaja Maria disse...

Adoro a foto. Conheço bem a Nazaré, mesmo aqui ao lado :)

Rosemildo Sales Furtado disse...

Engolir pedras para se manter no fundo do mar e se livrar das tempestades. Desta eu não sabia. Aqui, além de ler belos contos, a gente também aprende sobre diversos assuntos. Gostando e aguardando os acontecimentos.

Abraços,

Furtado