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21.2.20

OS SONHOS DE GIL GASPAR - PARTE XLI


- Hoje é doze de Dezembro, - respondeu ela.
-A minha filha faz um ano no dia catorze. Devias vê-la. É o bebé mais bonito do mundo. Meu Deus, preciso ligar para casa. Devem estar numa aflição.
Com o coração mais triste que dia de chuva, mas esforçando-se por não dar parte de fraca, Luísa estendeu-lhe o telemóvel dizendo:
- Liga-lhes. Conta-lhes o que te sucedeu, mas por favor não lhes digas onde estás, nem lhes fales de mim.
- Porquê? – perguntou ele franzindo o sobrolho.
- És um homem famoso. Se a imprensa sabe, que estiveste aqui durante todos estes dias, vão acampar aí à porta, tirar fotografias e encher-me de perguntas. Vão encher as páginas de jornais, inventar histórias, espionar a minha vida, até ao berço, e eu não quero perder o meu sossego.
- A minha família tem o direito de saber que só estou vivo, graças a ti.
-Poderás contar-lhes tudo o que quiseres, quando voltares a casa, mas pede-lhes que não o revelem a ninguém. Tenho direito ao anonimato e não quero ver a minha privacidade  invadida.
- Respeitarei a tua vontade, fica descansada.
- Podes telefonar do quarto estarás mais à vontade. Pede à tua mulher que avise a polícia, para que interrompam as buscas no rio. Não se justificam os gastos de dinheiro público, em buscas desnecessárias.
- Vou telefonar à minha irmã. Sou viúvo.
-Lamento, - respondeu, virando-lhe as costas, embora no íntimo tivesse gostado de saber que era um homem livre, que não tinha uma esposa à sua espera. Saiu da sala e foi para a cozinha. Meteu a loiça suja do almoço na máquina, e depois refugiou-se no seu atelier.
Estava desolada. Ela sabia que não podia ter-se apaixonado por ele. Era um desconhecido, podia até ser casado, a sua razão avisara-a todos os dias, mas o seu coração, não lhe dera ouvidos.
"Não se domina um coração sedento de amor." - murmurou para si mesma.
- Luísa!
- Estou aqui no atelier, - respondeu apresando-se a secar as lágrimas.
- Estás triste – disse estendendo-lhe o telemóvel. - Pensei que ficavas feliz por eu ter recuperado a memória.
- E é claro que fiquei. Mas habituei-me à tua companhia, vou sentir saudades.
Ele pegou-lhe nas mãos e puxou-as fazendo-a levantar-se. Abraçou-a.
-Antes mesmo de ter recuperado a memória, já tínhamos combinado esta manhã que eu partia hoje. As razões porque parto agora são totalmente diferentes das que te expus esta manhã, porque  agora sei, que não há nada nem ninguém que nos impeça de ter uma relação, se os teus sentimentos forem tão fortes quanto os meus. É verdade que nos conhecemos há poucos dias, mas sinto-me como se te conhecesse desde sempre. Também é verdade que não sou só. Tenho uma filha que amo de todo o coração e que terás de saber, se és capaz de  aceitar e amar, como a primeira dos nossos filhos, se me aceitares a mim. Conhecendo a generosidade dos teus sentimentos, acredito que a amarás como merece. Mas também sei, que os muitos anos que vives em solidão, podem confundir o teu coração, pelo que a minha ausência servirá para conheceres a força daquilo que sentes.

14.11.15

FOLHA EM BRANCO PARTE XXVII


                                                     foto do google


Inesperadamente, quase à entrada da ponte Vasco da Gama, Mariana disse:
-Lisboa é maravilhosa!
Miguel quase provocava um acidente ao olhar para ela, ao mesmo tempo que o seu pé carregava no travão.
-Lembraste alguma coisa?
-O quê?
Como o quê? Disseste que Lisboa é maravilhosa! – disse ele nervoso
- Ah! Isso? Não sei. Veio-me à cabeça, essa ideia. Nada mais.
- Pode ser um sinal, disse ele sem convicção. Fica atenta. Se reconheceres alguma rua, algum monumento, por favor diz.
- Fica descansado. Ninguém deseja mais isso do que eu.
Mas não voltou a falar até entrarem em casa.
Miguel vivia, no sexto andar de um edifício antigo, numa das zonas mais bonitas da cidade. À chegada, tiveram que dar uma volta pelo quarteirão, até que Miguel encontrou um lugar vago para estacionar, um pouco distante da casa.
O elevador, era antigo, pequeno, mas os dois lá se acomodaram o melhor que puderam pois as três malas de viagem quase o enchiam por completo.
A casa ocupava todo o espaço do prédio que só tinha um inquilino por andar.
Miguel foi abrindo as janelas e mostrando a casa à jovem.
Um quarto, que fora dos pais, o seu quarto, mais um quarto, que era da avó Ermelinda, quando vinha passar férias com o filho, e que seria o quarto para ela, a cozinha, uma sala, na qual uma escada em caracol, despertou a curiosidade da jovem.
-Dá para a mansarda, onde tenho o atelier. Também tem entrada pelo exterior, que uso para a entrada e saída dos materiais e telas.
E finalmente a casa de banho. Destoa do resto da casa, pois foi reconstruída o ano passado. Havia junto dela, um pequeno quarto sem utilidade, mandei derrubar a parede e assim o espaço quase triplicou.
- A casa está impecável. Tanto tempo, fechada, não devia ter pó?
-Na semana passada, telefonei à porteira e pedi-lha que arranjasse alguém de confiança, para vir limpar e arejar a casa.
- Pensas em tudo!
-Estou habituado a viver sozinho. Bom, agora que já conheces a casa, fica à vontade, eu vou lá abaixo à porteira. Preciso da sua ajuda, para resolver algumas coisas, e saber se já chegaram as telas e se elas as recebeu.
Saiu. Mariana foi até à janela e ficou maravilhada. A paisagem era muito bonita. Via-se uma grande parte de Lisboa, o Tejo, a ponte 25 de Abril, e o
Cristo-Rei. “O ideal para um pintor” murmurou preparando-se para arrumar as roupas no armário