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28.12.17

UMA CADELINHA CHAMADA NATAL


O ano do meu décimo aniversário foi também o primeiro ano em que toda a nossa família tinha emprego.
O meu pai fora dispensado do seu emprego de sempre, mas encontrara trabalho de pintura e carpintaria um pouco por toda a cidade. A minha mãe costurava vestidos elegantes e fazia tartes para fora, e eu trabalhava depois das aulas e aos fins de semana para a Srª. Brenner, uma vizinha que fazia criação de cães da raça cocker spaniel. Eu adorava o meu trabalho, principalmente o ter de cuidar e de alimentar ninhadas de travessos cachorrinhos. E, com um certo orgulho, dava tudo o que ganhava à minha mãe para ajudar nas despesas. Mas o trabalho era tão divertido que tê-lo-ia mesmo feito sem receber qualquer pagamento.
Durante esses “tempos difíceis”, sentia-me perfeitamente à vontade ao usar vestidos de lojas baratuchas e calças de ganga já muito coçadas. E dizia adeus aos cachorrinhos que partiam para as famílias abastadas sem qualquer pena.
Mas tudo isso mudou quando uma ninhada chegou ao canil.
Eram seis e seriam os últimos cachorros disponíveis para venda até ao Natal.
Quando os ia alimentar pela primeira vez…, o meu coração balançou. Uma cachorrinha de pelo brilhante e avermelhado, com tristes olhos castanhos, abanou a cauda e inclinou-se para a frente para me saudar.
— Parece que já tens aqui uma amiga! — sorriu a Srª. Brenner. — Vais ficar encarregada da alimentação dela.
“Natal,” murmurei, segurando a cadelinha bem junto a mim. Senti imediatamente que ela era especial. E cada dia reforçava mais ainda um inexplicável laço entre nós. O Natal aproximava-se e, uma noite ao jantar, dei por mim toda entusiasmada a enaltecer, pela centésima vez, as qualidades especiais da Natal.
— Ouve, filha.— O meu pai pousou o garfo. — Talvez um dia possas ter um cachorrinho só teu, mas os tempos agora são difíceis. Sabes que fui dispensado na fábrica. Se não fosse o trabalho que tive este mês com a remodelação da cozinha da Srª. Brenner, não sei o que faríamos.
— Eu sei, Pai, eu sei — murmurei.
Não conseguia suportar a expressão de dor na cara dele.
— Vamos ter de enfrentar com coragem este novo ano — suspirou.
Na véspera de Natal, só a Natal e um macho grande sobravam.
— Vêm buscá-los mais tarde — explicou a Srª. Brenner. — Conheço a família que vai levar a Natal — continuou ela. — Vai ser criada com imenso amor.
“Ninguém poderá amá-la tanto como eu”, pensei. “Ninguém.”
— Poderias vir amanhã de manhã? Vou desmamar alguns cachorrinhos novos no dia a seguir ao Natal. Limpas o chão com óleo de pinheiro e montas uma caminha fresca para a nova ninhada. Poderias fazer-me o enorme favor de alimentar também os cães do canil? Vou ter a casa cheia de visitas. Oh, e pede ao teu pai que passe aqui contigo. Uma das portas de um armário da cozinha precisa de um ligeiro ajuste. Que belo trabalho ele tem feito!
Acenei com a cabeça, mal conseguindo concentrar-me nas palavras. Os novos cachorrinhos seriam lindos, mas nunca haveria outra Natal. Nunca! A ideia de outra pessoa a criar a minha cachorrinha era demasiado difícil de aguentar.
Na manhã de Natal, depois da missa, abrimos os nossos escassos presentes.
A minha mãe reinventou o avental que eu lhe tinha feito com as minhas economias, dando-lhe um estilo de vestido parisiense. O meu pai delirou com a pulseira de relógio que lhe ofereci (nem sequer era de couro verdadeiro, mas ele substituiu logo a sua pulseira já puída e ficou a admirar a nova como se fosse de ouro). Deram-me um lindo livro e eu abracei os dois.
Nem sequer tinham presentes para dar um ao outro. Que Natal tão triste! Mas os três fingíamos que assim não era. Depois do pequeno-almoço, o meu pai e eu mudámos de roupa para ir a casa da Srª. Brenner. No curto passeio, cumprimentámos e conversámos com os vizinhos que passavam, mas evitávamos deliberadamente os assuntos “Natal” e “cachorrinhos”.
O meu pai acenou-me um adeus enquanto se dirigia para a porta da cozinha dos Brenner.
Fui diretamente à casota dos cachorrinhos, no pátio de trás. Estava tudo estranhamente silencioso: nada de rosnados, de tímidos latidos e nem sequer o farfalhar do papel. Tudo parecia tão triste e sombrio como eu! O meu cérebro deu ordem para começar a limpeza, mas lá no fundo do meu coração só queria sentar-me no chão vazio e gritar.
É engraçado olhar para trás, para os dias da infância. Alguns acontecimentos são vagos, os detalhes são incompletos e as caras indefinidas. Mas lembro-me tão claramente de voltar para casa nessa tarde de Natal! De entrar na cozinha, com o aroma do assado a cozinhar lentamente no fogão… Lembro-me da minha mãe a clarear a garganta e a chamar pelo meu pai, que apareceu subitamente à entrada da sala de jantar.
Com a rouquidão na voz, ele sussurrou: “Feliz Natal, filha!” E, sorrindo, pousou suavemente a Natal, embrulhada num laço vermelho, nos meus braços. O amor dos meus pais por mim misturou-se com o meu amor arrebatador pela Natal e jorrou do meu coração, como uma radiante fonte de alegria. Nesse momento, aquele Natal tornou-se, sem sombra de dúvida, o Natal mais belo que jamais vivi!
Toni Fulco
Jack Canfield & Mark Victor Hansen
Chicken Soup for the Soul – Christmas Cheer
Chicken Soup for the Soul Publishing, LLC, 2008
(Tradução e adaptação)

