Meia
hora depois, voltou ao quarto. O homem dormia embora se movesse agitado. Luísa voltou para a cozinha, a cabeça mergulhada num oceano de interrogações. Porque mostrara ele uma tão grande aversão pelo hospital? Teria algum trauma de infância? E quem seria? Ele dizia que não se lembrava de nada. Mas
seria verdade? Ou esconderia a sua identidade por motivos que só Deus saberia? E
o que fazia, perdido numa noite de tão grande tempestade? Ter-se-ia evadido de
alguma cadeia? "Que estupidez, mulher. Os prisioneiros não têm fatos daqueles nem
camisas de seda", - murmurou.
Mas porque não tinha com ele quaisquer documentos? Teria tido algum acidente? Mas se assim fosse não ficaria na estrada à espera de socorro? A sua casa não ficava propriamente perto da autoestrada, e a estrada que dava acesso até à sua porta, estava assinalada como troço sem saída. O melhor mesmo era telefonar ao doutor Fonseca, e se o médico entendesse que devia ir para o hospital chamava a ambulância e pronto. Por muito que o homem não quisesse ir, ela não ia arriscar. Vamos que ele lhe morria em casa? Ia ver-se metida numa série de problemas.
Mas porque não tinha com ele quaisquer documentos? Teria tido algum acidente? Mas se assim fosse não ficaria na estrada à espera de socorro? A sua casa não ficava propriamente perto da autoestrada, e a estrada que dava acesso até à sua porta, estava assinalada como troço sem saída. O melhor mesmo era telefonar ao doutor Fonseca, e se o médico entendesse que devia ir para o hospital chamava a ambulância e pronto. Por muito que o homem não quisesse ir, ela não ia arriscar. Vamos que ele lhe morria em casa? Ia ver-se metida numa série de problemas.
Pegou
no telemóvel e procurou nos seus contactos o nome do clínico. Foi atendida pela
sua assistente
-O doutor
Fonseca está com uma doente, e não gosta de ser interrompido. Pode deixar-me o
seu contacto que o doutor liga-lhe depois.
Luísa
deu-lho. Ela conhecia o médico, quase desde que tinha ido viver para aquela casa. Um dia, estava
a pintar junto ao rio, quando a dona Aurora, esposa do médico, a encontrara
numa das caminhadas que fazia diariamente por ali. Era uma senhora muito simpática.
Parara a ver a evolução da tela que pintava e depois elogiara o seu traço, as cores, enfim, o seu trabalho. A partir dali encontraram-se muitas vezes e Aurora sempre
parava junto dela para dois dedos de conversa. Até que um dia a convidou para
lanchar em sua casa, e Luísa que não conhecia ninguém na zona, aceitou agradecida.
Trocaram confidências. Aurora sentia-se muito só. Ser mulher de um médico, fora de uma cidade grande, ou mesmo de uma vila importante, não era fácil. Fonseca era o único médico num raio de vários quilómetros para norte, e para sul até Penacova. A qualquer hora do dia ou da noite era chamado e há anos que não tinham férias. “Como Deus não quis que tivesse filhos, só posso esperar que o meu António, se resolva a reformar-se, para não ter que viver os meus últimos dias tão só como sempre vivi” confessara-lhe uma vez. Um dia apresentara-lhe o marido. Era um homem de média estatura, meio careca, de sorriso fácil e ar bonacheirão que inspirava simpatia e confiança. Tinha a certeza que o médico lhe ligaria, logo que possível e isso deixou-a um pouco mais tranquila.
Trocaram confidências. Aurora sentia-se muito só. Ser mulher de um médico, fora de uma cidade grande, ou mesmo de uma vila importante, não era fácil. Fonseca era o único médico num raio de vários quilómetros para norte, e para sul até Penacova. A qualquer hora do dia ou da noite era chamado e há anos que não tinham férias. “Como Deus não quis que tivesse filhos, só posso esperar que o meu António, se resolva a reformar-se, para não ter que viver os meus últimos dias tão só como sempre vivi” confessara-lhe uma vez. Um dia apresentara-lhe o marido. Era um homem de média estatura, meio careca, de sorriso fácil e ar bonacheirão que inspirava simpatia e confiança. Tinha a certeza que o médico lhe ligaria, logo que possível e isso deixou-a um pouco mais tranquila.
Meia
hora mais tarde o médico retornou a chamada.
-Bom
dia, Luísa. Aconteceu alguma coisa? Viu a minha mulher?
