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23.4.21

CASAMENTO POR PROCURAÇÃO - PARTE XXV




Dias depois, Quim foi convocado pelo advogado dos tios para a leitura do testamento. Os tios tinham-lhe deixado tudo. A sua casa, o restaurante e um bom dinheiro. Excetuando uma pequena quantia que destinaram à empregada, e uma cláusula em que determinava que eles deveriam continuar  a mantê-la na casa, já que era quase como família.
O casal, mudou-se então para a casa, que fora dos tios, por cima do restaurante. Quim continuou a ser o chefe, Sofia, tratava de todos os assuntos relativos à gerência. O negócio ia bem, a conta bancária aumentava. Três anos depois, nasceu a  pequena Catarina. E quando esta estava prestes a completar um ano, aconteceu em Portugal, a tantas vezes sonhada revolução, que depôs o regime fascista e colonialista. Era Abril, os cravos floriram e com eles a libertação de um povo, martirizado pela fome e pela guerra.  As imagens correram mundo, e eles viram-nas pela televisão e renovaram as esperanças de poderem voltar a Portugal.
Se a guerra colonial acabasse, Quim podia voltar.  Era o sonho comum do casal. Voltar à terra que os vira nascer, rever parentes e amigos. E então aconteceu. A independência das colonias tornou-se irreversível, mas a paz tão sonhada não. Angola, Moçambique e Guiné, as três maiores colónias, tinham vários movimentos de libertação, e todos queriam o mesmo. Ser o seu movimento aquele que assumiria o poder, e isso teve como consequência que a guerra recrudesceu, levando os muitos portugueses lá residentes a fugiram para Portugal. Mais de meio milhão de portugueses, muitos deles nascidos naquelas possessões africanas, chegaram a Portugal, sem emprego, sem dinheiro, sem outros bens, que não a própria vida. Enquanto o governo procurava dar resposta, aquela avalanche de gente, a precisar de pão, roupas, casa, enfim do básico para sobreviver, alguns acolhiam-se ao abrigo de familiares, ou com algum sacrifício, emigravam para outros países, certos que estavam de não terem futuro em Portugal.  
Quim e Sofia, que na altura planeavam vender a casa e o restaurante, e regressar à terra que os vira nascer, e onde tinham os seus familiares, no intuito de se estabelecerem na terra-mãe, receando que a conjuntura do país naquele momento difícil, não lhes fosse favorável, adiaram  a decisão.
Porém poucos meses depois, Sofia voltou a ficar grávida, e eles ficaram sem outra opção. Se queriam realizar o sonho do regresso, era aquela a ocasião. Quim e Sofia, não queriam que o nascimento do novo bebé ocorresse em França.  Acreditavam que os filhos, iam crescer e sentir que a França era a sua terra, o seu país. Mais velhos, não quereriam ir viver para uma terra que embora fosse a dos seus pais, eles não conheciam, nem sentiam como sua. E os pais, fatalmente iriam ficar onde os filhos estivessem. Por isso era urgente o regresso. Venderam tudo, transferiram para Portugal o seu dinheiro e os três acompanhados de Idalina, a empregada, chegaram à aldeia no mês de Agosto do ano da graça de mil novecentos e setenta e seis.


E continua...

 

11 comentários:

Pedro Coimbra disse...

Quantos Quim e Sofia existiram!!!
Bfds

noname disse...

Que reviravolta interessante :)

Bom dia, Elvira

" R y k @ r d o " disse...

A descolonização foi muito mal feita. A falta de experiência dos governos, como era normal, dificultou a transmissão de poder. Muitos ficaram sem nada e regressaram a Portugal. Muitos morreram quando lhes ocuparam as quintas e as casas. Enfim. Nem é bom recordar por um lado, mas muito bom recordar por outro. Era uma guerra imbecil, imprópria, injusta.
Continuando a aconpanhar.
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Cumprimentos poéticos
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Pensamentos e Devaneios Poéticos
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Tintinaine disse...

Telefonei ao compadre Eduardo. Ele está um pouco doente (esqueleto e coluna) e muito desanimado. Além disso tem alguma dificuldade de visão.
A PDI não perdoa!

Jaime Portela disse...

Apanhados pelas convulsões políticas da colónia, tinham mesmo que regressar a Portugal.
Continuo a gostar da história e da sua escrita. Continue...
Bom fim de semana, querida amiga Elvira.
Beijo.

Maria João Brito de Sousa disse...

E está a continuar em beleza, este "Casamento por Procuração"!

Forte abraço, Elvira!

Emília Pinto disse...

Mas que volta a vida destes dois levou, Elvira! Lembro muitissimo bem desta época e foi em 1976 que eu e minha familia emigramos para o Brasil. Época feliz , por um lado, e por outro, muitos problemas econômicos, falta de empregos, empresas a fecharem e tantos, tantos a virem para cá, fugindo a novas guerras. Vamos lá ver se os nossos amigos não se arrependem. Beijinhos e um bom fim de semana, com SAÚDE
Emilia

Cidália Ferreira disse...

As voltas que a vida dá! :)
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Gotículas celestiais ...
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Beijo e um excelente fim de semana.

Emília Simões disse...

Boa tarde Elvira,
Um episódio muito bonito que nos traz muitas recordações dum momento tão importante na História do nosso País!
Adorei!
Um beijinho e saúde.
Ailime

teresadias disse...

Belo capítulo!!!
Eu cheguei a Lisboa em Março de 1975, grávida de 4 meses.
Beijo.

Rosemildo Sales Furtado disse...

Continuo acompanhando e gostando desse Casamento Por Procuração. Acredito que tenham tomado a decisão certa ao voltarem para Portugal.

Abraços,

Furtado