16 comentários:

chica disse...

Que lindo e uma cachorrinha traz alegrias sempre! beijos, chica

Joaquim Rosario disse...

bom dia
palavras para quê .
conto lindo !!!
JAFR

Larissa Santos disse...

Que bonito!
Bom dia

Hoje:-"Chuva, onde desejo tréguas."

Bjos
Continuação de festas felizes

Rogério G.V. Pereira disse...

Todos os contos de Natal
são assim
Fazem recordar a infância...

Francisco Manuel Carrajola Oliveira disse...

Uma bela história, aproveito para desejar umas Boas Festas e um excelente 2018.
Andarilhar
Dedais de Francisco e Idalisa
O prazer dos livros

Cantinho da Gaiata disse...

Que todos os nossos sonhos se tornem realidade para sermos feliz.
Lindo conto que nos deixa aqui Elvira, adorei.
Beijinho grande e Bom Ano.

Tintinaine disse...

Isso é que foi natal a valer!
Bonito conto, sem dúvida.

Olinda Melo disse...


Um belo presente de Natal: uma cadelinha chamada Natal
e o que a menina gostava dela.

Mais um belo conto de Natal.
Obrigada, Elvira, por esse trabalho de pesquisa.

Bj

Olinda

Vanessa disse...

Que cachorrinha linda e que bela história! Que seu ano novo seja repleto de paz, amor, saúde e prosperidade!! Feliz 2018!!
Tenha uma excelente quinta feira.

Majo Dutra disse...

Gostei muito do conto, estimada amiga.
São destes natais amorosos que gosto...
Seja bem regressada.
Abraço
~~~

Gaja Maria disse...

ohhh! Adorei o conto. Abraço Elvira. Que tenho um maravilhoso novo ano :)

Kique disse...

Que conto bonito...

Bjs
Kique
https://caminhos-percorridos2017.blogspot.pt

lis disse...

Gosto muito de contos onde os sentimentos afloram a ponto de me envolver totalmente.
E contos de Natal são especiais.
Obrigada Elvirinha você também é especial !
Um lindo 2018
com mais e mais inspiração e poesia.
beijos

Pedro Coimbra disse...

Beijinhos, que 2018 seja um ano Fabuloso!

Odete Ferreira disse...

Belíssimo conto, amiga.
Bjinho

Manu disse...

Que este novo ano seja o concretizar dos teus sonhos.

Beijinhos Elvira