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13.1.19

ELISA II

reedição
Elisa viu-se nessa altura obrigada a contar a verdade aos pais. Tinha que deixar o filho com alguém para ganhar-lhe o sustento. E quem melhor que os pais? O pai só lhe disse que devia ter contado antes. E que tomaria conta do neto, como se fora um filho. Elisa deixou o filho lá na aldeia e veio para Lisboa ser criada de servir. Não pensava em namorados. Tudo o que juntava mandava para os pais, para o sustento do filho. Mas um dia conheceu o António. António era moço de Lisboa, com muito mais experiência de vida, e não foi difícil dar a volta à cabeça da jovem. Prometeu-lhe casamento, criar-lhe o filho, dar-lhe até o seu nome. Elisa ia viver com ele, e logo que acabasse a tropa, tratavam do casório. E mandavam vir o filho. Elisa acreditou. E um tempo depois deu-se conta que estava outra vez grávida. Quando António soube da gravidez, os seus modos alteraram-se. Começou a chegar cada dia mais tarde, com a desculpa de que tinha serviço no quartel. E um dia deixou de aparecer. Elisa foi ao quartel. Queria saber o que se passava. Mas lá disseram-lhe que ele tinha pedido para ser transferido. E começou novo calvário para Elisa. Quando o adiantado estado de gravidez não a deixava já trabalhar, recorreu à instituição de Santa Zita, que a ajudou até que a menina nasceu, bem como nos primeiros tempos, até que ela conseguiu com a ajuda da instituição arranjar trabalho.
A vida de Elisa foi uma vida de escravidão ao trabalho para criar os filhos. Porque depois da morte da mãe, teve que ir buscar o filho mais velho, para junto de si. Foi pai e mãe dos filhos.
Nunca mais quis ouvir falar de homens na sua vida.
Quando os filhos cresceram, Portugal tornou-se pequeno para os seus sonhos. Só pensavam em emigrar para o Brasil. O sonho duma vida melhor fez com que juntassem todos os tostões para a viagem. E lá foram deixando a promessa de mandarem ir a mãe tão logo tivessem casa e trabalho.
A principio as cartas do Brasil chegavam todas as semanas. Eram cartas cheias de novidades e promessas. Depois passaram a ser de mês a mês. A vida corria bem, a filha tinha até casado, e só estavam esperando mudar de casa para mandar a passagem. É que a casa era pequena. Mais tarde nascera a neta, a despesa era maior. Depois o filho casou, tinha mais despesas. Aos poucos Elisa apercebeu-se que tinha perdido os filhos quando se despediu deles em Alcântara.
Por fim as cartas deixaram de chegar. O olhar perdeu-se no horizonte, o corpo foi-se vergando ao desgosto e ao peso dos anos.
Elisa foi hoje a sepultar...
Nunca vi um funeral tão triste. Meia dúzia de vizinhos, ninguém de família. E enquanto a terra caía sobre a urna, eu pensava se os filhos iriam  algum dia  arrepender-se do abandono a que votaram a mãe.
Elisa foi hoje a sepultar... 
E enquanto jogo uma flor sobre a sepultura murmuro uma prece:
Senhor, se é verdade que existe o paraíso, tem piedade desta tua serva, que já teve o seu inferno...

 Elvira Carvalho


Este conto foi mais uma reedição, pois a minha saúde continua muito periclitante. O olho está melhor, mas a constipação trouxe uma tosse que não me deixa ir à cama há três noites.
Peço-vos desculpa.







16 comentários:

Tintinaine disse...

Pobre Elisa, nunca soube o que é a felicidade.
Antigamente acontecia muito disto, hoje em dia acontecem coisas parecidas, especialmente quando há droga pelo meio.
Tome cuidado com a sua saúde, Elvira, que é coisa muito séria.
Bom domingo.

noname disse...

Não tem porque pedir desculpa, tem que se cuidar. Descanse, nós ficaremos à sua espera :-)

Melhoras rápidas.
Abraço

Cantinho da Gaiata disse...

Desejo-lhe rápidas melhoras, o tempo não está para brincadeiras.
Uma história com final triste bem que Elisa mereceia um desfecho melhor. São histórias do passado mas que nos tempos de hoje ainda há muito.
Beijinhos e as melhoras.

Maria João Brito de Sousa disse...

O mundo ainda hoje está cheio de Elisas, infelizmente...

Espero que melhore rapidamente, tanto da gripe, quanto do problema ocular, Elvira.

Abraço.

aluap disse...

Eram tempos difíceis, para os que partiam, como para os que ficavam, mas esta mãe merecia melhor sorte. Que filhos desprendidos, como foram capazes de virar costas à sua mãe?! Dá que pensar.
Abraço e as melhoras.

Meu Velho Baú disse...

A Vida para muitas pessoas infelizmente não tem nada de bom,e assim Elisa teve este fim triste.
As melhoras Elvira. A Saúde em primeiro lugar.
Quando puder eu cá estarei

Cidália Ferreira disse...

Lindo! Emocionante!
As melhoras querida Amiga!

Gélidos campos...
Beijo, e uma boa noite.

Rogério G.V. Pereira disse...

As melhoras, Elvira

Pedro Coimbra disse...

Tenha cuidado com a saúde e não se preocupe com os blogues.
As melhoras.
Boa semana

Joaquim Rosario disse...

Bom dia
Elisa uma mártir !!
Nunca são demais os desejos das melhoras.
JAFR

Os olhares da Gracinha! disse...

Elisa...espero que esteja melhor e recupere rapidamente!!!... eu estou constipada há mais de mês e meio e meu companheiro esteve com gripe com pneumonia!!!
...
Quanto ao conto... vou ler o primeiro capítulo para me inserir nele!!!
Bj

Maria João Brito de Sousa disse...

Elvira,

enviei-lhe um mail há dois ou três dias.
Espero que se encontre melhor e que o tenha recebido.

Forte abraço

Gaja Maria disse...

Vida triste... É nós que não paramos de nós queixar...
Elvira, desejo rápidas melhoras. A saúde é o nosso bem maior.
Abraço

Ailime disse...

Boa tarde Elvira,
Desejo as suas rápidas melhoras.
Sobre o conto, estou deveras emocionada.
Quantas Elisas não haverá por este Portugal fora...
Violada sacrificou sempre a sua vida e tentou dar uma vida melhor aos filhos que a abandonaram. Triste e injusto.
Magnífico conto, Elvira!
Parabéns!
Beijinhos,
Ailime

Victor Barão disse...

Minha estimada amiga Elvira, estes seus pequenos-grandes contos têm o dom de me emocionar profundamente, neste, antes mesmo de chegar ao "falecimento de Elisa", já estava comovido. O que ao menos da minha parte identifico como substantiva qualidade literária da sua parte, minha amiga.

Parabéns e obrigado por esta sua excelente expressão literária

Mas acima de tudo e para o caso peço-lhe que não se preocupe com partilhas virtuais, mas sim com a sua saúde, para que depois sim as partilhas virtuais regressem o mais breve e plenamente possível...

Salutar abraço de amizade

VB

lourdes disse...

Há vidas assim, inteirinhas só de trabalho e tristeza, sem nunca conhecerem a felicidade.
Apesar de se dizer que felicidade plena não existe, apenas existem momentos.
Bjs