Capela do quartel, foto do google
Estávamos em Maio de 62, num daqueles dias quentes, que mais parecem de Julho, quando à Seca, chegaram dois polícias numa carrinha, em busca do Manuel. Ele estava no trabalho, no armazém da lenha, e lá chegados os polícias deram-lhe voz de prisão, e levaram-no sem sequer poder avisar a família. Entrar algemado na carrinha, foi para o Manuel uma vergonha e dor tão grande, que ele pensou não resistir. Ao mesmo tempo que mandava um vigia avisar a mulher do Manuel, o Capitão, gerente da seca, telefonou para o posto no Barreiro, para saber do que era acusado, um homem que levava a vida a trabalhar, e não se metia em escaramuças nem políticas. Foi então informado, de que a ordem viera de Lisboa, com a acusação de que Manuel era um desertor.
Parece que à época, os mancebos aptos para a tropa, não ficavam livres depois de ela acabar, mas passavam a uma situação de reserva que só terminava aos 45 anos. Manuel fizera 44 em Abril. Ora todos os anos, eram vistos os processos, de todos os mancebos que cumpriram tropa e estavam nessa idade. E encontraram a caderneta militar do Manuel, que lhe devia ter sido entregue quando da passagem à reserva. Daí a investigarem o tempo de tropa dele foi um passo. E logo descobriram a deserção. E em consequência disso, Manuel estava agora preso e ia ser mandado para Lisboa. Precisamente para o quartel de Caçadores 5 em Campolide, de onde tinha desertado em 1941.
Uma vez no quartel, foi-lhe dito que teria de cumprir os quase dois anos de tropa que lhe faltavam quando desertou. Como porém em Abril de 63, faria 45 anos, e passava à reserva, ficaria na tropa até essa data. Ou seja, quase um ano.
Dá para imaginar o sofrimento do Manuel? Os jovens militares, gozavam com ele, mal acabava a formatura. Não estava em prisão no quartel. Estava na tropa, embora sem licença de saída.
Recebia a visita da mulher no quartel, e mortificava-se com a situação da família, agora sem o seu ordenado, que era o único na casa até à próxima safra, e ainda obrigada a gastar dinheiro em viagens para as visitas. Chorava todos os dias. E tudo por causa de umas malfadadas botas da tropa, que não pudera pagar ao estado.
Trabalhador humilde, sempre pronto a qualquer trabalho, mesmo que nada tivesse a ver com o armazém da lenha, alegre e bem-disposto, apesar de todas as dificuldades, o Manuel granjeara a simpatia, não só de todos na Seca, como do próprio patrão, que vivia em Lisboa e só muito raramente vinha à seca. Lembro, que ela era gerida pelo capitão Aníbal. Porém quando o patrão precisava de um homem para qualquer trabalho na sua casa, ou jardim, telefonava para a seca e o capitão mandava para lá o Manuel.
Boa pessoa, sabendo reconhecer os méritos do Manuel, o patrão deu ordem ao gerente da seca, para manter o ordenado do Manuel enquanto ele estivesse ausente. Não satisfeito com isso, o patrão, usou de toda a sua influência, (e se era influente a família Bensaúde) para retirar o Manuel daquela agonia. E foi por isso que ele, voltou à liberdade no início de Setembro, bem a tempo de dar um beijo à filha no dia dos seus 15 anos.
25 comentários:
Homens ricos de personalidade e de força de viver.
Vidas escritas com o próprio sangue.
a passar para acompanhar a história.
Bom domingo!
Isabel Sá
http://brilhos-da-moda.blogspot.pt
Era mesmo assim. Na tropa quando se mudava de unidade, ou se passava à situação de disponibilidade, tinha que se entregar todo material que antes se tinha recebido.Quem o não entregasse tinha que o pagar. Por isso quando nos roubavam algum desse material. O melhor era manter-se em silêncio e fazer o mesmo. O Manuel, se calhar não o conseguiu fazer antes de ter que entregar as botas. Teria, portanto, que continuar na tropa até as pagar, e só depois disso passaria à situação de disponibilidade! Todavia, o Manuel terá pensado que o melhor seria desertar? Se calhar sem antes ter pensado, nas consequências que a seguir surgiriam em seu desabono! Alguns portugueses, na idade de serem chamados para cumprir o serviço militar! Por causa da guerra nas ex-províncias ultramarinas, piraram-se assalto para a França, os quais só voltaram após o 25 de Abril de 1974. Graças à liberdade, não foram dados como desertores, por isso não foram presos nem tiverem que cumprir o serviço militar!
