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11.11.20

CILADAS DA VIDA PARTE LVII

 


Quatro semanas se passaram depois desta conversa que aproximou emocionalmente os dois irmãos. Quatro semanas em que muita coisa aconteceu na vida deles, e dos que com eles conviviam.

João continuava a passar diariamente as horas em que as enfermeira faziam as refeições com Teresa e fiel ao seu desejo de num futuro próximo pedir-lhe que se casasse com ele, decidiu que ela devia saber como tinha sido a sua vida, quem tinha sido e quem era. Por sua vez Teresa, também abriu o livro das recordações e falou da sua infância na aldeia, da mãe e da avó, ambas desiludidas com o sexo oposto, contara que ela própria tivera uma má experiência amorosa, quando estava na faculdade e que tudo isso contribuíra para a sua decisão de que nunca  iria querer saber de homem algum na sua vida. Essa fora a razão que a levara a querer ser mãe solteira, e a procurar a clínica de Procriação Medicamente Assistida.

Com o convívio diário e com todas as confidências trocadas os dois sentiam que começavam a estar unidos por qualquer coisa maior, mais íntima e mais pessoal do que a responsabilidade de criarem as três crianças.  

Inês ia regularmente todos os fins de semana vê-la, levava-lhe o correio, falava-lhe de como o negócio estava a decorrer e contava-lhe novidades de clientes e empregadas. Às vezes levava o filho e Teresa ficava radiante com o menino que crescia a olhos vistos e aumentava o vocabulário de uma visita para a outra.

Também João tinha ido jantar uma noite com o irmão e a futura cunhada, com quem simpatizou de imediato. Esperava que Teresa fizesse os três meses e tivessem a conversa que decidiria o seu futuro a fim de os convidar a irem passar um dia lá a casa para lhos apresentar e estreitar os laços de sangue que os uniam.

E chegou o dia em que Teresa ia ter a sua consulta das doze semanas. De mútuo acordo, os dois combinaram com Sandra, que ele acompanharia Teresa à consulta, e ele a chamaria depois se a médica achasse necessário dar-lhe novas instruções.

Já na consulta a médica fez-lhe a ecografia das doze semanas depois de lhe ter medido a tensão arterial, a ter pesado e lhe ter feito várias perguntas sobre como se tinha sentido durante aquelas quatro semanas.

Depois de vários minutos em que a observou atentamente disse:

-Está tudo bem com os vossos bebés. Vejam, aqui estão eles, minúsculos ainda, medem apenas cinco centímetros, mas já estão completamente formados da cabeça aos pés.  Vejam.

- Já se consegue ver se são meninos ou meninas – perguntou João.

- Vamos ver – disse a médica e depois de uns segundos apontou o ecrã. -  Este é um menino sem duvida, reparem aqui - disse ampliando a imagem - Este outro tem o cordão umbilical a impedir a descoberta, e este como vêm tem as pernitas cruzadas. Pode ser que se deixem ver na próxima ecografia. Mas às vezes não se deixam ver até ao momento em que nascem

Mas como são gémeos se um é menino, os outros também devem ser, ou não? – perguntou João.

-De modo algum. Os gémeos só são obrigatoriamente do mesmo sexo quando são gémeos monozigóticos.  Ou seja, o óvulo é fecundado por um só espermatozoide que se divide em dois depois de fecundado. São formados na mesma placenta dividem o saco amniótico, possuem o mesmo genoma e o mesmo DNA, e por isso são tão iguais que também se chamam idênticos. Podem distinguir-se apenas pelas impressões digitais, que são diferentes. Os vossos filhos são gémeos dizigóticos uma vez que não dividem a placenta nem o saco amniótico o que quer dizer que houve três óvulos, fecundados por três espermatozoides diferentes e assim tanto podem ser três meninos, como dois meninos e uma menina ou o contrário.

 A consulta está terminada, a Teresa recuperou muito bem, agora o risco de aborto foi reduzido, embora não esteja totalmente afastado e o repouso continue a ser recomendado, já não precisa estar o tempo todo na cama. Claro que não pode fazer esforços como subir escadas ou carregar pesos, deve evitar viagens grandes, mas já pode dar pequenos passeios, apanhar sol por causa da vitamina D. Continua com as vitaminas, o ácido fólico e volta para a consulta das vinte semanas a menos que surja algum problema. Vai continuar acompanhada com a enfermeira?

- Até que os bebés nasçam pelo menos, - respondeu João.

- Isso é bom. Pode sair e mandá-la entrar?


À margem:

Hoje dia 11 deslocar-me-ei ao hospital De Santa Maria para ver como está o olho do transplante, e ver se me vêm o outro que me está a dar grandes problemas.  Vamos ver.

