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7.12.22

CONTOS DE NATAL - O SUAVE MILAGRE - PARTE II




Apenas ouvira falar desse novo rabi da Galileia, que alimentava as multidões, amedrontava os demonios, emendava todas as desventuras - Obed, homem lido, que viajara na Fenicia, logo pensou que Jesus seria um desses feiticeiros tão acostumados na Palestina, como Apolonio, ou Rabi Bem-Dossa, ou Simão, o Subtil. Êsses, mesmo nas noites tenebrosas, conversam com as estrelas, para eles sempre claras e faceis nos seus segredos: com uma vara afugentam de sobre as searas os moscardos gerados nos lodos do Egipto: e agarram entre os dedos as sombras das arvores, que conduzem, como toldos beneficos, para cima das eiras, à hora da sesta. Jesus da Galileia, mais novo, com magias mais viçosas decerto, se ele largamente o pagasse, sustaria a mortandade dos seus gados, reverdesceria os seus vinhedos. Então Obed ordenou aos seus servos que partissem, procurassem por toda a Galileia o rabi novo, e com promessa de dinheiros ou alfaias o trouxessem a Enganim, no país de Isaachar.


Os servos apertaram os cinturões de oiro - e largaram pela estrada das Caravanas, que, costeando o lago, se estende até Damasco. Uma tarde, avistaram sobre o poente, vermelho como uma romã muito madura, as neves finas do monte Hermon. Depois, na frescura duma manhã macia, o lago de Tiberiade resplandeceu diante deles, transparente, coberto de silencio, mais azul que o céu, todo orlado de prados floridos, de densos vergeis, de rochas de pórfiro, e de alvos terraços por entre os pomares, sob o vôo das rolas.

Um pescador que desamarrava a sua barca duma ponta de relva, assombreada de aloendros, escutou, sorrindo, os servos. O Rabi de Nazareth? Oh, desde o mês de Ijar, o Rabi descera, com os seus discipulos, para os lados para onde o Jordão leva as águas.

Os servos, correndo, seguiam pelas margens do rio, até adiante do vau, onde ele se estira num largo remanso, e descansa, e um instante dorme, imóvel e verde, à sombra dos tamarindos. Um homem da tribo dos Essénios, todo vestido de linho branco, apanhava lentamente ervas salutares, pela beira da água, com um cordeirinho branco ao colo. Os servos humildemente saudaram-no, porque o povo ama aqueles homens de coração tão limpo e claro e cândido como as suas vestes cada manhã lavadas em tanques purificados. 

E sabia ele da passagem do novo Rabi da Galileia, que como os Essénios ensinava a doçura, e curava as gentes e os gados? O essénio murmurou que o Rabi atravessara o Oásis de Engaddi, depois se adiantara para além...

- Mas onde, "além"?

- Movendo um ramo de flores roxas que colhera, o essénio mostrou as terras de além Jordão, a planície de Moab. Os servos vadearam o rio - e debalde procuraram Jesus, arquejando pelos rudes trilhos, até às fragas onde se ergue a cidadela sinistra de Makaur... 


NOTA: Talvez tenham notado alguns erros, como palavras sem acento ou palavras com acento, com um z em vez de um s. Era assim que se escrevia no tempo do autor e portanto eu não ia fazer alterações

10 comentários:

Pedro Coimbra disse...

Há três grandes autores em Língua Portuguesa - O Eça, o Eça e o Eça (Vasco Santana)

chica disse...

Belo conto e realmente não poderia ser modificada a escrita da [época. Ótimo dia! beijos, chica

Tintinaine disse...

Eu sou como o Vasco Santana, o Eça e sempre o Eça!
Um bom resto de semana, no sábado temos que limpar os marroquinos!

Emília Pinto disse...

Belos contos nos tens apresentado, Elvira. Uito obrigada! Espero que estejas bem se saúde, com os teus problemas resolvidos. Um beijinho e que tudo vos corra pelo melhor
Emilia

Beatriz Pin disse...

Olá amiga Elvira. Gostei muito do que lí.
Agardo por uma continuação pois é uma historia diferente das que conhezo.
Um beijinho.
Bo tempo de solsticio de inverno.

ematejoca disse...

Concordo absolutamente com o Vasco Santana.
Em Portugal não há ninguém que não conheça este conto de natal 🎄 do „deus“ da literatura portuguesa.

Ailime disse...

Boa tarde Elvira,
É na verdade um belo conto.
Claro que se compreende que a ortografia não seja alterada.
Beijinhos, saúde e bom feriado.
Ailime

- R y k @ r d o - disse...

Um belo conto que gostei de ler
.
Cumprimentos poéticos
.
Pensamentos e Devaneios Poéticos
.

teresadias disse...

Continuo gostando e entendendo tudo o que leio.
Beijo, Elvira.

Ana Freire disse...

Um conto, com aquele inconfundível estilo descritivo de Eça... em que temos a sensação de tão bem visualizar o que o texto transmite!...
Fez bem em manter a versão original, Elvira!
Adorei ler este II capitulo! Beijinhos
Ana