Tenha amiga Elvira, um bom dia de domingo, um abraço,
Eduardo.
Tão bom acompanhar essa história e já 15 anos a menininha de outrora? bjs, chica
E o tempo passa rápido....
Beijinhos amigos e com votos de bom domingo
Interessante, abraço Lisette.
Tempos duros que aliado a alguma ingenuidade e ignorância chegavam a este ponto. Muitos pormenores de vidas que já foram esuqecidas pela maioria. Beijinhos. Bom Domingo.
Elvira, não tinha certeza de que o Manuel era seu pai, gostei de saber.
Uma história de familia bem contada.
Dinamicamente estamos conhecendo mais você... Você é uma personagem da sua própria narração!
Tudo muito interessante de se ler...
Um bom domingo... Abç
Lindo final de domingo!!!!!!!!!! Beijos
Olá Elvira! Com certeza esse beijo avivou a lembrança dos 15 anos da menina.
Li e comentei até a parte XXIX. Voltarei com mais tempo para ler as partes que faltam.
Abrigado pelas visitas e amáveis comentários deixados no nosso Arte & Emoções.
Abraços,
Furtado.
Um beijo que lhe acalmou a angonia de um tempo onde a liberdade lhe foi retirada!
Boa semana
Um beijo que lhe acalmou a angonia de um tempo onde a liberdade lhe foi retirada!
Boa semana
Complicado coitado
Blog LopesCa/Facebook
Caríssima:
Creio que me disse que viria por cá, por estes dias.
Mande-me um recado.
A ver se nos encontramos..
Beijinhos!
Que linda história Elvira, e o tempo passa...você já com 15 anos e recebendo o beijo do saudoso pai.Beijo que ameniza tantas coisa passadas na vida difícil!
Abraços, boa noite!!
Mariangela
Que linda história Elvira, e o tempo passa...você já com 15 anos e recebendo o beijo do saudoso pai.Beijo que ameniza tantas coisa passadas na vida difícil!
Abraços, boa noite!!
Mariangela
Ora, ora. Quem diria!
Uma decisão do passado a apanhar o Manel... até eu já havia esquecido!!
Imagino o espanto da família, dos amigos.
Deve ter sido uma pessoa abençoada.
SERIA UMA GRANDE INJUSTIÇA, UM HOMEM DO BEM COMO O MANUEL CONTINUAR PRESO.
http://zilanicelia.blogspot.com.br/
Tempo, tempo como passa! Muito boa a narrativa.
Beijo*
Apesar de tudo , Manuel teve um bom patrão que para além de não lhe retirar o ordenado, ainda intercedeu por ele. Voltar para casa deve ter sabido tão bem!
xx
Ainda por aqui a acompanhar:)
beijinhos
elisaumarapariganormal.blogspot.pt
Acontecia cada coisa!
Mas como se costuma dizer "quem tem amigos não morre na cadeia", o Manuel soube cultivá-los e assim regressou rápido ao seio familiar.
Bjo, Elvira
Nem sempre é assim, mas no geral um bom empregado faz um bom patrao e o bom patrão faz o bom empregado. No caso do Manuel isso aconteceu, felizmente Sabes quem me dizia isso? A empregada que eu tive no Brail e esteve tantos anos comigo que, sempre que lá vou a visito. A minha filha tinha 9 anos quando voltamos para Portugal e hoje, com 34, quando visita a " tia" ( empregada) abraça-se a ela e as duas choram feito crianças. Nunca deixei que nada lhe faltasse lá no Brasil, precisamente porque dela recebi sempre muita dedicação e amor pelos meus filhos. Elvira, desejo -te um boa Páscoa , junto dos teus , sempre com muita saúde e alegria. Beijinhos
Emilia
Olá, Elvira.
O Manuel teve um homem bom como patrão.
Deixo-lhe votos de uma boa Páscoa de paz.
Hola Elvira:
Todas las guerras son terribles y lo peor es que no se trata solamente del pasado. Tenemos realidades en nuestros días, con peligros no solamente referentes a conflagraciones declaradas, sino sorpresivas y suicidas, en cualquier rincón de cualquier ciudad.
Abrazo.
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