12.8.20

CILADAS DA VIDA - PARTE XVIII



- Mas também não pudemos disputar a criança como se ela fosse um objeto.
- E tu - disse ele tuteando-a pela primeira vez - deves ter já tomado uma decisão para me vires procurar. Posso saber qual a tua ideia?
- Deixa-me em paz durante os próximos três meses, - ela respondeu usando a mesma forma de tratamento. Esquece a ideia de processar o Centro Clínico, de pores o caso em praça pública e pensa na melhor solução para resolvermos o caso, pondo sempre em primeiro lugar o bem-estar da criança. Prometo-te que farei o mesmo. Depois disso, reunir-nos-emos e tomaremos uma decisão.
- Estás em vantagem, falaram-te de mim, disseram-te quem sou. Eu não sei quem ou como és. Quem me diz que durante estes três meses, não desapareces e nunca mais sei nada de ti, nem do bebé?
- Isso é uma tontice e tu não me pareces nada tonto. Em primeiro lugar se tencionasse fazer o que dizes, tê-lo-ia feito, imediatamente após saber o que se passava, e quando descobrisses a minha identidade, eu poderia estar em qualquer parte do mundo. Como já te disse, embora os meus recursos financeiros não se assemelhem aos teus, tenho o suficiente para viver razoavelmente bem em qualquer lugar,  até precisar voltar ao trabalho. E em vez disso, o que fiz foi vir ter contigo, procurar um entendimento. Em segundo lugar, não sou tão ingénua, que não saiba que mal ponha os pés para fora deste escritório, porás alguém a investigar-me e a vigiar-me, para que te informe, tão logo faça, o que pensas que vou fazer. Podia evitar-te o trabalho e dar-te todas essas informações, mas sei que não acreditarias em mim e farias as tuas próprias investigações na mesma.
Mirou-a de tal modo que Teresa sentiu um arrepio. Era como se quisesse mergulhar dentro dela, chegar ao seu coração, quiçá à sua alma. Ela ainda não o conhecia. Não sabia quão difícil era enganar aquele homem, mas não precisava nenhuma bola de cristal, para ver que era um tipo duro, dono de uma vontade férrea, alguém que ela não gostaria de ter como inimigo.
-Põe-me à prova – disse-lhe com voz rouca. - Fala-me de ti, diz-me quem és, e o porquê de teres recorrido à Procriação Medicamente Assistida. És uma mulher jovem, inteligente e bonita. Porque não te casaste e engravidaste de modo natural?
- Como sabes, que não me casei?
- Estaríamos aqui, a ter esta conversa, se fosses casada? - retorquiu 
Teresa pensou que ele tinha razão. Se fosse casada não teria recorrido àquele processo para engravidar. Resolveu arriscar.
- Nasci de mãe solteira, numa pequena aldeia, no vale de Lafões, perto das Termas de S. Pedro do Sul, onde vivi até terminar o Secundário. Depois vim para Lisboa, viver com uma tia-avó, para poder frequentar a Universidade. 
No último ano do curso, tive que abandonar os estudos e voltar à aldeia, para cuidar da minha mãe, gravemente doente. Depois da sua morte, regressei a Lisboa, para casa dessa minha tia.  A intenção era terminar o curso, mas estávamos a meio do ano letivo e enquanto esperava pelo fim desse ano e início do próximo, empreguei-me numa pastelaria e apaixonei-me pela vida de empresária de tal modo que quando o dono decidiu vender o negócio, com a ajuda da minha tia, que não tinha outros parentes que não eu, comprei-o. Sou a dona da pastelaria e padaria “Flor da Avenida”, na Avenida Estados Unidos da América.  Recorri ao PMA, porque desde menina sempre sonhei ser mãe e não estava interessada em nenhuma relação. O que realmente não esperava é que a vida me armasse esta cilada. Satisfeito?





