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29.8.18

FOLHA EM BRANCO - PARTE XXXV





                     Fachada em Sevilha. Foto minha


- Não digas asneiras. Foi só um pesadelo, - disse tentando que se acalmasse
- Não… não, Miguel.- Soluçava a jovem. - É verdade.  Eu lembrei, eu lembrei...
- Lembraste o quê?
-Tudo. Lembrei de tudo.
Continuava chorando com intensidade abraçada a ele.
O homem sentiu-se perturbado. Não sabia, se pela revelação que a jovem acabava de fazer, se pelo calor emanado do corpo que continuava abraçado ao seu.
-Tens a certeza de que não tiveste um pesadelo?
-Não é pesadelo Miguel. Antes fosse.
 Afastou-a de si. Sem brusquidão, mas com firmeza. Levantou-lhe o queixo obrigando-a a olhar para ele.
- Não acredito no que disseste. Tem de haver uma explicação. Por favor, acalma-te. E conta-me tudo o que te lembres.
Afastou-lhe o cabelo da cara, roçando as costas da mão pela face da jovem, numa leve caricia, que teve o condão de a acalmar um pouco.
 – Nunca conheci a minha mãe. Morreu de parto, quando eu nasci.
Meu pai era um homem muito apaixonado e nunca a esqueceu. Por isso não voltou a casar. Emigrou para Inglaterra, e eu fiquei com os meus avós, os pais da minha mãe. Os avós paternos viviam longe, numa aldeia no norte, e nunca cheguei a conhecê-los. Vivi com meus avós até aos sete anos.  Por essa altura, minha avó sofreu um AVC e partiu pouco depois. O avô não sabia cuidar dele, muito menos de mim. Foi nessa época que o pai regressou. Gastou todas as suas economias na compra da casa, para onde fomos viver os dois. Ele sempre se esforçou para que não me faltasse nada. Era como se quisesse suprir a falta da minha mãe, assumindo ele mesmo o papel dos dois.  De tal forma, que apesar de não ter conhecido a minha mãe, fui sempre uma criança feliz.
-Ó Miguel, eu amava-o tanto!
Ele, não disse nada. Limitou-se a apertar-lhe suavemente o ombro, num gesto de apoio.
A jovem continuou:
- Cresci saudável e feliz. Fui sempre uma boa aluna, nunca tive problemas na escola. Fiz o secundário, e entrei para a Universidade. Escolhi comunicação e jornalismo. Estava  no segundo ano.
Este ano pela Páscoa, meu pai que estava de férias, convidou-me para ir com ele a Andaluzia, assistir às cerimónias da Semana Santa. Era a primeira viagem que fazíamos juntos, depois que me tornei adulta, e era também uma espécie de prenda de anos pois tinha acabado de fazer vinte anos.
Calou-se por momentos. Respirou fundo, e continuou:
- Foi uma semana maravilhosa. Andámos por Málaga, Marbella, Sevilha, Granada, Sierra Nevada. Visitámos museus,e catedrais, e assistimos a  procissões grandiosas.
Calou-se. As recordações eram cada vez mais dolorosas.
-Eu tenho a carta de condução, desde os dezoito anos, mas não tenho carro.
  Apesar disso, e sempre que o desejava, o pai emprestava-me o carro dele, e estava habituada a conduzi-lo.



  

13 comentários:

chica disse...

Lembranças doloridas...coisas se encaixando na sua cabeça!
Bjs chica

noname disse...

Fico à espera, para ver o seguimento da história, que parece dolorosa.

Boa tarde

Meu Velho Baú disse...

Suspense.....
A memória voltou...
Beijinhos

Anete disse...


Muito suspense!!! Os pensamentos estão se organizando e logo terão esclarecimentos importantes... O drama tá prosseguindo bem...
Hummm, a psicologia com a sua complexidade!...
O meu carinho

esteban lob disse...

En nuestros tiempos no todos los padres tienen tanta fortaleza para suplir ante los hijos la falta de la madre.Es una interesante historia, Elvira.

Un beso austral.

Roselia Bezerra disse...

Boa tarde, querida amiga Elvira!
Nossa! Jamais poderia imaginar um desfecho assim. Muito bom!
Aguardando os próximos...
Tenha dias felizes e abençoados!
Bjm fraterno e carinhoso de paz e bem

Larissa Santos disse...

...temo que tenha sido violada, daí a razão... :/

Bjos
Votos de uma boa noite.

maria disse...

Estou em branco nesta folha, passo o trocadilho, preciso de me actualizar, passados que foram dois meses ser ler blogs, tenho de, aos poucos e poucos, fazer marcha atrás para conseguir andar para a frente, as suas histórias assim o exigem, Elvira.

Abraço e tenha uma boa noite.

Fá menor disse...

Tudo se resolve.

Estou a gostar, como sempre!

Beijinhos.

Rui disse...

Finalmente lá consegui pôr a leitura em dia, pelo menos para já ! :)

E precisamente no momento em que "ela" (?) recupera a memória (?), completamente ou talvez ainda não.
Três reacções notórias :
O facto de se emocionar quando se falava da família ;
A sirene da ambulância ;
Provavelmente o facto de achar Lisboa linda, mesmo antes da entrada na cidade !

Creio que a partir de agora o factor "amor" vai começar a prevalecer mais acentuadamente na cabeça da jovem e,... evidentemente, por Miguel ! :)

Grande abraço, Elvira e bom regresso ! :)
Que a sua saúde tenha andado bem e se sinta em boa recuperação. Que a antecipação do seu regresso não tenha nada a ver com isso.

Cidália Ferreira disse...

Será que sofreram um acidente? Ui

Beijos- Boa noite

Kique disse...

Esta historia continua interessantíssima
Bjs

Hoje em Caminhos Percorridos - AMOR LINDO...

Ailime disse...

Boa tarde Elvira,
Muito emocionante todo este capítulo.
Gosto imenso da forma e pormenores com que enriquece cada episódio desta instigante história.
Beijinhos,
Ailime