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26.12.23

O NATAL EM QUE FIQUEI RICA

 


Ser pobre e satisfeito é ser rico. 
E bastante rico.

William Shakespeare

Havia uma árvore naquele Natal. Não tão grande e frondosa como outras, mas estava pejada de enfeites e tesouros e resplandecia de luzes. Havia presentes, também. Alegremente embrulhados em papel vermelho ou verde, com etiquetas coloridas e fitas. Mas não tantos presentes como de costume. Eu já tinha reparado que a minha pilha de presentes era muito pequena.

Nós não éramos pobres. Mas os tempos eram difíceis, os empregos escassos, o dinheiro à justa. A minha mãe e eu partilhávamos uma casa com a minha avó e com os meus tios. Naquele ano da Depressão, toda a gente espaçava refeições, levava sanduíches para o trabalho e ia a pé para poupar nos bilhetes de autocarro. Anos antes da Segunda Guerra Mundial, já vivíamos no dia-a-dia, como muitas outras famílias, o que então se iria ouvir como slogan“Usa-o, aproveita-o ao máximo; faz com que funcione, ou passa sem ele.”

Havia poucas escolhas. Compreendia pois porque era tão pequeno o meu monte de presentes. Compreendia, mas sentia, ainda assim, uma ponta de pesar à mistura com um complexo de culpa. Sabia que não poderia haver surpresas empolgantes naquelas poucas caixas vistosamente embrulhadas. E sabia que uma delas tinha um livro. A minha mãe arranjava sempre um livro para mim. Mas nada de vestidos novos, camisolas ou um roupão acolchoado e quentinho. Nenhum dos miminhos tão desejados na altura do Natal…

Havia uma caixa com o meu nome da parte da minha avó. Guardei-a para o fim. Talvez fosse uma camisola nova, talvez um vestido — um vestido azul. A minha avó e eu gostávamos ambas de lindos vestidos e de todas as tonalidades de azul. Soltando os devidos “Ohs” e “Ahs” ao ver a aromática barra de sabonete feito de mel, as luvas vermelhas, o já esperado livro (um novo da Nancy Drew!), rapidamente cheguei àquele último embrulho. Dei por mim a sentir uma centelha do entusiasmo do Natal… Era uma caixa bastante grande. Com vergonha de mim mesma por ser tão gananciosa, por esperar receber um vestido ou uma camisola (mas esperando na mesma!), abri a caixa.

Meias! Só meias! Soquetes, meias altas, até mesmo um par daquelas meias horrorosas de algodão branco que estavam sempre a escorregar e se enrodilhavam em volta dos joelhos.

Esperando que ninguém tivesse dado conta do desapontamento, peguei num dos quatro pares e agradeci à minha avó, com um grande sorriso. Ela também sorria. Não com o seu sorriso educado e distraído de “Sim, querida,” mas com o seu sorriso feliz e radiante, de “Isto são coisas importantes para uma mulher!” Será que me esquecera de alguma coisa? Olhei de novo para a caixa no chão — nada, a não ser as meias. Só que agora eu conseguia ver que havia outro par por debaixo do que eu tinha pegado. Duas camadas de meias. E mais uma! Três camadas de meias!

A sorrir de verdade, comecei a retirá-las da caixa. Meias cor-de-rosa, meias brancas, meias verdes, meias de todos os tons inimagináveis de azul. Toda a gente estava a olhar, rindo comigo, enquanto eu atirava as meias ao ar e as contava. Doze pares de meias!

Levantei-me e dei um abraço tão apertado à minha avó que até nos doeu às duas. “Feliz Natal, menina Joan!” disse ela. “Agora, todos os dias, terás muitas escolhas a fazer. Estás rica, minha querida! ” E era verdade. Naquele Natal e durante todo o ano, todas as manhãs, eu escolhia do meu elegante armário da roupa interior qual o par de meias a usar. E sentia-me rica. E ainda sinto!

Mais tarde, a minha mãe disse-me que a minha avó tinha andado a esconder aquelas meias durante quase um ano — poupando todas as moedinhas, comprando um par de cada vez. Um dia, tendo visto um lindo par de meias azuis com as beiras elásticas bordadas à mão, ela pedira mesmo ao compreensivo vendedor para deixar um sinal a reservá-las durante três semanas.

Dentro daquela caixa estava embrulhado um ano de amor.

Foi um Natal que eu nunca esquecerei.

A prenda da minha avó mostrou-me como as pequenas coisas podem ser importantes.

E como o amor nos faz a todos imensamente ricos.


Joan Cinelli

Jack Canfield & Mark Victor Hansen
Chicken Soup for the Soul – Christmas Cheer
Chicken Soup for the Soul Publishing, LLC, 2008
(Tradução e adaptação)



Nota: Lamento pelo que aconteceu ontem com a fonte de onde li o conto que vos apresentei, nem sei porque o endereço da página saiu encriptado. Mais tarde voltei à página e emendei, mas não sei se viram. As minhas desculpas.



9 comentários:

Citu disse...

Me gusto el relato. Feliz navidad para ti y tu familia. Te mando un beso.

ematejoca disse...

A minha avó materna também tinha a mania de me dar meias … e muitos, muitos, muitos livros 📚

Fatyly disse...

Nunca recebi prendas e ou carinho da minha avó materna.
Este conto é tão bonito e gostei muito!
Beijos e um bom dia

Maria João Brito de Sousa disse...

Bom dia, querida amiga.

Não se preocupe que já está tudo resolvido, no que respeita ao mistério da fonte do conto de ontem.

O de hoje também é bonito. Vê-se bem que é com amor que escolhe os contos com que nos brinda nesta quadra natalícia.

Um afectuoso abraço!

Duarte disse...

O NATAL a grande fonte de inspiração.
Continuação de Boas Festas.
Abraço de vida

Manu disse...

Um bonito conto de Natal, que é um pouco coincidente com a realidade que vivemos.
É bom dar valor às pequenas coisas.
Boas festas!
Abraço Elvira

Olinda Melo disse...

Olá, Elvira
Mais um conto de Natal que nos traz uma bela lição. Saber dar valor às pequenas coisas é muito importante.
BOAS FESTAS!
Abraço
Olinda

Rogério V. Pereira disse...

Esse conto diz-me muito
Quase sempre olho
o olhar de quem me dá
E pouco olho ao que me é dado

Continuação de Boas Festas

redonda disse...

Esta também é tão bonita!