-
Bom dia doutor. Não vi a sua esposa. Deveria tê-la visto?
-Esta
manhã ela estava muito preocupada consigo por causa da tempestade, e disse-me
que se o tempo melhorasse, ia até aí ver se estava bem.
-
Não veio, e nem é aconselhável que venha com este tempo. Já lhe telefono, para que fique descansada. Doutor tenho aqui um doente a arder em febre. Seria possível o doutor vir
examiná-lo.
-Claro
que sim. Tenho ainda um paciente para consulta, mas logo que termine vou para
aí.
Muito
obrigado, doutor. Então até logo.
No ultimo capítulo vocês perguntavam porque o Gil não queria ir para o hospital se não se lembrava de quem é.
Talvez que no seu subconsciente as memórias das cirurgias que sofreu em tempos, ou do tempo em que a sua esposa morta, esteve ligada às máquinas para salvar a vida da filha que tinha no ventre, se imponham apesar de conscientemente não ter recordações. A mente humana é muito complexa.
No ultimo capítulo vocês perguntavam porque o Gil não queria ir para o hospital se não se lembrava de quem é.
Talvez que no seu subconsciente as memórias das cirurgias que sofreu em tempos, ou do tempo em que a sua esposa morta, esteve ligada às máquinas para salvar a vida da filha que tinha no ventre, se imponham apesar de conscientemente não ter recordações. A mente humana é muito complexa.
15 comentários:
Tomara que a Luísa não conte ao Gil que chamou o médico, caso ele entretanto acorde. É bem capaz dele fugir e a história retroceder.
Obrigada pela explicação final, que veio de encontro ao que eu tinha pensado e dito, Elvira. Como sabe sou uma leitora atenta. :)
Tenha uma noite descansada.
Boa noite Elvira,
Acompanhando com muito interesse.
Uma história que cativa.
Beijinhos,
Ailime
Bom dia
Cada dia que lemos mais um capitulo , mais a ansiedade aumenta .
JAFR
Em relação à sua explicação final, subscrevo as palavras da Janita.
Deixei a pergunta no ar porque me pareceu interessante que explorasse um pouco essa fobia do Gil Gaspar.
Forte abraço, Elvira.
Está a ficar interessante.
Continuação de uma boa semana.
Andarilhar
Dedais de Francisco e Idalisa
O prazer dos livros
Tal como disse a nossa mente é incrível... Bj
Delicia-me a qualidade do texto e o próprio enredo.
Quantas vezes não temos receio de fazer algo sem saber muito bem porquê...
A mente humana é demasiado complexa, assim como a escrita... A poesia tem a arte de cativar pela elegância, num charme e perfumado que delicia os sentidos. A prosa tem o desafio de não "aborrecer" o leitor, de o atrair a querer seguir e de ter um fio condutor e uma coerência que faça parecer possível o acontecimento, mesmo quando se escreve sobre algo de irreal... Este conto, até aqui, está extraordinário e assim que tiver u pouco de maior disponibilidade, vou aos seus arquivos para ver o começo da aventura do Gil.
Abraço e boa inspiração
A adorar ler este conto minha querida Elvira
Bem haja
Aos poucos descobrindo os sonhos do personagem/Gil Gaspar...
Estou gostando...
Bjs e alegre quarta-feira...
Olá, Elvira!
Gostei desta sua narrativa tão atual em termos de literatura, na qual as suas personagens encaixam-se perfeitamente no mundo de hoje, em que vivemos.
Uma boa continuação da semana, amiga Elvira.
Um abraço.
Pedro
Seguindo a história com muito interesse. Abraço Elvira
Eu fiz essa pergunta. Porque será que o Gil não quer ir para o hospital? No capitulo anterior. Só depois me lembrei de que seria pelo trágico acidente que originou a morte de sua esposa e o tempo em que permaneceu no hospital.
Luisa chamou o doutor, acho que fez bem. Gil precisa de ser tratado e só o médico o poderá fazer.
Tenha uma boa noite amiga Elvira. Um abraço.
Também eu vou acompanhando a história e só me queixo por ter que esperar 48 horas que ela continue.
A minha saúde vai como sempre, o segredo é aguentar as dores. Fiz uma TAC e vou consultar uma fisiatra para saber se há maneira de combater as dores sem tomar anti-inflamatórios. E a vida continua!
Acompanhando esta história encantadora!
Beijos!
Enviar um comentário