A mulher hesitou, mas por fim decidiu-se:
- Sabe, - disse baixando a voz como quem vai revelar um segredo. É que a Esperança, quando para aqui veio, tinha uns olhos castanhos, amendoados, que depois ficaram verdes. Ora eu penso que uma coisa assim só por bruxedo.
- Muito obrigada. Se a vir dou-lhe o recado senão…
Deixei a frase incompleta e afastei-me. Tinha ficado pensativa. Eu não acreditava em bruxedos, mas convenhamos que isto de uma pessoa ter olhos castanhos que viram verdes, não era de todo normal. As lentes de contacto em Portugal eram raras e caras, decerto não estavam ao nível do bolso de uma vendedora ambulante, pelo que o mais certo era a mulher se ter enganado.Com certeza que já não se lembrava bem dos olhos da outra. A idade faz muitas confusões. O melhor era não pensar mais nisso.
Mas a verdade é que aquela mulher me intrigou, desde a primeira vez que a vi.
E como sempre me apaixonaram os mistérios, e os detetives eram no meu imaginário, uma figura muito romântica, resolvi transformar-me num, e lá fui até à Prior do Crato.
Perguntei a várias pessoas se a conheciam. Ninguém sabia quem era. Comecei a pensar que a velha mulher dos amendoins, sabia do que falava quando disse que ninguém sabia onde morava. Quase a desistir, um garotito que jogava à bola, disse-me que a conhecia, e indicou-me a casa.
Respirei fundo e sem pensar dirigi-me para lá. Bati. Uma mulher dos seus quarenta anos, veio abrir. Pensei que o garoto me tinha enganado. E como o melhor remédio para o saber era perguntar-lhe, assim o fiz.
-Desculpe, disseram-me que morava aqui uma senhora que vende cartas, - foi a primeira coisa que me veio à cabeça e confesso que não era uma ideia famosa, já que podia comprar cartas em qualquer papelaria.
– Decerto me enganaram, - acrescentei ao ver que a mulher não parecia nem um pouco desconfiada.
- Ah! É aqui mesmo. É a Ti’Esperança. Mas ela está tão doente, coitadinha... Entre, entre, - convidou
Entrei. A casa era muito pobre. Tanto que me meteu dó. Sobre uma velha cama de ferro desconjuntada, com um puído lençol de linho, que já devia ter servido várias gerações, estava a enferma. Morta? Não fora os seus olhos, e eu diria que estava morta. Senti um arrepio….