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14.5.20

ISABEL - PARTE II


Igreja de Santa Maria  Foto minha
  
Depois de umas breves orações, mais pensadas que murmuradas, saiu e atravessando o largo, do Infante, passou para o outro lado da Avenida dos Descobrimentos, que os locais chamavam simplesmente de  "a marginal," como ela descobrira quando chegara.  Pensou que talvez o pequeno barco, que costumava atravessar o canal que separava a marginal, da Meia-Praia, poderia não estar lá com aquele dia, que parecia tão pouco propício a uma ida à praia. Mas logo o avistou mais à frente, junto às escadinhas que lhe davam acesso.  Apressou o passo e dirigiu-se para lá. A maré estava vazia, notava-se pelas pedras à mostra junto à muralha, ou paredão como lhe chamavam na cidade.
No barco, apenas se encontravam os dois tripulantes.
- Bom dia! Fazem a travessia com uma só pessoa? - perguntou.
- Claro. Um bom freguês vale por muitos, - respondeu com um sotaque brasileiro, o jovem que cobrava a passagem.
Isabel desceu as escadas, e entrou para o barco recusando com um sorriso, a mão do jovem, estendida para a ajudar.
Sentou-se e logo o outro jovem pôs o motor a trabalhar e o barco começou a afastar-se rumo à outra margem.
-"Com este tempo, devem pensar que sou maluca", pensou olhando a ondulação formada pelo movimento do barco. Poucos minutos depois, o barco encostava às escadas no lado contrário. 
-Vão cá estar mais logo quando quiser regressar? - perguntou
-Até às sete da tarde - responderam em uníssono. depois o mais velho acrescentou:
-Não pense que o tempo se vai manter assim. Dentro de duas, três horas no máximo,  o sol estará a brilhar sobre as águas e a queimar os corpos no areal.
Pouco convencida, Isabel despediu-se com um sorridente até logo, subiu as escadas e entrou pelo carreiro entre as dunas em direção à praia.
Quando chegou ao areal a tal chuvinha tinha desaparecido. A avó chamava-lhe “morrinha” o avô “molha-parvos” lembrou com um sorriso. Quando sorria, surgiam-lhe duas pequenas covas no rosto, que a tornavam ainda mais atraente. Mas apesar disso, o sorriso não conseguia apagar a tristeza que lhe habitava no olhar. 
A cidade estava quase totalmente rodeada de praias, e quando chegou percorreu-as todas. A maioria, praias pequenas, entre as falésias, muito bonitas para olhar, mas demasiado concorridas para o seu gosto. Das duas que mais gostou, escolheu a Meia-Praia, por lhe permitir o passeio a pé até ao barco, e, não precisar conduzir numa cidade em que a maioria das ruas, se  encontram vedadas ao trânsito automóvel.   
Mas não deixou de se surpreender, com o nome de Meia-Praia,  quando se trata de uma praia de alguns quilómetros de comprimento, dividida em várias zonas de banho, com salva-vidas, toldos e restaurantes. 
Até onde a vista alcançava a praia estava quase deserta, já que em algumas zonas se via uma ou outra pessoa. Mais à frente, da parte de cima, um pouco depois das dunas, um bairro de pequenas casas brancas. “Os índios da Meia-Praia”, que Zeca Afonso, o poeta cantor imortalizou, - pensou Isabel. Na água, mesmo à babujem, algumas pessoas numa espécie de dança, logo seguida de agachamento. A maré-vazia propiciava a apanha de conquilhas. Condelipas, murmurou ao lembrar-se que em Lagos era assim que as conquilhas se chamavam. Isabel, era curiosa, gostava de saber o porquê das coisas, e por isso, dias depois de ter chegado, ao ver as conquilhas no mercado rebatizadas, procurara saber  o porquê daquele nome que lhe pareceu um tanto estranho. Disseram-lhe, que no século XVIII, estivera em Lagos, um certo Conde de Lippe, que viera  reorganizar a defesa da cidade e se instalara na fortaleza, Pau da Bandeira, que ainda hoje se encontra junto à entrada da praia da Batata. Grande apreciador de conquilhas, o conde mandou vir sacos delas e ordenou que os soldados as espalhassem na praia.O povo que até aí nunca vira aqueles bivalves, e sabendo que fora o tal conde de Lippe  quem as mandara espalhar pela praia, achou que Condelipas, era o nome mais adequado, e  ainda hoje são assim chamadas.

