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5.8.19

LONGA TRAVESSIA - PARTE XVI





Abriu a porta, entrou e como era seu hábito, cerrou-a com um toque de calcanhar. Tirou o telemóvel do bolso do casaco, despiu-o e pendurou-o no bengaleiro. Então reparou num papel em cima da mesa de entrada. Aproximou-se, e verificou que se tratava da fatura de uma compra de produtos de limpeza, que a mulher-a-dias lhe tinha deixado.
Há anos que tinha aquela empregada, era pessoa em quem tinha confiança total. Tinha cuidado da sua mãe, e anos mais tarde, quando comprara aquela casa, contratara-a com a certeza de que podia estar descansado que a casa estaria sempre impecável.
Raramente a via, ela chegava sempre depois dele ter saído. Levantava a chave no condomínio e voltava a deixá-la lá, quando se ia embora. No final de cada mês, ele deixava o dinheiro ali, e o recibo que ela assinava e deixava no mesmo sitio. E quando era necessário fazer alguma compra, fazia-a e deixava-lhe ali a fatura. No dia seguinte encontrava o dinheiro. 
Foi até à sala, e deixou-se cair no sofá. Não parecia o homem forte e dominador que geria com mão de ferro, os seus negócios. Dirigiu-se à estante mas não pegou em nenhum livro. Ficou parado durante uns segundos, e depois, abriu o armário que ficava na parte inferior da estante, e retirou um saco de pano preto com uns desenhos circulares em cinzento.
Voltou para o sofá. Abriu o saco e retirou uns ténis infantis, azuis-escuros com estrelas nas laterais.
Durante uns momentos, deu-lhes várias voltas nas mãos. Estava pálido, e o seu rosto estava tão tenso que  dir-se-ia  ser de pedra.
Depois pressionou-os contra a palma da mão, e os ténis faiscaram como se tivessem uma corrente luminosa à volta da sola.
Decorreram largos minutos, com o homem fixando as luzinhas como se estivesse hipnotizado. Finalmente abrandou a pressão, e ao apagarem-se as luzes, como que voltou à terra. Respirou fundo e voltou a guardar os ténis no saco de pano.
Se alguém tivesse presenciado aquela cena, decerto ficaria perplexo. Como é que um homem, que todos conheciam como um implacável homem de negócios, ficava assim emocionado à vista de um simples par de ténis?  Que fetiche era aquele?
 Recostou a cabeça no enorme sofá branco, fechou os olhos, e durante um bom tempo, permaneceu assim, relembrando os dois anos que vivera com Teresa. Agora, à distância, dava-se conta de que aquela época da sua vida  fora a única realmente feliz que vivera. Agora que cumprira as juras de criança, que a ambição de riqueza já estava aplacada, chegava à triste conclusão que toda a fortuna amealhada, não servia para comprar um único dia de felicidade.  E afinal para quê? Se a única pessoa a quem gostaria de dar uma vida de luxo, não tivera forças para viver até esse dia.

11.7.19

UM PRESENTE INESPERADO - PARTE XLVI

BOA NOITE AMIGOS.  Meu marido está melhor, graças a Deus. Hoje já o puseram de pé e o ajudaram a andar. Continua com visão dupla e isso faz com que não consiga caminha sem alguém que o apoie. Ainda continua em exames, mas estamos com muita fé de que tudo vai correr bem. Muito obrigada a todos pelo vosso apoio. Que Deus vos abençoe






Ricardo que estava de costas junto da janela voltou-se quando a sentiu entrar, e foi ao seu encontro.
-Estás linda- disse pegando-lhe na mão e conduzindo-a ao sofá. 
-Obrigado! Tu também não estás nada mal- disse esboçando um sorriso, e estendendo-lhe o presente. 
Ele abriu-o e mostrou-se o seu agrado.
-Obrigado. É muito bonito - disse dando-lhe um beijo na face.
Curiosamente, como se tivessem combinado, também  ele tinha vestido, o mesmo fato cinzento-antracite que tinha levado ao casamento dos amigos. 
Naquele momento o porteiro informou-o pelo telefone interior que o jantar já ia no elevador. Ele encaminhou-se para a porta, que abriu assim que tocaram. Indicou a cozinha aos empregados que deixaram os recipientes com as várias iguarias sobre a mesa da cozinha, e saíram felizes com a gorjeta. A fatura iria para o seu escritório. Ricardo fechou a porta e voltou para a sala.
- Pedi para a Matilde ficar com os avós, a fim de ter uma conversa séria contigo. Porém será melhor irmos jantar e vamos conversando entretanto. Tenho fome, tu não?
- Nem por isso, mas vamos jantar. Vá que a tal conversa me desgosta tanto, que não consigo comer - disse Isabel, meio a brincar, para esconder a sua preocupação.
Levaram a comida para a mesa.
Ostras com molho de manga como entrada, Risoto de frutos do mar e gengibre, acompanhado por um Sauvignon Blanc, e para sobremesa morangos com chocolate. 
Mais uma vez, Isabel admirou a mesa com as melhores loiças, sobre uma impecável toalha branca, parcialmente coberta com pétalas de rosa e velas aromáticas
Durante a refeição falaram do trabalho, dos amigos, da menina. Do tempo quente de verão, que se fazia sentir lá fora e de uma possível ida à praia no fim-de-semana. Só não falaram daquilo que realmente os inquietava. O futuro da sua relação.
Depois do jantar, levantaram a mesa, levaram a loiça suja para a máquina e tomaram o café, lá mesmo na cozinha.
Quando terminaram, Ricardo enlaçou a mulher pela cintura e levou-a para o sofá. Depois puxou o cadeirão para a frente dela e sentou-se.
- Antes de terminar o serão vou contar-te uma história – disse ele. Era uma vez um homem que queria uma família. Ele conseguiu uma filha maravilhosa e uma companheira de eleição. A sua esposa, era uma mulher maravilhosa. O seu olhar tinha uma luz que o encantava. Ele nunca vira em nenhum outro ser uma tal luminosidade num olhar. Era como se a mulher trouxesse a alma presa nos olhos. Todavia não passou muito tempo, e a mulher foi perdendo essa luz, como se a sua alma estivesse a morrer lentamente. Hoje o homem vive desolado. Sente-se enganado e quer de volta a sua companheira, mas não sabe o que, ou como fazer para a ter de volta.
Estendeu a mão e agarrou a dela. Estava gelada.
- Será que podes ajudar este pobre homem, querida?
Ela inclinou-se para a frente e uma lágrima caiu sobre a mão dele, que ao senti-la empurrou para trás o cadeirão, e ajoelhou na sua frente.
- Que se passa Isabel? Porque choras? Estás arrependida do nosso trato?
Ela olhou-o com os olhos rasos de água e disse:
-Estou. Não sei se conseguirei continuar a levar esta farsa por muito tempo.