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6.6.19

UM PRESENTE INESPERADO - PARTE XV





Ricardo deixou-se cair pesadamente na cadeira. Ele e João, o irmão nunca se deram muito bem. Apesar de serem gémeos. A gravidez da mãe fora de risco, e as coisas não correram muito bem na hora do parto.  A mãe esteve muito mal, o pai chegou a dizer ao médico que se não fosse possível salvar os filhos, que salvasse a mãe. Felizmente os dois, eram prematuros,  nasceram saudáveis, mas a mãe esteve muito doente, e levou largos meses para se recompor. Não conseguia tratar dos dois bebés e em casa não havia dinheiro para contratar uma empregada, pois naquela época uma grave crise, se estendera por toda a Europa, e Portugal à beira da bancarrota, tivera que apelar para o FMI, a fim de conseguir sobreviver. O negócio do pai, estava quase na ruína, a maioria das pessoas, deixara de utilizar os seus automóveis, passando a utilizar os transportes públicos. A madrinha do João, que não podia ter filhos, pediu para o levar para sua casa, e os pais acabaram por o deixar ir. Os pais não  o deram para adoção, e quiseram ir buscá-lo logo que a mãe melhorou, mas a comadre convenceu-a para que o deixasse ficar mais um tempo, ela tinha melhores condições para o criar, pelo menos mais uns meses até à festa do aniversário, já que eles estavam prestes a fazer dois anos. Aconteceu que quando a mãe o levou para casa, João estava demasiado apegado à madrinha, chorava noite e dia, e ela convenceu-os a devolverem-lho com o argumento de que a criança estava infeliz, e ela podia criá-lo até ele ter entendimento para perceber as coisas.
  Não foi assim. João rejeitou os pais e tinha ciúmes do irmão. Dizia que eles  o tinham rejeitado e se tinham livrado dele ainda bebé, porque só gostavam do irmão. E estava sempre a fugir para casa da madrinha.
Na escola, fazia todos os disparates de que se lembrava para o prejudicar. Isso durou dois anos, depois a madrinha convenceu os compadres a deixarem-no definitivamente com ela,  dizendo que não era bom para nenhum dos miúdos a situação. Pouco tempo depois mudou-se para Coimbra, e embora a mãe fosse vê-lo todos os  meses, Ricardo nunca mais o viu, até ao seu regresso de Angola. Só nessa altura, soube que o irmão viera viver com os pais há quase dois anos, logo após a morte da madrinha e trabalhava num escritório de uma firma de importações e exportações. Mas também nessa altura os dois não se entenderam. João, a quem a madrinha dera uma vida de pequeno príncipe, coisa que os pais nunca lhe deram a ele, era um revoltado, continuava com ciúmes dele, e Ricardo chegou a dormir na oficina, de modo a passar o mínimo de tempo possível em casa, para evitar discussões que só serviam para fazer os pais sofrerem. Felizmente uns meses depois, João foi de férias para o Algarve, conheceu uma francesa, por quem se apaixonou, e quando ela acabou as férias, partiu com ela. Mandou mais tarde, uma carta aos pais, contando que se tinha casado lá, e estava a trabalhar com o sogro.
Nos últimos doze anos, Ricardo poucas vezes o viu. Quando o pai morreu, ele veio de França com a esposa, e resolveu levar a mãe com ele. Claro, era uma empregada a quem não teriam de pagar.
Depois disso, só voltara a vê-lo em Bordéus quando fora ao funeral da mãe. Desde aí não sabia nada dele, nem sequer se vinham ou não de férias, embora a mãe, antes de morrer, lhe tivesse dito, numa das conversas telefónicas, que ele lhe fazia semanalmente para saber como estava, que o compadre, tinha oferecido à filha uma casa em Campolide, para passarem férias. No funeral da mãe, conhecera a cunhada, bem como os dois sobrinhos, mas não sentiu por eles qualquer empatia.
 Por muito que lhe custasse a acreditar, o amigo tinha razão. Os seus pais eram ambos filhos únicos, pelo que ele não tinha nenhum outro familiar direto que não fosse o João. Mais uma vez o irmão fizera asneira e o culpara a ele.

