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18.3.17

CASAMENTO POR PROCURAÇÃO - PARTE XXII


Ficou triste. Mais do que isso, sentia-se irritada. Gostava do emprego, tinha-se esforçado por ser uma boa empregada e não tinha tido culpa de ter adoecido.
- Não fiques triste. Não é nada pessoal, acontece a qualquer um. E é melhor assim, precisas pôr-te boa e ainda vai levar um tempinho até que voltes a sentir-te como antes, - animou-a Quim.
-Sei. Mas não consigo evitar. Gostava do trabalho e as colegas eram uma simpatia. Também estou preocupada contigo, passas os dias comigo, não tens ido trabalhar…
-Não te preocupes. Nesta época a afluência ao restaurante baixa sempre de forma drástica. Por isso costumamos fechar oito dias antes do Natal, e reabrimos dois dias antes da passagem de ano. Natal é tempo de recolhimento, de família, mas no ano novo é diferente, é sempre dia de muito movimento. Faltam poucos dias para o Natal. Gostaria de cear com os tios. Achas que estarás bem até lá?
- Espero que sim. Estou cansada desta imobilidade.
Uma sombra de tristeza ensombrou o seu rosto. Ele reparou. Estava sempre atento.
- É a proximidade do Natal? Sentes saudades? - Perguntou
- Sim. É o primeiro Natal que passo longe dos meus pais. Da nossa terra.
Sentia vontade de chorar, mas não o queria fazer na frente dele. Já lhe bastava o sentir-se feita um trapo velho, o rosto macilento, o cabelo sem brilho, o corpo sem forças pela doença. 
O carinho com que a tratava, fazia com que cada dia gostasse mais dele. Mas com aquele aspeto era impossível provocar algum sentimento nele que não fosse compaixão. 
Será que ele ainda pensava na Joana-Boneca? Ela sempre pensava na outra, como um boneca, não conseguia imaginá-la como uma mulher a sério.
No dia seguinte, escreveu uma longa carta para a mãe. Falou da cidade, da casa, do marido. Disse-lhe que não estivesse preocupada, ela era muito feliz. Mas não disse que estava doente, nem falou das saudades que tinha de casa.

22.4.16

MANEL DA LENHA - PARTE LIX



De notar que a data da Vigília está enganada. Ela ocorreu em 72 e terminou no 1º de Janeiro de 73



A passagem de ano na Seca, era sempre vivida sem festa. À meia noite, ouviam-se as buzinas dos barcos , e o pessoal residente vinha às janelas fazer barulho com as tampas dos tachos. Depois tudo regressava ao silêncio. Festas com bolos e espumante nem pensar, que o pessoal mal ganhava para o essencial. Nesta altura o Manuel já não vivia na seca como sabemos, mas a passagem de ano para ele não era festa que se festejasse.  Ele gostava de brincar no Carnaval, adorava ter toda a família à mesa pelo Natal,  tinha uma paixão especial pelo futebol, e agora que já tinha TV, via sempre que havia transmissão, gostava de ler, e de trabalhar no quintal. As outras comemorações não tinham para ele grande significado. Nessa passagem de ano, numa Vigília na Capela do Rato, os Católicos apoiam a justa luta dos povos nas Colónias e isso sai-lhes caro pois a polícia invade a Capela e detém os 70 participantes. Mais tarde, o padre Alberto Neto, é afastado do seu cargo, bem como todos os participantes que tinham cargos públicos. 
A contestação é cada dia maior, e ainda nesse mês, por decreto lei é criada a categoria de vigilantes nas universidades. Os estudantes chamar-lhes-iam "os gorilas de Veiga Simão"
Dias depois, o líder do PAIGC,  Amílcar Cabral é assassinado em Conakry, atraiçoado por dois membros do seu próprio partido. 
Se o governo português pensava resolver o problema com a sua morte enganou-se, pois a luta intensificou-se, e a Guiné viria a proclamar a independência unilateral nesse mesmo ano.
Por essa altura, o genro do Manuel está de novo mobilizado para Angola.  Partirá no início de Março. Desta vez ele quer deixar já a mulher com tudo tratado para que embarque logo que ele chegue a Luanda. Não poderá ir logo com ele, pois o barco leva apenas militares. Ela seguirá de avião.