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Quando Rosa saiu do hospital, o padre que a tinha casado, arranjou-lhes um dos oito fogos, que ele próprio mandara construir para alguns dos seus paroquianos, que viviam em condições miseráveis. A casa ficava na vila, longe portanto da Seca, mas Rosa achou que lhes tinha saído a sorte grande. A casa, composta por uma boa cozinha, casa de banho e três quartos, com água, luz e chão de tacos, pareceu-lhe um palácio. A vida do casal começava a melhorar. A filha mais velha foi servir para Cascais e só vinha a casa uma vez por mês. A segunda também foi servir para casa dum Sr. Doutor, lá mesmo no Barreiro. Dos três mais velhos, ficava em casa o rapaz que era muito frágil e que tinha sempre “uma ninhada de gatos no peito”. Ali na vila, Rosa arranjou algumas senhoras que lhe davam umas horas de trabalho para limpezas, ou passar a ferro e a vida parecia começar a equilibrar-se. Mas… foi nessa altura que João mudou. Andava macambúzio, perdera parte da sua alegria, olhava à volta com desconfiança e, de vez em quando, saía à noite. Às vezes, vinha cedo mas outras, só voltava de madrugada. Rosa começou a pensar que ele tinha arranjado uma amante.
Sentia que o chão lhe fugia debaixo dos pés e um dia fez-lhe a pergunta direta.
João irritou-se. Que ela estava doida, onde teria ido buscar essa ideia. Mas Rosa não ficou convencida. E numa noite, em que o marido voltou a sair, ela foi atrás dele. E viu quando ele se encontrou com mais dois e como andavam
em silêncio, acautelando-se nas sombras. E viu quando um quarto homem chegou com uma pasta, da qual tirou uns papéis que distribuiu em silêncio. Escondida, viu como os homens espalhavam alguns papéis, protegendo-se sempre no escuro e sem trocarem uma palavra. Assustada, voltou para casa e meteu-se na cama. A tremer, esperou a chegada do marido. Ela já tinha visto alguns papéis daqueles no chão. Tentara até apanhar um, mas a vizinha impediu-a. Disse-lhe que eram papéis contra o governo, que os comunistas espalharam, e que se ela fosse apanhada com algum, seria considerada comunista e seria presa. O João podia ser preso? A frase martelava-lhe a cabeça e dava-lhe suores frios.
em silêncio, acautelando-se nas sombras. E viu quando um quarto homem chegou com uma pasta, da qual tirou uns papéis que distribuiu em silêncio. Escondida, viu como os homens espalhavam alguns papéis, protegendo-se sempre no escuro e sem trocarem uma palavra. Assustada, voltou para casa e meteu-se na cama. A tremer, esperou a chegada do marido. Ela já tinha visto alguns papéis daqueles no chão. Tentara até apanhar um, mas a vizinha impediu-a. Disse-lhe que eram papéis contra o governo, que os comunistas espalharam, e que se ela fosse apanhada com algum, seria considerada comunista e seria presa. O João podia ser preso? A frase martelava-lhe a cabeça e dava-lhe suores frios.
Quando João chegou a casa, achou a mulher estranha.
- O que tens, mulher? Aconteceu alguma coisa?
Ela respondeu com outra pergunta:
- Tu és comunista, João?
- Cala-te, - disse perdendo a cor. Nem em pensamento, ouviste, nem em pensamento, repitas isso.
- Então é verdade, - disse ela com a voz embargada pelas lágrimas. Mas porquê? Já passamos tanta fome, tanta miséria e agora que a nossa vida está bem melhor, é que queres desgraçar-nos.
-Tu não compreendes mulher. É nosso dever tentar que os nossos filhos não passem o que nós passamos.
- Mas… e se eles te prendem João?
- Não te preocupes, nós temos cuidado. É verdade que há muitos “bufos”, mas também há muita gente do nosso lado.
Mas, desde aquela noite, e durante vários anos, Rosa nunca mais teve um minuto de sossego.
11 comentários:
A Rosa achou que lhe tinha saído a sorte grande em ir viver para uma casa, composta por uma cozinha, casa de banho e três quartos, com água, luz e chão de tacos. Para quem antes vivia numa espécie de possilga. Só podia ter sido mesmo a sorte grande! O ciúme escangalha o casamento e a política escangalha amizades!
Tenha uma boa tarde amiga Elvira, um abraço,
Eduardo.
Agora também fiquei preocupada que vão apanhar o João...
um beijinho
E cá estou eu a recordar a história de Rosa, Elvira. Agora já sei o motivo que levou o João a casar com a Rosa, pois já não me lembrava. Um beijinho, amiga! Uma boa semana!
Emilia
Ohhhh, então agora que a Rosa estava tão feliz, será que o João vai estragar essa felicidade?
Elvira por favor, quero um final feliz, please.
Beijinho grande amiga.
(Estou muito feliz, por nós termos cruzado)
Rosa, um livro que já li e reli... só passei para deixar mais uma vez parabéns Amiga e fico a aguardar a próxima história, Beijinho!
Cuidado que vem aí a PIDE.
Com essa gente não se brinca que eles são maus como as cobras.
Vamos lá ver se o João se safa!
Bom dia
mas que grande volta vai com certeza dar esta historia.
a aguardar com ansiedade !!!
JAFR
Estou de acordo com o Roaquim isto vai dar uma grande volta.
Um abraço e boa semana.
Andarilhar
Dedais de Francisco e Idalisa
O prazer dos livros
Os tempos horrorosos das perseguições políticas !
Pena que a CUF que tanto trabalho dava a tanta gente, viesse também a sofrer com isso, indirectamente ! :(
... Um dos grandes erros do nosso passado ! :(
Que aflição, a da Rosa! E nem imaginava o tamanho do rolo em que João se metia!
Acabei de ler os últimos capítulos.
Muito interessante a introdução do ativismo clandestino na história, uma história alicerçada no conhecimento social e político da narradora.
Muito bem, Elvira!
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