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31.8.19

A HISTÓRIA DE UM PAR DE BOTAS...DA TROPA VI



                                               foto minha.

Em 1962 Manuel continuava a viver no velho barracão de madeira, assente em pilares de cimento, junto ao rio Coina, Era, o lenhador da Seca, o homem que transformava os grossos troncos de azinheira, trazidos do Alentejo, em cavacos, que alimentavam os grandes fogões das "maltas" dos homens e mulheres. Pois o Manuel, não só cortava e rachava a lenha, como a transportava num carrinho de mão para estes locais, e também para a casa do Capitão, gerente da Seca, e para as casas dos residentes fixos no local, os empregados de escritório, os electricistas, os vigias e o posto de Guarda Fiscal, que asseguravam o bom funcionamento da Seca durante todo o ano. Manuel era um homem magro, de baixa estatura, mas de uma força extraordinária.
 Causava espanto, a agilidade com que ele manejava uma marreta de 16 quilos, por ele, baptizada de segunda-feira. A mulher do Manuel, era simultaneamente porteira,e trabalhadora da Seca,  já que era ela quem abria o portão, para o pessoal que vindo do Barreiro, encurtava caminho, passando pela caldeira do Alemão, (onde hoje se encontra a zona ribeirinha da Polis ) e seguindo junto ao rio, até ao portão de entrada na Seca, que lhe ficava à porta. Quando passavam as últimas pessoas, fechava o portão à chave, e seguia com elas para o trabalho de lavar, salgar, banhar, estender ou enfardar o bacalhau. À tarde saía um pouco mais cedo para ir abrir o portão, por onde o pessoal passava de regresso a casa. Cabia-lhe ainda, a ingrata tarefa de revistar os cabazes que o pessoal trouxera com o almoço, não fora alguém esconder nele algum bacalhau. Na Seca havia mais dois portões. O principal que ligava a Seca à Telha e o único servido por uma estrada por onde circulavam os carros e os camiões e o terceiro junto ao antigo moinho de maré. Este portão separava a Seca da Quinta do Himalaia, e dava entrada ao pessoal que vinha de Palhais e Santo António, atravessando a mata do Himalaia.



                                              foto minha

Nessa época, o  casal tinha três filhos com pequena diferença de idade e ainda criava um dos irmãos mais novos da mulher que tinha quase a idade da sobrinha mais velha. Dos finais de Março a Setembro, com a inactividade da Seca, a mulher do Manuel não tinha trabalho, e o ordenado dele, não dava para sustentar seis bocas. O pequeno terreno que desbravara ao mato, ajudava com os legumes, e a mercearia ele mandava pôr no rol, que pagava religiosamente quando a próxima safra começava, agora já com a ajuda da filha mais velha, e do cunhado, que já trabalhavam na safra. Estávamos em Maio, num daqueles dias quentes, que mais parecem de Julho, quando à Seca, chegaram dois polícias numa carrinha, em busca do Manuel. Ele estava no trabalho, no armazém da lenha, e lá chegados os polícias deram-lhe voz de prisão, e levaram-no sem sequer poder avisar a família. Entrar algemado na carrinha, foi para o Manuel uma vergonha e dor tão grande, que ele pensou não resistir.

10 comentários:

noname disse...

Caramba! Nem sei o que dizer. Após todos esses anos, ainda a tropa?

Boa noite, Elvira

Ailime disse...

Boa noite Elvira,
Que história de vida!
Manuel um homem honesto, sério e trabalhador ver-se assim, de repente, preso deve ter sido muito difícil.
Muito sofreu o Manuel e a família.
(E ainda há quem se queixe nos dias de hoje)!
Beijinhos e um bom fim de semana.
Ailime

Tintinaine disse...

Coitado do Manel! Sofreu as passas do Algarve para sobreviver e criar a família. Naqueles tempos era assim, vida de pobre não era nenhuma pêra doce.
Bom fim de semana, Elvira!

Maria João Brito de Sousa disse...

Continuo bem presa a esta fascinante história verídica.

Abraço, amiga.

chica disse...

História empolgante e muito bem contada! Co0mo era difícil a vida! beijos, chica

esteban lob disse...

Tus historias, amiga Elvira, adquieren el interés por lugares tan atrayentes a la distancia como por ejemplo el río Coina, o la "Caldeira do Alemao". Aparte del interés que genera la trama.

Feliz fin de semana.

Majo Dutra disse...

Que coisa mais mesquinha! Que vida!
Nos tempos duros do após II GGuerra Mundial.
Falo um pouco dela hoje no A Vivenciar.
Já recordei o enredo.
Que falta de humanidade!
Tudo pelo melhor.
Abraço
~~~

Francisco Manuel Carrajola Oliveira disse...

Continuo a acompanhar com interesse e aproveito para desejar um bom fim-de-semana.

Andarilhar
Dedais de Francisco e Idalisa
Livros-Autografados

Larissa Santos disse...

Tenho capítulos em atraso. tenho que me orientar, no entanto penso que já segui esta, mas vou ver :))

Hoje:- As estrelas podem ser enganadoras.

Bjos
Votos dum óptimo Fim-de-semana

Duarte disse...

Como boa conhecedora da zona que és, consegues meter-nos nesse ambiente como se o estivéssemos vendo.
Ainda que caia na reiteração tenho que alabar as qualidades narrativas e o modo como argumentas as tuas criações. Os meus parabéns.
Abraços de vida cá de casa com muito carinho.