Até aqui eu falei da pesca à linha. Mas porque esta pesca era muito dura, e arriscada, os pescadores sempre sonhavam com uma maneira mais fácil de pescar o bacalhau. Daí que na primeira década do séc. XX apareceram os primeiros barcos arrastões de origem francesa. A Parceria Geral de Pescarias, sempre na vanguarda, manda construir um navio a vapor arrastão, tentando assim competir com os já citados arrastões franceses e quem sabe se resultasse deixar de lado a pesca à linha. Recorde-se que a Parceria Geral de Pescarias tinha na altura quatro veleiros, o Argus, o Creoula, actual navio escola da Marinha de Guerra, o Hortense e o Gazela Primeiro actual museu marítimo em Filadélfia.
Partiu pois o Elite para a pesca nesse longínquo ano de 1909, mas a verdade é que se a sua prestação não foi famosa nesse ano, no seguinte foi ainda pior. Consta que a máquina apesar de demasiado grande não tinha contudo força suficiente para puxar as redes. Mas parece que o facto de os pescadores não estarem habituados a esse tipo de pesca, o enorme consumo de carvão, também contribuíram em muito para o insucesso do Elite.
Por certo já todos ouviram falar do navio NRP AUGUSTO DE CASTILHO, heroicamente afundado, em 14 de Outubro de 1918 após luta desigual com o submarino U-139 da Imperial Marinha Alemã, a fim de dar fuga ao paquete S. MIGUEL em rota do Funchal para Ponta Delgada, transportando 206 passageiros. Agora o que talvez não saibam é que este navio era o mesmo arrastão Elite reconvertido e ao serviço da Marinha de Guerra.
Eis um pequeno excerto da história que poderão ler na integra
AQUI
“Foi no dia 14 de Outubro de 1918 que, encontrando-se a escoltar o paquete «São Miguel», que se dirigia da Madeira para os Açores com mais de 1500 pessoas a bordo, foi surpreendido pelo fogo alemão disparado a partir do submarino U-139, ao largo dos Açores.
O caça minas «Augusto de Castilho», a navegar sob o comando do 1.º Tenente Carvalho Araújo, enfrentou o inimigo, colocando-se entre o paquete e o submarino, ainda que consciente da desproporção de armamento entre as duas unidades de guerra.
Visivelmente em desvantagem, este pequeno caça minas improvisado conseguiu, através da sua intervenção, pôr a salvo o paquete «São Miguel» que se afastou do cenário de guerra, chegando incólume ao seu destino. Tal acção resultou, no entanto, na perda do «Augusto de Castilho» e na morte do seu comandante, de um aspirante a oficial e de quatro praças. “
Voltando à Pesca do Bacalhau, a partir de 1942 os armadores viraram-se em força para a compra de navios arrastões. Mas foi a chegada do “Fairtry” um enorme navio de bandeira inglesa que marcou o início do fim para a pesca do bacalhau do Atlântico e na verdade para muitas das fainas no mundo.
Foto da net
Este era o primeiro arrastão fábrica congelador, uma embarcação de vários milhões de dólares, equipada com todas as inovações do pós-guerra. Debaixo do convés havia uma fábrica de processamento com máquinas automáticas de filetes, refeições de peixe e um enorme conjunto de armazéns frigoríficos. Podia pescar sem parar 7 dias por semana, semanas sem fim, içando redes durante terríveis temporais de Inverno que facilmente deitariam abaixo a Estátua da Liberdade. Com radar, sonar, detectores de peixe, podia detectar e capturar cardumes inteiros de peixe com uma eficácia assustadora. Depois deste, outros vieram e cada vez maiores. A par destes navios fábrica continuavam a ir à Pesca os veleiros de pesca à linha.
O Bacalhau começou a ser pescado cada vez mais cedo. Um Bacalhau precisa de cerca de seis anos para atingir a sua maturidade sexual e se poder reproduzir. De cada 20 bacalhaus bebés só um conseguirá sobreviver até essa idade.
A partir de 1968 aconteceu que os grandes navios apesar de toda a sua capacidade em detectar o peixe, não encontravam os grandes cardumes a que estavam habituados. Também não era para menos por essa altura existiam mais de 700 destes grandes navios fábricas, sendo que só a União Soviética possuía 400.
Por outro lado em Portugal cuja pesca continuava a ser feita à linha, os pescadores começaram a recusar embarcar, os salários eram de miséria, os riscos muito grandes, e por outro lado começava a vaga da emigração portuguesa, que apresentava menos riscos e dava mais dinheiro.
Daí até à última partida destes veleiros mediaram apenas 3 anos.
Em 1975 a Islândia decide alargar a sua ZEE zona económica exclusiva para 200 milhas, à volta da ilha, proibindo assim a pesca dentro dessa zona. Isto deu origem à “ guerra do bacalhau” com os navios patrulha islandeses a tentarem expulsar os barcos pesqueiros e a marinha inglesa a proteger estes.
Apesar de ambos os países pertencerem à Nato, esta manteve-se neutral e foi a diplomacia que acabou por resolver o assunto, e conduziu a um acordo entre as partes.
Em 1977 o Canadá resolveu seguir o exemplo da Islândia, alargou os seus limites para as 200 milhas, mas não teve a visão suficiente para diminuir ou cessar a pesca do bacalhau pelos seus arrastões. Chegou ao limite em 1992 quando fechou os bancos à pesca, encerrando fábricas e mandando para o desemprego mais de 2000 pessoas. Porém pode ter sido tarde de mais e nunca mais se conseguir recuperar o stock de bacalhau, porque os arrastões não destruíram apenas os cardumes de bacalhau, mas também terão alterado todo o ecossistema que ele precisava para a sua sobrevivência.
Em 1999, a E.U. instaurou um plano de longo prazo para a recuperação da população do bacalhau na região do Báltico. E em 2003, foi proibida a pesca de bacalhau com redes de arrasto, redes de cerco dinamarquesas e similares, no mar Báltico, no período de Abril a Maio.
Segundo a Greenpeace neste momento existe apenas um stock “saudável” de bacalhau no Mar de Barents no Norte da Noruega e da Rússia. Se as regras não forem infringidas e as quotas ultrapassadas poderá manter-se assim . O problema continua a ser com os arrastões fábricas. Porque as suas redes têm no fundo um cabo grosso que chega a pesar mais de 300 toneladas, que serve para as manter bem no fundo mas que arrastam tudo no fundo, provocando no ecossistema feridas incicatrizáveis.
Resta a esperança de criação em cativeiro. Mas a produção de bacalhau em cativeiro, em gaiolas flutuantes, enfrenta um sério obstáculo. É que contrariamente ao salmão, o bacalhau apenas come organismos vivos, não aceita ração. E se este obstáculo for ultrapassado no futuro, alguém acredita que o bacalhau terá o mesmo gosto de agora?
Fontes
http://vilapraiadeancora.blogs.sapo.pt/91205.html
Wikipédia
http://www.greenpeace.org/
e o conhecimento da autora que.tendo nascido e vivido toda a sua infância na Parceria Geral de Pescarias, ali trabalhou durante largos anos
Maria Elvira Carvalho