Elisa viu-se nessa altura obrigada a
contar a verdade aos pais. Tinha que deixar o filho com alguém para ganhar-lhe
o sustento. E quem melhor que os pais? O pai só lhe disse que devia ter contado
antes. E que tomaria conta do neto, como se fora um filho. Elisa deixou o filho
lá na aldeia e veio para Lisboa ser criada de servir. Não pensava em namorados. Tudo o
que juntava mandava para os pais, para o sustento do filho. Mas um dia conheceu
o António. António era moço de Lisboa, com muito mais experiência de vida, e
não foi difícil dar a volta à cabeça da jovem. Prometeu-lhe casamento,
criar-lhe o filho, dar-lhe até o seu nome. Elisa ia viver com ele, e logo que
acabasse a tropa, tratavam do casório. E mandavam vir o filho. Elisa acreditou.
E um tempo depois deu-se conta que estava outra vez grávida. Quando António
soube da gravidez, os seus modos alteraram-se. Começou a chegar cada dia mais
tarde, com a desculpa de que tinha serviço no quartel. E um dia deixou de
aparecer. Elisa foi lá ao quartel. Queria saber o que se passava. Mas lá
disseram-lhe que ele tinha pedido para ser transferido. E começou novo calvário
para Elisa. Quando o adiantado estado de gravidez não a deixava já trabalhar,
recorreu à instituição de Santa Zita, que a ajudou até que a menina nasceu, bem
como nos primeiros tempos, até que ela conseguiu com a ajuda da instituição
arranjar trabalho.
A vida de Elisa foi uma vida de
escravidão ao trabalho para criar os filhos. Porque depois da morte da mãe,
teve que ir buscar o filho mais velho, para junto de si. Foi pai e mãe dos
filhos.
Nunca mais quis ouvir falar de homens
na sua vida.
Quando os filhos cresceram, Portugal tornou-se pequeno para os seus sonhos. Só
pensavam em emigrar para o Brasil. O sonho duma vida melhor fez com que
juntassem todos os tostões para a viagem. E lá foram deixando a promessa de
mandarem ir a mãe tão logo tivessem casa e trabalho.
A principio as cartas do Brasil
chegavam todas as semanas. Eram cartas cheias de novidades e promessas. Depois
passaram a ser de mês a mês. A vida corria bem, a filha tinha até casado, e só
estavam esperando mudar de casa para mandar a passagem. É que a casa era
pequena. Mais tarde nascera a neta, a despesa era maior. Depois o filho casou,
tinha mais despesas. Aos poucos Elisa apercebeu-se que tinha perdido os filhos
quando se despediu deles em Alcântara.
Por fim as cartas deixaram de chegar.
O olhar perdeu-se no horizonte, o corpo foi-se vergando ao desgosto e ao peso
dos anos.
Elisa foi hoje a sepultar...
Nunca vi um funeral tão triste. Meia
dúzia de vizinhos, ninguém de família. E enquanto a terra caía sobre a urna, eu
pensava se os filhos iriam pensar algum dia no abandono a que votaram a mãe.
Elisa foi hoje a sepultar... e
enquanto jogo uma flor sobre a sepultura murmuro uma prece:
Senhor, se é verdade que existe o
paraíso, tem piedade desta tua serva, que já teve o seu inferno...
Maria Elvira Carvalho
16 comentários:
Estou aqui emocionada, arrepiada...LINDO demais apesar de triste a vida de Elisa, pobre que acreditou em promessas e ainda viu-se abandonada pelos filhos, cada um pensando somente nas suas coisas e famílias,,, ADOREI ler! De bom tamanho, especial mesmo! beijos,chica
Incrivelmente lindo! estou emocionada!
Bjs
Oi Elvira!
Meu Deus que história triste. Mas acontece até hoje, filhos não querem velhos empecilhos em casa e os jogam em asilos.
Eu cuidei dos meus velhos até a morte.
Um conto real de uma inocente menina.
Beijos
Lua Singular
Que vida triste a desta Elisa! Espero bem que a minha Elisa tenha melhor sorte...
Beijinho
Por vezes a vida é muito madrasta para os pobres e deserdados da vida.
Um mal nunca vem só e desta feita tudo correu azedo para esta pobre mulher.
Quantas vezes na vida a gente se pergunta qdo é que a luta vai passar e a felicidade vai chegar?
Tem momentos que parece que tudo de ruim vem junto.
Fiquei emocionada.
bjokas =)
E esta é só mais uma Elisa...
Parabéns amiga por este teu conto.
Podes crer que chorei...
beijo
anacosta
Minha amiga não sei se é uma
história verídica ou não. Mas
até pode ser, porque casos desses
não faltam. Há mulheres que
sofrem imenso para criar os
seus filhos e depois não
recebem um pouquinho do muito
que deram.
Bj.
Irene Alves
Elvira,
A tristeza também é condimento da vida, e não há dúvida de que esta história está bem condimentada desse sentimento.
Conheço algumas histórias assim.
Beijo :)
Tampoco sé, apreciada Elvira, si es historia real o de ficción, pero en todo caso es emocionante y muy creíble.
Excelente texto.
Olá, estimada Elvira!
Não estou a seguir o conto, daí, não o comentar.
Deixo-lhe, no entanto, um beijo e abraço para todos.
Tenho que confessar que espera para a Elisa alguma recompensa pelos desaires da vida e pelo sacrifício que fez pelos filhos, mas, infelizmente todos nós conhecemos casos desses, onde, como se costuma dizer " uma desgraça nunca vem só. Gostei muito e agora só me resta pedir-te um novo conto, pode ser? Obrigada, amiga e muitos beijinhos. Sucesso nos estudos.
Emília
Os filhos crescem, um dia batem asas e partem e depois é tudo uma incógnita. Temos que estar preparados para isto, mesmo que isso nos doa muito...
Abraço do Zé
Bom dia de sábado!!!!
Agradeço sua visita tão carinhosa
e desejo sempre o melhor pra vc
tenha um final de semana cheio de alegria com esse post divino, que
sempre enche nossos olhos de muita
alegria bjussss
Abraços com carinho!
└──●► *Rita!!
Olá, Elvira!
É um enorme drama, numa vida sofrida; que de tanto o ser dá vontade de perguntar se valia a pena ter sido vivida...E que é comum a tanta gente, infelizmente.
Muito bem contruido o texto, como sempre.
Um abraço e boa semana
Vitor
Comoveste-me muito, Elvira, com este conto.Ainda sinto um nó na garganta e as lágrimas a acudir aos olhos.Uma vida marcada pelo sofrimento. Elisa, uma mulher trabalhadora, uma boa mãe, acabou os seus dias na maior solidão. Não merecia este fim tão trágico! Porém, histórias como esta encontramo-las na vida real e agora que muitos jovens são obrigados a partir este é o epílogo a que muitos pais estarão sujeitos. Há que estar preparado para tudo.Gostei muito! Continua, amiga. Beijinhos
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