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28.1.22

ARMADILHAS DO DESTINO - PARTE VI




Nuno dirigiu-se ao seu carro. Aí chegado, sentou-se ao volante, levou as mãos à cara e deixou-se ficar por momentos assim. Como se necessitasse desse tempo, para reforçar a barreira de indiferença, que a presença de Luísa de algum modo ameaçava destruir.
Depois lentamente, pôs o veículo a trabalhar e arrancou suavemente.

Tinham-se passado dezasseis anos desde que Luísa de uma forma abrupta, terminara a relação que mantinham há dez meses. Sem outra explicação a não ser a de que era muito jovem, não desejava prender-se tão cedo. Ele sentira-se traído, usado. Amava-a e sonhava com ela como sua companheira, e mãe dos seus filhos. Pensava pedi-la em casamento logo que ela  completasse os dezoito anos. Mas ela terminara tudo uns meses antes. 

E ele ficara desesperado. Não era um adolescente. Tinha vinte e cinco anos e sabia muito bem o que queria da vida. Por ela, pelo seu amor, tinha até renunciado aos seus sonhos de partir para terras longínquas, para cuidar dos esquecidos de Deus. Claro, não podia arrastar uma jovem tão frágil e delicada como Luísa para semelhantes lugares. E não acreditava em relações à distância. Conhecia-se. Não seria útil em lugar algum se a sua cabeça e o seu coração estivessem a milhares de quilómetros.

Luísa era uma excelente atriz. Tão boa que ele estava convencido que ela o amava de igual modo. Mas o que ela queria era alguém que a iniciasse nos prazeres do sexo, e decerto o escolhera por pensar que seria mais experiente que os rapazes da idade dela. Pelo menos era o que a sua atitude lhe fazia crer. Ela mudara por completo depois que tinham feito amor. A princípio ele pensara que era por timidez. Mal sabia ele, que ela se estava a preparar, para se descartar dele. Claro. Deixara de ter utilidade. Nunca na sua vida  sentira tal dor, e simultaneamente tal humilhação.

A sua mãe, na tentativa de lhe fazer esquecer, começou a convidar lá para casa, todas as filhas casadoiras das suas amigas. Para acabar com a situação, e também porque era o sonho de toda a sua vida, Nuno pusera em marcha o processo que o levaria para África, deixando a mãe destroçada. O pai, que sempre o apoiou, e que sabia das suas intenções para com Luísa, dizia-lhe que não valia a pena estar assim. Ele era muito novo, e o que não faltavam no mundo, eram mulheres carinhosas e dignas, capazes de retribuir o seu amor e serem companheiras dedicadas. Ele não acreditara na altura como não acreditava hoje.

Tornara-se num solitário. Luísa matara para sempre a sua fé nas mulheres. E ele conhecera muitas, naqueles dezasseis anos.  Era um homem jovem e fisicamente saudável. Tinha desejos como qualquer outro e não fizera voto de castidade.  Algumas aqueceram a sua cama, durante algumas horas. Algumas disseram mesmo que o amavam. Mas as suas declarações, resvalaram pela indiferença dele, como gotas de chuva pela vidraça.
Há três meses que tinha regressado. Pelos seus pais que estavam velhos e saudosos da presença do seu filho único, mas também porque ele já não era o mesmo homem de outrora. Estacionou junto do prédio onde morava. Um apartamento a cinquenta metros da casa dos seus progenitores. Suficientemente perto para os ver quase todos os dias, mas um lugar independente, onde podia lamber as suas feridas sem testemunhas.


E esta tarde estarei em Lisboa a fazer exames respiratórios, que não se fazem no Barreiro e que estão marcados há quase dois meses.


10 comentários:

Pedro Coimbra disse...

Duas almas doridas destinadas a reencontrar-se.
Bfds

Tintinaine disse...

A saúde, sempre a saúde em primeiro lugar, pois sem ela a vida não presta!
Pense bem em quem votar, o seu voto conta!

chica disse...

Capítulo bem engendrado e escrito. Te cuida! Boa consulta! beijos, ótimo fds! chica

Maria João Brito de Sousa disse...

Ambos magoados, cada qual com as suas feridas...

Que os seus exames corram bem e que os respectivos relatórios lhe tragam boas notícias, amiga.

Forte abraço!

Janita disse...

Com feridas causadas pelo mesmo algoz, vamos ver como vai surgir a oportunidade de Luísa esclarecer os motivos que a levaram a afastar-se.
É a primeira vez que leio ser o homem a pensar ter sido usado como objecto sexual...Era lá possível uma jovem querer iniciar-se nas artes de fazer amor e depois descartar o rapaz? Que eu saiba nenhuma moça quer isso, ou então não percebo nada destes tempos modernos. O rapaz não avaliou bem a situação, partiu logo para o pior lado da coisa...Agora vai ser um bico-de-obra para isto entrar nos eixos. :))

Abraço, Elvira.
(Com o dia chegou quase ao fim penso que os exames foram feitos, amanhã conte como lhe correram. )

Cidália Ferreira disse...

Mais um capitulo interessante, porém de sofrimento
-
Beijos. Bom fim de semana!

Paula Saraiva disse...

Gostei bastante. Beijinhos

Ailime disse...

Boa noite Elvira,
Continuando a acompanhar esta bela história.
Beijinhos,
Ailime

Lúcia Silva Poetisa do Sertão disse...

Ambos com suas mágoas sem as revelar e causando mal-entendidos, separando-os por tanto tempo.
Abraços fraternos!

João Santana Pinto disse...

Outra das caraterísticas da Elvira acaba por ser a justiça e a igualdade que dá aos temas sobre os quais versa e neste caso, aqui é oferecido a quem lê que o homem também pode sofrer por amor, que também pode sentir-se maltratado (era um amor jovem e nessas idades tudo ganha uma dimensão estratosférica).

Fico a aguardar pelo desenvolvimento no sentido que ele acabe por cair em si e verificar que para além do pai, ela teria sempre necessitado de crescer. Hoje, mais do que naquela época, até para que os casamentos tenham hipótese de longevidade, é importante o crescimento individual e a personagem Luísa não teve essa oportunidade.
Abraço, durante o fim de semana vou tentar avançar na leitura