Quando Teresa terminou o Ensino Secundário no liceu da vila mais próxima, a mãe decidiu que ela devia ir para a Universidade em Lisboa, já que era o único sítio onde tinha um familiar, a tia Julieta, irmã da sua mãe, viúva de um oficial da Marinha, a quem escreveu pedindo-lhe guarida para a filha, a fim de que esta pudesse frequentar a Universidade. A tia mostrou-se encantada em receber a sobrinha-neta e foi assim que ela viajou num carro de aluguer, desde a aldeia até à Avenida Estados Unidos da América onde a tia vivia. Um mês depois da chegada, a avó morreu de ataque cardíaco e Teresa voltou à aldeia, desta vez com a tia, para acompanharem Ermelinda à sua última morada.
Nessa altura, Teresa quis desistir da Universidade e ficar
na aldeia com a mãe, mas esta não o permitiu, e, assim tia e sobrinha voltaram para
Lisboa. A jovem tinha chegado ao último ano do Curso de Economia, quando a mãe sofreu um AVC
que a deixou incapaz de sobreviver sozinha. Teresa abandonou os estudos, despediu-se da tia-avó, e
regressou à aldeia. Durante oito meses foi uma filha amorosa e uma cuidadora
dedicada, mas isso não impediu que a mãe sofresse uma recidiva a que não resistiu.
Depois do funeral, Teresa fechou as
portas da casa, pediu ao casal que vivia na moradia ao lado, para dar uma
olhada pela sua habitação e lhe telefonar se houvesse alguma emergência e voltou com a tia-avó,
agora a única pessoa de família que lhe restava, para Lisboa. Enquanto esperava pelo novo ano escolar para
voltar à Universidade, empregou-se numa pastelaria, mais para sair de casa do que
por necessidade financeira, já que a mãe lhe tinha deixado algum dinheiro, e a
tia fazia questão de suprir todas as suas necessidades. Embora nunca tivesse
pensado em semelhante trabalho para o futuro, apaixonou-se por ele, fez amizade
com os colegas, especialmente com o pasteleiro, para junto de quem fugia nas
horas de menos movimento, para aprender como se faziam as mais diversas massas
e cremes. De tal modo, se entusiasmou que decidiu não voltar à Universidade. E
quando soube que o dono da pastelaria se pretendia retirar e queria vender o
negócio, comentou com a tia que se tivesse dinheiro suficiente, o compraria.
E então, Julieta disse-lhe:
-Bom, como sabes tenho oitenta e três anos, já não me
restarão muitos mais de vida. Além desta casa, tenho uma boa quantia em
dinheiro. O meu falecido marido era filho único e vinha de uma família com algumas
posses. Também ganhava bem e quando morreu, fiquei com uma boa pensão. Como
tens visto durante estes anos, desde que estás comigo, não sou pessoa de gastar mais do que preciso. E
como não tenho mais família, tudo será teu quando eu morrer, já o estipulei em
testamento. Por isso nada me impede de te comprar essa pastelaria se é esse o
teu sonho de vida. Vou telefonar ao meu advogado, para que trate disso.
Chorando de alegria e gratidão abraçou a tia, emocionada e
sem palavras para dizer o que lhe ia na alma.
E foi assim, que cinco anos antes, ela se tornara dona da
pastelaria “Flor da Avenida”, e iniciara a sua vida de empresária.
Naqueles cinco anos, muita coisa acontecera na vida de
Teresa. Desde logo a mais dolorosa, a perda da tia-avó Julieta, que, desde o primeiro momento em que chegara a Lisboa, fora como uma segunda mãe.
A sua vida ter-se-ia tornado ainda mais solitária, não fora
a relação de amizade que tinha com as suas empregadas, e especialmente com Mário,
o pasteleiro, que naqueles dias de tristeza a tratou com o mesmo carinho com
que um pai trataria uma filha, levando-a até sua casa, onde a mulher e a filha
completaram o seu trabalho, dispensando-lhe uma amizade e um carinho, que ela
nunca esqueceria.
Com uma mãe e uma avó profundamente religiosas, Teresa
aprendeu cedo que devia confiar em Deus, que Ele nunca lhe faltaria, e de facto,
até agora não se podia queixar. Perdera a família biológica, mas ganhara uma do
coração.
Ganhara até, na pessoa de Inês, a filha de Mário, uma irmã,
coisa que toda a vida desejara.