foto da net
No ano seguinte, Rosa dava à luz uma menina e no outro, mais uma menina e no outro ainda, um rapaz.
Três filhos em três anos. João
trabalhava agora na C.U.F., ganhava um pouco melhor mas, ainda assim,
pouquíssimo para as necessidades de cinco bocas. A casa também não tinha
condições. No quarto, além da cama de casal e do armário, só cabia o berço. As
duas crianças mais velhinhas dormiam no chão da cozinha, numa cama feita com duas mantas de trapos.
Quando vagou uma casa de dois
quartos no pátio, mudaram-se para lá. Mas Rosa já estava outra vez grávida.
Nessa altura não havia pílula, só as “camisinhas”. Mas João não as queria usar.
Quando os amigos, ou vizinhos comentavam da pobre Rosa que sofria de “prenhez
cronica” ele dizia a rir:
-E o que é que eu hei-de fazer? O
raio da mulher basta olhar para mim quando estou a mudar de roupa para
“embuchar” logo.
Rosa adorava o marido. Nunca lhe
batera, o que os maridos de algumas vizinhas faziam com frequência, nunca a ofendera e,
às vezes, até era carinhoso com ela. Era bom pai, muito trabalhador, não se
metia nos copos como a maioria dos homens do pátio. O pior, era não querer usar a malfadada “camisinha”.
Cada vez que ela lhe pedia, respondia sempre que "os rebuçados embrulhados
não sabem a nada". E Rosa começava a sentir-se exausta.
Felizmente para ela, o bebé não foi
além do terceiro mês, tendo sofrido um aborto espontâneo. O pior foi que pelo
Natal já estava outra vez grávida. Rosa tinha que aproveitar o trabalho na Seca
do Bacalhau para ajudar a despesa da casa. Levantava as crianças logo de
manhãzinha e lá ia ela para o trabalho, com um filho no bucho, os dois mais
pequenos sentados cada um do seu lado sobre a anca e a maiorzinha agarrada às
saias. Na Seca, estendia o xaile dentro dum carro de mão e lá metia os bebés
guardados pela pequenita enquanto ela trabalhava. Tempo depois, voltou a
abortar e deu Graças a Deus por isso.
Depois, vieram mais três em
quarenta meses. Rosa ainda não fizera 28 anos e já tivera seis filhos e dois
abortos. As duas filhas mais velhas já estavam na escola. Rosa tinha vergonha
de mandar as crianças, para a escola, com os sapatos rotos mas não podia comprar
outros. De roupa, as duas mais velhas estavam servidas. Havia na Seca uma
senhora, esposa do chefe de escritório, que tinha duas filhas, um pouco mais
velhas que as suas e dava-lhes a roupa que já não servia às meninas. Coisas
caras, de bons tecidos, que mesmo depois de deixarem de servir às filhas, ela
guardava religiosamente para a mais pequenina. Para os rapazinhos é que era
pior. Mas a necessidade aguça o engenho e Rosa ia aproveitando das suas roupas
e do marido, que já não davam para consertar, alguns bocados bons que dava para
uns calções ou um bibe para eles. De quando em vez, Amália, a cunhada, lá
arranjava maneira de lhe dar um quilo de arroz, umas batatas ou meio litro de
azeite. Não muito que também ela vivia com muitas dificuldades. O problema dos
pobres é que o que podem partilhar é sempre muito menos do que manda o seu
desejo de ajudar.
À noite, quando regressava do
trabalho, Rosa recolhia do pessoal que vivia na Seca e cuja cozinha era
composta por enormes fogões a lenha, o carvão que os ia aquecer na braseira.
Mas sentia-se muito cansada.
Sentia-se velha. A vida estava cada dia mais difícil. O ordenado do marido não
chegava para nada. O dono da mercearia fiava-lhe o avio durante a semana.
Quando no sábado o marido recebia a semanada, passava por lá para acertar
contas e vinha logo sem dinheiro para casa.
Continua
Continua
Bom fim de semana
18 comentários:
Tempos difíceis, muito trabalho, muitos filhos e pouco dinheiro.Mas apesar do cansaço, parece que era feliz.Será? Vamos esperar! bjs,chica
Assim se vê a importância que o planeamento familiar teria anos mais tarde...Não se pode estar sempre grávida, ainda mais sem dinheiro.
Um belo exemplo de como a questão de engravidar ou não, era coisa apenas da mulher...os homens não estavam dispostos a usar camisinha...!
Vamos ver o que acontece a seguir...
xx
Vida pobre demais Elvira _ amacia a mão que a pequena Rosa não vai aguentar ...rs (tô que nem nas novelas que o expectadores dão palpites e o autor vez ou outra obedece) ,
A Rosa com todas as dificuldades vai indo feliz _precisam criar juízo e não filhos,
Estou gostando e dessa vez, lendo em tempo real,
fica o abraço e desejos de uma boa sexta feira,
_felizmente parece que vamos ter uma chuvinha boa... :))
bj
Estamos a recordar um Portugal triste, opressor.
