Rua da Barroca - Foto minha
Ultimamente recordava demasiadas vezes o passado. Talvez que fosse um alerta do seu relógio biológico. Mas não conseguia afastar as recordações.
Ultimamente recordava demasiadas vezes o passado. Talvez que fosse um alerta do seu relógio biológico. Mas não conseguia afastar as recordações.
Lembrou aquela tarde em que disse aos pais que queria trabalhar. E pouco tempo depois estava a trabalhar numa papelaria. Mas o trabalho, não chegava para apagar na memória e no coração a angústia pelo que tinha acontecido. Decidiu estudar. Matriculou-se num curso nocturno. Era uma boa aluna. Terminou o Secundário. Seguiu-se a faculdade. Ela sempre gostara muito de publicidade e era muito criativa. Na hora da escolha decidiu-se pelo curso de Marketing, Publicidade e Relações Públicas. O fim do Curso foi o último dia em que teve os pais junto de si.
Fechou o livro. Olhou à volta e reparou no homem que um pouco mais à frente observava qualquer coisa na água. Encontrava-se de frente para a ribeira, com um pé em cima da muralha e a mão apoiada no joelho. Vestia calça de ganga e uma camisa branca.
Isabel não conseguiu ver-lhe o rosto voltado para a marina, mas qualquer coisa nele lhe despertou a atenção e pensou que a figura não lhe era totalmente estranha.
Encolheu os ombros, levantou-se e iniciou o regresso a casa., desta vez subindo a rua da Barroca.
Nessa noite Isabel custou a
adormecer. O que mais lhe desagradava na cidade eram as noites demasiado
barulhentas para o seu gosto. Contudo ela não costumava sofrer de insónias, e
quase sempre depois de dez minutos de leitura estava pronta a entregar-se nos
braços de Morfeu. Porém hoje, a noite há muito entrara pela madrugada, e ela
continuava a dar voltas e voltas na cama sem adormecer. As lembranças surgiam
como fantasmas, avançando traiçoeiras a coberto da escuridão nocturna.
Recordou o dia em que terminou o
Curso, a alegria dos seus velhos pais, apesar do ar cansado da mãe. Há dias que
ela andava assim, mas quando Isabel perguntava se tinha alguma coisa, sempre
respondia sorrindo. “Nada filha, não é nada. Ou melhor, é o peso dos anos”.
Bem cedo no dia seguinte, o pai bateu-lhe à porta do
quarto, pedindo para ela ir ver a mãe que não acordava.