23 comentários:

dercy lyne disse...
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noname disse...

O sangue, nem sempre é leal, e esta história o atesta.

Boa noite, Elvira

chica disse...

Gostando muito dessa trava envolvente! Beijos, chica

Pedro Coimbra disse...

Curiosamente conheço bem dois irmãos gémeos idênticos (a filha de um deles, quando era pequenina, perguntava se tinha dois pais) que não se dão nada bem.
Vale que um vive em Lisboa e outro em Macau.
Bfds

Maria João Brito de Sousa disse...

Passo de fugida, pois terei de começar a preparar-me para ser conduzida a mais uma consulta hospitalar e a lentidão que a minha situação me impõe é perfeitamente inenarrável.

Abraço, amiga Elvira.

teresa dias disse...

Irmãos gémeos... agora a trama complicou-se...
Beijo.

Francisco Manuel Carrajola Oliveira disse...

Estou a acompanhar e a gostar.
Um abraço e continuação de uma boa semana.

Andarilhar
Dedais de Francisco e Idalisa
O prazer dos livros

Os olhares da Gracinha! disse...

Parece que há muito para esclarecer!!! Bj

Olinda Melo disse...


Dois irmãos desavindos! E gémeos ainda por cima, separados quase à nascença...
Grande reviravolta. :)

Bj

Olinda

António Querido disse...

Dois meus vizinhos gémeos davam-se tão bem que era raro o dia que não houvesse pancadaria naquela casa, um deles emigrou e todos os anos vinha visitar o irmão.

O meu abraço

dercy lyne disse...
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Cidália Ferreira disse...

Pois, está-se mesmo a ver que foi o irmão!!lol

O silêncio, desnorteia certos caminhos. [POETIZANDO] .
Beijos e um excelente dia!

Isa Sá disse...

A passar por cá para acompanhar a história.


Isabel Sá
Brilhos da Moda

Meu Velho Baú disse...

Estes irmãos tiveram uma infância muito diferente...
E, agora vamos ver no que vai dar
Está bem interessante
Beijinhos

dercy lyne disse...
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Edum@nes disse...

Nesse capítulo tudo de menos bom aconteceu. Até o FMI esteve presente?

De certeza saudades não deixou,
penso que não estarei enganado
de juros uns milhões arrecadou
ainda agora continua endividado!

Tenha uma boa tarde, quase de invernia, amiga Elvira. Um abraço.

Janita disse...

O meu suspense agora gira todo em torno da conversa que Ricardo vai ter com a tia da menina. Será que lhe vai contar tudo sobre o irmão?
Veremos, tudo fica nas mãos do destino... que chama Elvira Carvalho :)

Um abraço.

Ailime disse...

Boa noite Elvira,
Está a fazer-se luz, mas vou aguardar o desenrolar dos acontecimentos.
Com muita imaginação e criatividade a sua escrita.
Beijinhos,
Ailime

Roselia Bezerra disse...

Boa noite de paz, querida Elvira!
Não esperava um irmão gêmeo e ficou excelente seu conto nessa expectativa. Gostei da criatividade até aqui.
Vamos ver os seguintes.
Imagino um final feliz para os tios... Tomara!
Tenha dias felizes!
Bjm carinhoso e fraterno de paz e bem

Sandra May disse...

Questão complicada, o sentimento de rejeição traz a consequências, quase sempre desastrosas...
Estou compreendendo esses irmãos gêmeos, penso que sim!

Rosemildo Sales Furtado disse...

Há males que vêm para o bem. O Ricardo ganha a sobrinha e a mãe/tia também. Rsrs.

Abraços,

Furtado

Gaja Maria disse...

Que irmão....

Lúcia Silva Poetisa do Sertão disse...

Irmãos com personalidades completamente diferentes! Pense numa história maravilhosa!
Beijos!