Que já não existe.
Mas existiu e de nada adianta ser negacionista.
Beijinhos e votos de bfds
Vida dura, muito dura.
As crianças foram vítimas.
Um tempo e uma sociedade feita de tantas carências...
Lentamente voltamos a esses tempos.
Esta coisa da CEE é o que nos dá.
Depois aparecem os políticos que a comunicação social promove e que destroem tudo por onde passam...
Parece um festival de verão com muita música e forrobodó...
...e o povo vota...
Tempos duros, estes que aqui recordas, amiga. Também me lembro de situações quase idênticas que me marcaram e que ainda hoje permanecem vivas na minha memória. Não que as tenha alguma vez vivido mas na mercearia dos meus pais aviavam-se muitas famílias, economicamente muito débeis,cujo ordenado mal lhes dava para comer. Famílias muito numerosas num tempo em que o salário do dia nem sempre estava garantido. Falo sobretudo de pescadores e agricultores. Os operários das fábricas tinham o ordenado mensal assegurado embora muito baixo. No entanto, não era suficiente para vestir as crianças e trazê-las calçadas. Tempos tristes que jamais irei esquecer. Beijinhos
vida difícil....
:(
Estou contente, porque na realidade a Rosa encontrou gente boa; o que ela está a passar é fruto da época, muito trabalho, pouco dinheiro e sempre muitos filhos. Na minha aldeia as minhas vizinhas tinham 10, 12 e mesmo uma com 14 filhos. Não sei como os meus pais não se " contaminaram " e tiveram só 2. O meu pai era um pobre taxista e dizia que só podia criar 2 e, mesmo sem pílula lá se foram arranjando; assim conseguiram dar um curso aos filhos. Cá estarei na próxima terça, Elvia. Um beijinho e um bom fim de semana
Emília
Havia alegria e muito humor!
humildes viviam numa pobre casinha
rebuçados embrulhados não têm sabor
João, não vestia a camisinha...
Eram pobres, cuja a pobreza não os impedia de seres felizes. Essa história está muito bem contada, cujos os acontecimentos nela relatados correspondem de facto à realidade ao tempo nela vividos. As duas crianças mais velhas dormiam no chão da cozinha, numa cama feita com duas mantas de trapos. Que ninguém duvide da sua veracidade! Aconteceu comigo, dormir no alpendre, não na casinha, dois sacos de serapilheira, meios de palha, as bocas cosidas uma na outra, foi o meu colchão durante muitos anos colocado em cima do cimento duro. Talvez seja por causa disso que eu não sofro da coluna e ainda bem.
Desejo-lhe amiga Elvira um bom fim de semana, um abraço.
Eduardo.
Será que a felicidade supera os tempos difíceis?
Gosto cada vez mais.
Beijo*
Que triste, muitos vivem assim...
bjokas =)
Vida difícil Elvira, ainda mais tendo um marido turrão por ignorância, que não pensa nem um pouquinho na saúde da esposa, e nas dificuldades à enfrentar com tantos filhos. Mas tomara que o amor dos dois vença esta etapa.
Gostei.
Abraços,
Mariangela
E a Rosa lá vai indo seguindo o seu caminho, no meio de sacrifícios e sem poder dispor da própria vida.
Cara Elvira, desejo-lhe um bom fim de semana.
Bj
Olinda
OI ELVIRA!
MUITA PENA DA ROSA. ERAM TEMPOS DIFÍCEIS PARA AS MULHERES QUE COMO ROSA, NÃO TINHAM COMO SE RESGUARDAR E SAIAM DE UMA GRAVIDEZ PARA OUTRA E COM ISSO, TAMBÉM MINAVAM SEUS ORGANISMOS E POR ISSO, ENFRAQUECIAM E ENVELHECIAM MUITO CEDO.
ESTÁ CADA VEZ MELHOR, ESTOU ACOMPANHANDO E GOSTANDO MUITO.
ABRÇS
http://zilanicelia.blogspot.com.br/
Os tempos eram difíceis para quase toda a gente, mas com tantos filhos era quase impossível ter uma qualidade de vida mínima.
Um relato impressionante, este teu conto.
Tem um bom domingo e uma boa semana, querida amiga Elvira.
Beijo.
Três crianças e dificuldades de vida...uma coisa que a Santa madre Igreja incentivava em conluio com o poder político.
Bom domingo e abraços
Que vida triste e pobre da Maria e sua família né? Mas o maridão não querer usar camisinha também é demais né? Cara bobo!!!!
A história continua boa minha amiga!
Olá, Elvira!
Vida de escrava, sofrida, em que os prazeres da mesma se resumiam a pouco mais do que fazer lilhos e vê-los crescer…
Gosto das expressões do antigamente que a Elvira tão bem usa no texto,saborosas e também caídas em desuso: como a de alguém "ir aviar-se à loja" - que me trazem memórias de infância, "moço de recados da mãe"...
Um abraço e boa semana.
Vitor
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