E hoje a minha Princesa mais nova faz 1 ano






27.12.18

UMA ÁRVORE DE NATAL ESPECIAL






Estar aborrecido com o que não tens é desperdiçar o que tens.
Ken S. Keyes





Era um dia frio, depressivo em vários sentidos. O Natal estava a aproximar-se e, como mãe solteira de três crianças a viver de apoios financeiros esporádicos, eu tentava fazer com que o pouco dinheiro que tinha esticasse em várias e diferentes direções. A minha mãe e o meu pai, juntamente com outros parentes bondosos, fariam com que os rapazes tivessem presentes, e a grande festa de Natal seria em casa do meu irmão. Por isso, eles cuidariam que o essencial não faltasse.
A festa de Natal anual feita na escola pouco contribuiu para me animar e, no caminho para casa, o vento cinzento e tempestuoso, arrastando a minha velha e pequena pick-up na estrada, apenas tornava as coisas pior.
Naquela noite, a questão seria colocada, como era todas as noites, por um ou por todos os rapazes: quando faremos a nossa árvore de Natal? E disseram-me de forma inequívoca que o Pai Natal não teria onde colocar os presentes se não tivéssemos uma árvore de Natal… Infelizmente, descobri que mesmo as árvores mais pequenas para venda nos Escuteiros estavam muito para além do meu orçamento.
Pequenos e grandes ramos agitavam-se em todas as direções, tornando a condução ainda mais desafiadora. Pareciam empurrar-se uns aos outros para fora do caminho, como se estivessem a fazer uma corrida para ver qual deles poderia saltar para a minha frente em primeiro lugar.
Muitos eram compactos, vacilando de um lado para o outro, como que a decidir o caminho a seguir. Alguns deles até se pareciam um pouco com uma árvore de Natal… De repente, fui arrastada para a berma da estrada, saí do carro e aguardei que um deles viesse ter comigo. O primeiro que vi era de tamanho médio, de cerca de sessenta centímetros de altura e noventa centímetros de largura. Amarrei-o na parte de trás do camião, e comecei a andar pelo campo, à procura de ramos ainda mais pequenos e com uma forma mais adequada. Não sabia muito bem o que ia fazer com eles, mas cheguei a casa com quatro e levei-os para a sala de estar. Quando as crianças chegaram, questionaram-me sobre a pilha de ramos a formarem um tufo denso e castanho…

— Esta vai ser a nossa árvore de Natal — disse eu, sabendo que seria realmente difícil convencê-los. — Será uma árvore como nenhuma outra e nenhum dos nossos amigos vai ter uma igual! E até ficaria muito surpreendida se nenhum fotógrafo viesse cá para lhe tirar uma foto…
Os meus filhos ouviram com educação, olhando fixamente o tempo todo para as quatro manchas de densa folhagem. O olhar de descrença no rosto deles era o mesmo que exibiram quando lhes disse que as cenouras eram boas para os olhos e que os espinafres iriam torná-los fortes…
No dia seguinte, tinha de pensar em algo antes que eles chegassem a casa da escola. Andei em torno das ramagens várias vezes, estudando a sua forma e tamanho individuais. A mais pequena era pontiaguda, e com uma fina corda branca pendurei-a no teto em frente da janela da sala de jantar, com o fundo arredondado virado para o chão. As três mais redondas foram penduradas à volta, dando a ilusão de árvores suspensas, com muito espaço em baixo para os presentes do Pai Natal.
Mas ainda não estava parecida com uma árvore de Natal!
Encontrei então uma lata de spray de tinta branca e alguns brilhantes multicoloridos que sobraram de um projeto da escola. Pendurei um lençol sobre a janela para protegê-la da tinta, pulverizei a “árvore” e, então, cuidadosamente, polvilhei-a com os brilhantes. Os arbustos eram demasiado frágeis para luzes tão pesadas. Então, cautelosamente, enfiei pequenas luzes brancas em volta do perímetro de cada um deles. O enfeite refletia as luzes, dando um efeito cintilante. Adicionei apenas os ornamentos mais pequenos, e o nosso anjo tradicional, que já vira melhores dias, encaixou-se perfeitamente no ponto mais alto do arbusto pontiagudo. Ficou maravilhoso!
As crianças olharam pela janela antes de entraram em casa, e correram para ver a minha criação.
— Parece um sonho bom! — disse o mais novo, aprovando.
Todas as crianças do bairro vieram naquela noite e ouviram-se ooohed! e aaahed! em torno da nossa árvore de Natal.
Felizmente, este seria o último ano em que teríamos um orçamento tão apertado. A nossa situação familiar mudou, e começou a haver dinheiro para uma grande árvore de Natal na nossa nova casa grande. Ficámos gratos por isso. Mas tempos difíceis tinham exigido criatividade, e não teríamos descoberto isso se tal não tivesse acontecido.
Os meus filhos são agora homens e têm as suas próprias famílias. Mas todos os anos, pelo Natal, alguém conta a história da nossa peculiar árvore de Natal. Como a mãe queria algo diferente, procurou arbustos ao longo de quilómetros pelos campos abertos, debaixo de uma enorme ventania, tentando apanhar os mais perfeitos. Estava cansada das mesmas árvores de sempre…
Sorrimos todos, e até hoje concordamos que aquela foi a árvore de Natal mais bonita de sempre!



Jackie Fleming