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2.11.20

CILADAS DA VIDA - PARTE L III

 


-Peço desculpa, doutora; - disse Teresa encaminhando-se para a marquesa – está lá fora o pai. Será que ele pode assistir à ecografia?

- Pode e deve. Afinal não foi ele que assumiu a responsabilidade de tratar de si, para que não fosse internada?

- Sandra, pode ir chamá-lo por favor, - pediu a jovem

- A vossa história é muito curiosa, -disse a médica quando a enfermeira saiu. Nunca tive conhecimento de nenhum caso igual.

Teresa não chegou a responder pois bateram à porta e à ordem da médica, João entrou na sala, e depois de cumprimentar a obstetra, tomou lugar junto da jovem.

- Bom, - explicou a doutora, enquanto punha o gel na parte visível da barriga de Teresa. - Às oito semanas não há ainda muito para os pais verem, pois só às doze é que os bebés estão inteiramente formados, mas é essencial para o médico ver se está tudo bem, e confirmar a idade gestacional do embrião, que é sempre duas semanas inferior ao tempo de gravidez. Muito mais tratando-se de uma gravidez múltipla. Bom, cá estão eles, vejam aqui, aqui e aqui, - disse, o rato apontando os locais no monitor.  Vamos ouvir os seus corações.

Uns segundos depois a médica deu o exame por terminado, desligou o aparelho e olhou-os. A jovem olhava embevecida o seu ventre como se pudesse ver através da pele o que lá ia dentro. O homem tinha a mão de Teresa entre as suas e os olhos semicerrados talvez para esconder a emoção que sentia.

- Está tudo bem com os bebés, a Teresa pode levantar-se, - disse a médica dando-lhe uma toalha de papel para que limpasse o ventre. E enquanto retirava as luvas acrescentou.

-É melhor o senhor sair agora e pedir à sua enfermeira que entre. A consulta está quase a terminar pode aguardar na sala de espera.

- Obrigado, doutora - disse apertando a mão que a médica lhe estendia.

João saiu e Sandra entrou. A sala de espera, ali no corredor das consultas era pequena. Um quadrado com dez cadeiras ocupando dois dos lados, no outro duas casas de banho.  A parte que dava para o corredor sem parede. Claro, havia a enorme sala onde estiveram anteriormente, junto à entrada, onde se encontravam os gabinetes de inscrição, e foi para aí que ele se dirigiu, uma vez que aquela estava cheia. Estava por demais emocionado. Desde criança sempre fora um solitário. Mesmo na escola, nunca se aproximava muito dos outros meninos, que chegavam sempre acompanhados pela mãe ou pelo pai. Ele ia sozinho. Apenas nos três primeiros dias de aulas, no primeiro ano, a mãe de Olga o levou. Mas o pai soube e logo a proibiu.

“A vizinha fica proibida de levar o rapaz à escola. Nem você nem a sua rapariga. Se eu que sou pai, não o levo, é porque entendo, que ele tem que aprender a desenrascar-se sozinho. Era o que me faltava, fazerem do rapaz um maricas, sempre agarrado às vossas saias” 

Ainda hoje, ele parecia estar a ouvi-lo gritar, mais do que dizer aquelas palavras à dona Hortense.

Com medo do pai, ele começou a isolar-se. Não ia para a rua brincar com os outros miúdos ao fim da tarde, e mesmo na escola nunca procurava entrar nas brincadeiras dos colegas.

Encontrou uma fuga à realidade quando aprendeu a ler. Com os livros ele viajava por terras estranhas, conhecia crianças felizes. Não como ele, a quem a mãe tinha abandonado, e às vezes perguntava-se porque o pai não fizera o mesmo. Afinal, também não parecia gostar dele.

Bom, verdade seja dita, nunca lhe faltou a comida, embora fosse a D. Hortense quem fizesse as refeições, ele sabia que era o pai que atestava a dispensa. Também nunca lhe faltou roupa, calçado e livros. Até um computador lhe comprou quando ele tinha 12 anos.

O pior foi depois. Quando ele começou a entusiasmar-se e  a não querer ir aos fins de semana para a oficina para ficar no computador.

Naquele momento Teresa e Sandra regressaram da consulta e ele apressou-a a ir buscar o automóvel.


Aos amigos que me visitam lembro que estamos em Novembro, e que não devem esquecer que apesar da pandemia há outras doenças que também matam, e que maia vale prevenir do que remediar.

Este símbolo estará no Sexta durante todo o mês para lhes lembrar isso mesmo, tal como esteve o mês passado o símbolo rosa. 


17 comentários:

Fá menor disse...

Muito bom, amiga Elvira. Sempre seguindo.

Bom mês de Novembro!
Beijinhos.

Ailime disse...

Boa noite Elvira,
Um episódio que apreciei bastante.
Os bebés estão bem.
A vida de João na infância muito traumatizante. Agora já está a ter a recompensa.
Beijinhos e bom novembro.
Ailime

noname disse...

Emocionante este capitulo.

Boa noite, Elvira

chica disse...

Traumas de infância do João. Mas agora a emoção desse lindo momento! Ótimo! Vale a lembrança do Novembro Azul! beijos, chica

Maria João Brito de Sousa disse...

Tudo parece estar a correr às mil maravilhas para este casal unido por uma cilada da vida...

Forte abraço, Elvira.

Tintinaine disse...

A isto chama-se "navegar de vento em popa", tudo corre às mil maravilhas!
Quanto ao mês de Novembro ser dos homens ... não gostei. Pensei que tinha direito a 12 meses por ano!

isabel disse...

desconhecia o mês de Novembro azul , obrigada pela partilha|||

e a historia continua cada vez mais interessante.

grata

Isa Sá disse...

A passar por ca para acompanhar a historia.

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

Amiga Elvira

Seguindo e adorando.
boa semana.
beijinhos
:)

Edum@nes disse...

Os acontecimentos do passado continuam matutar na cabeça de João. Há coisas por mais que se tente. Nunca se conseguem esquecer!

Tenha uma boa tarde amiga Elvira. Um abraço.

Janita disse...

Isto é a vida a deslizar... docemente sobre rodas.
Maravilha de capítulo.:)

Boa noite e um abraço, Elvira.

Teresa Isabel Silva disse...

Gostei bastante deste capítulo!

Bjxxx
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Gaja Maria disse...

Boa semana Elvira

teresa dias disse...

Bem, a emoção do João chegou até aqui...
Quanto ao mês de Novembro, marido alertado!
Beijo Elvira, boa semana, protejam-se.

lis disse...

Estamos seguindo essa gravidez com atenção e bom é que parece vai ser lindo o momento dos bebês virem ao mundo rs o papai continua feliz.
Muito bom Elvira _ sem atropelos, por favor rsrs
beijos

João Santana Pinto disse...

Um passado com fantasmas, um presente sólido e sorridente e um futuro promissor

Lúcia Silva Poetisa do Sertão disse...

Muita emoção neste capítulo e lembranças que atingem o coração dele.
Abraços fraternos!