                                            

16 comentários:

redonda disse...

Estou a gostar e até agora não me lembrei por isso não devo ter lido ainda. Gostei do nome de Condelipas.
um abraço e uma boa noite

Pedro Coimbra disse...

Não conhecia essa designação.
Estamos mesmo sempre a aprender.
Abraço

Joaquim Rosario disse...

Bom dia
Para alem da historia em si também temos lições de historia.

J R

Tintinaine disse...

Com que então condelipas! E são bem boas, por sinal, muito melhores que os mexilhões desta minha terra.

chica disse...

Estou gostando e parece nova pra mim...Isabel é como eu, gosta de praia com pouca gente. Meu pai também chamava a chuvinha assim de morrinha e usamos até hoje isso,rs... beijos, chica

" R y k @ r d o " disse...

Bom dia:- Desconhecia por completo que as conquilhas também tinham o nome pomposo de " Condelipas". Estamos sempre a aprender.
.
Saudações amigas
Cuide-se

noname disse...

Que gostusura de episódio, onde as conquilhas são condedlipas, e ambas uma maravilha :-)

Boa tarde, Elvira

Cidália Ferreira disse...

Maravilhoso episódio!:)
-
Pétalas da solidão ...

Beijo e um dia feliz.

Janita disse...

Desde criança que o nome desse bivalve, que se vendia no Mercado Municipal de Serpa, o conheço por conquilhas. Comia-as cruas, usando uma faquinha para as abrir ao meio. Nada tinham a areia no interior, que se sente hoje, tanto no berbigão como nas amêijoas. Ah, que boas memórias essas. Já vi que foi isso que me atraiu neste conto. Mas gostei muito de saber dessa designação. Saber não ocupa lugar.
Continuo a gostar desta personagem feminina e não tenho ideia nenhuma de já a ter lido. Tomara que isto não descambe em intrigas e traições. Não gosto nada disso. Gosto de histórias de vida simples que dispõem bem. :)

Um abraço e uma tarde boa.

Isa Sá disse...

A passar por cá para acompanhar a história..

Isabel Sá  
Brilhos da Moda

Alexandra disse...

Já conheço tudo. Com excepção da Isabel, que estou a conhecer. ;)

Ler as suas palavras é uma doçura!

Venha mais!

Abraço :)

Lúcia Silva Poetisa do Sertão disse...

Acompanhando, com prazer, mais essa história que promete muitas emoções com essa personagem tão cheia de vida e personalidade liberta!
Beijos afetuosos!

Cléo Gomes disse...

Uma curiosidade que não sabia.
Pena que eu não li a história anterior :(

Mas, já assimilei o novo vocábulo Condelipas.

Bjim

Edum@nes disse...

Ainda agora está no princípio. Daqui até ao fim muitas surpresas irão acontecer. Umas mais agradaveis do que outras. Isabel estará de ferias ou será alguma espia?

Tenha uma boa noite amiga Elvira. Um abraço.

Ailime disse...

Boa noite Elvira,
Gostei imenso de acompanhar Isabel nesse trajeto até à Meia Praia. Adoro Lagos e gostei de saber mais sobre a sua história.
Um beijinho,
Ailime

João Santana Pinto disse...

Não conhecia nem o nome nem a história... (sorrisos)

Continua a ser dado o conhecimento desta bela e misteriosa mulher com algo de sombrio que parece teimar em a acompanhar...

Este início tem muito encanto... vou continuar