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10.4.23

CICATRIZES DA ALMA - PARTE XXXVI

 


Quando às oito horas da manhã, Anabela entrou na cozinha, encontrou a mesa posta para tomar o pequeno-almoço mas apenas Joaquim se encontrava ali.

-Bom dia, - saudou.

-Bom dia, menina - respondeu o homem com tristeza.

-Anabela, por favor! Aconteceu alguma coisa? A sua esposa?

-Está arrumando o quarto do doutor.

-Tão cedo? - estranhou a jovem. E como ele está?

-Mal. Deve ter tido outro daqueles pesadelos.

-Que pesadelos, Joaquim?

- Não sei, menina. Quando ele saiu do hospital, nos primeiros tempos, eu dormia na sala ao lado com a porta entreaberta de modo a atendê-lo se ele precisasse de mim, durante a noite. E quase todas as noites o ouvia gritar, entrava no quarto e encontrava-o em grande sofrimento embora estivesse a dormir.

 Dizem que não se devem acordar as pessoas com pesadelos, mas eu, que Deus me perdoe, acordava-o sempre, pois não tinha coragem de ver o seu sofrimento. Porém, ele nunca comentou comigo o que o atormentava e a menina sabe como é, se ele quisesse contar tentaria ajudar, mas se não o fazia eu não me ia pôr com perguntas. Afinal ele é o nosso patrão, não um familiar.

- Provavelmente tem a ver com o acidente, - refletiu Anabela. Acontece muitas vezes, que pessoas que sofrem acidentes traumáticos, como o que o doutor Tiago sofreu, revivem em sonhos a tragédia. Às vezes, se não têm ajuda psicológica, até durante anos.

- É horrível, o doutor grita, treme como se estivesse a arder em febre, e o suor encharca-o.  E depois que acorda o olhar está esgazeado e ele olha para nós como se não soubesse onde está e não nos conhecesse.

Naquele momento Isilda entrou na cozinha dizendo:

- O doutor fechou agora o chuveiro.

Joaquim afastou-se em direção ao quarto enquanto a esposa lavava as mãos e começava a preparar o pequeno-almoço para o patrão.

Anabela acabou de comer, levantou-se da mesa e disse:

-Vou caminhar um pouco. Estarei de volta antes da hora do tratamento do doutor.

Saiu pensando no que o caseiro lhe contara sobre o doente.  Os pesadelos não eram incomuns em vítimas de acidentes traumáticos. Porém quando se tornavam recorrentes, quebravam o animo do doente e atrasavam a recuperação.

 Tinha de falar com o doutor Azevedo, ele devia insistir com o sobrinho para aceitar a ajuda de um psicólogo.                                                                  

7 comentários:

Pedro Coimbra disse...

Um ser humano atormentado.
As dores são mais físicas ou emocionais?
Boa semana

Tintinaine disse...

Ora cá temos a Anabela de volta!
Depois das festas e dos excessos, disto ou daquilo, é bom regressar à normalidade.

Janita disse...

Vim, li, e vou seguir caminho, algo atormentada com tanto sofrimento. Este é fictício, mas e os outros de que nos chegam notícias? Mundo cruel este!

Um abraço, Elvira!

chica disse...

Após um trauma, ficam essas sequelas... Tratá-las é preciso!
beijos, linda semana, chica

Ailime disse...

Boa tarde Elvira,
Anabela uma profissional a sério e sempre atenta que não descura os problemas.
Gostando e seguindo esta história que tantos traumas provocou.
Beijinhos e uma boa semana com saúde.
Ailime

lourdes disse...

Uma enfermeira valente, que não se deixa amedrontar pelo mau humor do doente e um doente que está a começar a "amolecer". A coisa ainda se vai compor para os dois. O que virá aí a seguir?
Bjs

teresadias disse...

Dá para sentir o sofrimento do Tiago.
Bjs