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8.2.16

MANEL DA LENHA - PARTE III


foto do google


Manuel tinha agora oito anos. Não parecia ter mais de seis, mas era rijo e comilão. 
"Está sempre com fome. Até parece que tem bicha solitária" - queixava-se Piedade, que cada dia tinha mais dificuldade em dar de comer aos filhos.
Na aldeia faltava a comida, o trabalho era pouco e mal pago, e mesmo quando havia algum dinheiro, era difícil encontrar o que pôr na panela. Para os que tinham um pedacinho de chão, sempre havia umas “berças” ou umas batatas, para una sopa. Para ela que nada tinha, era cada vez mais difícil enganar a fome dos filhos. Com ela não se importava. Mas os filhos, especialmente o mais novo, parecia que tinha nele, toda a fome do mundo.
Por essa altura, Laurinda era já uma mulherzinha, com os seus quinze anos, desejosa de sair da aldeia, de conhecer outras terras e outra vida. João continuava enfezadinho e já quase parecia ser da mesma idade do irmão. 
 À aldeia vizinha do Pisão, chegou como todos os anos, Alfredo Santos, um dos capatazes da Seca do Bacalhau, da Azinheira, situada nos arredores do Barreiro, e que todos os anos dava trabalho a mais de duzentas mulheres, e cinquenta homens. 
Por essa razão, sempre que chegavam os finais de Agosto, ele percorria algumas aldeias, no concelho de S. Pedro, donde ele era natural, e que conhecia bem, para engajar pessoal para trabalhar na Seca. 
Era um trabalho sazonal, que durava de início de Outubro, até finais de Março. Trabalho duro, mas ordenado certo quando o Inverno não era demasiado rigoroso, porque se chovesse muitos dias seguidos, podia ficar-se sem trabalho uma semana inteira.  É que naquela época, o bacalhau secava em extensas mesas de cimento e arame ao ar livre. E se começasse a chover, o pessoal ia lavando o bacalhau, dois ou três dias. Depois tinha que se parar até voltar o bom tempo para o pôr a secar.
Porém, como não pagavam alojamento, que era proporcionado pelo patrão, sempre juntavam alguma coisa para o resto do ano, quando os campos não davam trabalho. Por causa da doença de João, e também porque teria que comprar bilhetes para ela e os filhos, e dinheiro era coisa que ela nunca tinha,  Piedade nunca arriscara inscrever-se para ir trabalhar na Seca, mas a filha insistia a todas as horas, que queria ir. Naquele dia, Laurinda veio com a madrinha, a Graça do Pisão para pedir à mãe que a fosse inscrever para a próxima safra. A madrinha tomaria conta dela, e assim a mãe poderia ficar descansada. Depois de conversar com a comadre, lá foram as três falar com o Ti Alfredo,  dar o nome da jovem, e pôr o dedo na autorização, já que a filha era menor, e a mãe não sabia escrever.
                                                     

17 comentários:

chica disse...

O que acontecerá com Laurinda por lá? Fico curiosa! Gostando de ler ! bjs, chica

Edum@nes disse...

Era comilão, teria pouco para comer,
não era rico, era pobre
trabalhava para o rico mais enriquecer
havia nesse tempo fartura de fome
nenhuma mentira estou a dizer

Oxalá! Laurinda tenha sorte,
não se perca lá seca
nem se iluda por ser pobre
por alguma falsa promessa!

Tenha um bom dia de segunda-feira, amiga Elvira, um abraço,
Eduardo.

António Querido disse...

OBRIGADO AMIGA, pela receita, estou a melhorar, mas se amanhã chover é uma chatice porque não sou "pássaro de gaiola"! Peço desculpa, este comentário nada tem a ver com o seu post, mas li e gostei!
Com o meu abraço.

Silenciosamente ouvindo... disse...

Estou seguindo atentamente mais uma nova história.
Bjs.
e votos de que se encontre bem.
Irene Alves

Emília Pinto disse...

Ainda não consegui por em ordem a minha " vida blogueir", Elvira, mas já li algumas coisas aqui. Embora muitíssimo atrasada aqui te deixo os parabéns pela linda netinha e os votos de que ela tenha muita sorte na vida, muito amor e saúde. Aqui está mais um belo conto que acompanharei com atenção. Espero que a Laurinda tenha mais sorte do que a mãe. Beijinhos, querida amiga e tudo de bom. Até sempre
Emilia

aluap disse...

A essas couves, hoje chamam-lhe galegas, mas em tempos remotos eram conhecidas por berças. Obrigada por lembrar o termo, Elvira.
Era assim, muitas famílias não tinham terras suas, mas o Deus e a Pátria parece que queriam isso mesmo!
Bjos.

Fê blue bird disse...

Vamos lá ver o que vai acontecer à Laurinda.
Um beijinho amiga Elvira

Os olhares da Gracinha! disse...

Sua descrição é tão real!
Adoro sua escrita...bj

Socorro Melo disse...


Miséria, fome, doença, sofrimento, lágrimas... Uma realidade que nos comove e e assusta, pois, sabemos que muitos ainda hoje enfrentam esses desafios na vida, em todoo mundo.

Parabéns, Elvira!

Elisa disse...

Sempre aqui ...a passar um bom momento no seu blog . Beijinho
elisaumarapariganormal.blogspot.com

madrugadas disse...

Quadros reais da vida na aldeia nesse tempo.

Lu Nogfer disse...

Oi Elvira.
Não posso ainda opinar por não ter lido ainda as outras partes mas por esta ja sinto quea história é muito comovente.
Gosto mt do jeito que escreve... eu volto...

Beijinhos

Lua Singular disse...

Oi Elvira,
Estou correndo atrás do bonde, mesmo meio atrasada chegarei até o final, se Deus quiser e Ele quer. Que vida sofrida tem Piedade, esperando que sua filha tenha melhor sorte do que ela.
Como dizia minha mãe: *Quem mede a água e não mede fubá o angu sai encaroçado *.Quanta sabedoria tinha na sua simplicidade.
Estou amando seus contos em séries...
Obrigada
Lua Singular

Teresa Brum disse...

Está aguçando minha curiosidade amiga Elvira, o que está por vir para a Laurinda?
Um abraço.

Zilani Célia disse...

CONTINUANDO.

http://. zilanicelia.blogspotcom.br/

Portuguesinha disse...

Surpreendente.
Os detalhes. A quantidade de informação.

É bom que termine esta história depressa porque já me apetece ler de fio a pavio :)

Rosemildo Sales Furtado disse...

Parece que alguém começou a ter um pouco de piedade da Piedade. DEUS é PAI.

Abraços,

Furtado.