A nível
internacional o início de Janeiro é marcado pelo triunfo da revolução
castrista em Cuba. O ditador Fulgêncio Baptista em fuga No mesmo dia, entra em
vigor o mercado comum; primeira redução dos direitos aduaneiros entre os Seis.
Dois dias depois, Fidel
Castro entra triunfalmente em Havana.
Em Portugal logo nos primeiros
dias de Janeiro, Humberto Delgado foi compulsivamente aposentado e pede asilo
político na embaixada do Brasil. Nos meados de Janeiro, Henrique Galvão que se
encontrava no Hospital de Santa Maria em regime de prisão consegue fugir, e
pedir asilo político na embaixada da Argentina, donde parte pouco depois para o
exílio. Corre uma petição nacional para demitir Salazar e a PIDE não dá
tréguas, fazendo a detenção de dezenas de pessoas.
A meio de Fevereiro Fidel Castro, é o
novo Primeiro-Ministro de Cuba, e a 19 do mesmo mês a independência de Chipre é
acordada entre a Turquia, Grécia e Reino Unido.No início de Março, a safra do bacalhau estava quase a acabar. Parte do pessoal já tinha sido dispensado até à próxima e os navios faziam os últimos preparativos para a partida. Foi nessa altura que se deu a Revolta da Sé com Manuel Serra e o major Calafate. Mário Soares chama-lhe de inspiração católica. Participariam também o major Pastor Fernandes e o capitão Almeida Santos, cujo cadáver viria a ser encontrado um mês depois no Guincho. Enquanto isso, De Gaulle decide manter, em caso de guerra, um comando nacional quanto aos navios estacionados no Mediterrâneo, dando assim um sinal de independência relativa à NATO
N primeiro de Abril é inaugurado em Espanha o monumento do Vale de los Caídos. Dois dias depois o Dalai Lama foge para a Índia e Fidel Castro visita os E.U. Ainda em Abril, precisamente no dia em que o Manuel comemorava 41 anos, Delgado parte para o Brasil. Dias depois George Papandreou funda o Partido Liberal Democrático na Grécia, e Liu Shao-ch'i é o novo Presidente da República Popular da China.
A 17 de Maio, é inaugurado o Monumento ao Cristo Rei em Almada. Era o cumprimento de uma promessa dos bispos portugueses se Portugal não entrasse na guerra. Nem Salazar nem o presidente da República estiveram na Inauguração, desculpando-se com a autonomia da Igreja, numa altura em que os clamores da revolta se ouviam cada vez mais fortes. À noite o Manuel sentou nas escadas do barracão com os filhos e mostrou-lhes o Monumento que se via iluminado para lá das águas do Rio. Ele gostaria de levar a família a ver de perto o Monumento, mas onde arranjar dinheiro para as passagens? Quando a safra acabava, a mulher ficava sem trabalho até ao regresso dos navios em Setembro, e as bocas a comer eram sempre as mesmas. Por essa altura outros problemas atormentavam o Manuel. A professora dos filhos mandara-o chamar para lhe dizer que achava um crime que a sua filha não fosse estudar dado que era uma criança muito inteligente. Dissera-lhe ainda que ela própria, ia prepará-la para o exame de admissão, e pedir uma ajuda uma bolsa ou lá o que era para ela poder continuar a estudar. Se por um lado ele ficava feliz pela inteligência da sua menina, por outro interrogava-se como iria conseguir pô-la a estudar. É que ainda que a professora conseguisse a tal ajuda, isso não era tudo. A miúda não podia ir estudar para o Barreiro com as tamanquitas de madeira com que ia para a primária, ali ao pé da porta. E as roupas? E tudo o resto? E ainda que conseguisse havia a mais velha. Saíra da escola no ano anterior, gostaria de estudar, lia tudo o que apanhava à mão e até gostava de escrever histórias. Decerto ia ficar revoltada da irmã ir estudar e ela não. Mas por outro lado a mais velha era uma moça forte, podia tinha já quase o corpo de uma mulher e podia melhor aguentar o trabalho que a segunda que fora sempre uma miúda franzina, e medrosa. Por outro lado havia o rapaz. A professora acabara de lhe comunicar que o miúdo ficava mais um ano na primeira classe. Ele até parecia um miúdo inteligente, mas era “ pelego”. Ninguém no entendia, a não ser os pais. Dizia “pachino” em vez de paizinho, “machina” em vez de mãezinha, chamava a irmã Elvira de “Nebida” a Lourdes de “Nudes” e por aí fora. Claro que se a professora não o entendia era natural que ele não passasse. Mas e se ele nunca conseguisse falar bem, angustiava-se o Manuel. Em tempos levara-o ao médico. Mas ele dissera que não podia fazer nada, que talvez mais tarde com a mudança de idade ele ficasse normal. Mas ele já estava prestes a fazer 9 anos e nada. Um dia a cunhada dissera à Gravelina, para meter o miúdo num fole e percorrer com ele 7 freguesias. Coisa que eles nunca fizeram. Em parte por não acreditarem na receita, em parte também porque a distância entre as 7 freguesias era de vários Kms, o miúdo era pesado e a mãe nunca mais fora a mesma mulher forte que era desde que ele nascera.
Até parecia castigo. Tanto que ele desejara aquele filho. E afinal depois que ele nascera multiplicaram-se os seus problemas. Primeiro com a doença da mulher, depois, o miúdo gostava de se isolar, de brincar sozinho. Tivesse ele uns pedacitos de madeira uns pregos e um martelo e ele brincaria uma tarde inteira sozinho. Ou um balde com água e terra. E era vê-lo entretido em grandes construções.
Assim naquela noite enquanto mostrava aos filhos o monumento iluminado lá ao longe, Manuel erguia uma prece ao Cristo Redentor, suplicando ajuda para o seu menino.
A TODOS UM BOM FIM DE SEMANA